23 DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0005639-09.2014.8.19.0000 RELATOR: DES. MARIA INÊS DA PENHA GASPAR AGRAVANTE: ESTADO DO RIO DE JANEIRO AGRAVADO: DENISE DE HOLANDA TOMAZ “AGRAVO DE INSTRUMENTO. Decisão a quo que determinou o fornecimento de bomba infusora de insulina e insumos descritos em laudo médico. Autora portadora de diabetes mellitus I. Possibilidade de substituição ou inclusão de medicamentos e insumos, não descritos na inicial, que se fizerem necessários ao tratamento da doença. Súmula nº 116 TJRJ. Compete ao profissional de saúde indicar qual o melhor tratamento ao paciente. Irrelevância do fato do equipamento e dos insumos requeridos não constarem das listagens de medicamentos do SUS. A saúde é direito de todos, constituindo dever do ente público prover os meios suficientes para garanti-la aos necessitados, fornecendo os medicamentos e insumos necessários à sobrevivência do paciente. Precedentes desta E. Corte. Decisão mantida. Negativa de seguimento”. DECISÃO Trata-se de recurso de agravo interposto de decisão do Dr. Juiz de Direito da 3ª Vara de Fazenda Pública da Comarca da Capital que, em ação de cumprimento de obrigação de fazer movida pela agravada em face do agravante, deferiu a inclusão do utensílio BOMBA INFUSORA DE INSULINA PARADIGMA MODELO MMT 772 pleiteado, ao argumento de ser decorrente da mesma doença, consoante o Aviso nº 32 MARIA INES DA PENHA GASPAR:000011869 Assinado em 05/02/2014 13:01:55 Local: GAB. DES(A). MARIA INES DA PENHA GASPAR 24 desta E. Corte, determinando, outrossim, a intimação dos réus para o fornecimento do referido utensílio, conforme laudo médico de fls. 418/420, bem como deferiu a inclusão dos insumos elencados no receituário de fls. 441, tudo consoante fundamentação a fls. 431 e 461. Aduz o agravante (fls. 02/18), em síntese, não ter a agravada comprovado estar regularmente inscrita no “Programa de Diabetes e Hipertensão Arterial” criado pelo Município do Rio de Janeiro para atendimento à população, sendo condição para o recebimento de medicamentos a inscrição em programa de educação especial para diabéticos, o que, inclusive, está previsto na Lei 11.347/2006. Sustenta não ser razoável compelir o ente público ao tratamento reclamado, em prejuízo de todas as políticas públicas de saúde que já contam com respaldo orçamentário, salientando, ainda, que, de acordo com o parecer apresentado pelo Núcleo de Assessoria Técnica em Ações de Saúde (Parecer Técnico N.0041/2013), emitido em caso análogo, não são todos os pacientes que podem utilizar a bomba de infusão de insulina requerida. Argumenta que, a bomba pleiteada não está padronizada nas listas oficiais de fornecimento de medicamentos e insumos das esferas governamentais, merecendo cautela o exame da presente demanda, a qual não veicula o simples fornecimento gratuito de medicação pelo Estado, e sim o fornecimento de aparelho de alto custo não fornecido pelo SUS. Ressalta exigir o princípio da eficiência a utilização de meios menos onerosos para obtenção de resultados, sendo de altíssimo custo e difícil manuseio a utilização de bomba de insulina. Acrescenta existir política pública para a doença da parte agravada, como o fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento de diabetes e dos utensílios necessários à aplicação de insulina, pelo que não pode o ente público ser condenado a fornecer um medicamento específico, ou os insumos eleitos pela parte, sob pena de grave ofensa aos artigos 2º, 5º, 167 e 196, todos da CF. Afirma não ser possível à parte escolher a marca dos insumos e aparelhos pleiteados, sendo que entender de maneira diversa 2 25 incorreria em violação ao princípio da impessoalidade previsto no art. 37, caput da CF. Frisa, ainda, que o fornecimento de insumos e aparelhos pleiteados pela agravada afronta o princípio da isonomia, insculpido no art. 5º da CF, bem como ao art. 7º, IV da Lei 8080/90. Invoca jurisprudência que entende favorável à tese sustentada e pede, por fim, o provimento do recurso, com a reforma da decisão agravada, para que seja revogada a inclusão concedida. Sem razão o recorrente. Versa a hipótese ação ordinária, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada em face do Estado e do Município do Rio de Janeiro objetivando a autora o fornecimento de medicamentos indicados na inicial para o tratamento de diabetes mellitus I (fls. 02/10 dos autos originais). A tutela antecipada foi deferida para que os réus forneçam à parte autora, gratuitamente, “os medicamentos/equipamentos Insulinas (Lantus U-100) e Novo Rapid ou Hemalog U-100, Seringa BD Ultra-Fine 50-U, Agulha para caneta, Fitas reagentes para glicosimetro ACCU Check Advantage, nas quantidades indicadas nas fls. 16 e 20” (fls. 24 dos autos originais), a qual foi confirmada na sentença de fls. 80/82, que julgou procedente o pedido inicial, a qual, por sua vez, foi mantida pelo acórdão de fls. 149/152, emanado desta E. Câmara. A fls. 431 e 461, o Juízo a quo deferiu a inclusão de BOMBA INFUSORA DE INSULINA PARADIGMA MODELO MMT 772 descrita no laudo médico de fls. 418/420, bem como dos insumos elencados no receituário de fls. 441. Com efeito, é possível a substituição ou inclusão de medicamentos e insumos, não descritos na inicial, que se fizerem necessários ao tratamento da doença, sendo este o entendimento predominante desta E. Corte, consubstanciado na Súmula nº 116, in verbis: 3 26 “Na condenação do ente público à entrega de medicamento necessário ao tratamento de doença, a sua substituição não infringe o princípio da correlação, desde que relativa à mesma moléstia”. Na espécie, os relatórios médicos de fls. 418/420 e de fls. 441 atestam a necessidade de tratamento com o equipamento - BOMBA INFUSORA DE INSULINA PARADIGMA MODELO MMT 772 e fornecimento dos insumos elencados no receituário de fls. 441, sendo desinfluente para o deslinde da controvérsia que os mesmos não estejam incluídos em programa de fornecimento gratuito. Ainda que exista política pública para tratamento da doença em questão, conforme legislação específica, não significa que os medicamentos e outros insumos incluídos nesta se adéquem às necessidades da autora, porquanto se tratam de critérios eminentemente pessoais, a serem aferidos, mais uma vez, unicamente pelo médico assistente da parte. Não se trata, na verdade, de simplesmente permitir ao doente que escolha um tratamento qualquer, mais caro do que os já contemplados pelo sistema público de saúde, como determinados tipos de insulina ou outros métodos de aferição de níveis de glicose, mas apenas garantir o fornecimento de tratamento mais efetivo e adequado, para aqueles que não podem arcar com o seu custo. Ressalte-se que além do agravante não adunar qualquer laudo técnico atestando ser possível a substituição do equipamento e insumos requeridos por outros menos onerosos, certo é que a necessidade destes restou comprovada nos autos, pois conforme consta do laudo de fls. 418/420, o uso da bomba de insulina, com os insumos descritos a fls. 421 e 440, se faz indispensável no caso da autora diante do esgotamento de todas as alternativas tradicionais para o tratamento do seu diabetes (fls.419), sendo ali ressaltado que sem os citados equipamentos sua saúde estará em risco de graves complicações orgânicas (irrecuperáveis e irreversíveis) que poderão acarretar invalidez e morte precoce (fls. 420). 4 27 Sobre o tema, confiram-se os julgados emanados desta E. Corte, abaixo ementados: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDICAMENTOS ASSOCIADOS AO TRATAMENTO DE DIABETES MELLITUS, TIPO 1. FORNECIMENTO DE INSUMOS A PESSOA HIPOSSUFICIENTE (BOMBA DE INFUSÃO CONTÍNUA SUBCUTANEA DE INSULINA). LAUDO MÉDICO QUE COMPROVA A NECESSIDADE DO FORNECIMENTO DA REFERIDA BOMBA DE INFUSÃO. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. APLICAÇÃO DO VERBETE 59 DA SÚMULA DO TJRJ. MULTA DIÁRIA QUE DEVE SER FIXADA EM VALOR EXPRESSIVO, SOB PENA DE PERDER SUA UTILIDADE PARA A EFICÁCIA DO PROVIMENTO JURISDICIONAL. RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.” (AI 0023150-54.2013.8.19.0000, 14ª CC, Rel. Des. Plinio Pinto C. Filho, julgado em 11.10.2013) “Agravo (art. 557, § 1º, do CPC). Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Bomba infusora de insulina e insumos. Decisão que defere a tutela antecipada, para determinar deferiu a tutela antecipada, para determinar que os réus forneçam a insulina asparte ou glunicina na forma prescrita autorizando sua substituição por outra do mesmo principio ativo, bem como bomba infusora de insulina da marca disponibilizada pelos réus. A previsão orçamentária está sendo interpretada de forma singular, como se os casos individualizados tivessem que constar da previsão orçamentária, posto que como é de sabença o orçamento da parte ré é feito de maneira abstrata, assim, a gestão administrativa deve ser realizada para garantir a recuperação da saúde. Logo, não se pode invocar a má gestão administrativa, quando da previsão orçamentária, para elidir a obrigação que foi imposta pela Carta Magna. Inexistência de violação do princípio da separação de poderes e do orçamento. Súmula nº 65 - 5 28 TJ/RJ - "Deriva-se dos mandamentos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 8080/90, a responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios, garantindo o fundamental direito à saúde e conseqüente antecipação da respectiva tutela. O tratamento por meio de bomba infusora de insulina, além do fornecimento do insumo asparte ou glunicina é de rigor ao caso, uma vez que expressamente consignado por relatório médico que atestou a sua necessidade. Juízo a quo que não determinou que o Estado adquira o equipamento em marca diversa da disponibilizada pelos réus, ao revés. No caso temos materializada uma grave violação ao princípio constitucional do direito à saúde, com o descumprimento, pela ré, na qualidade de gestora dos recursos financeiros do SUS, da obrigação de fornecer os tratamentos e medicamentos necessários à recuperação da saúde da autora, merecedor de reparação pela via judicial. Agravo inominado desprovido.” (AI 0030583-12.2013.8.19.0000, 3ª CC, Rel. Des. Helda Lima Meireles, julgado em 10.07.2013) “APELAÇÃO CÍVEL. Ação de obrigação de fazer. Rito ordinário. Pleito de concessão de medicamentos necessários ao tratamento de diabetes e hipertensão. Sentença de procedência. Insurgência do Município de Campos dos Goytacazes e do Estado do Rio de Janeiro. Competência da Justiça Estadual. Preliminar rejeitada. Documentos constantes dos autos que comprovam o comprometimento do estado de saúde do autor e a necessidade dos medicamentos relacionados. Direito à saúde. Garantia constitucional. Obrigação solidária dos entes federativos. Enunciado nº 65 da súmula de jurisprudência deste Tribunal. Impossibilidade de limitação dos medicamentos e procedimentos a serem fornecidos, por listagem, mesmo que expedida por órgão oficial. Redução da verba honorária. Artigo 20, §4º, do CPC. Enunciado nº 182 da súmula de jurisprudência deste Tribunal. Precedentes. RECURSO DO MUNICÍPIO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO e RECURSO DO 6 29 ESTADO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.” (AP. Civ. 0063062-84.2011.8.19.0014, Rel. Des. Patricia Serra Vieira, 10ª CC, julgado em 07.01.2014) Ademais, a saúde é direito de todos (art. 6º, CF), constituindo dever do ente público (art. 196, CF) prover os meios suficientes para garanti-la aos necessitados, fornecendo os medicamentos e insumos necessários à sobrevivência do paciente, hipótese dos autos, não se vislumbrando vulneração aos dispositivos invocados (arts 2º, 5º, 37, caput, 167 e 196 da CF e art. 7º, IV da Lei nº 8080/90). A decisão recorrida não merece, portanto, retoque, afigurando-se de plano a improcedência do inconformismo. Aplicável, portanto, o artigo 557 da Lei de Ritos, pelo que nego seguimento ao recurso. Rio de Janeiro, 05 de fevereiro de 2014. MARIA INÊS DA PENHA GASPAR DESEMBARGADORA RELATORA F/0402 7