No Brasil deste fim de milênio apenas 1% da população brasileira

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UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
DAIANE CALIONI BERTON
DEMOCRACIA E DIREITOS HUMANOS: A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS EM UMA DEMOCRACIA
Ijuí (RS)
2015
2
DAIANE CALIONI BERTON
DEMOCRACIA E DIREITOS HUMANOS: A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS EM UMA DEMOCRACIA
Monografia final do Curso de Graduação em
Direito objetivando a aprovação no componente
curricular Monografia.
UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul.
DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e
Sociais
Orientador: MSc. Luiz Paulo Zeifert
Ijuí (RS)
2015
3
Dedico esta monografia a todos que de uma forma
ou outra colaboraram com minha trajetória
acadêmica, em especial a minha família, fazendo
com que fosse possível a realização deste trabalho
de conclusão de curso, bem como, em breve, a
formação no curso de graduação em direito.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos, em especial a minha
família, que de uma forma ou outra
contribuíram para realização deste trabalho, e
também pela contribuição que me foi
estendida no decorrer do curso.
5
“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos outros
com espírito de fraternidade.”
Artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos
Humanos - 1948
6
RESUMO
O presente trabalho de pesquisa monográfica tem como objetivo realizar um estudo
sobre a democracia e os direitos humanos, e de que forma se dá a efetivação desses direitos em
uma democracia. Para isso, foi realizado um estudo acerca do conceito, da história e de demais
peculiaridades de ambos os institutos para então se chegar ao objetivo proposto. Desse modo, o
resultado obtido através da pesquisa, demonstra que atualmente a efetivação dos direitos
humanos se dá com mais sucesso em uma democracia, isso, porém, não significa que se dê de
forma automática e que esse sucesso é uma consequência óbvia, é preciso a realização de um
conjunto de esforços para se chegar a efetivação. Destacamos ainda, que, a cidadania é um dos
elementos da democracia que mais tem colaborado para a efetivação dos direitos humanos na
atualidade.
Palavras-Chave: Democracia. Direitos Humanos. Cidadania. Dignidade da Pessoa
Humana.
7
ABSTRACT
This working monographic study aims to conduct a study on democracy and human
rights, and how to give the realization of these rights in a democracy. For this, a study was
conducted about the concept, history and other peculiarities of both institutes to then reach the
proposed goal. Thus, the results obtained through research, shows that currently the
realization of human rights is achieved more successfully in a democracy that, however, does
not mean it take automatically and that this success is an obvious consequence, it is necessary
conducting a series of efforts to arrive at effective. We also point out that citizenship is one of
the elements of democracy that has most contributed to the realization of human rights today.
Keywords: Democracy. Human rights. Citizenship. Dignity of human person.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................9
1 DEMOCRACIA...................................................................................................................11
1.1 Aspectos históricos............................................................................................................11
1.1.1 Democracia grega...........................................................................................................11
1.1.2 Democracia na modernidade..........................................................................................16
1.2 A democracia no Brasil: uma análise a partir das constituições brasileiras...............20
2 DIREITOS HUMANOS......................................................................................................24
2.1 Aspectos históricos............................................................................................................24
2.1.1 Marcos internacionais e nacionais de direitos humanos..............................................27
2.2 O conceito...........................................................................................................................28
2.2.1 Características dos direitos humanos.............................................................................30
2.2.2 Classificação dos direitos humanos................................................................................31
2.3 Os direitos humanos no Brasil.........................................................................................33
3 DEMOCRACIA E DIREITOS HUMANOS.....................................................................35
3.1 A relação existente entre democracia e direitos humanos.............................................35
3.2 Elemento articulador da democracia na efetivação dos direitos humanos..................36
3.2.1 A cidadania no Brasil......................................................................................................37
3.3 A efetivação dos direitos humanos em uma democracia...............................................40
CONCLUSÃO.........................................................................................................................46
REFERÊNCIAS......................................................................................................................48
ANEXO A................................................................................................................................51
9
INTRODUÇÃO
Somos uma geração que está presenciando uma fase de evolução dos direitos humanos
na história, evolução esta que deu início por volta do século XVIII, e encontra-se em
constante desenvolvimento até os dias atuais, através de movimentos que buscaram e buscam
consolidar esses direitos por acreditar que o ser humano encontra-se acima do Estado,
devendo então os direitos inerentes a pessoa humana prevalecer sobre ele.
Deste modo, o desafio proposto a este trabalho, é o de verificar de que forma a
democracia contribui para a efetivação desses direitos, uma vez que é nos Estados que aderem
a essa forma de governo que é possível contemplar com mais sucesso a efetivação dos direitos
humanos.
Para chegarmos ao resultado pretendido, o presente trabalho foi divido em três
capítulos. No primeiro capítulo, trabalharemos sobre a democracia. Analisaremos sua história
no decorrer dos séculos, o seu conceito, e a sua aplicabilidade nos Estados que aderem esta
forma de organização, entre eles, o Brasil.
No segundo capítulo, realizaremos uma análise acerca dos direitos humanos, sobre a
sua história, conceito, evolução e desenvolvimento destes direitos no Brasil e no mundo, bem
como quais documentos e movimentos foram fundamentais para que chegássemos a dimensão
do reconhecimento que chegamos, embora, infelizmente, ainda não se possa dizer que este
reconhecimento seja satisfatório, pois ainda há muito para ser realizado para que se possa
alcançar uma efetividade mais abrangente e de sucesso.
Por fim, no terceiro e último capítulo, far-se-á uma análise acerca de como se dá a
efetivação dos direitos humanos em uma democracia, destacando entre os elementos desta, a
10
cidadania, como um dos fatores que mais colabora para a efetivação dos direitos humanos
nesta forma de governo. E ainda, desmistificar o que o senso comum entende como direitos
humanos, esclarecendo que esses não são os diretos dos “criminosos”, e sim direitos inerentes
a toda pessoa humana independente de quem quer que seja não se devendo fazer distinção
entre eles, mas tratando todos com igualdade.
Destaca-se ainda, que o presente trabalho, será desenvolvido a partir do método de
abordagem hipotético- dedutivo, a partir de seleção de bibliografia e documentos referentes ao
assunto abordados nas mais diversas fontes de pesquisa. A partir de então, foi realizado leitura
e fichamento do material selecionado, uma reflexão crítica sobre o material selecionado, e a
exposição dos resultados, que pode ser verificado no decorrer desta monografia.
11
1 DEMOCRACIA
A democracia compreende um amplo assunto para estudo e debates, sua definição
ainda encontra-se em um patamar de divergências entre teoria e realidade, podendo ser
compreendido de diferentes formas. A mesma teve surgimento em Atenas, na Grécia Antiga,
e era conhecida como uma forma de governo.
Com a instituição do Estado Moderno, o termo democracia passou por variações no
seu conceito. A Constituição Federal de 1988 constituiu o Brasil como Estado Democrático
de Direito, e o embasou com fundamentos que fortalecem essa condição já no seu artigo 1º, e
ainda, no discorrer da mesma estabelece direitos e deveres que fortalecem o ideal
democrático, dispondo acerca das possíveis formas do exercício da cidadania.
Assim, o primeiro capítulo deste trabalho estará voltado para melhor compreensão e
elucidação do que é a democracia e de quais formas pode ser entendida e conceituada, e ainda
sua história, sua efetividade e sua influencia no decorrer dos séculos no Brasil e no mundo.
1.1 Aspectos históricos
A partir de agora, analisar-se-á a história da democracia, desde a Grécia Antiga até a
modernidade, e ainda, o que significava democracia para os gregos, e de que forma ela é
compreendida nos dias atuais.
1.1.1 Democracia grega
Até o final do século VI a.C., a Grécia encontrava-se em constante evolução política.
A partir deste momento, a cidade torna-se forte, e o indivíduo torna-se livre com a proteção
dela. Para os gregos, democracia não era apenas um conceito, mas uma realidade daquilo que
estavam desenvolvendo na polis ou cidade- estado. Segundo Anthony Arblaster (1987, p. 29),
A polis ou cidade- estado, era habitualmente uma entidade pequena,
autogovernada e auto mantida, que, à parte a sua autonomia política, tinha
muito poucas das características do Estado moderno. Na verdade, o termo
polis define certo tipo de sociedade política e não de Estado, se por Estado
entendermos uma estrutura de governo.
12
A palavra democracia significa em sentido etimológico “governo do povo”, ou
“governo da maioria”, é de origem grega, e reúne duas palavras mais curtas: demos e kratos.
Ambas as palavras possuem mais que um significado, demos podia e pode ser compreendida,
segundo Arblaster (1987), como todo o conjunto de cidadãos que viviam dentro de um
determinado aglomerado ou cidade-estado, ou ainda como “a populaça” ou “a ralé”. Já a
palavra kratos, podia significar “poder” ou “governo”.
Como a democracia significava
governo da maioria, e a maioria era pobre, seu significado era também, “governo dos pobres”
ou da “ralé”. Originariamente, a democracia significava: “O povo governando-se a si próprio,
sem mediações por meio de representantes, diretamente ou, se necessário, por rotação nos
cargos governativos entre os cidadãos”. (ARBLASTER, 1987, p. 94). Segundo Denis L.
Rosenfield (1994) A democracia era uma das possíveis formas de governo dentre outras duas,
monarquia “governo de um só”, e a aristocracia “governo de alguns”.
Atenas não foi a única cidade- estado conhecida como uma democracia, todavia foi a
mais estável de todas, e a mais duradoura, por este motivo, os estudos relacionados a
democracia na Grécia Clássica são realizados a partir dela. Antes disso, a estrutura de Atenas
era ditatorial e formada por aristocratas que nomeavam um de seus membros para ser o tirano
e tomar as decisões principais.
A democracia em Atenas teve seus primeiros ideais nos séculos VII e VI a.C., quando
o legislador Drácon, que teve posse em 621 a.C., foi nomeado como líder provisório da tirania
e realizou as seguintes tarefas:
indicou homens livres para elaborar leis, criou leis contra homicídios,
proibiu vingança das famílias, publicou normas com princípios de
solidariedade e fez leis de direitos comuns a todos os atenienses. Muitos
autores até defendem que as leis de Drácon formaram um verdadeiro
Código. (BAPTISTA, 2015).
Embora essas alterações, os comerciantes, os artesãos, os proprietários de terras e
também os escravos, continuavam reivindicando mais direitos. Reclamavam ainda do alto
valor dos tributos que deviam pagar ao governo. A classe média estava com medo de tornarse escrava, resolvendo então de lutar contra o governo tirano.
13
Assim, por volta de 594 a. C. a partir de uma constituição elaborada por Sólon,
aristocrata e legislador, os ideais democráticos foram ampliados. Nesta constituição, Sólon
dividiu os cidadãos em três classes, tendo como fundamento, as riquezas e propriedades de
cada indivíduo. Ficou determinado então que os cargos políticos pertenceriam às pessoas que
estavam na classe mais alta, já a classe mais baixa poderia participar na Assembleia ou
Eclésia e fazer parte dos júris (ARBLASTER, 1987). Segundo Mossé (apud BAPTISTA,
2015),
o aristocrata e legislador Sólon (posse em 594 a.C.), como novo arconte,
realizou a ampliação numérica de participantes das decisões públicas, criou
leis comuns a todos com ampla publicidade (Código), criou um Conselho de
400 membros que depois veio a ser chamado Conselho Bulé no governo de
Clístenes, ampliou o número de cidadãos de Atenas, rompeu com vários
costumes da política aristocrata etc.
No ano de 508 a.C., as reformas foram produto de conflito entre os aristocratas
conservadores, que neste momento eram dirigidas por Iságoras, e as massas conduzidas por
Clístenes. Iságoras pediu auxílio aos Espartanos para restaurar a oligarquia aristocrática,
todavia, Iságoras e os Espartanos foram cercados e rendidos pelas forças populares. Assim,
Clístenes retornou a Atenas, institui alterações na estrutura dos “círculos eleitorais” que eram
destinados a encorajar a lealdade dos cidadãos para com a polis como um todo. Aumentou
também o número de integrantes do conselho ou Bule1, passando de 400 para 500 membros.
(ARBLASTER, 1987).
Segundo Mossé (apud BAPTISTA), Iságoras foi declarado para o arcontado, todavia o
povo queria que Clístenes tomasse posse, o que aconteceu um ano depois. Foi nesse período
que o poder do rei tornou-se limitado, passando a prevalecer a vontade do povo. O povo não
queria no poder alguém que tomasse as decisões conforme sua própria vontade, todavia,
queriam realizar discussões e abrir o espaço público.
Conselho ou Bule: reunia – se diariamente e preparava a agenda para as reuniões da assembleia de
cidadãos. Cada uma das dez “tribos” ou círculos eleitorais escolhiam à sorte 50 pessoas para fazerem
parte do conselho durante um ano, e dentro do conselho esses 50 atuariam como comissão direta e
administrativa durante a décima parte do ano.
1
14
Deste modo, com a posse, Clístenes reconheceu que os homens livres nascidos em
Atenas, com idade superior a 18 (dezoito) anos, eram “cidadãos”, ou seja, aquelas pessoas que
poderiam participar do poder e das decisões públicas – excluindo os estrangeiros residentes
em Atenas (metecos), estrangeiros não residentes (xenos), escravos, mulheres, crianças, e
outros que correspondia de 85% a 90% da população (FERREIRA apud BAPTISTA, 2015).
Diante disso, nesta época a democracia foi inaugurada, ou pelo menos se iniciou o governo
com características democráticas. Aristóteles afirmou que após as medidas de Clístenes,
Atenas se tornou mais democrática do que na época de Sólon (BAPTISTA, 2015).
Os Atenienses se orgulhavam de sua forma de organização e da “constituição” que os
regia justamente por visar o interesse da grande maioria. Acreditavam que o primeiro
princípio que podia ser observado na prática era o da igualdade, pois na vida pública não se
faziam considerações pelo nascimento ou riquezas do indivíduo, e sim pela sua competência e
talento, e ainda a valorização do princípio da liberdade, pois todos podiam gozar da liberdade
dos seus atos, desde que observado os direitos do Estado, e submetendo-se às autoridades
instituídas e a lei. Foram esses princípios observados por Atenas, que teriam inspirado a
Declaração dos Direitos do Homem (GLOTZ, 1988).
Embora os termos “governo do povo” e “governo da maioria”, nos leve a pensar que
no mundo ateniense, todos, inclusive trabalhadores e mulheres faziam parte desta construção
política como já visto, isso não era verdade, confirmação se dá com as palavras de Rosenfield
(1994, p. 8), segundo ele,
A “maioria” possui aqui um significado restrito, pois ela denota apenas
aqueles cidadãos reconhecidos politicamente como tais, à exclusão de todos
aqueles que se dedicavam às tarefas de reprodução física e material. A
igualdade politica determinava-se, positivamente, pela relação do cidadão ao
todo do qual fazia parte e, negativamente, pela desigualdade social na qual
ela estava ancorada.
Ou seja, a igualdade “política a todos” existia apenas no sentido de que todas as
pessoas faziam parte da polis, e não da possibilidade de exercer seus direitos de cidadão e
introduzir seus ideais, isso por constituir o grupo mais desfavorecido da sociedade, podendose dizer inclusive que viviam em um regime de escravidão, condição esta que para o mundo
ateniense não feria os princípios políticos e morais da sociedade.
15
Embora se utilize a expressão governo da maioria para definir a democracia, isso não
significa que se busca conceituar a mesma utilizando-se apenas um método quantitativo, uma
vez que a filosofia política clássica busca saber “qual é a melhor forma de governo”, não se
atendo apenas a questões particulares de cada pessoa, pensando, porém, em uma forma de
organização que atinja o bem estar social, priorizando os valores das pessoas da comunidade a
fim de construir um espaço público justo e virtuoso (ROSENFIELD, 1994).
A democracia como forma de organização da polis foi bastante criticada por filósofos
e escritores da época (ARBLASTER, 1987). Dentre os mais antidemocráticos dos filósofos,
podemos citar Platão. Ele acreditava que a liberdade não era um bem e sim a causa de todo o
mal, e que a democracia não era o governo de todos e sim o contrário, para ele, era o “regime
do individualismo onde cada um faz o que quer” (GLOTZ, 1988, p. 123), acreditava ainda,
que a mesma não passava de um despertar da natureza tirânica, e acreditava que a constituição
de Esparta que deveria ser seguida como modelo, e não a de Atenas:
A constituição de Atenas – um modelo? São as legislações de Esparta e de
Creta que mais se aproximam da meta que se deve perseguir. Cumpre fazer
reinar a ordem tanto na cidade como nas almas; cumpre eliminar as
diversidades pessoais, proscrever o particular, conseguir que todos pensem
da mesma forma sobre todas as coisas. (GLOTZ, 1988, p. 123).
Aristóteles (apud GLOTZ, 1998, p. 123), também encarava a democracia com certo
desdém, segundo ele
É um erro comum fazê-la depender exclusivamente do direito soberano da
maioria. Também na oligarquia, a maioria é soberana. Existe democracia
quando a soberania pertence a todos os homens livres sem distinção de
riqueza. Consequentemente, não há democracia quando uma minoria de
homens livres dirige uma maioria de homens privados de liberdade; também
não há democracia quando a soberania pertence apenas aos ricos, mesmo
que eles constituam maioria. Em suma, “só há democracia verdadeira
quando os homens livres, mas pobres, formam a maioria e são soberanos”.
A democracia era considerada o governo dos pobres, sendo também por isso bastante
criticada, pode - se observar ainda na obra de Glotz (1988, p. 121), onde ele relata que em
determinada ocasião, certo aristocrata declarou:
16
Que loucura imaginar que a democracia possa aperfeiçoar-se! [...] Não há
reforma que possa impedir a multidão de ser ignorante, indisciplinada
desonesta, “porque a pobreza impele os homens às ações vergonhosas, por
falta de educação e por ignorância, que, para alguns, são decorrência da falta
de dinheiro”.
Em Atenas, os indivíduos se reunião na ágora, para discutir acerca das resoluções dos
problemas e como resolveriam determinadas situações. Eles não tinham medo de compartilhar
e raciocinar acerca do que era necessário, acreditavam que a luz nascia no decorrer do debate,
enquanto em outras formas de governo, a ousadia era efeito de ignorância, e o raciocínio
forma de irresolução. Diante disso, Atenas se tornou a audácia da reflexão, motivo esse, que
para Péricles, Atenas era a escola da Grécia (GLOTZ, 1988).
1.1.2 Democracia na modernidade
Com a instituição do Estado Moderno, a democracia que até então era considerada
termo político que significava espaço público, e uma das formas de organização deste espaço,
deixa de ser assim considerada para tornar-se uma possível forma de governo, passando
também a adjetivar o termo Estado, por exemplo, “Estado de Direito” (ROSENFIELD, 1994).
Com a transformação da democracia em uma forma de governo, a mesma torna-se um
aparelho moderno do Estado, sendo necessariamente estruturado por uma máquina
administrativa centralizada, significando então uma nova articulação do social pelo político e
do político pelo social (ROSENFIELD, p. 14).
Embora, busque-se dividir os significados de democracia entre, democracia como
termo político na Grécia, e democracia como forma de governo do Estado na modernidade,
segundo Alain Touraine (1996, p. 18), não é possível haver essa separação de significados.
Vejamos,
Giovanni Sartori tem razão em recusar absolutamente a separação entre duas
formas de democracia – politica e social, formal e real, burguesa e socialista
– segundo o vocabulário preferido dos ideólogos, e evocar a unidade da
democracia. E por dois motivos: em primeiro lugar, porque não seria
possível empregar a mesma palavra para designar duas realidades diferentes
se não tivessem importantes elementos comuns entre si; e, em segundo lugar,
porque o discurso que chega a chamar democracia a um regime autoritário e,
até mesmo, totalitário, acaba por se destruir.
17
Tanto a democracia na Grécia, como esta nova democracia tiveram forte influência da
Revolução Francesa que se deu no ano de 1789, sendo fruto da revolução burguesa, como
demais revoluções ocorridas nesta época, a partir de então, Deus e o rei foram erradicados,
passando a prevalecer a nação como força mobilizadora. Assim, em 1789 foi constituída a
Declaração dos direitos do homem e do Cidadão, afirmando então que Deus deixava de ser o
centro do universo, tornando-se então o homem centro deste. Esse quadro evidencia a
oposição que se deu entre o catolicismo e os fundamentos ideológicos da república, da
laicidade e da democracia. A nação passou a se opor ao direito divino, passando então a ser
encarada como um espaço de igualdade de todos os cidadãos (A REVOLUÇÃO, 2015). A
partir da Revolução Francesa, a democracia passou a ser considerada um princípio de
legitimação da ordem política e jurídica, e diferente do tempo da Grécia antiga, a democracia
passou a ser vista com uma conotação positiva, segundo C.B. Macpherson (apud
ARBLASTER, 1987, p. 18),
Democracia era um termo mau. Toda a gente que era alguém sabia que
democracia, no seu sentido original de governo do povo ou governo de
acordo com a vontade da maioria do povo, seria algo de mal – fatal para a
liberdade individual e para todo o encanto de uma vida civilizada. Era esta a
posição de quase todos os homens inteligentes desde os primeiros tempos
históricos até há cerca de cinquenta anos, a democracia tornou-se uma coisa
boa.
Os gregos também possuíam como ideais os princípios da igualdade e da liberdade, a
obediência às leis e aos funcionários públicos, e ainda participação constante em atividades
cívicas, por isso, segundo Alexandre José Pierini (2008), quando falamos em democracia nos
remetemos a pensamentos referentes ao fenômeno da liberdade, todavia, faz-se necessário
salientar que a visão de liberdade entre os gregos e o estado moderno é demonstrada na
prática de forma diversa, vejamos:
Mas, qual liberdade se estabelece no âmbito do sistema democrático?
Democracia e liberdade se convergem no sentido de proporcionar razão
às vontades humanas no que diz respeito às questões políticas. Os
antigos, ou mais propriamente, os atenienses, utilizavam-se da agora para se
manifestarem politicamente. A democracia era exercida por meio do
processo de participação direta e diante de todos sob a luz do sol que
iluminava a praça e as ideias dos cidadãos [...] Os modernos, para utilizar a
expressão do filósofo italiano Norberto Bobbio, se apropriaram da
liberdade política como um processo basicamente denominado
18
“representação política” que é estabelecido através do mecanismo
político denominado eleição. (PIERINI, 2008, p. 129, grifo nosso).
Segundo Touraine (1996, p. 43) a democracia passa a existir quando “se cria um
espaço político que protege os direitos dos cidadãos contra a onipotência do Estado”, sendo
necessário então que os cidadãos participem da vida coletiva do Estado. Todavia, bem se sabe
que o povo não governa diretamente como na Grécia antiga, e sim através de um
representante que fale em seu nome, porém não se pode afirmar que este seja a única forma de
demonstrar da população.
A democracia existe realmente quando a distância que separa o Estado da
vida privada é reconhecida e garantida por instituições políticas e pela lei.
Ela não se reduz a procedimentos porque representa um conjunto de
mediações entre a unidade do Estado e a multiplicidade dos atores sociais. É
preciso que sejam garantidos os direitos fundamentais dos indivíduos; é
preciso também que estes se sintam cidadãos e participem da construção da
vida coletiva. Portanto é preciso que os dois mundos – o Estado e a
sociedade civil – que devem permanecer separados, fiquem também ligados
um ao outro pela representatividade dos dirigentes políticos. (TOURAINE,
1996, p. 43).
Segundo o mesmo autor, não existe democracia perfeita, pelo contrário,
podemos fazer a classificação da mesma em três tipos que interdependem uma da outra. A
primeira dimensão pode ser reconhecida como a que dá uma importância central à limitação
do poder do Estado pela lei e pelo reconhecimento dos direitos fundamentais. A segunda dá a
maior importância à cidadania, à Constituição ou às ideias morais ou religiosas que garantem
a integração da sociedade e fornecem um sólido fundamento para as leis. A terceira e última
dimensão, insiste mais na representatividade social dos governantes e opõe a democracia.
Na primeira dimensão, pode-se observar que o seu ideal está no reconhecimento dos
direitos fundamentais na vida da sociedade. Historicamente, esta é a dimensão mais
importante, todavia não se sobrepõe as demais. O reconhecimento dos direitos fundamentais
que limitam o poder do Estado e também das Igrejas, famílias ou empresas, é indispensável à
existência da democracia.
Na segunda dimensão, deparamo-nos com a cidadania, característica essa da
democracia. É através do exercício da cidadania que o povo escolhe seus representantes que
19
atuaram diretamente nas decisões do Estado. Porém, nem todo tem interesse em realizar o
exercício da cidadania, segundo Touraine (1996, p. 44), isso se dá por dois motivos:
Ou se contentam em ocupar determinadas posições na sociedade sem se
interessarem pela modificação das decisões e leis que regulam seu
funcionamento; ou então porque procuram escapar das responsabilidades
que podem implicar grandes desafios.
A cidadania não significa apenas a escolha dos seus representantes através das
eleições, todavia, a inexistência de eleição, faz com que inexista a democracia. Cidadania
concebe um significado mais abrangente, os indivíduos a exercem também, quando são
convocados para pegar em armas e aceitam a limitação de sua liberdade. A cidadania exige
ainda,
integração social, a consciência de filiação não somente a uma sociedade,
Estado nacional ou federal, mas também a uma comunidade ligada por uma
cultura e história no interior de fronteiras que que estão sob a vigilância de
inimigos, concorrentes ou aliados. (TOURAINE, 1996, p. 45).
A terceira geração é a da representatividade social dos governantes e ela faz com que a
democracia oponha- se a oligarquia pode-se dizer ainda, que os representantes são agentes
políticos representam a sociedade (TOURAINE, 1996). Bem se sabe que a sociedade é
constituída de uma pluralidade de pessoas, dessa forma, consequentemente, os eleitos
constituirão uma representatividade pluralista. Uma sociedade política que não reconhece essa
pluralidade, de forma alguma poderá ser considerada democrática.
Essas três dimensões, todavia, não são suficientes para constituição de uma
democracia, segundo Touraine (1996, p. 46),
Para a democracia, é indispensável a recusa de toda essencialidade do poder.
Tal postura é manifestada concretamente pela lei da maioria. Ela só é o
instrumento da democracia se admitir que a maioria represente unicamente
metade mais um dos eleitores e que, até mesmo, pode existir “maioria de
ideias”, permutáveis segundo os problemas a serem resolvidos. A lei da
maioria é o contrário do poder popular, assim como desse recurso à vontade
do povo que deu embasamento aos regimes autoritários e destruiu as
democracias, em vez de consolidá-las.
20
Diante do exposto até aqui, pode-se perceber que a democracia não esta atrelado apenas a um
conceito no sentido etimológico da palavra, e sim que o mesmo ultrapassa a designação “governo do
povo” ou “governo da maioria”, todavia, designam-se democracia também aquelas práticas que visam
priorizar os princípios básicos da mesma.
Gallie (apud ARBLASTER, 1987, p. 16) acredita que democracia seja,
[...] “conceito essencialmente contestável”. É uma ideia inerentemente
discutível e mutável. Tal como “liberdade”, “igualdade”, “justiça”, “direitos
humanos” e assim por diante, “democracia” é um termo que, apesar do seu
significado conciso, significará sempre para muitos um princípio politico ou
ideal bem – amado, e só por essa razão nunca conseguirá alcançar uma
significação universal única.
Verifica-se então que embora alguns acreditem que a democracia possa ser
conceituada de forma simples, outros acreditam que ela não pode ser definida sem ser
contestada, colocando – a em nível de outros termos complexos que encontram dificuldades
em serem conceituados por estarem atrelados a termos valorativos, dependendo dos valores
éticos e morais.
1.2 A democracia no Brasil: uma análise a partir das constituições brasileiras
Até a efetiva consolidação da democracia no Brasil, e sua instituição em Estado
Democrático de Direito, é possível observar no decorrer da história, que o mesmo serviu antes
de diferentes regimes políticos, entre eles, o imperial, o ditatorial para então consolidar-se em
uma democracia.
O período Imperial no Brasil teve início em 1822 com a independência do mesmo. A
constituição deste período foi outorgada em 1824 por Dom Pedro I, e instalou-se no país um
governo monárquico, hereditário, constitucional e representativo. Além dos três Poderes,
legislativo, executivo e judiciário, existia também o poder Moderador. Foi esta a constituição
que vigorou por mais tempo (CONSTITUIÇÕES..., 2005).
A constituição do Império inaugura somente em aparência o Estado de Direito
brasileiro. Com a existência do poder moderador ao lado dos demais, não era possível o
controlo do poder pelo próprio poder. Além do mais, existia escravidão, e a origem autoritária
21
dessa carta contradiz o movimento constitucional de limitação do arbítrio do absolutismo
(RODRIGUES, 2006).
Já a constituição de 1891 foi promulgada pelo Congresso Constitucional, e elegeu
Deodoro da Fonseca a presidente. Esta constituição tinha caráter liberal e federalista, sendo
inspirada na tradição republicana dos Estados Unidos. Esta instituiu ainda o presidencialismo
e concedeu grande autonomia aos estados da federação e garantiu ainda a liberdade partidária.
Esta ainda idealizou mais,
Estabeleceu eleições diretas para a Câmara, o Senado e a Presidência da
República, com mandato de quatro anos. Estabeleceu o voto universal e nãosecreto para homens acima de 21 anos e vetava o mesmo a mulheres,
analfabetos, soldados e religiosos; determinou a separação oficial entre o
Estado e a Igreja Católica; instituiu o casamento civil e o habeas corpus;
aboliu a pena de morte e extinguiu o Poder Moderador. Também nesta
Constituição ficou estabelecida, em seu artigo terceiro, uma zona de 14.400
Km2 no Planalto Central, para a futura Capital Federal.
(CONSTITUIÇÕES..., 2005, p. 6).
Embora
esta constituição tenha apresentado um verdadeiro ideal republicano, o mesmo
era negado pelas práticas políticas de ocupação e exercício do poder.
Em 1934, nova constituição foi promulgada pela Assembleia Constituinte no primeiro
governo do presidente Getúlio Vargas. A mesma preservou os ideias da constituição anterior,
ampliando ainda alguns direitos, entre eles, deu maior poder ao governo federal, instituiu o
voto obrigatório e secreto e partir dos 18 anos e o voto feminino que já havia sido instituído
pelo Código Eleitoral em 1932. Houve também a mudança do enfoque da democracia,
passando da democracia individualista para a democracia social (CONSTITUIÇÕES..., 2005).
Todavia esta constituição não teve duração de muito tempo, embora seja considerada
“um primeiro ensaio de uma ordem política sujeita ao direito” (CONSTITUIÇÕES..., 2005, p.
7), pois em 1937, instaurou-se no Brasil o chamado Estado novo e a ditadura de Vargas, e não
o Estado de Direito.
Durante o período do Estado novo, houve limitação dos mais diversos direitos até
então conquistados. Esta carta deu supressão aos partidos políticos e concentrou o poder nas
22
mãos do chefe do Estado. Esta carta possuía inspirações visíveis dos modelos fascistas
europeus e institucionalizou o regime ditatorial. Ela ainda:
Extinguiu o cargo de vice-presidente, suprimiu a liberdade político-partidária
e anulou a independência dos Poderes e a autonomia federativa. Essa
Constituição permitiu a cassação da imunidade parlamentar, a prisão e o
exílio de opositores. Instituiu a eleição indireta para presidente da República,
com mandato de seis anos; a pena de morte e a censura prévia nos meios de
comunicação. Manteve os direitos trabalhistas. (CONSTITUIÇÕES..., 2005,
p. 8).
No ano de 1964, a nova Constituição instituiu um Estado de Direito e incorporou as
novas declarações de direitos coletivos e sociais já iniciadas na Constituição de 1934, todavia,
ainda não foi dessa vez que a democracia se consolidou (RODRIGUES, 2006).
Esta Constituição foi promulgada no governo do presidente Eurico Gaspar Dutra e
teve vigência durante 21 anos. A mesma foi elaborada sob a promessa da derrota dos regimes
totalitários na Europa após o termino da II Guerra Mundial e refletia a redemocratização do
Estado brasileiro (CONSTITUIÇÕES..., 2005).
A mesma ainda extinguiu a censura e a pena de morte. Houve a independência dos três
poderes, a autonomia dos estados e municípios e a eleição direta para presencia da República
com mandato de 5 anos. No ano de 1961 foi reformada com a adoção do parlamentarismo.
Sendo posteriormente anulada através de um plebiscito em 1963, restaurando então o regime
presidencialista.
No ano de 1964, o Brasil sofre um novo golpe de Estado e introduz nova constituição
em 1967. Esta foi promulgada pelo Congresso Nacional durante o governo de Castelo Branco,
e institucionalizou a ditadura do Regime Militar de 1964. Foram incorporadas nessa
Constituição disposições transitórias, podendo – se destacar o Ato Institucional nº 5, como um
dos mais afrontadores a democracia, este Ato permitiu que o presidente, dentre outros,
fecharem o Congresso Nacional, cassar mandatos e suspender direitos políticos, permitindo
aos governantes militares uma total liberdade de legislar em matéria política, eleitoral,
econômica e tributária, tornando-se então o poder executivo substituto do legislativo e
judiciário (CONSTITUIÇÕES..., 2005).
23
Após o período ditatorial, o Brasil promulgou no ano de 1988, no governo de José
Sarney, a atual Constituição. A mesma foi elaborada por uma Assembleia Constituinte, sendo
a primeira a permitir a incorporação de emendas populares. A Constituição de 1988 é
considerada de “Constituição Cidadão”, podendo ser considerada também uma das mais
democráticas do mundo. A mesma traz em seu preâmbulo que através desta passa a ser
instituído no Brasil um Estado Democrático, que visa assegurar
o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada
na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a
solução pacífica das controvérsias. (RODREGUES, 2006, p. 7).
Vejamos o texto original da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2015),
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Os principais pontos desta Constituição são a República representativa, federativa e
presidencialista. Ela ainda prevê que o voto é permitido e facultativo a analfabetos e maiores
de 16 anos de idade, o mandato do presidente da República é reduzido de 5 para 4 anos, sendo
aprovada emenda em 1997 que permite a reeleição do mesmo, e ainda de governantes e
prefeitos (CONSTITUIÇÕES..., 2005).
Diante do exposto, conclui-se aqui o primeiro capítulo deste trabalho, capítulo este que
visou trabalhar a democracia de um modo geral, desde o seu surgimento na Grécia antiga, até
os dias atuais no Brasil, inclusive, analisando o assunto detalhadamente em cada Constituição
promulgada e outorgada no país. A partir de agora, partiremos para o estudo de outro tema
fundamental deste trabalho, qual seja, os direitos humanos.
24
2 DIREITOS HUMANOS
Todos os seres humanos nascem essencialmente iguais, todavia com individualidades
no aspecto físico, intelectual e psicológico o que os fazem ser diferentes das demais pessoas.
Essas peculiaridades inerentes a cada ser humano não interfere na garantia dos direitos
fundamentais.
Os direitos fundamentais são aqueles direitos que sem os quais a pessoa humana não
conseguiria existir, desenvolver e participar plenamente da vida, e esses são os mesmos para
todas as pessoas independente de ser homem ou mulher, da cor de sua pele, da sua classe
social, de sua preferência política ou seu credo (DALLARI, 2004).
Os direitos humanos ainda é um fenômeno recente, sua maior consolidação passou a
se dar a partir da II Guerra Mundial, desde então, eles passaram a se internacionalizar de
forma mais intensa diante do reconhecimento da necessidade de uma proteção mais extensa a
pessoa humana (PINHEIRO, 2008).
Diante disso, o presente capítulo debruçar-se-á em elucidar a história dos direitos
humanos, em interpretar o seu conceito, e fazer observância as mudanças que tem realizado
na sociedade atual, destacando-se principalmente em que forma de governo esses direitos tem
alcançado mais efetividade.
2.1 Aspectos históricos
Foi através da religião, filosofia e ciência, que nos primórdios, a história dos direitos
humanos buscou se esclarecer, todavia, foi no século XVIII, que alguns países europeus, mais
especificamente a França, através da Revolução Francesa, que os direitos humanos
começaram a se desenvolver, tornando-se mais eficazes após a II Guerra Mundial.
Segundo Damião de Lima Trindade (2015), o início da história dos direitos humanos
vai depender do aspecto que se vai adotar para fazer a análise, por exemplo, no caso da
história filosófica a mesma começa a ter sua origem na antiguidade clássica na Grécia, por
volta dos séculos II ou III a.C., e a Cícero e Diógenes na antiga Roma. No caso da história
religiosa, no ocidente, é possível ver seu início a partir de certas passagens do Sermão na
25
Montanha. No caso da história política, é possível iniciar com algumas das noções da Magna
Charta Libertatum que o rei inglês João Sem Terra foi obrigado a acatar em 1.215. Já no caso
da história social, busca-se compreender como e por quais motivos reais ou velados, as
diversas forças sociais interferiram em cada momento no sentido de impulsionar, retardar ou
modificar o desenvolvimento e a efetividade dos direitos humanos na sociedade.
Como já citado, foi a partir do século XVIII com a Revolução Francesa, que teve
início no ano de 1789, que se deram os primeiros movimentos para o verdadeiro
desenvolvimento dos direitos humanos. Naquele momento, a França era um Estado
Absolutista, o rei concentrava em suas mãos os três poderes, executivo, legislativo e
judiciário. Neste período, a França encontrava-se dividida em três grupos de pessoas, entre
eles, o clero, a nobreza e o último sendo o restante da população, entre eles o burguês,
trabalhadores urbanos e camponeses, as pessoas pertencentes ao terceiro e último grupo, eram
exploradas em seus trabalhos, sofriam da falta de alimentos, altos valores cobrados de
impostos, por exemplo, e ainda lhes era negado participação nas decisões da sociedade.
A partir de então, com o descontentamento dessa parte da população, e com incentivo
da ideologia fornecida pelo movimento iluminista, os franceses deram início a Revolução
Francesa, em busca de uma nova forma de organizar a sociedade, o que resultou em uma nova
Constituição, que foi proclamada como a "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão",
esta reafirmou e reforçou que: “Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos”
em seu artigo 1º, faltando apenas o reconhecimento da fraternidade, ou seja, a exigência de
uma organização solidaria da vida em comum, sendo que esta só foi alcança com a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 1948 (COMPARATO, 2010).
Além desta Declaração, vários outros documentos contribuíram e foram importantes
para o desenvolvimento dos direitos humanos. A Magna Charta Libertatum de 1215, firmada
pelo Rei João Sem – Terra e pelos bispos barões ingleses, na Inglaterra na Idade Média.
Também tem importância para os direitos humanos, o habeas – corpus da forma como foi
regulado pela lei inglesa de 1969, que previa proteger a liberdade de locomoção e que depois
foi utilizado para proteger outras liberdades individuais (SILVA; PRADO, 2015).
Outro documento que também foi de grande valia, foi o Bill of Rights, firmada pelas
declarações, criava com a divisão dos poderes, o que a doutrina constitucionalista alemã do
26
século XX, viria a denominar como uma forma de organização do Estado, em que a sua
função em última análise era proteger os direitos fundamentais da pessoa humana (SILVA;
PRADO, 2015).
Segundo Sarlet (apud SILVA; PRADO, 2015),
a Petition of Righs, de 1628, firmada por Carlos I, o habeas corpus, de 1679,
firmado por Carlos II, e o Bill of Righs, de 1689, promulgadas pelo
Parlamento, entrando em vigor já no reinado de Guilherme d’Orange, como
resultado da Revolução Gloriosa, de 1688, representaram a positivação de
direitos e liberdades reconhecidos aos cidadãos ingleses, tais como o direito
de petição, a proibição de prisões arbitrárias, o princípio da legalidade penal,
e, até mesmo, um mitigado direito à liberdade de expressão, representando a
evolução das liberdades e privilégios estamentais medievais e corporativos
para liberdades genéricas no plano do direito público.
Fez-se importante ainda para a afirmação dos direitos humanos, a Declaração de
Direito do Povo da Virgínia de 1776, pois essa positivou direitos inerentes ao indivíduo,
reconhecendo que os direitos de toda pessoa humana não pode ser suprimido por uma decisão
política (SILVA; PRADO, 2015).
Além desses, outros documentos e declarações de diversas partes do mundo
contribuíram para a afirmação dos direitos humanos. No ano de 1948, num período pósguerra, foi aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, a Declaração Universal dos
Direitos Humanos, sendo esta redigida sob o impacto das atrocidades cometidas durante a
Segunda Guerra Mundial (SILVA; PRADO, 2015).
Em 10 de dezembro de 1948, fora aprovada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ANEXO A), que como se percebe
com a leitura de seu preâmbulo, foi redigida sob o impacto das atrocidades cometidas durante
a Segunda Guerra Mundial. Esta prevê em seu artigo I que “todos os serem humanos nascem
iguais em dignidade e direitos”, afirma Dallari (2004, p. 15) ainda que,
Segundo a Declaração, todos devem agir, uns em relação aos outros, “com
espirito de fraternidade”. A pessoa consciente do que é e do que os outros
são, a pessoa usa sua inteligência para perceber a realidade, sabe que não
teria nascido e sobrevivido sem o amparo e a ajuda de muitos. E todos,
mesmo os adultos saudáveis e muito ricos, podem facilmente perceber que
27
não podem dispensar a ajuda constante de muitas pessoas, para conseguirem
satisfazer suas necessidades básicas. Existe, portanto, uma solidariedade
natural, que decorre da fragilidade da pessoa humana e que dever ser
completada com o sentimento de solidariedade.
No ano de 1993 foi promulgada a Declaração de Viena, que reafirmou e consagrou o
já determinado pela declaração de 1948 quanto à proteção dos direitos humanos.
2.1.1 Marcos internacionais e nacionais de direitos humanos
Muitos foram os movimentos e os documentos que no decorrer da história
contribuíram para a efetivação dos direitos humanos. Diante disso, elencaremos aqui alguns
que tiveram uma maior repercussão nacional e internacional. Vejamos:
1789 – Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão
1948 – Declaração Universal dos Direitos Humanos
1948 – Convenção contra o Genocídio
1949 – Convenção para a Repressão do Tráfico de Pessoas e da Exploração da
Prostituição por Outros
1950 – Convenção Européia de Defesa dos Direitos do Homem e das Liberdades
Fundamentais
1951 – Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados
1956 – Convenção Complementar sobre Abolição da Escravidão
1965 – Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial
1966 – Pacto Internacional Relativo aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
1976 – Pacto Internacional Relativo aos Direitos Civis e Políticos
1979 – Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a
Mulher
1984 – Convenção contra a Tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanas
ou degradantes
1988 – Constituição Federal do Brasil
1989 – Convenção sobre os Direitos da Criança
1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente
1994 – Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra
a Mulher
28
1998 – Programa Nacional de Direitos Humanos I
2001 – Declaração de Durban - Combate ao Racismo, Discriminação Racial,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata
2002 – Programa Nacional de Direitos Humanos II
2003 – Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos
2006 - Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – Maria da Penha
(MARCOS..., 2015).
Diante disso, é possível perceber que os direitos humanos não nasceram prontos, mas
que se trata de direitos que estão em uma constante evolução, evolução esta que se deu e
continuará se dando, a partir de lutas e movimentos que levam esses direitos a serem
codificados.
2.2 O conceito
Segundo Dallari (2004, p. 12), “a expressão direitos humanos é uma forma abreviada
de mencionar os direitos fundamentais de uma pessoa humana”. Os direitos fundamentais são
aqueles que sem os quais a pessoa humana não consegue existir ou não é capaz de
desenvolver e de participar plenamente da vida. A vida é um direito fundamental, todavia,
para a preservação da mesma é necessária demais garantias para que a pessoa possa existir,
entre elas alimentação, saúde, moradia, educação, entre outros.
Pode-se conceituar os direitos humanos sob dois aspectos, o primeiro aspecto, analisa
os fundamentos primeiros desses direitos e é tema de uma importante relevância para a
filosofia, sociologia e ciência política contemporânea. Já o segundo aspecto, é a abordagem
jurídica que se relaciona diretamente com tratados, convenções e legislações, sendo através
desta definição que se dá a regulação dos mecanismos internacionais e nacionais garantidores
dos direitos fundamentais da pessoa humana (PINHEIRO, 2015).
Importante também se faz esclarecer a diferença do conceito de algumas expressões
que estão relacionadas a estes direitos, entre eles os direitos humanos, os direitos
fundamentais e os direitos do homem. Vejamos:
29
A primeira nomenclatura que surgiu foi a dos direitos do homem, a qual
remonta a época do jusnaturalismo, pois bastava ser homem para possuir
direitos e poder usufruí-los. Entretanto, tal nomenclatura sofreu várias
críticas devido à expressão “homem”, tendo em vista que tais direitos não
eram apenas inerentes as pessoas do sexo masculino, mas, sim, a qualquer
pessoa humana. Dessa maneira, após várias oposições com relação à
nomenclatura adotada, os direitos do homem passaram a ser chamados de
direitos fundamentais, os quais se ocupam do plano constitucional e visam
assegurar e proteger os direitos inerentes a cada ser humano para que possam
usufruir de uma vida digna. Não sendo diferente da finalidade dos direitos
humanos que, diferentemente dos direitos humanos, figuram no plano
internacional.
Dessa maneira, após várias oposições com relação à nomenclatura adotada,
os direitos do homem passaram a ser chamados de direitos fundamentais, os
quais se ocupam do plano constitucional e visam assegurar e proteger os
direitos inerentes a cada ser humano para que possam usufruir de uma vida
digna. Não sendo diferente da finalidade dos direitos humanos que,
diferentemente dos direitos humanos, figuram no plano internacional.
(BELLINHO, 2015).
Entre alguns dos principais direitos da pessoa humana, podemos destacar a
individualidade da mesma, pois embora todos nasçam iguais, cada ser humano tem suas
particularidades e é preciso respeitá-las. Além desta, destacamos também a liberdade,
liberdade de poder escolher aquilo que considera ser o melhor para si, embora muitas vezes,
essas decisões sejam influenciadas pela educação que recebem ou pelo meio social em que
vivem, todavia, embora essas circunstâncias a faculdade de cada pessoa em ser livre continua
prevalecendo. Por fim, destacamos a dignidade da pessoa humana e a solidariedade. A
Declaração Universal dos Direitos Humanos dita que “todos os seres humanos nascem iguais
em dignidade e direitos”, e ainda, que todos devem agir com “espirito de fraternidade”.
Assim, segundo Dallari (2004, p. 15)
A pessoa consciente do que é e do que os outros são, a pessoa que usa sua
inteligência para perceber a realidade, sabe que não teria nascido e
sobrevivido sem o amparo e ajuda de muitos. E todos, mesmo os adultos
saudáveis e muito ricos, podem facilmente perceber que não podem
dispensar a ajuda constante de muitas pessoas, para conseguirem satisfazer
suas necessidades básicas.
Segundo Eduardo R. Rabenhorst (2015, p. 5),
Ronald Dworkin concebe os direitos humanos como “coringas”, isto é, como
aquelas cartas do jogo de baralhos que possuem um valor especial, podendo
30
ganhar para quaisquer outras. Por exemplo, o Estado poderia desejar matar
todos os suspeitos de cometerem delitos em nome da redução da
criminalidade. Contudo, caso isso viesse a acontecer, poderíamos evocar em
nossa defesa a existência de valores mais importantes, tais como a vida e a
integridade física dos seres humanos. Na metáfora de um jogo que
estaríamos a jogar contra o Estado, tais valores funcionariam como trunfos
ou coringas.
Deste modo, faz-se importante a observância dos direitos acima declarados, a fim de
que a sociedade possa construir um ambiente mais harmônico e que respeite os direitos de
cada ser humano.
2.2.1 Características dos direitos humanos
A Declaração de Viena é um dos documentos mais adotados pela comunidade
internacional acerca dos direitos humanos, sendo essa resultado da II Conferência Mundial de
Direitos Humanos ocorrida em 1993. Essa Conferência contribuiu de forma decisiva na
consolidação dos direitos humanos, e ainda colocou fim a antigas disputas doutrinarias acerca
dos principais fundamentos dos direitos humanos. Assim, esses direitos passaram a ter
características próprias, entre elas: o internacionalismo, a universalidade a indivisibilidade e
como direitos frente ao Estado (PINHEIRO, 2015).
O internacionalismo como característica dos direitos humanos se divide, segundo a
doutrina, em dois efeitos, o vertical e o horizontal. O efeito vertical significa que os direitos
humanos devem obrigatoriamente recair nos Estados e não em outros indivíduos, pois são
direitos inerentes a todo ser humanos e de vigência universal. Já o efeito horizontal, implica
em conhecer as repercussões que as relações com outros indivíduos têm para o gozo e
exercício desses direitos, e ainda traz consigo obrigações específicas para o Estado enquanto
garantidor desses direitos (PINHEIRO, 2015).
Quanto à característica da universalidade dos direitos humanos, podemos afirmar,
segundo Pinheiro (2015), que a marca principal desta característica consiste no seu conteúdo,
qual seja, normas gerais que estão destinadas a todas as pessoas como seres humanos, sejam
elas nacionais ou estrangeiras. Essa característica, como já citado, se reafirma com a
Declaração de Viena em 1993, que declara em deu artigo primeiro que: “A natureza universal
de tais direitos e liberdades não admite dúvidas”. E ainda afirma no artigo 5º. que as
31
particularidades históricas, culturais e religiosas devem ser levadas em consideração, mas os
Estados têm o dever de promover e proteger todos os direitos, independentemente dos
respectivos sistemas (PINHEIRO, 2015).
Quanto à indivisibilidade, podemos dizer que “todos os direitos humanos, nacional e
internacional, constituem um complexo integral, harmônico e indivisível, em que os
diferentes direitos estão necessariamente inter-relacionados e são interdependentes entre si.”
(PINHEIRO, 2015, p. 6).
Por fim, os direitos humanos frente ao Estado, são aqueles direitos que ele deve
garantir a pessoa humana a fim de preservar sua dignidade como ser humano. Segundo
Pinheiro (2015, p. 7),
definir os direitos humanos como prerrogativas que tem todo indivíduo
frente aos órgãos do Poder para preservar sua dignidade como ser humano e
cuja função é executar a interferência indevida do Estado em áreas
específicas da vida individual e assegurar a prestação de determinados
serviços por parte do Estado para satisfazer as necessidades básicas que
reflitam as exigências fundamentais de cada ser humano.
Diante do exposto, é possível observar, que os direitos humanos possuem
características peculiares, e que essas características são indispensáveis para o
reconhecimento e exercício desses direitos. Todavia, embora essas características sejam bem
definidas, é importante saber que os direitos humanos são direitos que estão sempre em
movimento.
2.2.2 Classificação dos direitos humanos
Pode-se dizer que as várias reivindicações em prol dos direitos humanos no decorrer
da história possuem uma continuidade interna, e é indiscutível o progresso ético e político da
humanidade através delas. As reivindicações aconteceram em períodos distintos, e por isso, é
possível analisar pelo menos duas classificações desses acontecimentos em diferentes fases ou
gerações (BEDIN, 1995).
32
Segundo Bedin (1995), a primeira classificação que iremos mencionar, trata-se da
classificação proposta por T.H. Marshall (1967), na obra Cidadania, Classe Social e Status, e
aponta a seguinte classificação:
a) Direitos civis;
b) Direitos políticos;
c) Direitos sociais.
Marshall (apud Bedin, 1995) explica ainda que, os direitos civis teriam surgido no
século XVIII, os direitos políticos no século XIX, e os direitos sociais no século XX. Esta
classificação é aceita por outros autores, entre eles, Karl Loewenstein (1974), C.B. Macperson
(1991), Maria de Lurdes Manzini Covre (1991), Norberto Bobbio (1992) e Albert O.
Hirschman (1992).
A segunda classificação de direitos é proposta por outro grupo de autores, entre eles,
Gérman Bidart de Campos (1991), Celso Lafer (1991) e Paulo Bonavides (1993), sendo a
classificação conforme segue:
a) Direitos de primeira geração (direitos civis e políticos);
b) Direitos de segunda geração (direitos econômicos e sociais);
c) Direitos de terceira geração (direitos de solidariedade ou direitos do homem no
âmbito internacional).
Nesta classificação, os direitos de primeira geração teriam surgido nos séculos XVIII e
XIX, a segunda geração no início do século XX e a terceira no final da primeira metade do
século XX.
Das duas classificações apresentadas, a primeira classificação, que foi apresentada por
T.H. Marshall é a mais aceita e valorizada, todavia, segundo Bedin (1995), esta geração
possui uma grande lacuna, pois não abrange um fenômeno novo que ocorreu em 1950, que é a
questão dos direitos do homem no âmbito internacional. Diante disso, Bedin (1995) propõe
em seu artigo para estudo, a seguinte classificação:
a)
Direitos civis ou direitos de primeira geração;
33
b)
Direitos políticos ou direitos de segunda geração;
c)
Direitos econômicos e sociais ou direitos de terceira geração;
d)
Direitos de solidariedade ou direitos de quarta geração.
O surgimento na história de cada um desses direitos se dariam, no caso dos direitos
civis no século XVIII, os direitos políticos no século XIX, os direitos econômicos e sociais no
início do século XX, e os direitos de solidariedade no final da primeira metade do século XX.
2.3 Os direitos humanos no Brasil
Pode-se dizer que na raiz da formação da sociedade brasileira há um profundo
processo de exclusão da maior parte da população, e isso consiste em três questões principais,
sendo elas, a pobreza e desigualdade, o racismo, e o sexismo (CARBONARI, 2007).
Enquanto as Nações Unidas (ONU) construíam uma Carta tendo como objetivo
principal a concretização dos direitos humanos, o Brasil vivia a ditadura militar em sua fase
mais intensa. Através de movimentos sociais, a sociedade brasileira iniciou as suas
manifestações contra a ditadura no país, tendo elas uma colaboração significativa para que
mais tarde os direitos humanos se firmassem no país. Muitos movimentos se consolidaram na
década de 80, entre eles podemos destacar o Movimento Nacional de Direitos Humanos
fundado em 1982.
Pode-se dizer que a Constituição Federal de 1988 significou um marco de
convergência da resistência política e um ponto de referência para a afirmação dos direitos
humanos no Brasil. Vejamos:
O final da década de 1980 foi marcado por um conturbado momento
histórico: o término das alternativas reais à sociedade de mercado, em nível
mundial, de um lado, e a consciência crescente de que, no subterrâneo da
retórica dos direitos, vicejava sorrateiramente o neoliberalismo, por outro.
Foi um tempo de proclamação do fim das utopias. Contraditoriamente, no
entanto, a sociedade brasileira vivia os tempos de institucionalização de
parte de suas utopias, com a nova Constituição e, com eles, a inauguração da
construção de bases para a realização dos direitos humanos. Foi um tempo
também de eleição de uma aventura política que resultou inviabilizada por
meio do movimento do impeachment. A mesma força que levou a
Constituição a ser pautada pelos direitos humanos, consideradas as
34
circunstâncias, viu-se assolada por um governo que depunha contra ela. As
forças populares resistiram, no mesmo espírito, mesmo sem conseguir com
isso instaurar a abertura de novo ciclo político e, sobretudo, a implementação
de transformações econômicas e sociais estruturantes. O movimento de
constitucionalização dos direitos viu-se, imediatamente em seguida,
chamado à sua complementação mediante a construção de legislações
complementares. Nessa esteira nasceram leis orgânicas como a da Saúde e o
Estatuto da Criança e do Adolescente, para exemplificar, além de inúmeras
propostas que não se tornaram legislação ainda, como o fim da Justiça
Militar, e outras que somente se transformaram em lei mais tarde, como a
que tipifica o crime de tortura, entre outras. (CARBONARI, 2007, p. 44).
Já na década de 1990, deu-se início através de um forte movimento social que exigia
direitos, uma consolidação legislativa capaz de abrir espaços no Estado visando garantir maior
participação dos cidadãos e a busca pelo controle social para auxiliar na efetivação dos
direitos constitucionais (CARBONARI, 2007).
Embora o Brasil concorde com as principais convenções internacionais acerca dos
direitos humanos, este ainda se encontra distante de atingir plenamente a efetivação desses
direitos. Podemos citar alguns exemplos que violam os direitos humanos, entre eles, a
violação do direito à terra, à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia e justiça social. Há
também um grande aumento no número de mortes em virtude da violência urbana e da
violência contra a mulher. Há mortes também de crianças indígenas provocadas pela
subnutrição, e morte de trabalhadores em canaviais que são obrigados a produzir 10 toneladas
de cana por dia para garantir sua cesta básica (RODRIGUES, 2006).
A população rural do Brasil é a que tem mais dificuldade na América Latina em ter
acesso a água potável, e a pobreza, a fome e a violação a alimentação adequada ainda é um
grande desafio para a sociedade brasileira, em especial aos povos indígenas, quilombolas,
afrodescendentes, às populações acampadas, assentadas, aos sem teto, em situação de rua e
aos que sobrevivem dos lixões (RODRIGUES, 2006).
Diante disso, pode–se perceber que os direitos humanos como instrumentos
normativos, legais, jurídicos e políticos é relativamente recente, assim como o as formas de
contribuições para a efetivação desses direitos (CARBONARI, 2007). Assim, faz-se
necessário que o país continue insistindo e avançando na proteção a pessoa humana, a fim de
que lhe seja garantido dignidade como disposto na Constituição do País.
35
3 DEMOCRACIA E DIREITOS HUMANOS
Até aqui, trabalhamos buscando conceituar, localizar na história, e esclarecer demais
fatores importantes acerca da democracia e dos direitos humanos, a fim de que pudéssemos, a
partir do estudo até então realizado, adentrar no objetivo principal proposto a este trabalho,
qual seja, a efetivação dos direitos humanos em uma democracia.
Deste modo, buscar-se-á no decorrer deste capítulo verificar a forma de
desenvolvimento dos direitos humanos em uma democracia, e porque esses direitos se dão
com mais “sucesso”, nessa forma de governo. Para isso, serão analisados alguns critérios
adotados pelas democracias que contribuem para a efetivação dos direitos da pessoa humana,
entre eles a cidadania.
No Brasil, a Constituição Federal prevê a dignidade da pessoa humana e direito ao
exercício da cidadania através do voto, por exemplo, fatores esses que são essenciais para a
efetivação dos direitos fundamentais a pessoa humana, independente da sua cor, classe social,
opção política e religiosa e demais fatores.
3.1 A relação existente entre democracia e direitos humanos
É possível dizer que democracia e direitos humanos são assuntos que se relacionam
desde a Grécia Antiga até os dias de hoje, ao passo que quanto mais democrático um Estado,
mais possível se torna a efetivação dos direitos humanos.
Segundo Maria Victória de Mesquita Benevides (2015, p. 3),
existe uma associação essencial entre direitos humanos e democracia, esta
entendida como o regime político da soberania popular e do respeito integral
aos direitos humanos, o que inclui reconhecimento, proteção e promoção.
Tanto a democracia dos antigos, como a democracia atual, sendo que a primeira está
relacionada à liberdade de participação na vida pública, e a democracia moderna que é
embasada no ideal republicano, nos valores do liberalismo político e na democracia social,
trabalham em prol da efetivação dos direitos humanos. Desse modo, é possível perceber, que
esses direitos com o tempo foram sendo conquistados e consequentemente aperfeiçoados.
36
Uma das formas de efetivação dos direitos humanos em uma democracia se dá pelo
exercício da cidadania dos cidadãos do Estado, que significa dizer que estes possuem
participação na vida pública.
3.2 Elemento articulador da democracia na efetivação dos direitos humanos
Cidadania significa um conjunto de direitos que dá a um determinado grupo de
pessoas, chamados de cidadão, a possibilidade de influenciar na vida pública do lugar em que
vive, tanto de forma direta como indireta. Segundo Dallari (2004), é possível dizer que
aquelas pessoas que não participam da vida pública encontram-se marginalizado ou excluído
da vida social.
A palavra cidadania iniciou a ser usada na Roma antiga, e essa designava a situação
política de uma pessoa, bem como os direitos que podia exercer. Havia nesta sociedade, uma
divisão que se dava através de várias categorias, por exemplo, no caso da liberdade, a
diferenciação se dava entre livres e escravos, outra categoria, era a dos patrícios e plebeus. Os
patrícios eram membros das famílias mais importantes e eram considerados nobres, já do
segundo grupo faziam parte as pessoas comuns, que não tinham direito de participar da vida
política, diferente dos nobres.
Os romanos livres possuíam cidadania, todavia nem todos podiam participar das
atividades políticas e administrativas. Diante disso, faziam uma distinção entre cidadania e
cidadania ativa, sendo que somente os cidadãos ativos podiam participar das atividades
públicas.
Na Grécia antiga, com o início dos ideais democráticos nos séculos VII e VI a.C.,
também é possível observar o início de alguns fatores que influenciaram na efetivação da
cidadania. É possível perceber essa efetivação a partir do que dispõe Baptista (2012):
De fato, é preciso abordar esta democracia como um fato histórico
importante e significativo, no âmbito dos direitos políticos (FIGUEIRA,
2001: 44). Se a democracia significa governo na mão de muitos ou governo
que não está na mão de um só, destaca-se que de fato ocorreu sim a
democracia em Atenas, pois a soberania de Atenas era parcialmente popular,
37
sendo totalmente o contrário do que seja ditadura, despotismo, autoritarismo,
totalitarismo etc. A própria democracia deste período era direta, pois não
tinha representantes: o próprio povo, os considerados cidadãos, tomava as
decisões públicas diretamente, embora, como já abordado, houvesse em
Atenas também características da democracia indireta, pois havia
conselhos e um representante geral da cidade.
Como a cidadania significa participação do povo no poder público, é possível
identificar a partir desta colocação a existência dela na democracia da Grécia Antiga.
O conceito de cidadania adotado na França no século XVIII foi adotado da história
romana, sendo que a partir deste século, passou a ser adotada e introduzida nas legislações
modernas fazendo a distinção entre cidadania e cidadania ativa. Segundo Dallari (p. 23,
2004),
A cidadania, que no século XVIII teve sentido político, ligando-se ao
princípio da igualdade de todos, passou a expressar uma situação jurídica,
indicando um conjunto de direitos e deveres jurídicos. Na terminologia atual,
cidadão é o indivíduo vinculado à ordem jurídica de um Estado. Essa
vinculação pode ser determinada pelo local do nascimento ou pela
descendência, bem como por outros fatores, dependendo das leis de cada
Estado. Assim, por exemplo, o Brasil considera seus cidadãos, como regra
geral, as pessoas nascidas em território brasileiro ou que tenham mãe ou pai
brasileiro.
Diante desta colocação, é possível perceber a importância da cidadania para o
desenvolvimento da democracia, e as modificações ocorridas no decorrer da história, a partir
da Revolução Francesa até os dias atuais no Brasil.
3.2.1 A cidadania no Brasil
No Brasil, o exercício da cidadania é assegurado pelo disposto na Constituição Federal
de 1988, e pode ser contemplada já no seu artigo 1º, conforme segue:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
II - a cidadania;
38
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Como já relatado, a cidadania compreende a participação dos cidadãos da vida e do
governo do povo. Diante do parágrafo único do artigo primeiro da Constituição, é possível
perceber que aos cidadãos brasileiros é garantido esse direito, uma vez que o mesmo declara
que “todo poder emana do povo”.
Além dos direitos já tradicionalmente reconhecidos, como o direito de votar para
escolher representantes no Legislativo e no Executivo, e o direito de se candidatar para esses
cargos, a nossa Constituição Federal dispõe acerca de outras garantias que permitem a
efetivação da cidadania no país (DALLARI, 2004).
Podemos dizer que entre essas garantias estão, o direito do cidadão de apresentar
projeto de lei por meio de iniciativa popular, tanto ao Legislativo federal, como as
Assembleias Legislativas dos Estados e às Câmaras Municipais, conforme artigo 61, § 2º da
Constituição Federal de 1988, que dispõe o que segue:
Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do
Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal
Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos
cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
[...]
§ 2º A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos
Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do
eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não
menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
É direito do cidadão também, conforme artigo 14 da Constituição, participar de
plebiscito e referendo, quando forem realizadas consultas ao povo acerca de projetos de lei ou
atos do governo, vejamos:
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei,
mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.
39
Prevê ainda, a possibilidade do cidadão brasileiro o direito de propor certas ações
judiciais, denominadas garantias constitucionais, especialmente previstas para a garantia de
direitos fundamentais, entre elas, a ação popular e o mandado de segurança, que visam
impedir abusos de autoridades em prejuízo de direitos de um cidadão ou de toda a cidadania.
Por fim, a Constituição prevê também a participação obrigatória de representantes da
comunidade em órgãos de consulta e decisão sobre os direitos da criança e do adolescente, na
área da educação e na área da saúde, participação essa, que efetiva os direitos à cidadania, e
colabora para a democratização da sociedade.
Ademais, importante é ressaltar que os direitos à cidadania são também deveres.
Segundo Dallari (2004, p. 25),
Pode parecer estranho dizer que uma pessoa tem o dever de exercer seus
direitos, porque isso dá a impressão de que tais direitos são convertidos em
obrigações. Mas a natureza associativa da pessoa humana, a solidariedade
natural característica de humanidade, a fraqueza dos indivíduos isolados em
enfrentar o Estado ou grupos sociais poderosos são fatores que tornam
necessária a participação de todos nas atividades sociais. Acrescente-se a
isso a impossibilidade de viver democraticamente se os membros da
sociedade não externarem suas opiniões e sua vontade. Tudo isso se torna
imprescindível que os cidadãos exerçam seus direitos de cidadania.
Conforme Dallari (2004, p. 22) ainda,
É através do conceito de cidadania afirmam-se os direitos fundamentais da
pessoa humana, na perspectiva da convivência que é necessidade essencial
de todos os seres humanos. Assim, conjugando-se os aspectos individual e
social, acentua-se também o dever de participação inerente à cidadania.
Desse modo, é possível dizer que o Brasil é um país que prevê e pratica a cidadania, o
que é indispensável em um Estado Democrático de Direito, contribuindo assim, para a
efetivação dos direitos humanos no país.
40
3.3 A efetivação dos direitos humanos em uma democracia
Com o decorrer dos séculos, os direitos humanos vêm se consolidando, e atualmente
ocupam posição central em nível mundial em reconhecimento de que esses direitos devem e
precisam ser reconhecidos. Esta importância se dá de forma tão intensa, que segundo
Trindade (2015), por serem inerentes a todo ser humano, são superiores aos direitos do Estado
bem como das formas de organizações políticas.
Todavia, para que esses direitos sejam efetivados, é necessário uma forma de governo
que dê possibilidade de efetivação a estes, tanto na elaboração das leis, como na forma em
que se dá a aplicação desses direitos na prática, e pode –se dizer que atualmente, a
organização política que mais tem contribuído para esses direitos é a democracia.
Já dizia Habermas (apud Hamel, 2006, p. 12) que, “as leis são legítimas quando
surgem da formação democrática da vontade pelo exercício do direito de participação política
dos cidadãos democráticos”. Conforme visto no item acima, cidadania significa um conjunto
de direitos que dá a um determinado grupo de pessoas chamados de cidadãos, a possibilidade
de influenciar na vida pública do lugar em que vive, tanto de forma direta como indireta.
Deste modo, quando o princípio discursivo toma a forma jurídica nasce o princípio
democrático.
O mesmo autor (apud HAMEL, 2006, p. 12-13),
Atribui aos cidadãos a autonomia no sentido da formação racional da
vontade. Os cidadãos devem ligar a sua vontade àquelas leis que eles se dão
a si mesmos em consequência da vontade comum, a qual foi obtida por meio
de um discurso. Dessa maneira, estabelece um nexo entre razão e vontade,
em que a liberdade de todos passa a depender da liberdade individual de
cada um, podendo tomar posição dizendo “sim” ou “não”.
De acordo com Arroyo (apud HAMEL, 2006, p. 13),
Habermas não tem uma definição específica de direitos humanos, porém,
uma das expressões com maior fluência empregada pelo autor para referir-se
ao núcleo da noção de direitos humanos é “o direito de todos os indivíduos a
iguais liberdades’ de ação.”1 Com isso, Habermas inclui nessa fórmula dois
valores tradicionais: os ideais de liberdade e os de igualdade.
41
A partir dessas citações, é possível perceber que a valorização da pessoa humana para
Hamel, está intimamente ligada com o exercício da cidadania, pois ele acredita que é direito
de todos os indivíduos se manifestarem de forma igual, e através do estudo até aqui realizado,
podemos concluir que essas manifestações só são possíveis em uma democracia.
Ademais, cabe destacar que foram por mobilização dos Estados democráticos que os
direitos humanos tornaram-se o fundamento das Nações Unidas após o horror causado no
século XX pela ocorrência das duas guerras mundiais, e demais crueldades. Vejamos:
É para exorcizar essa descida aos infernos que, logo após a guerra, os povos
e os Estados democráticos mobilizaram-se para fazer dos Direitos Humanos
o fundamento do sistema das Nações Unidas, “a quintessência dos valores
pelos quais afirmamos juntos, que somos uma única comunidade humana”,
ou seja, “o irredutível humano”
[...]
Paralelamente, sob a pressão dos movimentos sociais, de opinião pública e
de cidadania, assiste-se, em numerosos países, à consolidação dos estados de
direito, ao fortalecimento das garantias das liberdades negativas (freedom
from) e à ampliação das liberdades positivas (freedom for). Por toda parte, a
luta pelos direitos do homem, com seus fracassos duramente pagos, constitui
o eixo fundamental da política. (SACHS, 2015, p. 155-156).
Assim, é possível constatar que para que os direitos humanos fossem alcançados,
vários movimentos socais foram realizados, assim como muitas lutas. A conquista desses
direitos não se deu sempre de forma pacífica, e sim através de um conjunto de mobilizações.
Estamos em uma fase da história, considerada a fase dos direitos, direitos estes que se
deram através da realização de muitos movimentos, para que então chegássemos a essa fase.
Todavia, o caminho a percorrer, segundo Sachs (2015), ainda é longo e árduo se julgarmos a
distância a vencer para ultrapassar a extrema pobreza que constitui uma manifesta negação
dos direitos humanos.
Idade dos direitos, mas também idade dos extremos, para retomar o título da
magistral história do curto século XX escrita por Eric Hobsbawm (1994).
Graças ao poderio tecnológico multiplicado ao longo do século, a economia
mundial conheceu crescimento sem precedentes, alcançando elevados níveis
de produção de bens materiais. Porém, a parte maldita do produto não para
de crescer, engolida pelo aumento dos custos das transações e dos custos
42
embutidos para o funcionamento do capitalismo e esterilizada nos circuitos
de especulação financeira, gerando uma riqueza virtual, sem esquecer as
despesas bélicas.
[...]
Disso resulta gigantesco potlatch e a má distribuição cada vez mais
pronunciada entre as nações e no interior delas, desencadeando fenômenos
de desemprego em massa, de subemprego e de exclusão social, mais do que
desperdício, destruição de vidas humanas. (SACHS, 2015, p. 157).
Com o processo histórico, democracia e desenvolvimento passaram a ser conceitos
confundidos. O termo desenvolvimento ganhou maior amplitude, sendo característica de
desenvolvimento econômico, social, cultural, sustentável e humano. Este último, tinha como
objetivo a plena realização dos homens e das mulheres em vez da multiplicação dos bens. Já a
democracia, além da instauração do estado de direito e das instituições de governo
democráticas, segundo Sachs (2015, p. 159),
A democratização é também o aprofundamento, nunca concluído, da
democracia no cotidiano, do exercício da cidadania em vista da expansão, da
universalização e da apropriação efetiva dos direitos de segunda e de terceira
geração.
Segundo Jack Donnelly (2015, p. 167), o
Desenvolvimento, democracia e direitos humanos tornaram-se ideias
políticas hegemônicas na sociedade internacional do final do século vinte.
Virtualmente, todos os países reivindicam perseguir o crescimento
econômico rápido e sustentável (“desenvolvimento”), participação política
popular (“democracia”) e respeito aos direitos humanos de seus cidadãos
(“direitos humanos”). Países contemporâneos encontram-se tipicamente
forçados a adotar, pelo menos, a linguagem do desenvolvimento, democracia
e direitos humanos nas suas relações internacionais. A própria legitimidade
de regimes que não estão compromissados centralmente com esses objetivos
está aberta a um sério questionamento, tanto nacional quanto
internacionalmente.
Diante desta colocação, é possível perceber a correlação existente entre democracia e
direitos humanos, e também, de interdependência, sendo necessário um Estado democrático
para a efetivação dos direitos humanos, direitos esses, que se encontram em um patamar de
grande importância em nível mundial, levando àqueles Estados que não estão
compromissados com esses objetivos serem questionadas pelos demais.
43
A ligação existente entre a democracia com a legitimidade política é mais recente. No
decorrer da história, grande parte das constituições se deu com autoridade de cima para baixo,
sendo que em primeiro plano encontravam-se uma dádiva divina, ordem natural, tradição, que
podia ser definida pelo nascimento, idade, riqueza, habilidades ou poder. Todavia, foi na
metade do século vinte, que muitos regimes modificaram essa ordem, fazendo então com que
a autorização se desse de baixo para cima, ou seja, do povo. Assim, ao longo da última
metade do século, quase todos os regimes passaram a extrair sua legitimidade do “povo”, e
não de uma fonte superior.
Para Donnelly (2015, p. 169- 170),
Os direitos humanos são o componente mais recente nesse triunvirato. A
ideia de que a legitimidade de um governo é baseada na extensão do respeito
e defesa aos direitos humanos dos seus cidadãos tem estado no coração da
tradição do contrato social liberal da teoria política, pelo menos, desde o
embrionário Segundo Tratado de Governo de John Locke, no final do século
dezessete.
[...]
Na sociedade internacional do pós- Guerra Fria, no entanto, os direitos
humanos são geralmente vistos como intimamente ligados do que opostos à
democracia a ao desenvolvimento. As democracias dos povos – que
sacrificaram os direitos das classes inimigas e dissidentes em favor de um
bem coletivo maior (como entendido pelo partido) – passaram rapidamente
da cena política onde quer que ao povo fosse oferecida uma escolha.
[...]
Apelos “democráticos” à nação e à coletividade do povo têm sido
frequentemente, tão importantes quanto os apelos aos direitos humanos de
cidadãos individuais. Contrastando acentuadamente com duas décadas atrás,
nos dias atuais, porém somente uma minoria diminuta dos estados justifica
publicamente recusas sistemáticas de direitos humanos internacionalmente
reconhecidos.
Importante se faz destacar ainda, como Benevides define e vê a relação existente entre
direitos humanos e democracia. Segundo a autora,
Partimos da premissa de que existe uma associação essencial entre direitos
humanos e democracia, esta entendida como o regime político da soberania
popular e do respeito integral aos direitos humanos, o que inclui
reconhecimento, proteção e promoção. Esta breve definição tem a vantagem
de agregar democracia política e democracia social. Em outros termos, reúne
os pilares da “democracia dos antigos”, ou democracia política – tão bem
explicitada por Benjamin Constant e Hannah Arendt, quando a definem
44
como a liberdade para a participação na vida pública – e a democracia
moderna, embasada no ideal republicano, nos valores do liberalismo político
e da democracia social. Ou seja, reúne as exigências da cidadania plena, a
única que engloba as liberdades civis e a participação política, ao mesmo
tempo em que reivindica a igualdade e a prática da solidariedade, a partir da
exigência dos direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais, para todos
nós, viventes, e para as gerações futuras. Direitos dos humanos de hoje,
direitos de toda a humanidade. (2015, p. 3).
Embora os direitos humanos possuam essa relação com a democracia, segundo Andrei
Koerner (2003, p. 152), eles não são apenas um pressuposto institucional ou objeto do
processo político, e sim estão no centro deste processo, e
Significam a via de manifestação de forças sociais, pois é a forma por
excelência de formulação dos interesses e das identidades sociais nas
sociedades democráticas. Devido ao seu caráter transnacional, dão apoio à
constituição de agentes coletivos e à construção de problemas sociais, assim
como auxiliam a formulação de diagnósticos e programas de ação
compartilhados pelos agentes internos às democracias.
Segundo Benevides (2015, p. 2), embora muitos considerem que democracia,
tolerância, direitos humanos e paz, podem ser entendidos como sendo redundante, pois não é
possível imaginar “democracia sem respeito aos direitos humanos, democracia com
intolerância, seja de que tipo for democracia sem justiça, e justiça, como sabemos é uma
condição para paz”, a autora acredita, que “questões de paz, democracia, tolerância e direitos
humanos permanecem interligadas e interdependentes”.
Importante se faz destacar, que para a efetivação desses direitos é indispensável a
participação do povo, ou seja, o exercício da cidadania, conceito este que a comunidade tem
facilidade em compreender seu significado. Todavia, os direitos humanos ainda carregam na
nossa sociedade atual um significado pejorativo. Muitos acreditam ainda que esse conceito
signifique simplesmente a proteção de pessoas que realizaram crimes, o que na verdade é um
entendimento completamente equivocado e que faz parte do senso comum, pois os direitos
humanos buscam valorizar toda pessoa humana dando a ela uma vida digna.
Sobre a dignidade da pessoa humana, afirma Benevides (2015, p. 10) que,
45
Todos os textos internacionais sobre direitos humanos elucidam a dignidade
como fruto da própria “humanização”; vale dizer, foi o ser humano que criou
ele mesmo o Direito. Ele mesmo desenvolveu a ideia de dignidade em
grandes textos normativos que podem ser sintetizados no artigo 1º da
Declaração Internacional de Direitos Humanos de 1948: “todos os seres
humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. Como já
assinalado, foi uma revolução no pensamento e na história da humanidade
chegar à reflexão conclusiva de que todos os seres humanos detêm a mesma
dignidade. É evidente que nos regimes que praticam a escravidão, ou
qualquer tipo de discriminação, não vigora tal compreensão, pois neles a
dignidade é entendida como um atributo de apenas alguns, aqueles que
pertençam a um determinado grupo. Nossa dignidade pode ser entendida
por critério de racionalidade, mas isso não basta. Quando se trata de valores
(como os intrínsecos aos Direitos Humanos) tem-se um processo educativo
no qual se procura atingir a razão, mas também a emoção, “os corações e
mentes”. Pois o bicho-humano não é apenas um ser que pensa e raciocina,
mas que chora e que ri capaz de amar e de odiar, capaz de indignação e
enternecimento, capaz da criação estética. O filósofo Unamuno alertava: o
que mais nos diferencia dos outros animais é o sentimento, e não a razão. O
bicho-humano é essencialmente moral, pois seu comportamento racional
estará sempre sujeito a juízos sobre o bem e o mal. Nenhum outro ser no
mundo pode ser assim apreciado em termos de dever ser, da sua bondade ou
da sua maldade.
Diante desta última colocação, é possível compreender que embora a efetivação dos
direitos humanos se dê de forma mais satisfatória em uma democracia do que em outras
formas de governo, em função da colaboração da cidadania e do desenvolvimento, os
verdadeiros sujeitos capazes de fazer com que esses direitos se concretizem somos nós
próprios seres humanos, e para isso, é preciso que continuemos a realizar movimentos como
foram e são realizados a fim de que o desenvolvimento dos direitos humanos venham
continuar se dando cada vez de forma mais intensa.
46
CONCLUSÃO
No decorrer deste trabalho, foi possível realizar um estudo acerca da democracia e dos
direitos humanos, e de que forma se dá a efetivação desses direitos em uma democracia, uma
vez que é nesta forma de governo que esses direitos alcançam uma maior efetivação.
Trabalhamos no decorrer deste ainda, acerca da efetivação dos direitos humanos no
Brasil por se tratar de um Estado que tem como forma de governo a democracia, sendo então
possível demonstrar na prática a efetivação desses direitos, e como pode ser contemplado.
Verifica-se que embora os esforços para efetivação desses direitos, que se encontram
inclusive protegidos pela própria Constituição Federal do Brasil, e ainda pela aderência do
Brasil a demais documentos internacionais que visam efetivar esses direitos, ainda há muito
pra se realizar para que possamos atingir uma maior eficácia dos direitos humanos de forma
satisfatória, pois ainda convivemos com o trabalho escravo e trabalho infantil, com o racismo,
e a xenofobia no país.
Diante disso, é possível perceber que não basta termos apenas legislações que
amparam os direitos humanos, é necessário que o próprio for humano aprenda a respeitar as
demais pessoas, para que seja possível dar a todos está dignidade que de fato merecem e tem
direito, e não estar atrelado somente aquela ideia de que direitos humanos é proteção para
“bandido” como muitos pensam que se resume a isso.
Por fim, foi possível verificar, que o fato dos direitos humanos terem uma maior
eficácia em uma democracia, ela não se dá de forma automática ou inevitável, sendo
necessária uma união de esforços para que isso aconteça.
47
Assim, além de simplesmente elaborar um trabalho obrigatório para a conclusão do
curso, este vem ainda com a intensão de esclarecer algumas dúvidas e preconceitos existentes
entre ambos os assuntos tratados, democracia e direitos humanos. A fim de que possamos
analisar e nos questionar de que forma nós cidadãos de um Estado Democrático de Direito
estamos contribuindo para a efetivação dos direitos inerentes a todo ser humano.
48
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51
ANEXO A - Declaração Universal dos Direitos do Homem *
Adoptada e proclamada pela Assembleia Geral na sua Resolução 217A (III) de 10 de
Dezembro de 1948.
Publicada no Diário da República, I Série A, n.º 57/78, de 9 de Março de 1978, mediante
aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Preâmbulo
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da
família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade,
da justiça e da paz no mundo;
Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do homem conduziram a actos
de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que
os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi
proclamado como a mais alta inspiração do homem;
Considerando que é essencial a protecção dos direitos do homem através de um regime de
direito, para que o homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania
e a opressão;
Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as
nações;
Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos
direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de
direitos dos homens e das mulheres e se declararam resolvidos a favorecer o progresso social
e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;
Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a
Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efectivo dos direitos do homem e das
liberdades fundamentais;
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Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta
importância para dar plena satisfação a tal compromisso:
A Assembleia Geral
Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a
atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os
órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela
educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas
progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação
universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as
dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
Artigo 1.º
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão
e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
Artigo 2.º
Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente
Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de
religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento
ou de qualquer outra situação.
Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou
internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território
independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.
Artigo 3.º
Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
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Artigo 4.º
Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos,
sob todas as formas, são proibidos.
Artigo 5.º
Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes.
Artigo 6.º
Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento em todos os lugares da sua personalidade
jurídica.
Artigo 7.º
Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm
direito a protecção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e
contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Artigo 8.º
Toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra
os actos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.
Artigo 9.º
Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.
Artigo 10.º
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Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e
publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e
obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.
Artigo 11.º
1. Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua
culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as
garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.
2. Ninguém será condenado por acções ou omissões que, no momento da sua prática, não
constituíam acto delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não
será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o acto delituoso
foi cometido.
Artigo 12.º
Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio
ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou
ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei.
Artigo 13.º
1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de
um Estado.
2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o
direito de regressar ao seu país.
Artigo 14.º
1. Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em
outros países.
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2. Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por
crime de direito comum ou por actividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações
Unidas.
Artigo 15.º
1. Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade.
2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar
de nacionalidade.
Artigo 16.º
1. A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família,
sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da
sua dissolução, ambos têm direitos iguais.
2. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros
esposos.
3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à protecção desta e
do Estado.
Artigo 17.º
1. Toda a pessoa, individual ou colectivamente, tem direito à propriedade.
2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade.
Artigo 18.º
Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito
implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de
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manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em
privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.
Artigo 19.º
Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de
não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração
de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.
Artigo 20.º
1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas.
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.
Artigo 21.º
1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direcção dos negócios públicos do seu país,
quer directamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos.
2. Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicos do seu
país.
3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos; e deve exprimir-se
através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto
secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.
Artigo 22.º
Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode
legitimamente exigir a satisfação dos direitos económicos, sociais e culturais indispensáveis,
graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os
recursos de cada país.
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Artigo 23.º
1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e
satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego.
2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.
3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à
sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por
todos os outros meios de protecção social.
4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em
sindicatos para a defesa dos seus interesses.
Artigo 24.º
Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres e, especialmente, a uma limitação razoável
da duração do trabalho e a férias periódicas pagas.
Artigo 25.º
1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a
saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à
assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança
no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de
meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.
2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças,
nascidas dentro ou fora do matrimónio, gozam da mesma protecção social.
Artigo 26.º
1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a
correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino
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técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto
a todos em plena igualdade, em função do seu mérito.
2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos
do homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a
amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o
desenvolvimento das actividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.
3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos.
Artigo 27.º
1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de
fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam.
2. Todos têm direito à protecção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer
produção científica, literária ou artística da sua autoria.
Artigo 28.º
Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem
capaz de tornar plenamente efectivos os direitos e as liberdades enunciados na presente
Declaração.
Artigo 29.º
1. O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e
pleno desenvolvimento da sua personalidade.
2. No exercício destes direitos e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às
limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o
respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da
moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática.
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3. Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente aos fins e
aos princípios das Nações Unidas.
Artigo 30.º
Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para
qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma actividade ou de
praticar algum acto destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.
* Fonte: Centro dos Direitos do Homem das Nações Unidas, publicação GE.94-15440.
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