DEBATER A EUROPA Periódico do CIEDA e do CEIS20, em parceria com GPE e a RCE. N.7 Julho/Dezembro 2012 – Semestral ISSN 1647-6336 Disponível em: http://www.europe-direct-aveiro.aeva.eu/debatereuropa/ A Europa e a política de ambiente em Portugal Helena Freitas Vice-Reitora da UC Professora Catedrática do DCV da FCTUC E-mail: [email protected] Maria João Martins Doutoranda do CEF-DCV da UC E-mail: [email protected] Resumo Desde o início da década de 50 que se assiste na Europa, e no mundo, a uma crescente tomada de consciência ambiental. Em Portugal o impulso é dado pela fundação da Liga para a Protecção da Natureza (LPN), em 1948. É já na década de 70 que é criada a primeira Comissão Nacional do Ambiente, produzido o primeiro relatório relativo a temas ambientais e fundada a primeira reserva nacional. Nesta mesma década, a Comunidade Económica Europeia (CEE) é líder mundial na produção de instrumentos e de medidas em matéria de ambiente. A adesão de Portugal à CEE, em 1986, constitui um marco fundamental no desenvolvimento da política ambiental no país. No ano subsequente, as Nações Unidas publicam o famoso “Relatório Brundtland” que introduz o conceito de desenvolvimento sustentável. Nesse mesmo ano (1987), Portugal publica a Lei de Bases do Ambiente, em vigor até aos nossos dias. Nos anos seguintes são publicados vários diplomas dedicados a questões ambientais, ainda que muitos deles tenham ficado aquém das expectativas criadas. Os fundos estruturais foram, igualmente, ineficazes na resolução dos problemas ambientais básicos e estruturais que o país apresentava em matéria de ambiente. Em 1990, é criada a Agência Europeia do Ambiente e, em Portugal, o Ministério do Ambiente. É no seio da “Conferência do Rio” (ONU, 1992) que é consolidado o conceito de desenvolvimento sustentável e assinadas as convenções para a diversidade biológica e para o combate às alterações climáticas. Sob inspiração do “Rio 92”, o ano de 1992 é profícuo em publicações dedicadas ao ambiente, passando o desenvolvimento sustentável a ser um objectivo da, agora, Europa 78 dos 15. Nesse mesmo ano é lançado o programa LIFE, considerado como alicerce fundamental da consolidação da política ambiental europeia. Em 1998, com a Convenção de Aarhus, é formalizada a cidadania activa, promulgada que estava o direito à informação e o dever da participação pública nas questões ambientais. No entanto, Portugal (dados de 2007) é o país com menores níveis de interesse e de conhecimento. A Cimeira da Terra (Joanesburgo, 2002) revela o fracasso do “Rio 92” e nela são assumidos novos compromissos e novas metas. É com o Tratado de Lisboa (2009) que é criado o quadro jurídico e os instrumentos políticos para fazer face aos novos desafios do séc. XXI: a globalização e a urbanização explosiva. De forma geral, a agenda europeia tem sido favorável a uma legislação nacional mais coerente e exigente. Todo o acervo comunitário foi transposto para o direito nacional. No entanto, apesar dos inúmeros planos aprovados, estes continuam, e até aos nossos dias, a ser ultrapassados pelos sucessivos governos que constantemente se sobrepõem às políticas ambientais. Palavras-chave: Europa; Portugal; Protecção da Natureza; Políticas Ambientais Abstract Environmental concern in Europe and worldwide is particularly evident after the 1950’s. In Portugal, the fist public initiative is the foundation of LPN, the League for the Protection of Nature (1948). In the 1970’s, the first National Commission for the Environment was formed, and the first reports on the Environment were produced. In the same decade, the European Commission (EEC) was the world leader in terms of environmental policy and related legislation. In 1986, Portugal joined the EEC and this was an essential step forward for the nation’s environmental policy. In 1987, The UN famous Brundtland report introduced the sustainable development concept. In this same year, Portugal published the National Environment framework (Lei de Bases do Ambiente). The European structural funds were not very enough to solve all the basic environmental problems in the country. In 1990 the European Environmental Agency was established and in Portugal the first Ministry for Environment. The Rio Conference (1992), is considered a landmark to the global objective of sustainable development, with the signature of the Conventions for Biological Diversity and Climate change. In 1998, the Aarhus convention brings the active citizenship and public participation to the core of the environmental policies. The Earth summit, in 2000, proves the failure of the Rio objectives, as most of milestones were not attained. In 2009, the Treaty of Lisbon 79 set up the framework to support the new challenges of the XXI century: globalization and urban sprawl. In general, the European programmes and policies for Environment were relevant to produce a national agenda for Environment, supporting a more sound and tough law. Keywords: Europe; Portugal; Environmental Protection; Environmental Policies A consciência ambiental começa a ter expressão na Europa e no mundo a partir de 1950. No entanto, o ambientalismo e os movimentos ambientalistas, surgem ainda durante o século XIX, em particular em Inglaterra e nos Estados Unidos, em resposta à revolução industrial (Beuad et al., 1993). Em 1900, assinava-se em Londres a Convenção para a Preservação de Animais, Pássaros e Peixes de África (Flores, 1937). Quase todos os movimentos que surgiram durante o século XIX e início do século XX, eram direccionados para a conservação da natureza e para a gestão dos recursos naturais. É já na década de 1960, no decorrer da Conferência Intergovernamental sobre o Uso e a Conservação da Biosfera, (UNESCO, 1968) que surge o primeiro debate sobre sustentabilidade. Nesse mesmo ano, realiza-se nos Estados Unidos o primeiro acto político na área do ambiente: o National Environment Policy Act. Assiste-se desde então a uma crescente consciencialização ambiental em todo o mundo, e à percepção pública dos temas ambientais como parte do conjunto das preocupações sociais, políticas e culturais (Schmidt, 2008). Pode considerar-se que foram três os eixos impulsionadores da consciência ambiental internacional: a conservação da natureza, a escassez de recursos alimentares e a energia nuclear. Por um lado, o usufruto, o lazer e a beleza natural, por outro, a sobrevivência, quer pela limitação de recursos, quer pela contaminação do ar e do meio envolvente (Schmidt, 2008). Portugal escapa um pouco a esta trilogia na génese das suas políticas ambientais, com excepção da consciência conservacionista impulsionada pela fundação da Liga para a Protecção da Natureza, em 1948. Esta organização é igualmente responsável pelos primeiros inventários do património natural, que posteriormente servirão de base ao primeiro conjunto de áreas protegidas. Em 1972, o Clube de Roma divulga o estudo “Limites do Crescimento” (Meadows et al., 1972) e é publicada a Declaração de Estocolmo, formulada na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano. Esta declaração reconhece a necessidade de um ambiente saudável para assegurar o bem-estar humano. A 80 participação de Portugal nesta Conferência esteve na origem da Comissão Nacional de Ambiente (1971), criada no âmbito da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, que, nesse mesmo ano, produz o primeiro “Relatório Nacional sobre os Problemas Relativos ao Ambiente” (Borrego, 2010). Dois anos antes (1970) decorria o Ano Europeu da Conservação da Natureza, que culmina, em Portugal, com a publicação da Legislação da Conservação da Natureza (Lei 7/70). Nesse mesmo ano, é ainda criada a primeira área protegida em Portugal: o Parque Nacional da Peneda-Gerês. Com a revolução de Abril é criado o Ministério do Equipamento Social e do Ambiente, que será extinto menos de ano depois. A primeira crise do petróleo, em 1973, lança a OPEP num debate sobre os limites dos combustíveis fósseis; a publicação na revista Nature (1974) de um artigo sobre a degradação da camada de ozono e a sua relação com os CFC’s; o acidente do petroleiro “Amoco Cadiz” na costa da Bretanha e o acidente nuclear “Three Miles Island” (1979), na Pensilvânia, nos Estados Unidos, reacendem o debate internacional em torno do ambiente. Nas décadas seguintes, tornou-se evidente a necessidade de estabelecer uma nova ordem nas políticas ambientais. A necessidade de controlo e redução da poluição do ar é consumada na Convenção sobre a Poluição Atmosférica Transfronteiriça de longa distância (CEE/ONU, 1979) e, nesse mesmo ano, é assumido que as estratégias de conservação das espécies só teriam viabilidade se integradas num contexto ecológico e social mais abrangente. Esta nova concepção é consignada na Estratégia Mundial para a Conservação da Natureza (IUCN, 1980). Neste mesmo ano, sob o auspício do Presidente Jimmy Carter, redige-se o relatório “Global 2000” onde a biodiversidade é reconhecida como uma questão crítica para o adequado funcionamento do ecossistema planetário. A CEE tornou-se nesta década a principal fonte de orientação das estratégias ambientais, sobretudo na produção de instrumentos, acções e medidas, lançando em 1973 o 1º Programa Comunitário em Matéria de Ambiente (1973-1976). Actualmente, a União Europeia é o espaço político com as normas ambientais mais exigentes do mundo. Em Portugal, é criada em 1983 a Reserva Ecológica Nacional (D.L. 321/83, de 5 Julho), na vigência de Ribeiro-Telles. Trata-se de um instrumento fundamental no ordenamento do território que, desde essa data, ainda que com várias revisões do diploma (1990, 2006 e 2008), tem contribuído para proteger os recursos naturais, especialmente os recursos água e solo, para salvaguardar processos indispensáveis a 81 uma boa gestão do território e para favorecer a conservação da natureza e da biodiversidade. Assiste-se, actualmente, ao desvirtuar contínuo desta figura estratégica de ordenamento do território (Pardal, 2004; 2012). Em 1986, Portugal adere à União Europeia, o que constitui um marco fundamental no desenvolvimento da política ambiental do país através da intensificação da legislação e das medidas. Nesse mesmo ano, o ambiente é assumido como uma acção comunitária e são introduzidos três artigos sobre ambiente no Tratado da Comunidade Económica Europeia. No ano seguinte, comemora-se o Ano Europeu do Ambiente, e as Nações Unidas tornam público o relatório “O nosso futuro comum”, habitualmente designado por “Relatório Brundtland”, que introduz o conceito de "desenvolvimento sustentável". Nesse mesmo ano, em 1987, Portugal, acabado de aderir à Comunidade Económica Europeia, aprova e publica a Lei de Bases do Ambiente (LBA), que materializa os direitos e deveres ambientais já consagrados na Constituição de 1976. Surge a primeira referência à avaliação de impacte ambiental, determina o princípio de “avaliação prévia de impacte ambiental” e estabelece que “os projectos que possam afectar o ambiente terão de ser acompanhados de um estudo de impacte ambiental” (in Relatórios do Estado do Ambiente, Agência Portuguesa do Ambiente). Nos anos subsequentes, são publicados vários diplomas dedicados a questões ambientais: gestão da água, do ar, do ruído, resíduos e conservação na natureza. A avaliação de impacte ambiental só seria regulamentada em 2000, com a transposição da Directiva 85/337/CEE para o direito nacional. Muitas destas leis ficaram aquém das expectativas então criadas. Os financiamentos europeus, inicialmente com o objectivo de consolidar infra-estruturas, tornaram-se ineficazes na solução de problemas básicos e estruturantes como o saneamento básico e os resíduos sólidos (Schmidt, 2008; Borrego, 2010). É no final da década de 80, início da década de 90, que as alterações climáticas e a degradação da camada de ozono passam a ser tema central de vários protocolos e convenções, (Protocolo de Montreal, ONU) sendo criado o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas. No período entre 1987 e 1992, assiste-se a um reforço da legislação ambiental europeia, consolidada no Acto Único Europeu e no alargamento das competências do Parlamento Europeu em matéria de ambiente. Em 1990, é criada a Agência Europeia do Ambiente (EEA) e em Portugal, o Ministério do Ambiente, mais tarde Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, actualmente convertido em Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território. 82 Em 1992, ano em que Portugal presidiu pela primeira vez à União Europeia, realizou-se a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e Desenvolvimento, também designada Conferência do Rio. Portugal liderou a delegação europeia a esta conferência, tendo desempenhado um papel preponderante na elaboração de vários documentos estratégicos (Borrego, 2010). É no seio do “Rio 92” que são formalizadas a Declaração de Princípios do Rio e a Agenda 21, consolidado o conceito de Desenvolvimento Sustentável, e são redigidos dois documentos jurídicos estratégicos para o ambiente e o desenvolvimento: a Convenção para a Diversidade Biológica e a Convenção Quadro das Nações Unidas para o Combate às Alterações Climáticas Globais. A Convenção para a Diversidade Biológica vem associar a conservação da diversidade biológica ao novo paradigma do desenvolvimento sustentável, assumindo 3 grandes objectivos: i) a conservação da diversidade biológica; ii) o uso sustentável da diversidade biológica e iii) a divisão justa e equitativa dos benefícios obtidos pela utilização dos recursos genéticos. O ano de 1992, sob a inspiração do “Rio 92”, é profícuo em matéria de ambiente e são publicados vários documentos fundamentais: a Convenção sobre a Avaliação de Impacte Ambiental num Contexto Transfronteiriço (CEE/ONU, Espoo); a Convenção sobre a Protecção dos Solos e os Usos dos Cursos de Água Transfronteiriços e dos Lagos Internacionais (CEE/ONU, Helsínquia); a Convenção sobre os Efeitos Transfronteiriços dos Acidentes Industriais (CEE/ONU, Helsínquia) e a Convenção para a Protecção do Ambiente Marinho do Atlântico Nordeste (CEE, Paris). Os princípios da precaução, da prevenção, e do poluidor-pagador, começam a desenhar-se no contexto europeu e internacional. É lançado o primeiro programa de financiamento LIFE I (L’Instrument Financier pour L’Environment) (1992-1995) considerado um alicerce fundamental da política ambiental europeia. Este programa visa a aplicação, o desenvolvimento e o reforço da política legislativa comunitária em matéria de ambiente, assim como a integração do ambiente de forma transversal noutras políticas da União Europeia. Até 2004 (final do programa LIFE III) tinham sido financiados 118 projectos em Portugal, 63 centrados na inovação ambiental e 55 na conservação da natureza. Nesse mesmo ano, decorriam 26 projectos num total de 35 milhões de euros de financiamento, 20 dos quais provenientes da União Europeia. Actualmente, está em vigor o Programa LIFE + (2007-2013) cujo objectivo central é o desenvolvimento, a aplicação e a actualização da política e da legislação comunitária a nível ambiental em três áreas fundamentais: natureza e biodiversidade; política e governação ambiental, e 83 informação e comunicação (in Projectos LIFE em Portugal, ec.europa.eu/environment/LIFE/). A assinatura do Tratado de Maastricht (UE, 1992) e a sua entrada em vigor (1993) transpõe para a União Europeia (EU) as linhas orientadoras da Conferência do Rio, tratando o ambiente como uma política comunitária e definindo como missão da UE a promoção de um desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades humanas, o crescimento sustentável, e o respeito pelo ambiente. O desenvolvimento sustentável passa a ser um objectivo na Europa dos 15. É no ano de 1993 que é aprovado o 5º Programa de Acção em Matéria de Ambiente (1993-2000) sob o tema “Em direcção a um futuro sustentável”. Assumidas que estão as questões ambientais e reconhecida a necessidade de actuação conjunta, em 1994, em Washington, é criado o Fundo Mundial para o Ambiente cujo propósito é fomentar projectos direccionados para a perda de biodiversidade, as alterações climáticas, a degradação da camada de ozono, a degradação das água internacionais, a degradação dos solos e os poluentes orgânicos persistentes. O ano de 1997 é novamente fértil em acontecimentos que marcarão o futuro das políticas ambientais internacionais e europeias: Tratado de Amesterdão (UE), que reforça a política ambiental europeia “Viver num meio ambiente são – uma exigência dos europeus”; a Conferência Rio +5 (ONU) que em sessão especial analisa os progressos na implementação dos acordos do Rio 92, em particular a Agenda 21, reconhecendo que o progresso realizado é pouco; é assinado o Protocolo de Quioto que estabelece os limites para a redução das emissões de gases com efeito de estufa e criado o “mercado de emissões” para os países desenvolvidos e o “mecanismos de desenvolvimento limpo” para os países em vias de desenvolvimento. O Protocolo de Quioto é adoptado no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas para o Combate às Alterações Climáticas Globais e os limites às emissões de gases com efeito de estufa passam a ser vinculativos. Neste cenário, a União Europeia compromete-se, solidariamente, a reduzir em 8% as emissões desses gases no período de 2008-2012, relativamente às emissões de 1990. Portugal beneficia do chamado “Burden sharing” – podendo aumentar em 27% as emissões sob “a cobertura” do crescimento económico (Borrego, 2010). No entanto, em 2001, Portugal já tinha ultrapassado a sua quota em 36%, em especial pelo impacto da energia e dos transportes. Em 2004, é aprovado em Conselho de Ministros o Programa Nacional para 84 as Alterações Climáticas (PNAC 2001-2007), com a primeira alteração em 2006, e em vigor até aos nossos dias. Está em revisão até 31 de Dezembro de 2012. A cidadania activa é um elemento essencial para o desenvolvimento das sociedades democráticas, assentando em 3 pilares fundamentais: 1. o conhecimento sobre os mecanismos e processos democráticos; 2. a atitude e envolvimento do cidadão; 3. algum conhecimento sobre a sociedade em geral e a aceitação das suas regras elementares de funcionamento democrático. Uma cidadania activa implica, por isso, que os instrumentos de participação do cidadão têm acesso fácil e devem conduzir a uma actuação eficaz. O cidadão tem que identificar esses instrumentos, compreender facilmente a sua utilização e confiar na resposta dos serviços. Qualquer ineficácia na resposta, num processo que conta apenas com a atitude e o empenho do cidadão, integrado numa organização ou não, forçosamente dissuade a sua participação. Por outro lado, a participação pública deve ser reconhecida e o seu interesse claramente percepcionado pelo cidadão. A Convenção sobre o Acesso à informação, Participação do Público na Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria Ambiental – “Convenção de Aarhus” (1998) formaliza esta cidadania activa, o direito/obrigação de participação activa e de responsabilidade partilhada, no sentido que estabelece o direito do público e obrigações das autoridades públicas no acesso à informação, a participação do público na tomada de decisão e o acesso à justiça em matéria ambiental e estabelece, pela primeira, uma relação directa entre os direitos humanos e o direito ao ambiente. Em 2005, Portugal, é palco de várias manifestações e manifestos públicos contra a implementação da co-incineração. Àquela data, a participação pública travou o processo, tendo sido retomado apenas alguns anos depois. No entanto, de acordo com o European Values Survey (2007), os índices de intervenção e de conhecimento em Portugal são os mais baixos da Europa. O ano 2000 é marcado pela Cimeira do Milénio (ONU), a maior Assembleiageral da Nações Unidas de governos e de chefes de estado. Nesta cimeira é adoptada a “Declaração do Milénio”, destacando-se o compromisso de erradicação da pobreza e o reconhecimento da importância de uma economia mundial mais justa. Nesse mesmo ano, em Portugal, é publicada a primeira edição do SIDS Portugal (Sistema de Indicadores de Desenvolvimento Sustentável), com um conjunto de 118 indicadores, categorizado por 10 temas de Estratégia de Desenvolvimento Sustentável da UE. Em Setembro de 2002, realiza-se em Joanesburgo, na África do Sul, uma Cimeira Mundial do Desenvolvimento Sustentável, a Cimeira da Terra, sob os auspícios 85 da Organização das Nações Unidas. Uma década depois da Conferência do Rio, esta reunião visava fazer o balanço de 10 anos de políticas ambientais, económicas e de desenvolvimento, actualizar o diagnóstico da situação, e propor as medidas necessárias à prossecução dos objectivos da sustentabilidade. Esta Cimeira, revelou existir um hiato entre as boas intenções políticas e a concretização das acções que podem levar ao seu êxito. Os compromissos mais importantes desta Cimeira, terão sido a intenção proclamada e assumida por todos, de “reduzir de forma significativa a de perda da biodiversidade até 2010” e a aprovação do “Plano de Implementação de Joanesburgo” que operacionaliza as orientações da Agenda 21. Para que tal, serão necessários novos programas de avaliação e monitorização e, sobretudo, o respeito integral pelo seu cumprimento. O cumprimento dos compromissos ambientais até agora estabelecidos, regra geral falharam. O governo português, elaborou a Estratégia Nacional para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade em 2001, assumindo-a como uma resposta formal aos compromissos do Rio mas a verdade é que, desde a sua apresentação pública, as suas acções, metas e obrigações têm sido ignoradas. Anteriormente, a Comunidade Económica Europeia, já tinha publicado a Convenção sobre a Diversidade Biológica (1992), a “Directiva Aves” (1979) e a “Directiva Habitats” (1992). Estes dois últimos documentos são transpostos para o direito nacional apenas em 1999 (D.L. 140/99, de 24 de Abril) e republicados em 2005 (D.L. n.º 49/2005). O programa LIFE II (1996-1999) financia a implementação em Portugal da Directiva Habitats e a produção das Lista de Sítios (Sítios de Importância Comunitária). Até hoje, a rede NATURA 2000, não tem grande significado na gestão das áreas circunscritas, funcionando apenas como figura legal restritiva de algumas actividades. Em 2001 é aprovado o 6º Programa de Acção em Matéria de Ambiente (20022010) – “Ambiente: o ambiente até ao ano 2010. Estabelece quatro domínios prioritários de actuação: alterações climáticas, protecção da natureza e da biodiversidade; saúde e qualidade de vida e utilização sustentável dos recursos (política energética 20-20-20: 20% aumento da eficiência; 20% redução das emissões; 20% quota de energias renováveis). Introduz de forma clara e inequívoca seis princípios fundamentais: o da precaução, da prevenção, da correcção na fonte, do poluidorpagador e da subsidiariedade. Em 2009, é publicada a directiva 2009/28/CE, de 23 de Abril, relativa à promoção e utilização de energias provenientes de fontes renováveis, pelo que Portugal elabora no seu âmbito o Plano Nacional de Acção para as Energias 86 Renováveis (PNAER) para o horizonte de 2020, assumindo as metas traçadas por Bruxelas. O século XXI traz para a agenda política internacional e europeia novos desafios: a globalização e a urbanização explosiva (metade da população mundial vive em cidades que ocupam 2% da superfície terrestre e consomem 75% dos recursos naturais). A urbanização e as cidades eram debatidas na Europa desde o ano de 1994 primeira Conferência sobre Cidades Europeias Sustentáveis - Carta de Aalborg (Dinamarca, 1994). Esta Carta assume as cidades como entidades passíveis de serem sustentáveis e que essa sustentabilidade passa por ser um processo criativo, local e equilibrado, lançando questões várias relacionadas com os padrões de uso sustentável do território. O Tratado de Lisboa (UE, 2009) cria o quadro jurídico e os instrumentos políticos para fazer face a estes novos desafios, tendo como principais objectivos em matéria de ambiente: as alterações climáticas; os habitats naturais e a vida selvagem; o ambiente e a saúde e a gestão de resíduos, em tudo similares aos já definidos objectivos do 6º Programa de Acção (Borrego, 2010). Todo o acervo comunitário em matéria de ambiente foi, até hoje, transposto para a legislação nacional com implicações no planeamento do território e com obrigação de elaboração de diversos planos: Plano Nacional da Água - PNA; Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos – PERSU I (1997) e II (2007); Plano de Ordenamento da Orla Costeira – POOC; Plano de Acção Ambiente e Saúde – PNAA’s; e estratégias: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas; Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento; Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável – ENDS15, entre outros. Apesar dos inúmeros planos aprovados, a verdade é que acabam por ser ultrapassados pelas dinâmicas locais de ocupação do território ou por propostas dos sucessivos governos, que assim contornam e desacreditam as políticas ambientais. A agenda ambiental europeia, para além de proporcionar um enquadramento legislativo mais exigente do ponto de vista ambiental, obriga a reproduzir as regras e as intenções e a responder pelo seu incumprimento. De forma geral, a agenda ambiental europeia tem sido favorável a uma legislação nacional mais coerente e exigente, com reflexos notórios na percepção das questões ambientais por parte da sociedade civil (exemplo: qualidade do ar e da água). Só em 2009, foram publicados mais de 100 diplomas relativos ao ambiente (Borrego, 2010). Os compromissos políticos crescentes e a necessidade de respostas políticas transversais, de certa forma também catapultou a 87 própria importância das políticas ambientais nacionais no seio da actividade governativa. Esta legislação, obrigou ainda a uma abertura dos processos de decisão à participação pública, com a criação simultânea de diversas plataformas organizadas para responder às novas solicitações (comissões de acompanhamento, instrumentos de ordenamento). Excepção feita à introdução do conceito de governança ambiental e à integração do elemento transversalidade à política ambiental. O desafio mais urgente, para além da credibilidade das próprias políticas, passará sempre pela educação para a cidadania ambiental e para o desenvolvimento sustentável. Bibliografia BEAUD, M., Beaud, C. e Bouguerra, M. L. (1993), L’Etat de L’Environnement, Paris, La Découverte. BORREGO, C. (2010), A política ambiental de Portugal no espaço europeu: atitudes e desafios. In Europa: Novas Fronteiras Portugal: 25 anos de intergração europeia. Centro de Informação Europeia Jacques Delors p. 177-182. FLORES, F. M. (1937), A Protecção da Natureza - Directrizes Actuais, Relatório Final de Curso de Engenheiro Silvicultor, Instituto Superior de Agronomia, Texto policopiado. Liga para a Protecção da Natureza (2008), 60 Anos pela Conservação da Natureza em Portugal, Lisboa, Ed. LPN. MEADOWS, D.H, Meadows, D.L., Randers, J, and Behrens, W.W. (1972). The limits of growth. MIT, Clube de Roma. SIDÓNIO, Pardal (2012). A maldição da reserva Ecológica em Portugal. Parecer sobre a proposta de alteração ao regime da REN, Decreto-Lei N.º 166/2008 88