corpos felizes corpos domados

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XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI.
GT 03: Sociologia e antropologia das emoções
A felicidade nos tempos do hiperconsumo: Corpos felizes e corpos domados
Jéssica Ferrer E. de Amorim; Mestranda em Sociologia pela Universidade
Federal da Paraíba; ([email protected])
Introdução
Este artigo sintetiza dados e reflexões discutidos em meu trabalho de
conclusão de curso em 2011. A pesquisa foi realizada com consumidores entre
segmentos de baixa renda e frequentadores de dois centros comerciais
populares da cidade de João Pessoa. Um dos objetivos principais era tentar
compreender o significado social da felicidade relacionada às práticas de
consumo entre segmentos populares da cidade. Outro ponto crucial na
pesquisa era refletir sobre o fenômeno do consumo, percebido em seu aspecto
sociocultural, levantando discussões sobre o universo simbólico deste
fenômeno e fundamentando discussões sobre o imperativo da felicidade na
sociedade contemporânea, e é sobre este último ponto que este artigo se
detém.
Para tal proposta, a de discorrer sobre a representação social da
felicidade
na
sociedade
de
hiperconsumo,
ressaltamos
brevemente
aproximadas concepções da felicidade em sua perspectiva filosófica e
socioantropológica. Sabe-se que a história da felicidade confunde-se com o
início da filosofia e até meados do século XX adquire uma concepção
relacionada a comportamentos que conduziam os homens a uma vida feliz. Por
um lado, a ideia da felicidade como um bem supremo da sociedade a admitia
como critério normativo das ações dos homens, conduzindo a conduta destes,
segundo a Teoria Moral do Eudemonismo1. Deste modo, tanto o significado
social do Eudemonismo quanto da felicidade vem sofrendo mudanças,
marcado fortemente pela sua associação com pequenos prazeres a partir
principalmente do humanismo, desta maneira, no século XX a partir de 1968, a
felicidade passa a significar não apenas um direito, mas um dever de todos os
homens- estes deveriam ser livres e felizes.
1
O Eudemonismo é uma doutrina filosófica onde se acredita que os comportamentos bons conduzem a
felicidade, e esta sendo o bem supremo em que os homens justificam todos seus esforços. Aristóteles,
por exemplo, acreditava que a felicidade é o bem de todos os indivíduos e o fim de suas ações, isto é,
não é o fim, mas o fim em si mesmo. Assim o Eudenomismo que tem como princípio e fundamento
moral a felicidade é distinto da ideia de hedonismo, que tem como princípio o prazer. Porém, Aristóteles
salienta que a felicidade não é um estado, e sim uma vida boa desejada e alcançada através de bons e
virtuosos atos. Para saber mais sobre a Doutrina eudemonista ver ‘O Estoicismo Romano’, de Reinholdo
Ullmann.
2
Bruckner (2002), em sua tese sobre a euforia perpétua se aproxima da
concepção socioantropológica da felicidade. Segundo este autor, a felicidade é
um conceito social e histórico na medida em que seu significado é variável de
sociedade a sociedade. A felicidade para Bruckner torna-se tirânica, onde os
homens estão acorrentados a sua procura essencialmente associada ao poder
sobre seu destino social e espiritual, e associada também ao prazer. Essa
felicidade tirânica se relaciona com o sofrimento humano. Os homens possuem
o direito de não sofrer, e assim sofrem duplamente em busca de qualidade de
vida associada na contemporaneidade ao luxo, ao status, a fuga do próprio
sofrimento ou de outros constrangimentos sociais, não se esquecendo da sua
dimensão espiritual. Assim, a fuga do sofrimento, da dor e a busca pelo prazer
se transformam em guias para a felicidade na atualidade.
A ideia chave da proposição acima, a saber, a felicidade como um fim
último a ser alcançado, ainda é percebida implicitamente dentro das ciências
sociais, principalmente relativos as abordagens sobre a modernidade e a
sobreposição de uma razão instrumental sobre a vida prática. Na abordagem
de Heller (1994) sobre o pêndulo da modernidade, o ordenamento fundamental
das sociedades modernas em contraposição as sociedades pré-modernas são
os modelos de reciprocidade simétricas. Esses modelos são traduzidos na
ideia de que todos os humanos nascem livres e são igualmente dotados de
consciência, em suma, os homens possuem o direito a liberdade, a vida e a
felicidade. Neste momento, a felicidade torna-se valor supremo das sociedades
modernas em que os homens irão buscá-la não mais naturalmente, mas
artificialmente.
Com certeza, essa crença da felicidade e da realização existencial dos
homens constitui uma grande problemática: o estado harmonioso ou feliz
prometido não foi concretizado e alcançado plenamente, amortecidos nos
tempos de hiperconsumo por felicidades momentâneas e artificiais2.
2
Giannetti salienta a associação entre felicidade e civilização, remetendo esta ao século da razão.
Conforme alguns estudiosos do tema, como Eduardo Giannetti que problematiza sobre a felicidade, os
homens das luzes compreendiam que o estado pleno e harmonioso se erigia do progresso cientifico e
tecnológico, isto é, esta visão harmoniosa e otimista do futuro era produto do progresso dos
conhecimentos tecnológico e científico. A promessa do projeto iluminista, segundo estes teóricos e
estudiosos do assunto, também nos ajuda a refletir sobre a felicidade na sociedade de hiperconsumo,
atuando como um imperativo.
3
Estas abordagens são importantes para compreender a concepção
moderna da felicidade e sua importância na era de hiperconsumo. Elas
revelaram a associação estreita da felicidade e a filosofia, e por outro lado, nos
aproximou de uma concepção socioantropológica da felicidade. Nos tempos de
hiperconsumo, a felicidade é fortemente relacionada à cultura material, isto é, a
aquisição de bens materiais e simbólicos, ressaltando também a sua forte
dimensão espiritual. Contudo, há entrelaçados nestas visões a indicação da
felicidade
como
um
sentimento
social
percebendo
essencialmente
a
associação entre emoções e cultura contemporânea, sendo a felicidade e
outros sentimentos sociais como veremos no decorrer do artigo relacionado à
constituição da identidade e das subjetividades, atuando como dispositivos de
poder conduzindo práticas e hábitos de consumo, ponto essencial em nosso
artigo, e que está sendo aprofundado por mim em minha pesquisa de
mestrado.
Na primeira parte, apresentarei abordagens puramente teóricas sobre a
relação entre consumo e felicidade. Discorrerei sobre os principais autores
estudados e analisados em meu trabalho de conclusão de curso que elucidam
esta relação, como Bauman (2008; 2009), Baudrillard (1991; 1993), Lipovetsky
(2007), dentre outros. Na segunda parte, apresentarei as conclusões obtidas
deste trabalho aprofundando tais resultados embasados pela noção da
felicidade como um dispositivo que tem a capacidade de condicionar as ações
dos indivíduos, tendo como cerne a questão do consumismo entre segmentos
de baixa renda.
Os consumidores foram escolhidos de acordo com sua renda familiar,
assim foram entrevistados indivíduos de até quatro salários mínimos o
equivalente a R$2.180,00 e identificando-os segundo o IBGE como indivíduos
de classe social D e E. Estes consumidores foram abordados em dois centros
comerciais populares da cidade, os quais foram ambientes de nossa pesquisa
de campo: o Shopping Terceirão e o Centro comercial de Passagem.
Foram utilizados como recurso metodológico, entrevistas, questionários
e diário de campo aproximando-se de uma pesquisa de cunho etnográfica. É
importante frisar que em alguns momentos serão expostos resultados do
projeto de pesquisa em que participei e que contribuiu assiduamente para a
4
formulação do meu trabalho de conclusão de curso, e as analises realizadas3.
Do meu trabalho de conclusão realizei entrevista com quatro consumidores,
sendo um homem e três mulheres. Apesar de haver uma associação entre
consumo e gênero não aprofundarei essa questão, já que o objetivo do artigo é
investigar as práticas e representações acerca do imperativo da felicidade na
sociedade de hiperconsumo; e do projeto de pesquisa realizo entrevistas e
aplico questionários com cinquenta consumidores dos locais referidos. A
preocupação de evitar a inclusão na amostra de segmentos médios está
relacionada a tentativa de obter uma representação leal do significado social do
consumo associado a felicidade, especificamente entre segmentos sociais de
baixa renda. Setores sociais médios estão assim como os segmentos sociais
populares inseridos no universo simbólico do consumo, mas os primeiros
apresentam por vezes padrões e práticas diferenciadas de consumo. Nosso
artigo também vai de acordo com a tentativa de levantar questionamentos
sobre a inserção dos segmentos de baixa renda no universo simbólico do
consumo, e advertindo que estes também não apenas em suas práticas
relativas a este fenômeno, mas em seu cotidiano são conduzidos a agir
conforme o bem supremo- a felicidade.
Felicidade e consumo – entrelaçamentos
Muitos estudiosos do consumo corroboram com a ideia de que a
felicidade é um imperativo da sociedade de consumo. Dentre eles, Lipovetsky
(2007), irá discutir as práticas de consumo na sociedade contemporânea e em
sua tese analisa tais práticas voltadas para o individuo, isto é, o consumo
voltado às experiências subjetivas. Ele destaca que os consumidores buscam
suas satisfações individuais na sociedade de hiperconsumo onde predomina
uma cultura hedonista, denominada pelo mesmo de ‘civilização do desejo’, que
nasce na segunda metade do século XX orientada pela expansão do
capitalismo de consumo. Nessa ‘civilização do desejo’ o que importa é o
presente, é o agora. E neste sentido, a busca pelo valor supremo da sociedade
3
Projeto de pesquisa realizado pelo Departamento de Ciências Sociais da UFPB cujo título era ‘Da
distinção a Individualização: O significado social do consumo entre segmentos populares da cidade de
João Pessoa’, em que fui voluntária durante 2009 a 2011.
5
de consumo- a felicidade- pode estar relacionada a busca pelo bem-estar
emocional.
É importante salientar que Lipovetsky discorre sobre três fases do ciclo
evolutivo do consumo, assinalando a primeira fase em volta dos anos de 1880.
Essa primeira fase é caracterizada pelo desenvolvimento do comércio em
grande escala, dos grandes mercados nacionais que ocasionaram o
crescimento da produção com custos baixos, originando a produção em massa.
É caracterizado também nesta fase, o surgimento do consumidor moderno e do
marketing de massa, em que surgem os produtos personalizados e as grandes
marcas. Convém ressaltar, o movimento originado pelos grandes magazines, a
saber, o processo de “democratização do desejo”. Os locais de venda
impulsionados pelos grandes magazines foram transformados em “palácios de
sonho”, e revolucionaram os processos de consumo fazendo com que os
produtos atingissem a burguesia. Deste modo, percebe-se um processo de
consumo relacionado as estratégias do marketing. Segundo Lipovetsky:
Impressionar a imaginação, despertar o desejo, apresentar a compra
como um prazer, os grandes magazines foram, com a publicidade, os
principais instrumentos da elevação do consumo a arte de viver e
emblema da felicidade moderna (...). A fase I inventou o consumosedução, o consumo- distração de que somos herdeiros fiéis. ( 2007,
p.31)
A segunda fase do ciclo evolutivo de consumo tem início na década de
1950 e se estende por mais três décadas. Esta segunda fase é caracterizada
pelo seu poder de abundância em que se multiplica o poder de compra da
burguesia e se ‘democratiza’ os desejos e sonhos inventados. É nesta fase que
surge o crédito como meio de alcançar os desejos e sonhos instantaneamente,
e é pela primeira vez que os consumidores se separam do consumo de
necessidades mais básicas, aumentando o consumo conspícuo e de luxo. Os
segmentos mais abastados tem mais acesso a produtos individualizados, mais
acessos e possibilidades a estilos de vida, lazeres e moda, antes consumidos
apenas pela elite.
Dentro deste aspecto, Lipovetsky assinala ainda nesta segunda fase o
aumento da renda e da condição de vida dos indivíduos, e estes passando a
seguir o ideal da sociedade de consumo – semelhante a salvação- em que
6
“toda a sociedade se mobiliza em torno do projeto de arranjar um cotidiano
confortável e fácil, sinônimo de felicidade” (2007, p.35). Assim, esta fase é
caracterizada pelo hedonismo, é dita uma sociedade de abundancia e
dispêndio; e os indivíduos buscam mais conforto e lazeres.
Lipovetsky, afirma que o final da segunda fase do capitalismo de
consumo é marcada pela a sobreposição de um consumo individualista sobre a
lógica dos dispêndios em vista a posição social. E é, pois, na terceira fase que
ocorre uma mudança significativa, de uma lógica ostentatória de consumo para
a lógica de um consumo subjetivo e/ou emocional. Nesta perspectiva, o
consumo está associado a um processo de individualização excedendo um
consumo utilitário, e advertindo o consumo como colonizador das relações
mais íntimas dos indivíduos, isto é, a motivação para o consumo passa a ser
de natureza privada, ou dita de outra forma, de felicidade privada, em que os
bens de consumo irão aparecer cada vez mais a serviço dos indivíduos.
É nesta terceira fase, denominada por Lipovetsky de era do
hiperconsumo, em que há a supremacia do bem estar. Esta era nasce a partir
do advento da globalização marcada pela expansão da economia do
consumidor e do capital financeiro. Neste sentido, o autor salienta que as
práticas e/ou hábitos de consumo traduzem um consumo voltado para o
indivíduo, de si para si, em outros termos, estaríamos vivendo na sociedade
de hiperconsumo organizada em nome de uma felicidade paradoxal, sendo
esta felicidade o valor supremo desta mesma sociedade.
Cabe-nos analisar o que seria essa felicidade paradoxal assinalada
pelo autor. A felicidade, segundo Lipovestky, até meados do século XVIII
adquire outra significação, identificando-a como um valor supremo ou a uma
salvação terrestre. Os indivíduos deveriam ser felizes e livres. A ideia da
felicidade como valor supremo é pensada a partir da ideia que os modernos
tinham sobre o progresso: era um projeto ou uma promessa de que o
progresso para o conhecimento e para as técnicas os levaria a alcançar um
maior bem-estar, isto é, alcançar uma felicidade completa. Mas na era do
hiperconsumo segundo o autor, a felicidade é refletida no presente, devendo
ser satisfeita logo, imediatamente.
7
É em nome da felicidade que se desenvolve a sociedade de
hiperconsumo. (...) Nesse contexto, guias e métodos para viver
melhor fervilham, a televisão e os jornais destilam conselhos de
saúde e de forma, os psicólogos ajudam os casais e os pais em
dificuldade, os gurus que prometem a plenitude multiplicam-se.
Alimentar-se, seduzir, relaxar, fazer amor, comunicar-se com os filhos
(...) quais esferas ainda escapa as receitas da felicidade? Passamos
do mundo fechado ao universo infinito das chaves da felicidade: eis o
tempo do treinamento generalizado e da felicidade “modo de usar
para todos”. (LIPOVETSKY, 2007, p.336)
Dentro desta perspectiva, este autor irá dizer que a busca pela felicidade
na era do hiperconsumo elucida indivíduos que são vistos como livres, porém
são vitimas deste sistema capitalista e tirânico. Salienta o autor “É possível
que o culto moderno do Homo Felix seja o instrumento de nossa maior
infelicidade?” (2007, p.336).
As indagações do autor em detrimento a
sociedade de hiperconsumo partem sob o princípio de que as profusões de
objetos e de ‘felicidades’ destroem o meio ambiente e as relações e os vínculos
entre os indivíduos. Lipovetsky frisa que existe uma diferença entre ter muitos
objetos e ser feliz, ou seja, não se pode confundir a aquisição de objetos com a
felicidade.
Bauman (2009), por exemplo, é um teórico que também corrobora com a
ideia da felicidade como valor supremo da sociedade de consumo. Ele admite
que a felicidade seja um valor desejado constantemente pelos indivíduos.
Porém, assinala que os ‘bens’ necessários - o amor, a amizade e os prazeres
da vida - á uma vida feliz não são comprados, porém os mercados vendem a
felicidade.
(...) como é forte e generalizada a crença de que há um vínculo íntimo
entre a felicidade e o volume e qualidade do consumo: um
pressuposto subjacente a todas as estratégias mediadas pelas lojas.
O que também podemos aprender é com que sucesso os mercados
conseguem empregar esse pressuposto oculto como uma máquina
que produz lucros - identificando o consumo gerador de felicidade
com o consumo dos objetos e serviços postos à venda nas lojas.
(BAUMAN, 2009, p.18)
Deste modo, salienta o autor que a aquisição de objetos é um meio para
se alcançar um estado de felicidade ou vida feliz, porém, um estado de que não
é duradoura e que nunca chega ao fim. O que existe é a busca incessante para
8
se chegar e alcançar a felicidade, e o manter-se na corrida é o que mantém
viva a esperança de ser feliz, “os mercados fazem com que essa busca nunca
possa terminar” (2009, p. 19). É dentro desta perspectiva que percebemos a
relação entre felicidade e consumo para Bauman, as mercadorias servem
como ponte para felicidade. Outra relação também apontada por ele é entre a
busca pela felicidade e identidade. Nesta sociedade a identidade agrega outros
valores,
sendo
uma
identidade
liquida
percebida
como
um
atributo
momentâneo em busca do seu eu. A identidade é constituída a partir da
aquisição de mercadorias em que o substituir o velho pelo novo é estar sempre
a frente. As relações nesta sociedade de consumidores são condicionadas
pelos bens de consumo, isto é, pelos objetos, em que o sentimento de
pertencimento social é adquirido por meio da própria identificação do eu com
as tendências de estilo.
Ainda dentro destas abordagens que explicitam a relação entre
felicidade e consumo, Campbell (2001) afirma que os consumidores modernos
se baseiam em uma estrutura de pensamento hedonista. Nesta perspectiva, o
hedonismo moderno esta ancorado em emoções controladas pela imaginação,
assim os objetos e as mercadorias em sua visão proporcionam prazer aos
indivíduos. A cultura hedonista segundo este autor é baseada pela fruição do
prazer nos atos de compra, ou seja, os bens de consumo proporcionam
sentidos relacionados á emoção. O querer e o desejar são primordiais no
fenômeno do consumismo moderno, e a busca interminável por mercadorias
provoca o desejo pelo novo, assim os indivíduos ficam a espera da desejada
felicidade, dos sonhos, indicando a relação com outros sentimentos sociais,
como a frustração e o constrangimento, na medida em que os objetos tornamse obsoletos.
O consumismo tem mais haver com sentimentos e emoções (na
forma de desejos) do que com a razão e calculismo, na medida em
que é claramente individualista, em vez de público, em sua natureza.
(CAMPBELL, 2006, p. 49)
Ainda é perceptível dentro deste contexto, a relação entre o consumo,
identidade e a metafísica. A atividade do consumo, segundo Campbell serve
9
como um meio de construção das identidades que as pessoas tanto querem e
desejam, sendo um mecanismo de autoconhecimento.
Baudrillard (1993) também salienta que a felicidade é o valor supremo
da sociedade de consumo, e assemelha este valor à salvação da alma, como
um valor a ser alcançado. A ideia da felicidade para ele, como referência da
sociedade contemporânea de consumo é uma ideia ingênua quando se pensa
que existe uma propensão natural desta sociedade na busca individual da
felicidade, para ele:
A força ideológica da noção de felicidade não deriva da inclinação
natural de cada individuo para realizar por si mesmo. Advém-lhe,
sócio-historicamente, do facto de que o mito da felicidade é aquele
que recolhe e encarna, nas sociedades modernas, o mito da
igualdade. (BAUDRILLARD, 1993, p.47)
Desde modo, a felicidade aparece como um modo de relação que parte
de um sistema de diferenciação social, existindo na felicidade um significado
social relacionado à igualdade.
Em detrimento as abordagens de Lipovetsky, Campbell e Bauman,
Baudrillard (1993) nega uma função de prazer/ de bem–estar emocional do
consumo associada à ideia de felicidade, sendo a sociedade de consumo para
ele derivada de princípios democráticos e igualitários em que a ideia de bemestar associa-se com o mito da igualdade. Baudrillard elucida uma teoria do
consumo em que não há relação com uma teoria das necessidades e suas
satisfações, mas em uma teoria ‘igualitária do bem-estar’ ou dos signos da
diferença.
Baudrillard é um dos autores que salientam que o consumismo não
possui uma função de prazer, não existe desse modo um consumo de si para
si. O consumo, desta maneira, serve como ponte para uma felicidade individual
quando existe um consumo voltado para o coletivo, englobado pelo sistema
das diferenças. Esse sistema das diferenças integram os indivíduos, os
excluindo ou os incluindo socialmente, então podemos concluir que o processo
de consumo classifica os indivíduos servindo como um processo de
comunicação e de permuta através de signos compartilhados.
Neste sentido, o consumo não possui a função de conforto e de
satisfações pessoais ou individuais, em que a felicidade estaria associada ao
prazer. Mas antes disso, os indivíduos são manipulados pelo sistema cultural
10
de diferenciação, em que suas necessidades são manipuladas. O sistema de
diferenciação social, pois, controla os indivíduos fazendo-os consumir signos e
não objetos em si. Não existe segundo Baudrillard a liberdade dos
consumidores perante a sociedade de consumo contemporânea, em que é
percebida em suas obras como A sociedade de consumo e O sistema dos
objetos a sociedade em que tudo é mercadoria e a alienação domina e
manipula a vida dos indivíduos. Desta maneira, as práticas de consumo para
esse autor podem ser entendidas como uma ‘linguagem’, em que o sistema de
consumo é visto como um sistema de interpretações. No entanto, Baudrillard
considera que exista uma função social no consumo de diferenciação social
aproximando da tese de Bourdieu sobre os hábitos de consumo entre camadas
populares.
Corpos felizes e corpos domados: O significado social da felicidade
Uma das entrevistadas afirma:
“(...) quando é uma coisa que a gente quer pra gente, por que pros
outros não. A gente gasta muito dinheiro com os outros, imagina se
compro pra mim e pros meus filhos, além de economizar é coisa pra
gente. É isso!”
Esta fala aponta para dois pontos importantes: o primeiro, que as
práticas de consumo estão relacionadas a um sentido pragmático, apontado
quando a entrevistada revela que deve gastar dinheiro consigo e não com os
outros; outro ponto se refere às práticas de consumo associadas a experiência
de consumo individualizada, como frisa Lipovetsky em sua tese sobre as
práticas consumistas na contemporaneidade. Ou seja, estamos vivendo em
uma cultura hedônica referente à era de hiperconsumo, em que o consumo
‘para si’ suplanta o consumo ‘para o outro’ indicando o consumo emocional ou
hedonista (2007, p.42).
Merece ser destacado que as práticas de consumo entre segmentos de
baixa renda estão envolvidas, em grande parte dos casos, por uma
racionalidade utilitarista/econômica. Com isso, frisamos que os consumidores
destes segmentos compram e consomem de acordo com sua condição
11
financeira- baixa. Porém, possuir este sentido pragmático não elimina a ideia
de que os indivíduos destes segmentos estejam inseridos no universo
simbólico do consumo envolvidos por um imaginário social, caracterizando-os
deste modo, como consumidores hedonistas. Sobre este último sentido,
Campbell assinala que “um aspecto característico do consumo moderno é a
extensão em que produtos e serviços são comprados pelos indivíduos para uso
próprio” (2006, p.48). Conforme este autor, percebemos que o consumo ou a
atividade de compra possui a disposição de proporcionar prazer aos indivíduos.
Esses dados são explícitos em sua tese sobre o comportamento do
consumidor moderno em que formula uma ‘teoria da conduta hedonista’4.
Campbell, no entanto, assinala que o comportamento do consumidor moderno
é caracterizado pela busca do prazer, e os indivíduos exercem controle sobre
os estímulos que os mesmos experimentam, percebendo a atividade de
compra como uma ação individualizada e prazerosa.
Há desta maneira uma evidente relação entre o ato de compra e a
felicidade, quando indicado pelas entrevistadas ‘o comprar para si’ como
motivo de bem-estar e de felicidade. O consumo torna-se uma condição de
existência do próprio individuo. A associação entre felicidade e consumo ainda
é visível na seguinte fala:
“Quero ganhar na mega sena! Mulher, quem não quer ‘né’!? Daria pra
comprar tudo, e dava pra pagar as dívidas que é mais importante.
Primeiro eu ia pagar os cartões da C&A (...) depois comprava o que
tinha que comprar, mas meu marido mesmo ele pensa logo em
comprar um carro bonitão, esse é o sonho dele. E meus meninos
querem é viajar, tão certo eles ‘né’!? Tá vendo como é bom gastar
com a gente!”
Nesta fala percebemos a associação entre sonho de consumo, luxo e
felicidade. O sonho de consumo da entrevistada acima –ganhar na mega senarelaciona-se com o poder de compra como garantia de uma vida rica e
essencialmente uma vida feliz. O dinheiro e o nível de consumo tornam-se o
meio para alcançar esse modo de vida. Tanto o sonho da consumidora como
de seu marido fazem jus a uma felicidade alcançada através da aquisição e
abundância de mercadorias. Bauman (2009) reforça este fato frisando que os
4
Ver Campbell (2001).
12
meios necessários para uma vida feliz na sociedade de consumidores é
através da ‘felicidade’ vendida pelo mercado. É neste ponto em que Bauman
faz uma forte critica a relação entre felicidade e aquisição de mercadorias,
apontando que a busca pela felicidade –ou vida feliz- transforma os indivíduos
em escravos da cultura consumista, na medida em que estes vão estar sempre
a procura do novo. A sociedade dos consumidores, para este autor, faz com
que os indivíduos se mantenham presos a corrida pela felicidade prometida.
Ainda sobre os sonhos, ressaltamos Bloch em sua tese sobre o princípio
esperança, em que há uma associação entre este conceito e o da felicidade.
Conforme este autor, os indivíduos de um lado são seres esperançosos, que
sonham e esperam; e de outro lado, a felicidade é que mantém o sentimento
de esperança nas quais os indivíduos esperam alcançar – sempre um algo
melhor em suas vidas. Bloch insere essa associação entre felicidade e
esperança em um momento histórico referente a segunda guerra mundial. O
momento histórico eram tempos de insuficiência e infelicidade, fazendo sua
forte critica ao sistema capitalista. Desta maneira, a relação entre a esperança
e a felicidade em Bloch elucida a busca pela dignidade humana, fundada na
realidade, sendo a esperança, utopia e o messianismo problemas cruciais em
suas obras. Dentro desta perspectiva, os indivíduos se lançam através de seus
‘sonhos diurnos’ para o futuro buscando o não existente, mas que poderá
existir.
Na pesquisa empírica realizada entre 2009 e 2011 entre os segmentos
populares da cidade de João pessoa na tentativa de compreender o
significado social do consumo entre os segmentos de baixa renda, foi
constatado que a beleza e a estética consistem em ‘valores’ supremos na
sociedade de consumo contemporânea. Conforme Baudrillard, a beleza se
tornou um imperativo desta sociedade em que os indivíduos priorizam ‘o ser
bonita’ e “cuidam do rosto e da linha como sua alma” (1991, p.140).
Neste
aspecto, também constatamos o significado do consumo de marcas que
revela que estes produtos não são consumidos mais em seu valor de uso. A
marca de uma roupa, por exemplo, para estes segmentos se associam a uma
vida ou um estilo de vida desejado. Em muitos casos, fica evidenciada a
relação entre marca e beleza, assim as pessoas consomem produtos de
marca no desejo de se distinguir dos outros sujeitos, isto é, consomem estes
13
produtos a fim de obter status e reconhecimento social. Este último ponto
refere-se a lógica da distinção ou diferenciação social em que o consumo de
produtos são
associados as práticas distintivas, em que a marca seria
utilizada para distinguir-se dos outros ou classificar-se. Produtos de
vestuários, principalmente sapatos e roupas de marca, elucidam o consumo
como mecanismo de diferenciação social. As marcas se conformam em um
sistema de diferenciação social como propõe Jean Baudrillard, e os objetos se
orquestram como diferenças e como valores fixos em uma hierarquia. Deste
modo, os objetos como signos irão diferenciar os indivíduos dentro de sua
comunidade os diferenciando-os com outros grupos. Porém, estas escolhas
não são condicionadas por imposição ou obrigatoriedade, mas são segundo o
autor, condutas que se assemelham a “liberdade como aspiração”
(BAUDRILLARD, 1993, p.60).
Porém, o ponto que merece principal destaque é a lógica subjetiva
constatada nas práticas de consumo entre segmentos de baixa renda,
proporcionando estados de felicidade.
Percebemos que o conforto e a
satisfação foram citados em maior frequência quando perguntados o que
esperam de uma roupa ou sapato, transparecendo sujeitos preocupados com
seu bem-estar subjetivo. Desde modo, Lipovetsky frisa uma nova relação entre
consumidores e estes tipos de produtos de marca. Segundo ele, esta nova
relação com as marcas “psicologizou-se, desinstitucionalizou-se, subjetivou-se”
(2007, p.49), evidenciando que a busca pelo status ou reconhecimento social
apesar de não ser eliminada, é cada vez mais suplantada por sujeitos que
consomem estes produtos em relação ao prazer narcísico de sentir uma
distância de sua classe social, de estar bem consigo, de ‘estar satisfeito
consigo’.
Contudo, o consumo de marcas não está essencialmente relacionado
ao querer se diferenciar. Isto é, se associam ao desejar ‘estar bem consigo’
novamente nos remetendo ao que Lipovetsky assinala sobre o fetichismo das
marcas, evidenciando uma elevada preocupação com os cuidados de saúde
entre os segmentos de baixa renda.
Enquanto um número crescente de atividades e de esferas da
existência toma uma coloração sanitária, os bens de consumo
integram cada vez mais a dimensão da saúde: alimentos, turismo,
14
hábitat, cosméticos, a temática da saúde tornou-se um argumento
decisivo de venda. A fase III anuncia-se como o tempo da
medicalização da vida e do consumo. (LIPOVETSKY, 2007, p. 54)
Os cuidados com o corpo e com a saúde evidenciam uma
reconfiguração na relação entre consumidores e consumo. É, pois na era do
hiperconsumo em que as mercadorias são medicalizadas, carregadas de
preocupações, exigindo em contrapartida responsabilidade por quem as
consomem. Salienta Lipovetsky que o Homo Medicus se torna essencial na era
do hiperconsumo elevando a obsessão com o corpo e a saúde, deste modo,
elucidando sujeitos que controlam suas emoções. Este movimento na era do
hiperconsumo se relaciona estritamente com a expansão das tecnologias para
melhorar a vida, e esta expansão inerente a sociedade de consumo se associa
com a procura da felicidade que “se abriga sob a égide da intervenção técnica,
do medicamento, das próteses químicas” se referindo as “farmácias da
felicidade” (2007, p.57). Neste sentido, percebemos por um lado, indivíduos
que a partir das novas técnicas mudam seu destino social através das
intervenções médicas e químicas, e por outro lado, indivíduos que se sentem
donos de si, mas são escravos dos mercados de felicidade, em que os meios
técnicos ou o próprio sistema capitalista os aprisionam.
Entretanto, fica claro principalmente nos quesitos sobre luxo e sonho a
interminável busca pela felicidade através do consumo e/ou aquisição de
mercadorias. Nestes quesitos, também foram perceptíveis o papel dos meios
de comunicação na sociedade de consumo. Assim, foi constatada a forte
influência que estes meios exercem entre os segmentos populares.
A
televisão, por exemplo, possui papel fundamental nestas famílias, em que 55%
afirmaram assisti-la sempre, lembrando que todos os entrevistados destes
segmentos afirmaram possuir pelo menos uma televisão em suas casas e
nenhum afirmou não assisti-la.
Sobre esta influência, Castro assinala que “Se antes vendiam-se coisas,
atualmente vendem-se, sobretudo, imagens e modos de ser. Verifica-se um
investimento mais sutil do mercado nos próprios processos de subjetivação.”
(2007, p.139). Como percebemos existe um papel importante dos apelos do
meio de comunicação como fomentador da associação entre felicidade e
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consumo. Na sociedade de consumo a publicidade possui um papel
fundamental na venda de valores e ideias para estas famílias, influenciando as
práticas de consumo dos mesmos. Outro ponto apontado pelos entrevistados
foi referente a publicidade dirigida ao público infantil, e mais uma vez
constatamos o papel desempenhado pela mídia ao prover desejos aos
indivíduos para estes adquirirem certos produtos.
“Não, quer dizer... Minhas roupas compro tudo lá. Tenho já cartão em
duas lojas é bom que pode dividir ‘e tal’. Mais tipo sapato, sandália,
bolsa compro por essas lojas aqui do centro. Mas adoro ir nele sabe,
me distrai e compro e olho as novidades.”
Com relação a associação entre felicidade e a atividade de compra,
notamos através da fala desta entrevistada que o shopping possui uma
característica social de distinção relacionada ao espaço físico. Explicita-se de
tal modo a partir de outras falas da mesma entrevistada que o que a motiva
para sair para comprar se relaciona tanto com necessidades básicas, como a
alimentação, como o ato de ir ao shopping Center. Neste sentido, o ir ao
shopping está associado ao espaço luxuoso, sendo esta associação traduzida
por um mecanismo de distinção, para exibir-se ou diferenciar-se, porém esta
distinção revela-se estreitamente associada a felicidade. Falamos deste modo,
sobre os significados atribuídos aos espaços de consumo, que atualmente
servem para ocupar o tempo e de se desculpabilizar dos atos de compra,
assim remetendo-se ao consumo sedução, ao consumo distração, ao consumo
como momentos de felicidade. Os shoppings são vistos como parte de um
universo simbólico e lúdico, e em nossa cultura hedonística salienta uma
compra- prazer, um consumo experiencial. A atividade de compra, entretanto,
como olhar as vitrines é uma ocupação lúdica e prazerosa entre as classes
mais populares evidenciando o movimento socio-histórico da formação de uma
nova classe de consumidores que são as novas classes médias ou
emergentes.
“Sair de casa, ocupar a cabeça com outras coisas, tem hora que não
aguento ficar em casa ‘afe’, um saco, e quando é pra comprar para
mim melhor ainda.”
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Esta fala nos mostra mais uma vez as práticas de consumo voltadas
para o próprio individuo, isto é, individualizadas, e nos mostra uma questão
crucial que sustenta a relação entre felicidade e consumo, a saber, a
associação da felicidade com outros sentimentos sociais na era do
hiperconsumo. Na fala acima, o sair para comprar seria uma fuga dos
problemas
de
casa
–
fuga
das
mágoas,
frustrações
e/ou
outros
constrangimentos. Conforme Lipovetsky há uma relação entre a atividade de
compra e as frustrações da vida, salientando este autor “Sofro, logo compro’:
quanto mais o indivíduo está isolado ou frustrado, mais busca consolo nas
felicidades imediatas da mercadoria” (2007, p. 60).
O poder de compra aparece como um meio para suprir as frustrações ou
carências, salientando Lipovetsky que o consumo “(...) é uma forma de
consolo, funciona também como um agente de experiências emocionais que
valem por si mesmas” (2007, p.61). A desejada felicidade na sociedade de
hiperconsumo assemelha-se a salvação- a salvação encontrada na fuga dos
problemas e frustrações do dia-a-dia- como explicitada por nossa entrevistada.
Esse tipo de salvação é procurado por todos, “toda a sociedade se mobiliza em
torno do projeto de arranjar um cotidiano confortável e fácil, sinônimo de
felicidade” (LIPOVETSKY, p.35). Neste aspecto, percebemos a associação
entre a felicidade e outros sentimentos sociais, salientando a incorporação da
felicidade na vida dos indivíduos quando esta alivia certos constrangimentos
sociais.
Considerações finais
Como indicamos na introdução, o presente artigo se insere em um
estudo mais amplo sobre o fenômeno do consumo que nos conduz
primeiramente ao tema da felicidade como motor das ações individuais e/ou
coletivas, e em seguida, a relação entre felicidade e as práticas e hábitos de
consumo. Percorrendo este caminho, percebemos o imperativo da felicidade
associada às funções subjetivas do consumo, percebendo o modo como este
fenômeno afeta a subjetividade. É, pois, na sociedade de consumo
contemporânea que se difunde atenuadamente a imposição da felicidade como
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bem ou valor supremo em nossas vidas, conduzindo nossos comportamentos e
ações.
Entretanto, no que se refere ao significado social da felicidade na cultura
de consumo percebemos o papel central dos meios de comunicação na
propagação de um imaginário social que atinge todos os indivíduos da
sociedade. O artigo mostrou que os indivíduos entre segmentos de baixa renda
estão inseridos no universo simbólico do consumo e que estão permeados pela
lógica subjetiva do consumo expressas pelo prazer narcísico ou pelo consumo
emocional. Porém, cabe-nos ressaltar que a felicidade não possui apenas este
significado social, relacionado ao processo subjetivo de consumo, advertindo
vários significados na sociedade de hiperconsumo, como por exemplo, a
associação com a cidadania que se dá através de outros mecanismos
traduzidos por indivíduos que se inserem (ou querem se inserir) em certos
grupos sociais expressando singularmente sentimentos de pertencimento
social associados a sentimentos de felicidade.
Outro aspecto que nos auxilia a entender a busca incessante por esse
bem supremo, bem como sua representação social na atualidade, é uma
redramatização entre cultura de consumo e emoções, essencialmente
relacionadas a construção identitária – a procura do ‘quem eu sou’; fetichismo
das marcas; fuga das frustrações; dentre outros.
Não se trata, entretanto de uma construção vazia, a questão entre
felicidade e consumo: pois são, nos ‘mercados da felicidade’ que se traduzem
por um lado, indivíduos a procura de um algo melhor em suas vidas, donos de
de seus destinos; e por outro lado, a profusão de arcabouços a favor e inerente
a era do hiperconsumo, que é traduzida por indivíduos não tão soberanos de si
ou felizes, mas indivíduos domados e submersos a um aparato fortemente
capitalista, conferindo as instituições o controle externo sobre as nossas
emoções e ações.
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