TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 008.824/2009

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TC 008.824/2009-6
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
GRUPO I – CLASSE VI – Segunda Câmara.
TC 008.824/2009-6 (com 2 volumes e 3 anexos).
Natureza: Representação.
Unidade: Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia – Into.
Responsáveis: Allergan Produtos Farmacêuticos Ltda. (CNPJ
43.426.626/0001-77); Geraldo da Rocha Motta Filho (CPF
391.619.607-30); Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia
(CNPJ 00.394.544/0212-63).
Interessada: Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda. (CNPJ
44.734.671/0001-51).
Advogados constituídos nos autos: Romeu Pereira de Souza (OAB/SP
171215), Fábio Floriano Melo Marins (OAB/SP 247.545 e OAB/DF
24.468), Kelson José Lopes (OAB/SP 290.794), Sérgio de Regina
(OAB/RJ 57.887), Leonardo Romeiro Bezerra (OAB/DF 28.944).
Sumário: REPRESENTAÇÃO FORMULADA POR LICITANTE
CONSIDERADA IMPROCEDENTE. CONHECIMENTO DE
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONSTATAÇÃO DA
EXISTÊNCIA DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. PROVIMENTO.
INSUBSISTÊNCIA
DA
DELIBERAÇÃO
RECORRIDA.
DILIGÊNCIAS EFETIVADAS. ELEMENTOS ACOSTADOS
SUFICIENTES
PARA
CARACTERIZAREM
A
IRREGULARIDADE DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.
FIXAÇÃO DE PRAZO PARA O EXATO CUMPRIMENTO DA
LEI. DETERMINAÇÕES.
RELATÓRIO
Tratam os autos de representação formulada pela empresa Cristália Produtos Químicos
Farmacêuticos Ltda., em que relata suposta irregularidade no edital do Pregão Eletrônico 018/2009, por
meio do qual o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia – Into realizou registro de preços para a
aquisição do medicamento toxina botulínica tipo A 100 U + albumina humana 0,5 mg. O valor estimado
da aquisição monta a R$ 156.888,00 (cento e cinquenta e seis mil oitocentos e oitenta e oito reais) (fls. 1/
23 e 56, principal).
2.
Por meio do Acórdão 3773/2009, a Segunda Câmara do Tribunal conheceu da presente
representação para, no mérito, julgá-la improcedente. Irresignada com a deliberação, a representante opôs
embargos de declaração arguindo a existência de omissão e contradição na decisão embargada, com o que
concordou o colegiado desta Corte de Contas que, por meio do Acórdão 4718/2009, conheceu do recurso
e tornou insubsistente o acórdão recorrido.
3.
Por meio do mesmo acórdão, foi expedida determinação à Secex/RJ para que realizasse a
oitiva da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Saúde, para que se
manifestasse sobre os protocolos existentes em relação à utilização da toxina botulínica tipo A (princípio
ativo), independentemente de sua apresentação comercial, para os fins terapêuticos previstos na licitação.
4.
Autorizou, ainda, a unidade a realizar todas as medidas necessárias ao saneamento do
processo, e que, tão logo fossem acostados os novos elementos, procedesse à sua análise em conjunto e
em confronto com as demais informações e documentos já acostados aos autos, com vistas a subsidiar a
deliberação a ser adotada pelo Tribunal.
5.
Em cumprimento à determinação, a unidade técnica adotou os procedimentos de
saneamento e, ainda, expediu diligência à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do
Ministério da Saúde – SCTIE/MS para que também se manifestasse sobre os itens tratados neste
processo, bem como informasse se expediu qualquer orientação aos órgãos e unidades
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subordinados/vinculados ao Ministério da Saúde sobre a aquisição ou utilização de “Toxina Botulínica
Tipo A 100 UI” (fls. 167 e 171/172, do v. p.).
6.
Em resposta às diligências, as entidades encaminharam a documentação acostada às fls.
185/190 e 201/204 do v p., que foi analisada pela unidade técnica nos termos da instrução acostada às fls.
212/224, v. 2, que abaixo reproduzo como parte deste relatório:
“[...]
7.
Antes de passarmos ao exame das respostas às diligências realizadas, cumpre
lembrar que o Pregão nº 018/2009 foi aberto às 14h02min de 27 de março de 2009, com a
divulgação das propostas e posterior abertura da fase de lances. Em 30 de março de 2009, a
proposta da Cristália foi desclassificada por não atender às especificações do edital. Em 6 de abril
de 2009, a representante apresentou intenção de recurso contra sua desclassificação, que foi
rejeitada pelo Pregoeiro sob a alegação de que a área técnica do Into informou que o produto cotado
não corresponderia à descrição do edital (fls. 135/138, principal).
8.
A empresa Allergan foi então declarada vencedora do certame, tendo a adjudicação
do objeto ocorrido em 9/4/2009, pelo valor unitário de R$ 440,00 e total de R$ 132.000,00. A
licitação foi homologada pelo Diretor do Into em 15/4/2009 (fls. 137/140, principal).
9.
A Ata de Registro de Preços foi assinada em 15/4/2009, com vigência de 20/4/2009 a
19/4/2010 (fl. 211, anexo 1).
10. Em consulta ao sistema Siafi, verificamos que não houve, até o presente momento
nenhum empenho de despesa com base na referida ata de registro de preço. A última aquisição de
toxina botulínica tipo A feita pelo Into ocorreu em abril deste ano, na vigência da ata de registro de
preços anterior. Na ocasião, o Instituto adquiriu 225 unidades do medicamento Botox ao preço
unitário de R$ 418,83 (fls. 212/219, anexo 1).
II – Exame das Diligências
11. Vejamos, então, as questões formuladas nas diligências e as respostas para cada uma
delas a partir da síntese das informações fornecidas pela Anvisa e pela SCTIE/MS.
12. Questão: o medicamento Prosigne, fabricado por Cristália Produtos Químicos
Farmacêuticos Ltda., sob o registro nº 102980317 MS, atende à especificação contida no edital do
Pregão Eletrônico nº 018/2009, realizado pelo Into, a saber: “TOXINA BOTULÍNICA TIPO A 100
UI + ALBUMINA HUMANA 0,5 MG – C/ INDICAÇÃO DE USO PEDIÁTRICO?
13. De acordo com a Anvisa, os medicamentos biológicos que contêm a toxina
botulínica tipo A são: Prosigne, Botox e Dysport, cujos dados apresentamos na tabela a seguir (fls.
202, principal).
PROSIGNE
BOTOX
DYSPORT
Princípio
Toxina botulínica tipo A Toxina botulínica tipo A Toxina botulínica tipo A
ativo
Gelatina, dextrano e Albumina humana e Lactose monoidratada e
Excipientes
sacarose
cloreto de sódio
albumina 20%
Agente
paralisante Agente
paralisante Agente
paralisante
Classificação
neuromuscular
neuromuscular
neuromuscular
1.0147.0045
1.6977.0001
Registro MS 1.0298.0317
03/2013
06/2012
04/2014
Validade
Cristália
Produtos
Allergan
Produtos Beaufour
Ipsen
Químicos Farmacêuticos
Empresa
Farmacêuticos Ltda.
Farmacêutica Ltda.
Ltda.
50 unidades (c/ 0,25 mg
50 ou 100 unidades, em
500 unidades (com 2,5
de albumina) ou 100
cartucho de cartolina
mg de albumina) em
unidades (c/ 0,5 mg de
Apresentação
com 1 ou 5 frascoscartucho com 1 ou 2
albumina, ambas em
ampola
frascos-ampola.
cartuchos de cartolina
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com 1 frasco-ampola
Fabricante
Allergan Pharmaceuticals
Lanzhou Institute of
Ireland (Irlanda)
Biological
Products
Allergan
Bioscience
(República Popular da
Laboratories
(Estados
China)
Unidos)
Ipsen Biopharm Limited
(Reino Unido)
HPA
Centre
for
Emergency Preparedness
and Response (Reino
Unido)
Fonte: fls. 84, 142 e 202, principal).
14. Destarte, as informações prestadas mostram que há apenas dois produtos que
possuem o princípio ativo toxina botulínica tipo A e apresentação de 100 unidades: Prosigne e
Botox. O medicamento Dysport está disponível apenas na apresentação de 500 unidades.
15. A Anvisa destaca que as indicações aprovadas na bula do Prosigne, após
comprovação da eficácia e segurança por estudos clínicos são: tratamento da sintomatologia de
doenças tais como estrabismo, blefaroespasmo, espasmo hemifacial, torcicolo espasmódico,
distonia cervical, espasticidade, paralisia cerebral, reabilitação muscular, linhas faciais
hipercinéticas (rugas de expressão da testa, glabela, ao redor dos olhos, boca e plastima) e
hiperidrose em adultos. Em relação ao uso pediátrico, ficaram comprovadas a segurança e a eficácia
em crianças com menos de 12 anos de idade que utilizaram o Prosigne em diversas patologias
(espasticidade, paralisia cerebral, e reabilitação muscular) através de ensaios clínicos controlados,
multicêntricos e internacionais e estudos clínicos (fls. 85/86 e 202, principal).
16. O Botox, por seu turno, possui indicações para uso adulto e pediátrico no tratamento
do estrabismo, do blefaroespasmo associado com distonia, incluindo blefaroespasmo essencial
benigno ou distúrbio do 7º nervo em pacientes com idade acima de 12 anos, sendo também indicado
para o tratamento de distonia cervical, espasmo hemifacial, espasticidade muscular, linhas faciais
hipercinéticas e hiperidrose focal palmar e axilar (fl. 189, principal).
17. Assim, a SCTIE/MS destacou que, embora o Prosigne e o Botox possuam o mesmo
princípio ativo e indicações para uso adulto e pediátrico, eles diferem em sua composição. Como
consta na tabela acima, o Prosigne possui como excipientes gelatina, dextrano e sacarose, enquanto
o Botox possui como excipientes albumina humana e cloreto de sódio. Em vista disso, concluiu que
a descrição constante do edital ‘contempla somente a descrição do medicamento Botox pois o
Prosigne não atende a esta especificação por não apresentar em sua composição a albumina
humana’ (fls. 186/187, principal).
18. Forçoso é, concluir, portanto, que o medicamento Prosigne não atende à
especificação do edital do Pregão Eletrônico nº 018/2009, realizado pelo Into, haja vista não possuir
albumina humana em sua composição.
19. Questão: há outros medicamentos liberados para comercialização pela Anvisa que
atendem à especificação contida no edital do Pregão Eletrônico nº 018/2009, realizado pelo Into, a
saber: ‘TOXINA BOTULÍNICA TIPO A 100 UI + ALBUMINA HUMANA 0,5 MG – C/
INDICAÇÃO DE USO PEDIÁTRICO?
20. Como vimos na questão anterior, dos três medicamentos registrados na Anvisa que
possuem como princípio ativo a toxina botulínica tipo A, somente o Botox atende à especificação
contida no edital do Pregão Eletrônico nº 018/2009, realizado pelo Into, pois é o único com
apresentação de 100 unidades que contém albumina humana em sua composição. Portanto, não há,
além do Botox, nenhum outro medicamento liberado pela Anvisa que atenda à referida
especificação.
21. Questão: há alguma queixa ou procedimento de investigação que contraindique a
utilização do medicamento Prosigne, fabricado por Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos
Ltda.?
22. De início, cabe registrar que a Anvisa prestou esclarecimentos acerca das queixas
técnicas formuladas pelo Into constantes das notificações nos 2006.12.000125 e 2006.12.000126, de
20/12/2006, referentes à ausência de vácuo nos frascos dos lotes 20060801 e 20051002 do
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medicamento Prosigne adquiridos pelo Instituto em razão da licitação anterior, fato que, segundo o
Instituto, impediu a sucção completa do produto para a seringa e ocasionou maior consumo do
medicamento, haja vista que parte da substância ficou retida no frasco (fls. 118 e 143, principal).
23. De acordo com a Anvisa, após triagem segundo critérios de risco definidos pela
Resolução RDC nº 55/2005, as queixas técnicas do Into foram colocadas no estágio de
‘agrupamento’, em que é necessário um maior número de notificações referentes a um mesmo
medicamento ou lote para que seja iniciado um processo de investigação. A Agência esclareceu,
ainda, que a ausência de informações imprescindíveis para a investigação – como o número do lote
que apresentou problema – somada ao baixo número de reclamações ou notificações de queixa do
produto – somente três notificações em três anos – contribuíram para que fosse tomada a decisão de
não iniciar um processo de investigação em detrimento de outros casos com gravidade ou
frequência maiores (fls. 192 e 193, principal).
24. Especificamente quanto à questão em tela, a Anvisa respondeu que não há, em seus
bancos de dados, notificação de suspeita de reações adversas ao medicamento Prosigne que
contraindiquem a sua utilização (fl. 201, principal).
25. Questão: a SCTIE/MS expediu qualquer orientação aos órgãos e unidades
subordinados/vinculados ao Ministério da Saúde sobre a aquisição ou utilização de ‘TOXINA
BOTULÍNICA TIPO A 100 UI’?
26. A SCTIE/MS informou que ‘o Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos
Estratégicos não encaminhou informação aos órgãos e unidades subordinados (caso do Into) ou
vinculados ao Ministério da Saúde sobre a aquisição ou utilização sobre a Toxina Botulínica tipo A’
(fl. 187, principal, grifo nosso).
27. Outrossim, esclareceu que o Parecer Técnico nº 63/2008/DAF/SCTIE/MS,
mencionado pela Cristália em sua representação, foi encaminhado somente às Secretarias
Estaduais de Saúde, haja vista que cuidava da aquisição e financiamento da toxina botulínica tipo
A no âmbito do Componente de Medicamentos de Dispensação Excepcional (CDME).
28. Como o assunto é mencionado tanto pela representante quanto pelo Into, julgamos
oportuno acrescentar, a título de esclarecimento, que o CDME, aprovado pela Portaria nº
2.577/GM, de 27 de outubro de 2006, tem por objetivo disponibilizar medicamentos no âmbito
do Sistema Único de Saúde para tratamento de agravos inseridos nos seguintes critérios (fls.
154/159, anexo 1):
‘1. doença rara ou de baixa prevalência, com indicação de uso de medicamento de
alto valor unitário ou que, em caso de uso crônico ou prolongado, seja um tratamento de
custo elevado; e
2. doença prevalente, com uso de medicamento de alto custo unitário ou que, em
caso de uso crônico ou prolongado, seja um tratamento de custo elevado desde que:
2.1. haja tratamento previsto para o agravo no nível da atenção básica, ao qual o
paciente apresentou necessariamente intolerância, refratariedade ou evolução para quadro
clínico de maior gravidade, ou
2.2. o diagnóstico ou estabelecimento de conduta terapêutica para o agravo
estejam inseridos na atenção especializada.’
29. O fornecimento de medicamentos no âmbito do CMDE deverá obedecer aos critérios
de diagnóstico, indicação e tratamento, inclusão e exclusão de pacientes, esquemas terapêuticos,
monitoramento, acompanhamento e demais parâmetros contidos nos Protocolos Clínicos e
Diretrizes Terapêuticas estabelecidos pelo Ministério da Saúde para os medicamentos de
dispensação excepcional, de abrangência nacional.
30. De acordo com a supracitada portaria, a toxina botulínica tipo A, nas concentrações
de 100 e 500 unidades, está prevista para utilização em pacientes portadores de distonias e
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espasticidade focal disfuncional, conforme os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
constantes das Portarias SAS nº 1.013 e 1.014/2002.
31. Quando da publicação desses protocolos clínicos, em 2002, havia no mercado
somente dois medicamentos com princípio ativo toxina botulínica tipo A registrados na Anvisa, a
saber: Botox e Dysport (fl. 188, principal).
32. Em 2007, ante a necessidade de revisar e atualizar os protocolos clínicos, novas
versões foram submetidas à consulta pública. Como nessa ocasião já havia no mercado um
terceiro medicamento registrado na Anvisa – o Prosigne – a possibilidade de sua utilização foi
inserida nos textos das novas versões (fls. 188, principal, e 182, 187, 197 e 201, anexo 1).
33. Cabe destacar, conforme ressaltado pelo Ministério da Saúde, que ‘os Protocolos
Clínicos e Diretrizes Terapêuticas publicados em Consulta Pública pelo Ministério da Saúde
devem ser observados pelas Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito Federal, na
regulação da dispensação dos medicamentos, desde que as indicações e os tratamentos já estejam
cobertos pelo Componente de Medicamentos de Dispensação Excepcional’ (fl. 189, principal,
grifo nosso).
34. Não obstante, os arts. 4º das referidas consultas públicas estabeleceram que, até a
publicação da versão final consolidada, as Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito Federal,
deveriam ser observados os Protocolos Clínicos aprovados pelas Portarias SAS nº 1.013 e
1.014/2002 (fls. 182 e 197, anexo 1).
35. Ante a publicação, em consulta pública, de novos protocolos clínicos, bem como em
razão de questionamentos dos Estados em relação à aquisição e ao financiamento da toxina
botulínica tipo A, o Ministério da Saúde esclareceu às Secretarias Estaduais de Saúde, por meio
do já mencionado Parecer Técnico nº 63/2008/DAF/SCTIE/MS, de 23/7/2008 (fls. 188/190,
principal):
‘Como o Botox e o Prosigne apresentam as mesmas características em relação à
via de administração, forma e apresentação farmacêutica, os estados podem escolher entre
as duas toxinas botulínicas tipo A de 100 U disponíveis no mercado brasileiro.
(...)
As três apresentações comerciais de toxina botulínica tipo A têm formas de
armazenamento, diluição e doses de administração diferentes. São produtos biológicos que
apresentam mecanismo de ação idêntico, mas diferem em seu comportamento
farmacocinético. O médico deverá conhecer suas similaridades de diferenças, pois não há
uma razão fixa de potência entre elas.
(...)
Do ponto de vista sanitário e da eficácia e da segurança, as três formulações de
toxina botulínica, quando administradas com acompanhamento de profissionais
especializados são importantes para o tratamento das distonias e espasticidades. Os três
medicamentos registrados podem ser adquiridos pelos estados e co-financiados pelo
Ministério da Saúde no âmbito do CDME. Saliente-se que é fundamental o registro, junto à
ANVISA, de quaisquer problemas relacionados com os medicamentos. Portanto, em casos
de falta de eficácia, desvios de qualidade ou outro problema relacionado aos medicamentos
os profissionais da área da saúde deve, fazer o registro em formulário próprio no site da
ANVISA.’
36. Acrescentamos que, recentemente, por meio das Portarias SAS nº 376 e 377, de
10/11/2009, foram aprovados os novos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para Distonias
Focais e Espasmo Hemifacial e para Espasticidade. Assim como as versões submetidas à consulta
pública, eles preveem a utilização dos três medicamentos que têm como princípio ativo a toxina
botulínica tipo A existentes hoje no mercado, quais sejam, Botox, Prosigne e Dysport (fls. 160, 164,
173 e 177, anexo 1).
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III – Reexame das Alegações da Representante
37. Acostados aos autos novos elementos decorrentes das diligências realizadas, cumprenos proceder à análise das alegações da representante e do Into, em conjunto e em confronto com as
demais informações e documentos já acostados aos autos, com vistas a subsidiar a deliberação a ser
adotada pelo Tribunal, conforme determinado no Acórdão nº 4718/2009-2ª Câmara.
38. Em síntese, a empresa Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda. alega o
seguinte:
a)
a descrição do objeto do edital do Pregão Eletrônico nº 018/2009 direciona a
licitação para o produto Botox, fabricado pela Allergan, e restringe a competitividade;
b)
as substâncias gelatina, presente na formulação do Prosigne, e albumina humana,
presente na formulação do Botox, não integram o princípio ativo dos medicamentos e tampouco
interferem nas suas indicações, abrangências e segurança terapêutica;
c)
assim, nem a gelatina nem a albumina humana – substâncias inertes do ponto de vista
da função terapêutica e que emprestam características secundárias e adicionais aos medicamentos,
tais como cor, consistência e sabor – podem servir para descrever o medicamento toxina botulínica
tipo A;
d)
os argumentos do Into para indeferir a impugnação ao edital feita pela representante
e para desclassificá-la no certame contrariam as normas e determinações do Ministério da Saúde e
da Anvisa, pois o medicamento Prosigne tem registro no MS e o seu uso nas indicações constantes
da sua bula foi aprovado pela Anvisa;
e)
os medicamentos Prosigne e Botox estão liberados para comercialização em todo o
território nacional para as mesmas indicações terapêuticas, por cumprirem as exigências do
Ministério da Saúde e da Anvisa quanto à segurança e eficácia terapêuticas;
f)
tanto é assim que tem participado de inúmeras licitações em vários órgãos públicos
ofertando a toxina botulínica tipo A 100 U;
g)
por ocasião do registro do produto, a fábrica de Lanzhou foi inspecionada por
técnicos da Anvisa, tendo recebido o Certificado de Boas Práticas de Fabricação, documento que
habilita um laboratório a produzir medicamento.
39. A respeito dos questionamentos feitos pela Cristália, o Into argumentou, em resumo
(fls. 2/3 e 126, anexo 1):
a)
o medicamento toxina botulínica é registrado na Anvisa como medicamento
biológico, regulamentado pela RDC nº 315, de 26/10/2005, em que fica claro que a Agência não
confere intercambialidade entre produtos biológicos porque, de acordo com a Lei nº 9.787/1999,
produtos farmacêuticos necessitam comprovar equivalência em testes de bioequivalência e
biodisponibilidade;
b)
o Protocolo Clínico aprovado pela Portaria SAS nº 1013, de 20/12/2002, utilizado
pelo Into, descreve a toxina botulínica tipo A de 100 U com composição de 0,5 mg de albumina
humana e 0,9 mg de cloreto de sódio, e ressalta que o médico deverá conhecer suas similaridades e
diferenças, pois há controvérsias na literatura sobre a equivalência das apresentações;
c)
somente o medicamento Botox contém indicação para o tratamento de espasticidade
muscular, para o qual o mesmo é usado no Into;
d)
o Ministério da Saúde afirma que não existem unidades padrão internacionais e as
unidades de uma preparação não são intercambiáveis, ou seja, as unidades de uma formulação de
toxina são exclusivas daquele produto;
e)
o parecer técnico da médica responsável pela aplicação do medicamento nos
pacientes do Into, Maria Luiza de A. Meireles, que subsidiou a decisão do pregoeiro pela
desclassificação da Cristália no certame, foi no seguinte sentido (grifo nosso):
‘Os produtos biológicos diferem em seu comportamento farmacocinético. Não existem
unidades-padrão internacionais e as unidades de uma preparação não são intercambiáveis e, por
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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
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último, não existem estudos clínicos comparativos cruzados que comparem a eficácia no tratamento
da espasticidade em crianças.
Por já ter utilizado as duas Toxinas em crianças; por experiência e por ser a única pessoa
que utiliza a TBA de 100U no Into, escolho pela Toxina Botulínica em 100 unidades em Albumina
Humana pela sua melhor eficácia.’
40. De início, e para melhor compreensão do assunto, é importante esclarecer o que é um
medicamento biológico.
41. De acordo com a Resolução RDC nº 315/2005, que trata do registro de produtos
biológicos, medicamento biológico é aquele que contém molécula com atividade biológica
conhecida (fl. 51, anexo 1).
42. Este é o caso da toxina botulínica, que é uma neurotoxina produzida pela bactéria
Clostridium botulinum, cujo principal mecanismo de ação é o bloqueio da liberação da acetilcolina,
que é o principal neurotransmissor da placa motora. Ela provoca a interrupção da transmissão
neuronal e o consequente bloqueio neuromuscular. Por este motivo, é usada em condições que se
caracterizam por atividade muscular exagerada, de acordo com o Ministério da Saúde (fl. 189,
principal).
43. A esse respeito, a Anvisa esclareceu, em seu Informe SNVS/Anvisa/GFARM nº
6/2007 (fl. 144, principal, grifo nosso):
‘1. Os medicamentos biológicos são muito mais complexos do que os
medicamentos químicos sintéticos e semi-sintéticos, tendo peso molecular muito maior,
caracterização química mais difícil, e exigindo um processo de produção muito mais longo
e complicado.
2. Não é possível que um fabricante duplique o processo de fabricação de um
medicamento biológico inovador desenvolvido por outro fabricante, e o conceito de
bioequivalência não está estabelecido para esses produtos porque critérios
farmacocinéticos não são relevantes ou mensuráveis, de forma que não se aceita a
existência de medicamentos biológicos genéricos, embora o termo biogenérico seja
encontrado na literatura médica.
3. ‘Cópias’ de medicamentos biológicos existem, como é o caso das toxinas
botulínicas, mas não são consideradas medicamentos genéricos, e nem esse termo dever ser
utilizado nesses casos. Na Europa, costuma-se usar o termo ‘biossimilar’, e nos Estados
Unidos, eles são conhecidos como follow-on biologicals.
(...)
5. Como a Anvisa, assim como outras autoridade reguladoras, não aceita a
similaridade entre produtos biológicos, cada um deles, para ser registrado, deve ser
submetido a estudos pré-clínicos e clínicos de forma independente, que servirão de
subsídio para seu registro. Não se registra um medicamento biológico com base em estudos
desenvolvidos com um outro produto, o que pode ocorrer no caso dos medicamentos
genéricos, desde que se comprove sua equivalência farmacêutica e bioequivalência ao
medicamento de referência.
6. Assim sendo, para cada indicação terapêutica, devem existir estudos
clínicos que a respaldem, o que explica que diferentes medicamentos biológicos sejam
aprovados para diferentes indicações, o que ocorre também no caso das toxinas botulínicas.
7. As doses de toxina botulínica aprovadas para cada indicação terapêutica e
a duração do efeito podem variar entre os diferentes produtos registrados no país.
8. Muitas tentativas têm sido feitas para estabelecer experimentalmente um fator
de conversão entre as diferentes toxinas botulínicas tipo A existentes, mas nenhuma dessas
tentativas provou ser suficientemente confiável para aceitação mundial.
9. As diferenças entre as toxinas botulínicas existentes no mercado, que são
inerentes à sua condição de produtos biológicos manufaturados por empresas
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diferentes, e a inexistência de fatores de conversão entre os diferentes produtos que se
apliquem para todas as indicações limitam a intercambialidade entre eles.’
44. No mesmo sentido se manifestou o Ministério da Saúde em julho de 2008, como
vimos no parágrafo 34, acima (grifo nosso):
‘As três apresentações comerciais de toxina botulínica tipo A têm formas de
armazenamento, diluição e doses de administração diferentes. São produtos biológicos
que apresentam mecanismo de ação idêntico, mas diferem em seu comportamento
farmacocinético. O médico deverá conhecer suas similaridades de diferenças, pois não há
uma razão fixa de potência entre elas. Não existem unidades-padrão internacionais e
as unidades de uma preparação não são intercambiáveis com as de outra, ou seja, as
unidades de uma formulação de toxina são exclusivas para aquele produto.’
45. Não obstante não haja, como afirmado pelo Into, intercambialidade entre as toxinas
botulínicas tipo A, é fato que tanto o Botox quanto o Prosigne possuem, em suas bulas, indicações
para uso no tratamento de distonias e espasticidades (fls. 85, 186, 189 e 202, principal). Cabe
ressaltar a informação prestada pela Anvisa de que ‘cada medicamento registrado no Brasil recebe
aprovação da Anvisa para uma ou mais indicações, as quais passam a constar na sua bula, e que
são as respaldadas pela Agência. O registro de medicamentos novos é concedido desde que sejam
comprovadas a qualidade, a eficácia e a segurança do medicamento, sendo as duas últimas
baseadas em estudos clínicos realizados para testá-lo para essas indicações’ (grifo nosso).
46. No caso específico do Prosigne, a sua bula informa, em relação ao uso pediátrico,
que ficaram comprovadas a segurança e a eficácia em crianças com menos de 12 anos de idade que
utilizaram o Prosigne em espasticidade, paralisia cerebral e reabilitação muscular (fls. 85 e 202,
principal). Assim, forçoso é concluir que a utilização do Prosigne no tratamento da espasticidade
em crianças tem o respaldo da Anvisa. Não procede, destarte, o argumento do Into de que somente
o medicamento Botox contém indicação para o tratamento de espasticidade.
47. Tanto é assim que os novos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para
Distonias Focais e Espasmo Hemifacial e para Espasticidade do Ministério da Saúde contemplam
os três medicamentos que têm como princípio ativo a toxina botulínica tipo A existentes hoje no
mercado, quais sejam, Botox, Prosigne e Dysport (fls. 163 e 177, anexo 1). Como não há
intercambialidade ou equipotência entre as toxinas, cabe ao médico conhecer as suas similaridades e
diferenças ao definir a dose a ser administrada. Há apenas a sugestão, no protocolo clínico para
espasticidade, da relação de 1 unidade de Botox para 1 unidade de Prosigne (fls. 163/164 e 177,
anexo 1).
48. Cabe destacar que os novos protocolos clínicos do Ministério da Saúde foram
publicados recentemente, em novembro deste ano, e revogaram os antigos, mencionados pelo Into
em sua argumentação. Destarte, não mais procede a alegação do Into de que somente a toxina
botulínica tipo A com 0,5 mg de albumina humana está prevista nos protocolos clínicos do
Ministério da Saúde.
49. Outrossim vimos que o Ministério da Saúde afirma que ‘do ponto de vista sanitário e
da eficácia e da segurança, as três formulações de toxina botulínica, quando administradas com
acompanhamento de profissionais especializados são importantes para o tratamento das
distonias e espasticidades’ (fl. 190, principal, grifo nosso).
50. Vê-se, portanto, que tanto a Anvisa quanto o Ministério da Saúde asseguram a
eficácia e a segurança das três formulações de toxina botulínicas existentes no país. Assim, em que
pese a afirmação da médica do Into quanto à ‘melhor eficácia’ do medicamento Botox, é preciso
ponderar que tal afirmação, desacompanhada de estudos clínicos que a respaldem, não pode, no
âmbito das aquisições feitas pela Administração Pública, se sobrepor às análises feitas pelo
Ministério da Saúde e pela Anvisa.
8
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 008.824/2009-6
51. Importante destacar que as conclusões dos estudos científicos juntado aos autos pelo
Into tampouco afastam a segurança ou a eficácia da toxina botulínica produzida pelo Lanzhou
Institute of Biological Products (fls. 20, 26 e 41, anexo 1, grifo nosso):
‘Conclusão: ambos os preparados são tratamentos seguros e eficazes para
pacientes com distonia focal e espasmo muscular. Ambos têm efeitos sub-clínicos sobre a
transmissão neuromuscular de músculos remotos não injetados. O preparado chinês é um
pouco menos potente, porém mais barato, que o Botox.’
‘Conclusão: Aplicação localizada de Botox ou de CBTX-A é um tratamento
seguro, eficaz, simples e de fácil aplicação. A preparação nacional apresenta efeito
terapêutico real a um preço econômico. Apesar de pacientes isolados apresentarem reações
alérgicas, ainda pode se considerar como uma boa escolha para o tratamento da distonia
cervical.’
52. Por outro lado, estes estudos afirmam, também, que a dose necessária da toxina
botulínica chinesa é maior do que a do Botox (fls. 25, 31 e 41, anexo 1):
‘As duas preparações apresentaram semelhante efeito terapêutico na distonia
cervical, porém para alcançar efeitos terapêuticos similares, a quantidade da dose
necessária no grupo CBTX-A é maior que a do grupo do Botox. (...) em cada tratamento, a
dose necessária no grupo de CBTX-A foi mais elevada do que de Botox (Ρ<0,05 Tabela
1)’
‘A dose do preparado chinês, que produziu efeitos similares aos do Botox, foi
maior. (...) A dose média no grupo do Botox foi de 99,4 U (30-300 U), e no grupo de
CBTX-A foi de 107,3 U (30-300 U), sem mostrar diferenças significativas.’
53. Entretanto, ambos os estudos afirmam que o preço da toxina botulínica chinesa é
menor (fls. 35 e 41, anexo 1):
‘O preparado chinês é um pouco menos potente, porém mais barato, que o Botox.’
‘...em termos de preço, a mesma unidade de BTX-A, Botox custa
aproximadamente 8 vezes o preço de CBTX-A.’
54. Acerca da relação custo-benefício do medicamento Prosigne, o Pregoeiro do Into
afirmou, ao indeferir a intenção de recurso interposta pela representante contra sua desclassificação
no certame, que, ‘em relação aos dados científicos que mostram que é necessária uma quantidade
maior (cerca de 30%) de uma toxina em relação a outra, entendemos que este fator deve ser
considerado na questão da economicidade pois o consumo do medicamento torna-se maior para
tratar o mesmo número de pacientes, e no último pregão a diferença de preço não foi maior que
30%’. A empresa Allergan afirma, também, que o estudo científico às fls. 25/35 do anexo 1
demonstra uma diferença de 30% a mais na dosagem do Prosigne em relação ao Botox (fl. 129,
anexo 1).
55. Os elementos constantes dos autos não permitem estabelecer a relação custobenefício entre os dois medicamentos. Outrossim, não há indícios de que tal relação seja
significativamente desfavorável ao Prosigne. A leitura dos estudos científicos apresentados pelo
Into dá a entender que a maior quantidade de medicamento utilizada é compensada pelo seu baixo
preço. De toda forma, tal relação está sujeita a alterações decorrentes de mudanças na composição
dos custos dos fabricantes em razão, por exemplo, do desenvolvimentos de novas tecnologias de
produção e mesmo de alterações no cenário econômico.
56. Em vista de todo o exposto, somos de opinião que, embora haja limitações à
intercambialidade entre os medicamentos Prosigne e Botox, em razão de serem produtos biológicos
manufaturados por empresas diferentes, o que faz com que não haja um fator de conversão
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TC 008.824/2009-6
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
mundialmente aceito, havendo apenas uma sugestão de proporção de 1 unidade de Botox para 1
unidade de Prosigne no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Espasticidade do
Ministério da Saúde, tal limitação não é suficiente para justificar a restrição à participação do
medicamento Prosigne no certame do Into, haja vista que ambos têm a sua segurança e eficácia no
tratamento da espasticidade asseguradas pelo Ministério da Saúde e pela Anvisa, cabendo ao
médico que for aplicá-los conhecer as suas similaridades e diferenças ao definir a dose a ser
administrada para obter o resultado desejado.
57. O art. 7º, § 5º, da Lei nº 8.666/93, veda a realização de licitação cujo objeto inclua
bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas, salvo
nos casos em que for tecnicamente justificável, ou ainda quando o fornecimento de tais materiais e
serviços for feito sob o regime de administração contratada, previsto e discriminado no ato
convocatório.
58. Assim, como o Into não logrou justificar tecnicamente, de forma inequívoca, que a
utilização do Prosigne não produz os mesmos resultados terapêuticos que o Botox no tratamento da
espasticidade, forçoso é concluir que a inclusão, na descrição do objeto, de substâncias que não
compõem o princípio ativo do medicamento, restringiu a participação no certame, em desacordo
com os arts. 3º, § 1º, I, art. 7º, § 5º, art. 15, § 7º, todos da Lei nº 8.666/93.
59. Impõe-se, destarte, a anulação do Pregão Eletrônico nº 018/2009 e,
consequentemente, da respectiva Ata de Registro de Preços assinada em 15/4/2009 pelo Into e pela
empresa Allergan Produtos Farmacêuticos Ltda.
60. Lembramos que, até o presente momento, não houve aquisições com base na ata de
registro de preços decorrente do Pregão Eletrônico nº 018/2009.
61. Por fim, registramos que a empresa Allergan Produtos Farmacêuticos Ltda. foi
devidamente oficiada para, se desejasse, ingressar nos autos como interessada, tendo se
pronunciado conforme documentação às fls. 127/151 do anexo 1.
IV – Proposta de encaminhamento
62. Ante todo o exposto, sugerimos o encaminhamento dos autos ao Gabinete do Ex.mo
Ministro-Relator, Aroldo Cedraz, propondo:
62.1 conhecer da presente representação, formulada nos termos do art. 113, §1º, da Lei nº
8.666/93, para, no mérito, considerá-la procedente;
62.2 fixar o prazo de 15 (quinze) dias, com fundamento no art. 71, inciso IX, da
Constituição Federal, c/c o art. 45 da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992 e com o art. 251 do
Regimento Interno/TCU, para que o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia adote
medidas no sentido de anular o Pregão nº 18/2009 e a Ata de Registro de Preços dele decorrente,
assinada em 15/4/2009;
62.3 determinar ao Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia que:
a)
encaminhe ao Tribunal de Contas da União documento que comprove a adoção da
medida prevista no item 62.2 acima;
b)
abstenha-se de incluir, na descrição do objeto a ser licitado, características e
especificações exclusivas de determinado bem ou serviço, salvo nos casos em que for tecnicamente
justificável, conforme determina o art. 7º, § 5º, da Lei nº 8.666/93;
62.4 encaminhar cópia da deliberação que vier a ser proferida, bem como do relatório e
voto que a acompanharem, às empresas Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda e Allergan
Produtos Farmacêuticos Ltda.; e
62.5 arquivar o presente processo.[...]”
É o Relatório.
VOTO
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Como se observa do Relatório que precede a este Voto, o processo em questão teve origem
na representação formulada pela empresa Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda., em que relata
suposta irregularidade no edital do Pregão Eletrônico 018/2009, por meio do qual o Instituto Nacional de
Traumatologia e Ortopedia (Into) realizou registro de preços para a aquisição do medicamento toxina
botulínica tipo A 100 U + albumina humana 0,5 mg, sendo que, por meio do Acórdão 3773/2009, a
Segunda Câmara do Tribunal conheceu da representação para, no mérito, julgá-la improcedente.
2.
A deliberação, entretanto, foi tornada insubsistente por meio do Acórdão 4718/2009-TCU2ª Câmara, que determinou a adoção de procedimentos com vistas ao melhor saneamento do processo.
3.
Acostado aos autos novos elementos decorrentes das diligências realizadas, a unidade
instruiu novamente o processo, confrontando esses elementos com as demais informações e documentos
já acostados aos autos.
4.
Da análise, foi possível constatar que os novos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas
para distonias focais e espasmo hemifacial e para espasticidade do Ministério da Saúde, publicados em
novembro de 2009, contemplam os três medicamentos que têm como princípio ativo a “toxina botulínica
tipo A” existentes hoje no mercado, quais sejam, Botox, Prosigne e Dysport. Tais protocolos revogaram
os antigos protocolos mencionados pelo Into em sua argumentação produzida neste processo.
5.
Foi registrada, também, na instrução, a afirmativa do Ministério da Saúde de que, do ponto
de vista sanitário, da eficácia e da segurança, as três formulações de toxina botulínica, se administradas
com acompanhamento de profissionais especializados, são importantes para o tratamento das distonias e
espasticidades.
6.
Vê-se, portanto, que tanto a Anvisa quanto o Ministério da Saúde asseguram a eficácia e a
segurança das três formulações de toxina botulínicas existentes no país. Assim, em que pese a afirmação
da médica do Into quanto à “melhor eficácia” do medicamento Botox, é preciso ponderar que tal
afirmação, desacompanhada de estudos clínicos que a respaldem, não pode, no âmbito das aquisições
feitas pela Administração Pública, se sobrepor às análises feitas pelo Ministério da Saúde e pela Anvisa.
7.
Quanto ao segundo ponto abordado pela unidade técnica que, em resumo, diz respeito à
relação custo-benefício do medicamento, vez que seriam diferentes as doses necessárias para alcançar
efeitos terapêuticos similares, em relação a dois dos produtos analisados, houve a conclusão que os
elementos constantes dos autos não permitem estabelecer a relação custo-benefício entre dois
medicamentos, embora estudos científicos apresentados pelo Into dão a entender que a maior quantidade
de medicamento de um dos fabricantes é compensada pelo preço mais baixo ofertado.
8.
Independentemente desses argumentos, entendo que a análise da economicidade não deve
ser considerada no deslinde dessa questão, pois o objeto principal da análise é verificar a viabilidade da
competição ante a segurança, riscos à saúde dos enfermos e eficácia na utilização de um medicamento
independentemente da sua apresentação comercial.
9.
Assim, considerando que, neste caso concreto, o Into não logrou justificar tecnicamente
que a utilização do Prosigne não produz os mesmos resultados terapêuticos que o Botox e, considerando,
ainda, que estão disponíveis para comércio, no mercado brasileiro, três marcas da toxina botulínica,
produzidas por três laboratórios diferentes: o americano Allergan, dono da marca Botox; o laboratório
Aché, que recentemente comprou a Biosintética, antiga representante do produto, que distribui o Dysport,
fabricado pelo laboratório francês Beaufour Ipsend; e o laboratório Cristália, que comercializa o
Prosigne, produzido pelo laboratório chinês Lan Zhou, que, segundo o Ministério da Saúde e a Anvisa,
possuem a mesma segurança e eficácia no tratamento da espascidade, é possível inferir que a inclusão, na
descrição do objeto do pregão, de substâncias que não compõem o princípio ativo do medicamento
acabou por restringir a participação no certame, em infringência aos arts. 3º, § 1º, I, art. 7º, § 5º, art. 15, §
7º, todos da Lei 8.666/93.
10.
Por fim, é importante registrar que o pregão 018/2009, aberto em 27/3/2009, foi
homologado em 15/4/2009 e a ata de registro de preços assinada em 15/4/2009, tem vigência de
20/4/2009 a 19/4/2010. Entretanto, pesquisa efetivada pela Secex/RJ, no sistema Siafi, revela que não
houve, até a data da instrução, a expedição de empenho de despesa com base na referida ata de registro de
preço. A última aquisição de toxina botulínica tipo A teria ocorrido em abril de 2009, na vigência da ata
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TC 008.824/2009-6
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
de registro de preços anterior. Na ocasião, o Instituto adquiriu 225 unidades do medicamento Botox ao
preço unitário de R$ 418,83.
11.
Diante de todas as informações constantes dos itens precedentes, entendo que a
representação deve ser conhecida e considerada procedente e que seja fixado o prazo de 15 (quinze) para
que o Into adote as providências com vistas ao exato cumprimento da Lei, consistente na anulação do
pregão eletrônico 018/2009 e, consequentemente, da respectiva ata de registro de preços assinada em
15/4/2009, com a empresa Allergan Produtos Farmacêuticos Ltda.
Sala das Sessões, em 18 de maio de 2010.
AROLDO CEDRAZ
Relator
ACÓRDÃO Nº 2407/2010 – TCU – 2ª Câmara
1. Processo TC 008.824/2009-6 (com 2 volumes e 3 anexos)
2. Grupo I – Classe VI – Representação.
3. Responsáveis: Allergan Produtos Farmacêuticos Ltda. (CNPJ 43.426.626/0001-77); Geraldo da Rocha
Motta Filho (CPF 391.619.607-30); Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (CNPJ
00.394.544/0212-63)
3.1. Interessada: Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda. (CNPJ 44.734.671/0001-51).
4. Entidade: Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into).
5. Relator: Ministro Aroldo Cedraz.
6. Representante do Ministério Público: não atuou
7. Unidade Técnica: Secex/RJ.
8. Advogado constituído nos autos: Romeu Pereira de Souza (OAB/SP 171215), Fábio Floriano Melo
Martins (OAB/SP 247.545 e OAB/DF 24.468), Kelson José Lopes (OAB/SP 290.794), Sérgio de Regina
(OAB/RJ 57.887), Leonardo Romeiro Bezerra (OAB/DF 28.944).
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos relativos à representação formulada pela
empresa Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda., em que relata suposta irregularidade no edital
do pregão eletrônico 018/2009, por meio do qual o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia –
Into realizou registro de preços para a aquisição do medicamento toxina botulínica tipo A 100 U +
albumina humana 0,5 mg.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 2ª
Câmara, diante das razões expostas pelo Relator, em:
9.1. com fundamento nos artigos art. 113, §1º, da Lei 8.666/93, 1º, inciso II, e 43, inciso I,
da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992 c/c os artigos 1º, inciso XXIV; 17, inciso IV; com fundamento
nos artigos 237, inciso VII, e parágrafo único, do Regimento Interno, em conhecer da presente
representação, para, no mérito, considerá-la procedente;
9.2. com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, no art. 45 da Lei
8.443/1992 e no art. 251 do Regimento Interno/TCU, fixar o prazo de 15 (quinze) dias, a partir do
recebimento da comunicação deste acórdão, para que Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia
(Into) adote as providências administrativas necessárias ao exato cumprimento da Lei, no sentido de
promover anulação do pregão eletrônico 18/2009 e, consequentemente, da respectiva ata de registro de
preços assinada em 15/4/2009, em obediência ao disposto nos arts. 3º, § 1º, I, art. 7º, § 5º, art. 15, § 7º,
todos da Lei 8.666/93, em vista da inclusão no edital de exigências que configuram restrição ao caráter
competitivo do certame;
12
TC 008.824/2009-6
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
9.3. determinar ao Into que:
9.3.1. encaminhe ao Tribunal de Contas da União documento que comprove a adoção da
medida prevista no item 9.2 retro;
9.3.2. abstenha-se de incluir, na descrição do objeto a ser licitado, características e
especificações exclusivas de determinado bem ou serviço, salvo nos casos em que for tecnicamente
justificável, conforme determina o art. 7º, § 5º, da Lei 8.666/93;
9.4. encaminhar cópia da deliberação que vier a ser proferida, bem como do relatório e
voto que a fundamentarem às empresas Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda. e Allergan
Produtos Farmacêuticos Ltda.; e
9.5. arquivar o presente processo.
10. Ata n° 16/2010 – 2ª Câmara.
11. Data da Sessão: 18/5/2010 – Extraordinária.
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-2407-16/10-2.
13. Especificação do quorum:
13.1. Ministros presentes: Raimundo Carreiro (na Presidência), Aroldo Cedraz (Relator) e José Jorge.
13.2. Auditor convocado: André Luís de Carvalho.
(Assinado Eletronicamente)
(Assinado Eletronicamente)
RAIMUNDO CARREIRO
na Presidência
AROLDO CEDRAZ
Relator
Fui presente:
(Assinado Eletronicamente)
MARINUS EDUARDO DE VRIES MARSICO
Procurador
13
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