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EM DEFESA DO POVO BRASILEIRO
Fábio Konder Comparato1
A situação de nítida morbidez em que se encontra atualmente o nosso
país deve ser analisada segundo os parâmetros estabelecidos por Hipócrates
para o tratamento de todas as doenças. Não podemos, com efeito, cuidar
simplesmente dos sintomas, sem antes procurar eliminar suas causas, ou
seja, a fonte primária da moléstia.
Empregamos todo tempo a palavra crise para caracterizar o
lamentável estado de nossa política e de nossa economia no presente. Ora,
justamente, no tratado Dos Ares, das Águas e dos Lugares, o Pai da
Medicina denominou krisis, palavra que na língua helênica significa
julgamento, o momento preciso em que é possível discernir a doença e
desvendar a sorte do doente. É nesse momento que o olhar crítico do
médico observa uma mudança súbita no estado do paciente, para o bem ou
para o mal; o instante em que se declaram nitidamente os sintomas da
moléstia, permitindo o diagnóstico e o prognóstico.
Lamento dizer que, em minha modesta opinião, a crise atual, que não
afeta aliás apenas o Brasil, mas o mundo inteiro, aponta, infelizmente para
a probabilidade cada vez mais forte de um desfecho sombrio.
Examinemos, pois, antes de mais nada, segundo a lição de
Hipócrates, a verdadeira causa da moléstia.
A Oligarquia Brasileira
Uma esquizofrenia política
A nenhum observador atento escapa o fato de que a organização do
Estado Brasileiro apresenta um caráter nitidamente esquizofrênico, com a
dissociação permanente entre aparência e realidade.
1 Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Doutor Honoris
Causa da Universidade de Coimbra.
1
A Constituição Federal em vigor abre-se com a declaração solene de
que “a República Federativa do Brasil [...] constitui-se em Estado
Democrático de Direito”. Na crua realidade política, porém, nenhum dos
três princípios fundamentais aí enunciados vigora na prática.
A Constituição Federal de 1988 declara que constitui objetivo
fundamental do Estado Brasileiro “construir uma sociedade livre, justa e
solidária”, com a promoção do bem de todos, sem discriminação de
qualquer espécie (art. 3º). Acontece que a realização desse objetivo esbarra
no espírito de individualismo privatista, que desde sempre representou um
obstáculo insuperável à realização do bem comum do povo brasileiro; ou
seja, aquilo que na Roma clássica denominava-se justamente res publica.
Não me canso de relembrar a advertência formulada por Frei Vicente do
Salvador, em sua obra clássica,2 editada em 1627: “Nem um homem nesta
terra é repúblico, nem zela e trata do bem comum, senão do bem
particular”.
Nosso país não é tampouco uma Democracia autêntica, porque o
povo brasileiro nunca dispôs de poder, não se podendo olvidar que a
etimologia grega do vocábulo é exatamente a de poder popular (demos,
povo; kratos, poder).
Desde 1934, vimos declarando, em todas as Constituições, que “todo
poder emana do povo” (Constituição Federal de 1988, art. 1º, parágrafo
único). Mas a única prerrogativa política efetiva do nosso conjunto de
cidadãos é de eleger representantes no Executivo e no Legislativo; sendo
que tais eleições (ou escolhas) são feitas, como ninguém ignora, sob forte
influência do poder econômico privado e dos políticos profissionais.
Em seu art. 14, a mesma Constituição declara, como formas de
exercício da soberania do povo, o plebiscito, o referendo e a iniciativa
popular. Mas no art. 49, inciso XV, ela mesma estabelece que “é da
2 História do Brasil, 1500-1627, 5ª ed., Edições Melhoramentos, São Paulo, p. 59.
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competência exclusiva do Congresso Nacional autorizar referendo e
convocar plebiscito”. Ou seja, nessa curiosa forma de mandato político, o
povo mandante só tem o direito de se manifestar diretamente, quando seus
mandatários lhe derem permissão para tanto... Quanto à iniciativa popular,
só admitida em matéria legislativa, e não de emendas constitucionais, ela se
tornou impraticável, em razão da exigência absurdamente criada pela
Câmara dos Deputados de conferência de todas as assinaturas do 1% do
eleitorado, estabelecido na Constituição (um milhão e meio de eleitores
atualmente!).
Ainda no campo da Democracia, o Brasil é um dos países em que a
Constituição e suas emendas – ápice do ordenamento jurídico – são votadas
unicamente pelo órgão legislativo, sem a menor participação do povo.
Finalmente, em matéria de Estado de Direito, ou seja, de controle
institucional de poderes em todos os níveis, continuamos deixando muito a
desejar. Basta dizer, a esse respeito, que os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, no exercício de suas elevadas funções, não estão praticamente
sujeitos a controle algum, podendo impunemente deixar de cumprir, não só
a Constituição (da qual aquela Corte é declarada guardiã precípua pelo seu
art. 102) e as leis, como até mesmo as próprias normas do Regimento
Interno da Corte, por eles aprovadas. O Supremo Tribunal Federal é o
único órgão do Judiciário não sujeito ao controle do Conselho Nacional de
Justiça.
Causa da moléstia esquizofrênica
Em toda organização política, os principais fatores estruturantes
sempre foram a relação de poder e a mentalidade coletiva, isto é, o
conjunto de valores e costumes enraizados no seio do povo. Durante
milênios, até o dealbar da idade moderna, ambos esses fatores foram
estritamente moldados pela fé religiosa. Com o advento, porém, da
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sociedade massas, no final do século XIX, iniciou-se uma fase
verdadeiramente revolucionária, na qual a mentalidade coletiva passou a
ser formada pelo sistema de poder político, de caráter não religioso na
maior parte do mundo.
Ao se consolidar mundialmente a civilização capitalista em fins do
século passado, a relação íntima entre esses dois fatores estruturantes da
organização política foi radicalmente alterada. Desde então, foi o poder
político que passou a plasmar a mentalidade coletiva, utilizando-se, para
tanto, do controle dos meios de comunicação de massa, exercido
atualmente, na quase totalidade dos países do globo, por oligopólios
empresariais.
Pois bem, entre nós, desde os primórdios da colonização portuguesa,
o poder político efetivo – diferentemente do poder oficial – tem sido
exercido, sem descontinuar, por dois grupos associados: os potentados
econômicos privados e os grandes agentes estatais. Nossa oligarquia
sempre teve, assim, um caráter binário: quem manda, em última instância,
não é apenas a burguesia empresarial, como pretendeu a análise marxista,
nem tampouco tão-só o estamento burocrático estatal, como sustentaram os
seguidores de Max Weber, a exemplo de Raymundo Faoro 3. O poder
supremo pertence a ambos. É esta a principal causa da corrupção endêmica
que vigora no Brasil no plano estatal.
Essa oligarquia binária não é, na verdade, uma originalidade
brasileira, mas sim um traço essencial do sistema capitalista. Como
salientou Fernand Braudel, que lecionou na Universidade de São Paulo
logo após a sua fundação, o capitalismo só triunfa quando se une ao Estado,
quando é o Estado.4
3 Cf. sua obra já clássica, Os Donos do Poder – Formação do patronato político brasileiro, 3ª
edição revista, Editora Globo, 2001.
4 La dynamique du capitalisme, Éditions Flammarion, Paris, 2008, p. 68.
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No curso de nossa História, tivemos uma sucessão de potentados
econômicos privados, aliados aos agentes do Estado; a começar pelos
senhores de engenho no século XVI, passando pelos traficantes de
escravos, os grandes fazendeiros, os industriais, até chegar aos atuais
controladores das grandes instituições financeiras.
Verificamos, por aí, como o nosso país sempre acompanhou a
evolução do sistema capitalista. Surgimos na História, graças à expansão
mundial do capitalismo mercantil europeu, na passagem do século XV ao
século XVI. Entramos tardiamente na fase do capitalismo industrial, após a
Grande Depressão de 1929. Vemo-nos, hoje, inteiramente mergulhados no
capitalismo financeiro, cuja dominação é mundial.
Vale a pena salientar esse ponto, pois ele explica a natureza e as
perspectivas de solução da atual crise política e econômica brasileira, como
reflexo da crise mundial.
Em obra recente,5 o grande economista francês, François Morin,
salientou que, atualmente, um conglomerado de 28 bancos internacionais,
detém o controle mundial dos mercados de câmbio, de juros e de capitais;
mercados esses de tal forma interligados, que a derrocada de um deles
provoca o imediato colapso de todos os outros. Um conglomerado dessa
ordem, além de não se submeter a nenhum Estado no plano internacional,
exerce uma influência preponderante sobre o poder interno de todos eles.
Ressalte-se que 14 dos bancos integrantes desse oligopólio
internacional produzem os chamados “produtos derivados tóxicos”; isto é,
os valores mobiliários oriundos da superposição de papéis financeiros de
pouco lastro, cuja súbita desvalorização desencadeou, como sabido, a crise
de 2008, da qual o mundo ainda não se livrou. O montante atualmente em
negociação desses falsos valores mobiliários atinge a soma astronômica de
5 L’hydre mondiale: L’oligopole bancaire, Paris, Lux Editeur.
5
710 trilhões de dólares, ou seja, o equivalente a dez vezes o Produto Bruto
mundial.
No Brasil de hoje, os cinco maiores bancos (Itaú Unibanco,
Bradesco, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Santander)
controlam 86% do total dos ativos financeiros; quando em 1995 o montante
desses ativos por eles controlados era de 56%. No segundo trimestre de
2015, enquanto o Produto Nacional Bruto entrava em recessão, o lucro
líquido contábil dos três maiores bancos privados – Itaú, Bradesco e
Santander – crescia 22%.
Desde o término da Segunda Guerra Mundial até o início dos anos 80
do século passado, o Brasil foi um dos países de maior crescimento
econômico do mundo. E isto se deveu ao dinamismo industrial, fortemente
impulsionado pelo Estado, durante a era Vargas e sob o governo de
Juscelino Kubitschek.
A partir do último quartel do século XX, no entanto, a dominação
mundial crescente do capitalismo financeiro, associada à difusão
igualmente global do neoliberalismo econômico, que procurou limitar,
senão suprimir, toda interferência estatal na economia, provocou uma
mudança radical nesse quadro econômico. A indústria brasileira iniciou um
processo de debilitação, que persiste até hoje. Para se ter uma ideia
aproximada disso, basta dizer que enquanto em 1984 a participação da
indústria no PIB de nosso país era de 35,84%, ela é hoje quase um terço
disso: 13%.
Como sabido, a partir da Revolução Industrial em meados do século
XVIII, a riqueza mundial cresceu em ritmo e intensidade jamais vistos na
História. Esse crescimento, porém, recuou nitidamente e tende hoje a ser
sucedido pela geral estagnação, justamente devido à implantação mundial
do capitalismo financeiro. E a razão é óbvia: a essência da atividade
industrial é a produção de bens ou a prestação empresarial de serviços, a
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qual gera o aumento constante da riqueza material. Já a atividade financeira
não produz nenhuma riqueza material de base, mas limita-se a criar valores
econômicos artificiais, por meio da especulação, ou, na mais favorável das
hipóteses, a auxiliar a atividade industrial ou o comércio de bens, pelo
serviço de crédito. Ora, exatamente pelo fato de a indústria e o comércio
terem se enfraquecido globalmente nas últimas décadas, os bancos –
privados ou estatais – passaram a concentrar suas atividades nos negócios
puramente especulativos, cujo risco de súbito colapso é enorme.
Como se vê, a celebrada eficiência do sistema capitalista na
produção de riqueza vê-se hoje totalmente desmentida. Com isso, a
fantástica desigualdade social, por ele criada no mundo inteiro, já não tem a
menor condição de ser reduzida, menos ainda eliminada. No início da
Revolução Industrial, estimou-se que entre o povo mais rico e o mais pobre
do planeta a diferença em termos econômicos era de 2 para 1; atualmente,
ela é estimada em 80 para 1! Levando-se em conta o crescimento
inexorável da população mundial e a estagnação geral da produção de
riqueza, não é difícil visualizar o prognóstico sombrio de Malthus, feito no
final do século XVIII. E as vítimas serão, como sempre, as camadas mais
pobres do mundo todo.
O Brasil, aliás, como ninguém ignora, continua a ser um dos países
de maior desigualdade social do mundo, e de maior benefício fiscal para a
classe abastada. Segundo dados extraídos da Receita Federal, 30% da
riqueza hoje tributada em nosso país está nas mãos de 0,8% dos
contribuintes do imposto de renda. Ora, por efeito da isenção fiscal de
pagamento desse imposto ao receberam lucros e dividendos de sociedades,
calculou-se em 2013 que quase 200 bilhões de reais foram recebidos pelos
contribuintes mais ricos sem pagar um centavo ao Fisco. Em suma, neste
país os pobres são muito mais tributados que os ricos.
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Ora, para agravar essa situação de escandalosa injustiça, o Estado
Brasileiro tem-se revelado radicalmente incapaz de levantar o nível
socioeconômico da enorme maioria pobre, mediante adequadas políticas de
educação e saúde.
Segundo relatório internacional da Organização para a Cooperação e
o Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado em maio de 2015, o
nosso país ocupa a 60ª posição em matéria de educação, num conjunto de
78 países. O número de nossos analfabetos funcionais é de 27% da
população.
Quanto ao nível percentual dos gastos públicos com o serviço
fundamental de saúde, em relação ao total da despesa pública, ele é o mais
baixo da América Latina: 6,93%, contra 31,76% na Argentina. Pois bem,
para cúmulo do absurdo, o governo federal no final do primeiro semestre
de 2015, operou cortes de um bilhão de reais no orçamento da educação e
mais de um bilhão no orçamento da saúde.
Ora, essa situação de profunda e permanente desigualdade social
representa um grave obstáculo à instauração de uma verdadeira democracia
em nosso país. É que no regime democrático, diversamente das autocracias
ou oligarquias, o poder político não é concentrado, mas difuso por todo o
povo. A democracia, por conseguinte, para poder funcionar, pressupõe um
nível mínimo de igualdade socioeconômica entre os cidadãos, sem a qual
não se estabelece uma comunhão de propósitos e atitudes no seio do povo,
ou seja, uma mentalidade coletiva coerente. Foi por isso, como assinalou
Aristóteles, que o regime democrático funda-se na existência de uma
robusta classe média.
No Brasil, além da tradicional debilidade dessa classe, a mentalidade
social foi profundamente marcada por quase quatro séculos de escravidão
legal, gerando a difusa convicção de que, ao contrário do que proclama a
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Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, os seres humanos são
naturalmente desiguais, em dignidade e direitos.
Com a análise deste triste quadro, não podemos deixar de concluir
que o regime oligárquico, desde sempre em vigor entre nós, revela-se
totalmente incapaz de enfrentar o grave estado mórbido que tomou conta
do país.
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Como Evitar a Letalidade da Moléstia?
Comecemos por reconhecer o fato de que a solução revolucionária,
entendida como a mudança súbita e radical do poder na sociedade, modelo
ao mesmo tempo tão louvado e temido no mundo todo até há pouco, já não
convence ninguém. É que esse tipo de ruptura brusca da ordem social só
atinge a relação de poder, deixando de lado o outro fator estruturante das
sociedades: a mentalidade coletiva. Foi o que se viu, de maneira dramática,
com as revoluções bolchevique e maoísta, as quais deram origem aos
regimes comunistas na Rússia e na China no século XX. Com a derrocada
de ambos no último quartel do século, voltaram à tona, nos dois países, as
velhas tradições de autocracia burocrática, doravante ligadas à integral
adoção do sistema capitalista, contra o qual foram feitas as revoluções.
Se quisermos, pois, mudar, de modo substancial e permanente, as
instituições políticas, precisamos reformar a mentalidade coletiva, com
base em novos valores que a elas se adequem. E tais valores são o oposto
do individualismo privatista, próprio do sistema capitalista.
Ora, isto não se faz e nunca se fez da noite para o dia. Em geral, temse em matéria de revoluções, o modelo clássico, que é o da França no
século XVIII. Mas o que se deixa na sombra, ao assim considerar, é o fato
de que a preparação da Revolução Francesa principiou pelo menos dois
séculos antes, com a mudança na visão de mundo, provocada pela Reforma
Calvinista e a chamada Revolução Científica de Copérnico, Tycho Brahe e
Kepler, seguidos por Galileu e Isaac Newton.
Por outro lado, importa não perder de vista que nada se resolverá,
simplesmente atuando no nível político superficial, pela troca de governo
ou a modificação de pontos particulares do sistema eleitoral, por exemplo.
O fundamental é iniciar, desde logo, o longo processo de mudança
política no nível mais profundo; isto é, no que diz respeito aos detentores
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efetivos do poder supremo e ao caráter da mentalidade coletiva dominante.
Sem essas mudanças de base, jamais estaremos em condições de fazer
vigorar entre nós os princípios políticos fundamentais da República, da
Democracia e do Estado de Direito.
Mas qual a melhor estratégia para tanto?
Creio que ela consiste em principiar pela criação de um grupo coeso
e dinâmico, composto de um lado por agentes políticos e de outro por
atores da sociedade civil, dispostos a dar início a esse processo de
mudança.
Quanto aos agentes políticos, penso sobretudo na formação de um
núcleo suprapartidário de parlamentares federais, pois as grandes reformas
institucionais hão de ser feitas no nível constitucional e legislativo.
No campo da sociedade civil, parece-me indispensável, por tudo o
que ficou dito acima, obter o apoio da classe industrial brasileira,
particularmente prejudicada pela atual supremacia incontrastável do capital
financeiro.
O
revigoramento
da
indústria
nacional
dará,
incontestavelmente, novo alento à nossa economia e poderá iniciar a
retomada do processo de crescimento econômico. Poder-se-ia começar, por
exemplo, nesse setor, pela proposta legislativa de conteúdo local mínimo
para todo o setor industrial instalado em nosso país.
Ainda no campo da sociedade civil, é indispensável que o núcleo de
parlamentares federais, acima referido, tenha o apoio constante e criativo
de especialistas nas principais áreas: direito, economia, finanças públicas,
educação, saúde etc.
As propostas pontuais de mudança deveriam, a meu ver, visar à
abertura de fendas na muralha oligárquica, tanto no nível da relação de
poder, quanto no da mentalidade coletiva.
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Poder-se-ia, assim, pensar prioritariamente em projetos de lei – ou, se
possível, em emendas constitucionais –, tendo por objetivo criar
instrumentos de democracia direta ou participativa.
Ainda prioritariamente, deve-se iniciar a correção da profunda
desigualdade tributária vigorante entre nós, principiando, por exemplo, pelo
imposto sobre grandes fortunas, instituído pela Constituição e que aguarda
regulação legal desde 1988. Na mesma linha de combate à desigualdade
social, é de primordial importância preservar as políticas de educação e
saúde de cortes orçamentários, em todas as unidades da federação.
Já no que diz respeito à formação cívica da mentalidade coletiva,
cuidado especial deve ser dirigido ao setor de comunicação social,
notadamente ao rádio e à televisão. No Brasil, como apontado até mesmo
pela UNESCO em relatório de 2010, o setor acha-se submetido há dezenas
de anos ao controle oligopolístico de empresas privadas e políticos
profissionais, de acordo com o nosso tradicional modelo de oligarquia
binária.
Em razão disso, desde a promulgação da Carta Constitucional em
vigor, ou seja, há mais de um quarto de século, normas fundamentais que
regem a matéria aguardam regulamentação legal para serem aplicadas.
Assim é com a proibição do monopólio e do oligopólio, direto ou indireto
de todos os meios de comunicação social (art. 220, § 5º). Assim é, da
mesma forma, com a norma de preferência, na produção e programação das
emissoras de rádio e televisão, a finalidades educativas, artísticas, culturais
e informativas (art. 221, inciso I). Em 2011, um partido político e uma
confederação nacional de trabalhadores ingressaram, a esse respeito, com
ações de inconstitucionalidade por omissão perante o Supremo Tribunal
Federal. Acontece que, encerrada a instrução desses processos e já com
parecer parcialmente favorável da Procuradoria-Geral da República, os
autos permanecem conclusos com a Ministra Relatora desde maio de 2012,
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numa clara ilustração da vacuidade, entre nós, do princípio do Estado de
Direito.
Estas são as ideias e as propostas que me parece urgente e
indispensável examinar, neste momento de grande perigo para o futuro do
Povo Brasileiro e do nosso País.
12 de Agosto de 2015.
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