Clinical Chemistry 48:1 18-24 (2002) Miniresenha ____________________________________________________________________________________ Detecção da Telomerase nos Fluidos Corporais JENNIFER L. HESS1 e W.EDWARD HIGHSMITH, JR.2 * ______________________________________________________________________ Background: A telomerase é uma proteína ribonucléica que conserva o comprimento do telômero cromossômico. A telomerase não é ativa nas células somáticas não-malignas, mas é ativada na maioria dos cânceres humanos. A atividade telomerase em fluidos corporais facilmente colhidos que envolvem os tumores pode se constituir num útil marcador do câncer, especialmente quando usado em conjunto com a citologia convencional. Metodologia: São revisados os resultados de estudos que analisaram a atividade da telomerase em fluidos corporais de fácil coleta. Conteúdo: O ensaio do protocolo da amplificação repetida da telomerase (TRAP) [telomerase repeat amplification protocol] tem sido utilizado para medir a atividade da telomerase, incluindo ascites, líquidos pleurais, lavados pélvicos lavados brônquicos lavagem brônquica urina, lavados da bexiga, rinsagens orais e plasma. A atividade da telomerase apresenta sensibilidades de 60-90% como marcador de tumor com especificidades clínicas para câncer de ~90%. A atividade telomerase é mais sensível do que a citologia convencional, cuja sensibilidade observada em diversos estudos foi de 40-65%. Resumo: A atividade telomerase em fluidos corporais, conforme determinada no ensaio TRAP, é um sensível marcador potencial de que pode ajudar a aumentar a detecção do câncer e a taxa de tratamentos bem-sucedidos quando usado em combinação com a citologia convencional. ________________________________________ 2 NOTAS DE RODAPÉ 1 Program in Human Genetics e 2 Department of Pathology, University of Maryland at Baltimore, 737 w. Lombard St., Baltimore, MD 21201. *Address correspondence to this author at: Department of Pathology, University of Maryland at Baltimore, 7-22 MSTF, 10 South Pine St., Baltimore, MD 21201. Fax 410-706-8414; e-mail [email protected]. 3 Abreviaturas não padronizadas: TRAP, protocolo de ampmlificação de repetição de telômeros [telomere repeat amplification protocol]; HCC. carcinoma hepatocelular [hepatocellular carcinona]; e PC, carcionomatose peritoneal [peritoneal carcionomatosis]. Received March 15, 2001; accepted October 9,2001. ______________________________________________________________________ Os terminais dos cromossomas são estabilizados e protegidos da degradação por nucleases intercelulares [e] por estruturas nucleoproteínicas especializadas, os telômeros. O componente DNA dos telômeros é consistido por muitas centenas a muitos milhares de simples seqüências repetidoras. Nos mamíferos, essa seqüência é 5'-TTAGGG-3' (1-3 ). Por isso que o mecanismo de replicação do DNA não pode replicar inteiramente os terminais do DNA linear, os telômeros progressivamente encurtam a cada rodada [round] de replicações celulares (4). Eventualmente, atinge-se um comprimento criticamente curto de telômero, e a célula interrompe a divisão e envelhece (5-7). Acredita-se que esse fenômeno funcione como uma espécie de “relógio molecular”, limitando a vida das células individuais. Contudo, os tipos de células que, como parte da sua biologia normal, devem replicar durante muitas rodadas de divisão celular, e.g., células-germe, células de embrião, e células-tronco, devem possuir um mecanismo que "acerta o relógio" (8, 9 ). Esse mecanismo é proporcionado pela enzima telomerase, uma proteína ribonucléica que reconhece os terminais dos telômeros e acrescenta repetições adicionais (1-3 ). Na maioria dos tipos de células pósembrionárias, a atividade da telomerase é regulada para baixo; nas células cancerosas, porém, a expressão da telomerase é ativada (8-11). Por isso, a telomerase tem sido o foco de muita pesquisa nos últimos anos, com crescente interesse no papel desempenhado por esta enzima na carcinogênese, como um marcador para quimioterapia anticâncer e como um marcador biológico para detecção do câncer. A telomerase é uma proteína ribonucléica com três componentes: duas sub-unidades de proteína e uma sub-unidade de RNA. O cerne catalítico consiste de hTERT, a subunidade catalítica com atividade transcriptase reversa, e hTR, componente codificar de RNA (12-14). A segunda proteína da telomerase, o hTP, pode desempenhar um papel 3 estrutural. O hTR e o hTP são expressos ubiqüitariamente, com a taxa de liberação de hTERT como limite da atividade de telomerase (15). Kim et al. (8) demonstraram que a atividade telomerase pode ser detectada em diversos tumores sólidos e em malignidades hematológicas. Estudos adicionais em muitos laboratórios mundiais têm demonstrado que a telomerase é ativa em 80-90% dos cânceres humanos (8-11). Revisões recentes sobre a detecção de telomerase em tecidos constam das Referências (16-18). A presente revisão compara e contrasta os resultados de estudos que têm procurado avaliar a utilidade da telomerase como um marcador de tumores em fluidos corporais (Tabela 1). Ensaios da atividade telomerase Têm sido desenvolvidos diversos métodos de deteção da atividade telomerase. Para medir a atividade telomerase, não só é necessário que todos os componentes da telomerase tenham sido liberados na célula ou tecido que está sendo estudado, como é também preciso que eles estejam corretamente reunidos numa unidade funcional capaz de acrescentar repetições de 5'-TTAGGG-3' à extremidade do telômero. O ensaio do protocolo da amplificação repetida da telomerase (TRAP)3 e as variações desse ensaio são os métodos mais comumente para o monitoramento da atividade telomerase. O ensaio TRAP, originalmente descrito por Kim et al. (8), é um ensaio com dois estágios, baseado em PCR. No primeiro estágio, a telomerase acrescenta repetições de 5'-TTAGGG-3' ao final de um primer sintético (denominado primer TS) que apresenta uma seqüência tipo telômero No segundo estágio, os produtos oligonucleotídios extendidos são amplificados com uso de um primer reverso (denominado primer CX), que é complementar às seqüências repetidas. Quando visualizadas por auto-radiografia, um teste positivo com o ensaio TRAP revela uma seqüência de bandas diferindo em 6 bp, do comprimento da repetição hexamérica 5'-TTAGGG-3' (8). O volume da banda pode ser quantificado por densitometria, imagens obtidas por fosforescência ou por fluorescência após a incorporação de 32P durante a amplificação ou depois da coloração com SYBR Green TM (Sondas Moleculares). O ensaio TRAP é altamente sensível e específico para a atividade telomerase em amostras de tumores, mas tem diversas limitações práticas. Entre estas, o fato de ser mão-de-obra e tempo intensivo, geralmente exigindo um técnico experimentado durante 4 24 h para gerar resultados. Outra limitação significativa é que, devido a telomerase conter um componente RNA, a atividade é instável e facilmente destruída pela RNase. Por conseguinte, o protocolo de preparação de amostras para o ensaio TRAP é complexo e exige atenção cuidadosa na coleta de amostras. Adicionalmente, o ensaio TRAP, conforme descrito originalmente por Kim et al. (8), requer o uso de radioatividade e eletroforese de gel poliacrilamida. Por esses motivos, têm sido feitas diversas modificações no ensaio TRAP, a fim de torna-lo mais “amigável para o usuário”. Um desses métodos modificados, o jogo de reagentes de detecção da telomerase comercialmente conhecido como TRAP-eze® (Intergen Discovery Products), inclui os reagentes necessários acondicionados de maneira conveniente (19); é considerado mais sensível e econômico e menos mão-de-obra-intensivo do que o ensaio TRAP convencional (19). O TRAP-eze ainda usa radioatividade e eletroforese de gel poliacrilamida, e requer o trabalho de um técnico durante 8-10 horas. Foi descrito um ensaio de telomerase que substitui a etapa de eletroforese por um sistema de detecção ELISA. Neste sistema, o produto amplificado por PCR é ‘hibridizado’ com sondas que são complementares à seqüência 5'-TTAGGG-3’, seguido da quantificação ELISA (20). Wu et al. (20) recentemente comparam este protocolo com o ensaio TRAPeze. Esse grupo verificou que o TRAP-eze e o TRAP ELISA têm faixas lineares de 250-5000 célula-equivalentes. Mais recentemente, os autores concluíram que nenhum dos dois métodos parece apresentar uma vantagem nítida sobre o outro. Foi proposto que os pesquisadores façam usos do método com que se sintam mais confortáveis, e usem o outro método como método de backup ou doublecheck (20). Uma outra limitação do ensaio TRAP é que se trata de uma técnica de fase de solução, de modo que informações sobre o tipo de célula que libera a telomerase são perdidas. Não é possível saber se a atividade telomerase tem origem em células do tumor ou em outras células presentes na amostra, tais como linfócitos ativados. Para eliminar esta limitação, Ohyashiki et al. (21) desenvolveram um ensaio TRAP in situ que utiliza corantes fluorescentes e microscopia para visualizar a atividade telomerase nos núcleos das células de interesse. Objetivando eliminar as questões técnicas no ensaio TRAP, diversos autores têm desenvolvido ensaios de hibridização in situ para a quantificação do hTR RNA e do 5 hTERT mRNA e correlataram os resultados com fatores de prognóstico para os tumores (22). A liberação de hTR e hTERT não indicam necessariamente a atividade telomerase. A atividade telomerase em fluidos corporais: Razões Diversos laboratórios têm investigado a liberação da atividade telomerase em tumores vs tecidos sadios e não-malignos (8, 9,16, 17). Contudo, a coleta de amostras na maioria dos tumores é prática invasiva e imprópria para ensaios seriais. Por este motivo, os pesquisadores começaram a realizar ensaios da atividade telomerase em fluidos corporais que podem conter células de tumores e que tenham sido liberadas do local do tumor, e passaram a comparar os resultados com variáveis tais como a progressão do tumor e o estágio do tumor. Essas amostras de fluidos, tais como ascites, efusões pleurais, catarro, lavagens ou lavados brônquicos, urina ou lavados da bexiga, rinsagens orais e plasma podem em geral ser obtidas por meios não-invasivos ou minimamente invasivos. Embora o exame citológico de células presentes nesses fluidos continue sendo o padrão para a detecção de muitos cânceres, a sua sensibilidade é geralmente de 50-75% (Tabela 1). Medindo a atividade telomerase em ascites/efusões pleurais Vários pesquisadores têm investigado o uso de medições da atividade telomerase na diferenciação da etiologia benigna ou maligna do ascites. Tangkijvanich et al. (23) mediram a atividade telomerase em ascites não-malignas e em ascites relacionadas a malignidade associadas ao carcinoma hepatocelular (HCC) e à carcinomatose peritonial (PC). A sensibilidade e especificidade do ensaio de telomerase na detecção de malignidade foram comparadas com a sensibilidade e especificidade da citologia. A atividade telomerase foi detectada em 81% das amostras de ascites relacionadas com PC e 67% das amostras relacionadas com HCC. Curiosamente, PC e HCC foram diagnosticados positivamente pela citologia em apenas 56% e 11% dos casos, respectivamente. A taxa falso-positiva da telomerase, ou o número de casos de ascites em que a atividade telomerase detectada foi 4,3%; todas essas amostras apresentavam algum grau de contaminação linfática. Para HCC e PC combinados, as sensibilidades gerais da atividade telomerase e da citologia foram 76% e 40%, respectivamente; as enquanto as especificidades foram 95,7% e 100%, respectivamente. Os autores 6 concluíram que a atividade telomerase é mais sensível do que a citologia no diagnóstico de PC e HCC, e que a atividade telomerase pode ser útil na detecção de metástases intraperitoneal incipientes (23). Duggan et al. (24) concluíram que a atividade telomerase é mais sensível do que a citologia em amostras de ascites de pacientes com câncer ovariano. A atividade telomerase foi detectada em 88% das amostras ascíticas de pacientes com câncer ovariano, enquanto um diagnóstico citológico positivo foi encontrado em apenas 64% dos pacientes. A diferença em especificidades foi estatisticamente significativa. A taxa da atividade telomerase falso-positiva foi 5%. Contudo, uma das razões para cautela ao considerar esses dados é que este grupo [de pesquisadores] detectou a atividade telomerase em amostras que permaneceram 5 dias em temperatura ambiente sem serem processadas (24). Segundo a experiência de muitos laboratórios de pesquisa, a atividade telomerase é sensível à degradação. Por conseguinte, as amostras geralmente requerem tratamento imediato com inibidores RNase e congelamento instantâneo para conservar a atividade telomerase. A questão do processamento de amostras também influencia a confiabilidade do estudo realizado por Cunningham et al. em 1997 (25). Esse grupo realizou ensaios de atividade telomerase com amostras de lavados pélvicos de pacientes com diversos tipos de tumor com diferentes localizações. As efusões pleurais e os lavados pélvicos são fluidos cujas amostras, ao serem colhidas, podem conter células de tumores proveniente de localizações diversas, inclusive pulmão, seios, ovários e trato gastrointestinal, porque os carcinomas em qualquer órgão podem sofrer metástase na pleura. Esses resultados foram comparados com amostras, aspiradas por meio de agulhas finas, dos mesmos pacientes. Este estudo tenha baixo número de amostras (n = 24). Somente seis das amostras de lavados foram citologicamente positivas, e somente quatro destas apresentaram atividade telomerase detectável. No entanto, as amostras ficaram sem processar 2 a 3 dias, de modo que as duas amostras que eram citologicamente positivas e telomerase negativas podem ter sido amostras positivas degradadas, e, portanto eram falso-negativas. Adicionalmente, a especificidade de detecção da atividade telomerase foi mais alta nos aspirados com agulhas finas (25). Deve ser notado, porém, que este trabalho foi realizado em 1997, quando o ensaio TRAP ainda estava nos primeiros anos de pesquisa da sua utilidade. 7 Yang et al. (26) apresentaram provas mais convincentes da utilidade clínica da telomerase em efusões pleurais em três grupos: (a) efusões pleurais malignas, de acordo com diagnóstico citológico; (b) efusões pleurais não-malignas; e (c) efusões pleurais suspeitas de malignidade, mas citologicamente inconclusas. Das 144 amostras, foi detectada atividade telomerase em 91% (64 em 70) das amostras malignas, 91% (20 em 22) amostras suspeitas, e apenas 5,8% (3 em 52) das amostras não-malignas. Em geral, a atividade telomerase tinha uma sensibilidade de 91%, uma especificidade de 94% um valor de previsão positiva de 96%, e um valor de previsão negativo de 89%. Curiosamente, os três resultados falso-positivos neste estudo foram de amostras de pacientes com tuberculose. Os autores comentaram que a prevalência da tuberculose é maior entre pacientes de câncer e concluíram que a medição da atividade telomerase é um auxiliar útil da citologia na avaliação de efusões pleurais malignas (26). A atividade telomerase em lavados brônquicos/amostras de lavagens Amostras de lavagem brônquica e de amostras de lavados brônquicos têm sido usadas para avaliar a utilidade das medições da atividade telomerase em pacientes com câncer pulmonar. Yahata et al. (27) compraram diagnósticos citológicos de câncer do pulmão com a atividade telomerase medida pelos dois métodos, o TRAP fase-de-solução e o novel ensaio TRAP in situ. Para o ensaio in situ, as células de lavados brônquicos foram imobilizadas em lâminas de vidro, foi realizado o protocolo TRAP, e uma amostra foi considerada telomerase positiva quando o sinal fluorescente estava presente no núcleo. Para as duas versões do ensaio TRAP combinado, a sensibilidade para o câncer pulmonar foi 82%, enquanto a sensibilidade citológica foi apenas 41%; havia uma concordância de 77% entre as duas versões do ensaio TRAP. A atividade telomerase pôde ser detectada independentemente da localização do tumor pulmonar. Os autores concluíram que a combinação da citologia com os ensaios TRAP é útil para o diagnóstico precoce e o monitoramento do câncer pulmonar (27). Este grupo publicou um segundo estudo (28) em que foi pesquisada a atividade telomerase medida pelo método in situ em diversos casos de câncer pulmonar. O ensaio TRAP in situ apresentou alta sensibilidade à célula de carcinomas, adenocarcinoma, células grandes de câncer e metástase de carcinoma do cólon, mas não apresentou sensibilidade para células pequenas de câncer. Além disso, todas as células que foram telomerase positivas 8 apresentaram características morfológicas de malignidade (28). Contudo, este estudo contava com pequeno número de amostras (n = 18). Seria interessante e útil se essas observações fossem reproduzidas com um conjunto maior de amostras. Xinarinanos et al. (29) constataram que a atividade telomerase em amostras de lavagem brônquica era 70% sensíveis em pacientes com células não-pequenas de câncer pulmonar. Também foram comparadas amostras de lavagem brônquica de paciente isentas de células não-pequenas de câncer pulmonar obtidas de controles de saúde, e a taxa de detecção da atividade telomerase foi comparada com a taxa de detecção dos exames citológicos. A atividade telomerase foi detectada mais freqüentemente em células escamosas de carcinoma do que em adenocarcinomas. Noventa por cento das amostras citologicamente positivas foram igualmente positivas pela atividade telomerase, além disso, 54% das amostras negativas por citologia possuíam atividade telomerase. A sensibilidade da citologia em si foi 43%, quando a citologia foi combinada com o ensaio TRAPa sensibilidade combinada alcançou 74% (29). Os autores observaram que esta taxa de sensibilidade combinada era mais elevada do que a sensibilidade que estava sendo então alcançada rotineiramente no teste diagnóstico de câncer pulmonar. Medindo a atividade telomerase na urina/lavados da bexiga CÂNCER DE BEXIGA Os ensaios de atividade telomerase podem aumentar a detecção do câncer na urina e nas amostras de lavados da bexiga. Kinoshita et al. (30) constataram que a atividade telomerase era 80% sensível quando a resultada de amostras de urina e irrigações da bexiga do mesmo paciente era combinada. A análise citológica desse paciente era apenas 42% sensível. O ensaio TRAP era 100% específico para pacientes com câncer. Talvez ainda mais importante, o ensaio TRAP era assinaladamente mais sensível que a citologia na detecção dos tumores mais tratáveis (grau 1); a percentagem de amostras positivas detectadas pelo ensaio TRAP e pela citologia era 75% e 8%, respectivamente (30). Yoshida et al. (31) obtiveram resultados semelhantes com amostras de urina. A sensibilidade do ensaio TRAP na urina foi 62%; a sensibilidade do ensaio TRAP em 9 amostras de tumores primários foi 86%; e a especificidade do ensaio TRAP foi 96%. [Este estudo não apresentou uma comparação com a citologia (31).] Semelhantemente, Kalavier et al. (32) compararam o ensaio TRAP, neste caso na versão TRAP-eze, com citologia em amostras de urina de pacientes com câncer da bexiga. Todos os pacientes de câncer tinham sido diagnosticados, mas ainda não tratados. Foi observada uma diferença estatisticamente significativa entre a sensibilidade do ensaio TRAP (85%) e da citologia (51%), mas o ensaio TRAP apresentou uma taxa de 39% falso-positivos, cuja explicação mais provável era de que esses pacientes tinham sofrido inflamações graves e as células inflamatórias contaminaram as amostras (32). Ramakumar et al. (33) analisaram amostras de urina vertidas de pacientes com câncer de bexiga com os controles, para comparar as sensibilidades e especificidades de diversos métodos de triagem de câncer de bexiga, incluindo o antígeno do tumor de bexiga (BTA), a proteína matriz nuclear 22 (NMP22), produtos de degradação da fibrina/fibrinogênio (FDP), hemoglobina quimioluminescente e os ensaios TRAP. Entre todos os métodos analisados o ensaio TRAP apresentou mais altas sensibilidades (67%) especificidade (99%). Para todos os tumores, e entre todos os graus e estágios de tumores, a telomerase apresentou a associação mais forte com o câncer da bexiga, a associação sendo especialmente forte entre a atividade telomerase e os tumores grau 1 e não-invasivos (33). CÂNCER DE PRÓSTATA Meid et al. (34) investigaram o uso da análises TRAP em urina vertida após massagem da próstata, para detecção de câncer da próstata. Os autores observaram que o exame citológico de células esfoliadas em sedimentos de urina, mesmo após massagem da próstata, apresenta uma sensibilidade relativamente fraca para detecção de câncer da próstata. A atividade telomerase foi detectada em 14 de 24 amostras de pacientes com câncer da próstata e em nenhuma dos 12 controles sem evidência histológica de neoplasia (sensibilidade, 58%; especificidade, 100%). O teste de telomerase apresentou mais sensibilidade em 9 pacientes com câncer fracamente diferenciado (8 em 9 positivos) do que em 15 pacientes com tumores bem ou moderadamente diferenciados (6 em 15 positivos). Para abordar a questão da estabilidade da telomerase na urina, células de PC-3 ou LNCaP foram misturados com urina recentemente vertida e 10 incubada na temperatura ambiente ou 4°C. Como substituto da estabilidade telomerase, o RNA foi extraído dessas células, e a integridade do RNA foi avaliada pela aparência das bandas de RNA 18S e 28S com eletroforese de gel de agarose. Mesmo após incubação por 30 minutos, o RNA extraído estava marcadamente degradado. Os autores verificaram que a adição de EDTA a uma concentração final de 20 mmol/L estabilizava o RNA durante até 2 h a 4 °C. Embora esses autores não tenham medido a atividade telomerase em amostras de urina células adicionadas para uma determinação direta da estabilidade da telomerase, eles foram os primeiros a tratar dessa questão crítica. Os autores concluíram que as medições da atividade telomerase podem ser úteis na detecção do câncer de próstata, mas observaram que para tratar da questão da estabilidade seria necessário investigar mais. Medindo a atividade telomerase em outros fluidos: rinsagens orais e plasma Em rinsagens orais de pacientes com câncer na cabeça e no pescoço, a sensibilidade do ensaio TRAP foi somente 32%, embora tenha sido positiva em 80% dos tumores (35). O plasma sanguíneo é um dos fluidos corporais dos quais mais amostras são colhidas rotineiramente, sendo obtido após a centrifugação do sangue integral. À primeira vista, o plasma não aparenta ser útil como meio de amostragem para telomerase porque normalmente não existiriam células de tumores circulando no sangue. Contudo, se até mesmo um pequeno número de células de tumores sofrerem necrose e liberarem o seu conteúdo no plasma, haverá a possibilidade de serem detectados analitos tumorespecíficos. Embora diversos estudos tenham tratado da detecção do tumor-específico mRNA no plasma, este é um tópico mais amplo que foge ao escopo desta resenha. Existe um relatório de detecção de hTERT e hTR mRNA no plasma. Chen et al. (22) relataram a detecção desses ‘transcripts’ por transcrição reversa PCR. O hTR foi liberado em 94% dos tumores, encontrado em apenas 28% das amostras de plasma dos mesmos pacientes. Noventa e quatro por cento dos tumores, embora não os mesmos 94% com liberação de hTR, liberaram hTERT, mas somente 25% das amostras de plasma de pacientes foram positivas para hTERT mRNA (22). Uma vez mais, é crítico observar que a liberação de hTR e hTERT numa célula não correlata necessariamente com a atividade telomerase naquela célula. Este estudo, diferente dos estudos anteriormente discutidos, não estava medindo a atividade telomerase. 11 Sumário e futuras orientações A medição da atividade telomerase em fluidos de fácil obtenção pode ser uma ferramenta útil para o diagnóstico e monitoramento do progresso de cânceres. O ensaio TRAP de uso comum é sensível, mas tempo e mão-de-obra intensivo, e requer a preparação cuidadosa das amostras e um técnico cuidadosamente treinado. A especificidade do ensaio TRAP na detecção de malignidade é 94-100% (Tabela 1). A maioria dos relatórios mencionados nesta resenha observaram que resultados falsopositivos do TRAP eram mais provavelmente atribuíveis a contaminação por linfócitos. Isto significa que os resultados do ensaio TRAP podem ser melhor interpretados em conjunto com o exame citológico, ainda não foi definido o desempenho de algoritmos para a triagem combinada de citologia/telomerase. Igualmente, os testes de telomerase com sistemas de ensaios múltiplos (TRAP, TRAP in situ, análise da liberação de hTERT ) podem aumentar a sensibilidade na detecção de cânceres, mas possivelmente às custas de menor especificidade. A estratégia ótima para as análises com uso de um ou mais testes combinados de detecção de telomerase ainda está por definir. Métodos alternativos de detecção, como os ensaios ELISA para detecção da subunidade hTERT, poderiam estudar algumas das dificuldades técnicas. Usando o ensaio TRAP, os pesquisadores mediram a atividade telomerase em ascites, efusões pleurais, lavagens e lavados brônquicos, urina, lavados de bexiga e rinsagens orais. Em todos esses casos, com exceção do último mencionado, o ensaio TRAP foi mais sensível do que a citologia padrão na identificação de pacientes com câncer. Em muitos casos, a detecção precoce do câncer levou a opções de tratamento mais eficientes e conseqüentemente a uma maior taxa de sobrevivência para os pacientes. Os ensaios de atividade telomerase ainda estão por causar impacto no laboratório de análises clínicas de rotina. É razoável perguntar por que. Uma das razões é de ordem técnica. Poucos pesquisadores definiram com rigor a estabilidade da atividade telomerase em espécimes clínicos. Hou et al. (36) constataram telomerase de meiasvidas de 5 a 11 horas em três linhas de células; a meia-vida dos fluidos corporais é provavelmente menor. Do ponto de vista operacional, é provável que sejam críticas as questões relativas ao transporte e processamento de amostras. Além disso, os estudos disponíveis não demonstraram que a detecção da telomerase proporciona informações independentes para diagnóstico ou prognóstico. Até o momento falta desenvolver 12 algoritmos para decisão que incorporem ensaios de telomerase para qualquer tipo de tumor. Estudos de resultados também serão necessários nesta área. Parece que as medições de telomerase em fluidos corporais de fácil obtenção podem ser de muita utilidade para o laboratório de análises clínicas no diagnóstico do câncer. Obstáculos técnicos terão de ser superados, e as utilidades clínicas dos testes de telomerase terão de ser definidos com maior rigor antes que possa tornar-se rotina no laboratório de análises clínicas. 13 Referências 1. Morin GB. The human telomerase terminal transferase enzyme is a ribonucleoprotein that synthesizes TTAGGG repeats. Cell 1989; 59:521-9. 2. Olovnikov AM. A theory of marginotomy: the incomplete copying of template margin in enzymatic synthesis of polynucleotides and the biological significance of this phenomenon. J Theor Biol 1973;4: 181-90. 3. Watson JD. Origin of concatameric T7 DNA. Nat New Biol 1972;239:197-201. 4. Harley CB. Telomere loss: mitotic clock or genetic time bomb? Mutat Res 1991;256:271-82. 5. Wright WE, Peresia-Smith OM, Shay JW. Reversible cellular senescence; implications for immortalization of normal human diploid fibroblasts. Mol Cell Biol 1989;9:3088-92. 6. Goldstein S. Replicative senescence: the human fibroblast comes of age. Science 1990;249:1129-33. 7. Wright WE, Shay JW. Telomere dynamics in cancer progression and prevention; fundamental differences in human and mouse telomerase biology. Nat Med 2000;6:847-51. 8. Kim NW, Piatyszek MA, Prowse KR, Harley CB, West MD, Ho PLC, et al. Specific association of human telomerase activity with immortal cells and cancer. Science 1994;266:2011-5. 9. Shay JW, Bacchetti S. A survey of telomerase activity in human cancer. Eur J Cancer 1997;33:787-91. 10. Shay JW, Wright WE. Telomerase activity in human cancer. Curr Opin Oncol 1996;8:66-71. 11. Counter CM, Gupta J, Harley CB, Leber B, Bacchetti S. Telomerase activity in normal leukocytes and in hematologic malignancies. Blood 1995;85:2315-20. 12. Feng J, FunkWD, Wang SS, Weinrich SL, Avilion AA, Chiu CP, et al. The RNA component of human telomerase. Science 1995;269: 1236-41. 13. Lingner J, Hughes TK, Shevchenko A, Mann M, Lundlad V, Cech TR et al. Reverse transcriptase motifs in the catalytic subunit of telomerase. Science 1997;276:561-7. 14. Harrington L, Zhou W, McPhail T, Oulton R, Yeung DS, Mar V, et al. The catalytic subunit of yeast telomerase. Genes Dev 1997;11: 3109-15. 14 15. Counter CM, Meyerson M, Eaton EN, Ellisen LW, Caddle SD, Haber DA, et al. Telomerase activity is restored in human cells by ectopic expression of hTERT (hEST2), the catalytic subunit of telomerase. Oncogene 1998;16:1217-22. 16. Dhaene K, Van Marck E, Parwaresch R. Telomeres, telomerase and cancer: an up-date. Virchows Arch 2000;437:1-16. 17. Shay JW. Telomerase and cancer. In: Srivastavia S, Henson DE, Gazdar A, eds. Molecular pathology of early cancer. Amsterdam: IOS Press, 1999:425-33. 18. Dahse R, Fiedler, Ernst G. Telomeres and telomerase: biological and clinical importance. Clin Chem 1997;43:708-14. 19. Holt SE, Norton JC, Wright WE, Shay JW. Comparison of the telomeric repeat amplification (TRAP) to the new TRAP-eze telomerase detection kit. Methods Cell Sci 1996;18:237-48. 20. Wu Y-Y, Hruszkewycz AM, Delgado RM, Yang A, Vortmeyer A0, Moon Y-W, et al. Limitations on the quantitative determination of telomerase activity by the electrophoretic and ELISA based TRAP assays. Clin Chim Acta 2000;293:199-212. 21. Ohyashiki K, Ohyashiki JH, Nishimaki J, Toyama K, Ebinhara Y, Kato H, et al. Cytological detection of telomerase activity using an in situ telomeric repeat amplification protocol assay. Cancer Res 1997;57:2100-3. 22. Chen X, Bonnefoi H, Pelte M-F, Lyautey J, Lederrey C, Movarekhi S, et al. Telomerase RNA as a detection marker in the serum of breast cancer patients. Clin Cancer Res 2000;6:3823-6. 23. Tangkijvanich P, Tresukosol D, Sampatanukul P, Sakdikul S, Voravud N, Mahachai V, et al. Telomerase assay for differentiating between malignancy-related and nonmalignant ascites. Clin Cancer Res 1999;5:2470-5. 24. Duggan BD, Wan M, Yu MC, Roman LD, Muderspach LI, Delgadillo E, et al. Detection of ovarian cancer cells: comparison of a telomerase assay and cytologic examination. J Natl Cancer Inst 1998;90:238-42. 25. Cunningham VJ, Markham N, Shroyer AL, Shroyer KR. Detection of telomerase expression in fine-needle aspirations and fluids. Diagn Cytopathol 1997;18:431-6. 26. Yang C-T, Lee M-H, Lan R-S, Chen J-K. Telomerase activity in pleural effusions: diagnostic significance. J Clin Oncol 1998;16: 567-73. 27. Yahata NY, Ohyashiki K, Ohyashiki JH, Iwama H, Hayashi S, Ando K, et al. Telomerase activity in lung cancer cells obtained from bronchial washings. J Natl Cancer Inst 1998;90:684-90. 28. Dejmek A, Yahata N, Ohyashiki K, Kakihana M, Hirano T, Kawate N, et al. Correlation between morphology and telomerase activity in cells from exfoliative lung cytologic specimens. Cancer Cytopathol 2000;90:117-25. 15 29. Xinarinanos G, Scott FM, Liloglou T, Prime W, Turnbull L, Walshaw fivl, et al. Evaluation of telomerase activity in bronchial lavage as a potential diagnostic marker for malignant lung disease. Lung Cancer 2000;28:37-42. 30. Kinoshita H, Osamu 0, Kakehi Y, Mishìna M, Mitsumori K, Itoh N, et al. Detection of telomerase activity in exfoliated cells in urine from patients with bladder cancer. J Natl Cancer Inst 1997;89: 724-30. 31. Yoshida K, Sugino T, Tahara H, Woodman A, Bolodeoku J, Nargund V, et al. Telomerase activity in bladder carcinoma and its implications for noninvasive diagnosis by detection of exfoliated cancer cells in urine. Cancer 1997;79:362-9. 32. Kalavier E, Landman J, Chang Y, Droller MJ, Liu BC-S. Detecting human bladder carcinoma cells in voided urine samples by assaying for the presence of telomerase activity. Cancer 1998; 82:708-14. 33. Ramakumar S, Bhuiyan J, Besse JA, Roberts SG, Wollan PC, Blute ML, et al. Comparison of screening methods in the detection of bladder cancer. J Urol 1999;161:388-94. 34. Meid FH, Gygi CM, Leisinger H-J, Bosman FT, Benhattar J. The use of telomerase activity for the detection of prostatic cancer cells after prostate massage. J Urol 2001;165:1802-5. 35. Califano J, Ahrendt SA, Meininger G, Westra WH, Koch WM, Sidransky D. Detection of telomerase activity in oral rinses from head and neck squamous cell carcinoma patients. Cancer Res 1996;56:5720-2. 36 . Hou M, Xu D, Bjorkholm M, Gruber A. Real-time quantitative telomeric repeat amplification protocol assay for the detection of telomerase activity. Clin Chem 2001;47:519-24.