ana carolina oliveira de holanda integração das artes plásticas e

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ANA CAROLINA OLIVEIRA DE HOLANDA
INTEGRAÇÃO DAS ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA EM PERNAMBUCO,
1950-1980
RECIFE
2011
ANA CAROLINA OLIVEIRA DE HOLANDA
INTEGRAÇÃO DAS ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA EM PERNAMBUCO,
1950-1980
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Desenvolvimento
Urbano da Universidade Federal de
Pernambuco
–
MDU-UFPE
como
requisito para obtenção de título de
Mestre em Ambiente Construído.
Orientador: Prof. Dr. Fernando Diniz Moreira
Linha de Pesquisa: Ambiente Construído
RECIFE
2011
Prof. Fernando Diniz Moreira
Orientador
Maria do Carmo de Siqueira Nino
Examinadora Externa/Deptº Teoria da Arte e
Expressão Artística/UFPE
Agnaldo Aricê Caldas Farias
Examinador Externo/USP
Ana Rita Sá Carneiro
Examinadora Interna/PPG/MDU
Rebeca Júlia Melo Tavares
Secretária do Programa
Ana Carolina Oliveira de Holanda
Candidata
Ao meu tio, Anchises Azevedo, e a
Vital Pessoa de Melo (in memoriam), por
terem me despertado para a importância do
trabalho conjunto entre artista plástico e
arquiteto.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço à minha família, pelo apoio constante nesta caminhada de
dois anos e meio. Especialmente à minha mãe, Aparecida, por sempre estar do meu
lado, me incentivando a sempre ir mais longe e aos meus irmãos, Mônica e Júnior,
pela torcida constante desde a seleção até a conclusão do mestrado.
A Amore mio, por ter estado sempre ao meu lado nos momentos em que mais
precisei, e por ter “puxado minha orelha” quando necessário.
A meu orientador, Fernando Diniz, por ter sido paciente e por ter acreditado no meu
potencial em todos esses anos de convívio.
Aos meus tios, Anchises e Socorro, por continuarem acreditando no meu trabalho.
Às meus amigos da faculdade, Raphaela Banks, Carol Freitas, Renata Caldas,
Adriana Veras, Bárbara Aguiar, Helen Palmeira, Patrícia Pedrosa, Maria Milet,
Márcio Bezerra e Ana Clara Salvador, por terem sido companheiros e terem, cada
um de seu jeito, contribuído de forma essencial para meu trabalho. Especialmente
agradeço a Fernanda Herbster e Carla Cortês. O apoio constante de vocês duas foi
muito importante para mim.
À Andréa Steiner, pelas conversas confortantes e pelo apoio indispensável que
mesmo neste pouco tempo de convivência, foi algo fundamental.
Às amigas e artistas plásticas Marisa Lacerda e Marília Lacerda, pelo constante
incentivo.
Às minhas colegas de trabalho, Adriana Monteiro, Lúcia Padilha, Mariana Gusmão,
Ana Amélia Tavares e Adelaide Henriques por me incentivarem e acreditarem na
minha pesquisa.
Aos arquitetos Vital Pessoa de Melo (in memoriam), Dinauro Esteves, Reginaldo
Esteves, Marcos Domingues, Luiz Amorim, Ricardo Pessoa de Melo, Heitor Maia
Neto, Antônio Carlos Maia, e aos artistas plásticos Abelardo da Hora, e Paulo
Bruscky, pelas conversas construtivas e discussões acerca da integração das artes.
Ao CNPq, que me proporcionou uma bolsa de estudos, essencial para a conclusão
desta dissertação, e a todos que de alguma forma, contribuíram para que este
trabalho fosse realizado.
5
“Arte na vida!”
Vladmir Tátlin
HOLANDA, Ana C. O. de. Integração das Artes Plásticas e Arquitetura em
Pernambuco, 1950-1980. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação
em Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal de Pernambuco, 2010. 186p.
RESUMO
A integração das artes é um tema que vem sendo discutido desde o movimento Arts & Crafts
e que foi retomado várias vezes em congressos e encontros nacionais e internacionais,
principalmente entre as décadas de 1930 e 1950. Em Pernambuco, os rebatimentos dessas
discussões podem ser observados principalmente entre 1950 e 1980, período que compreende
grande parte da produção moderna do estado. Além disso, muitos teóricos apontam para um
enriquecimento mútuo entre artes plásticas e arquitetura, e que o volume final dos edifícios também
caracteriza uma obra de arte maior (conjunto da arquitetura e bens integrados). Esta pesquisa
procura identificar a relação entre artes plásticas e arquitetura em Pernambuco de 1950 a 1980,
observando as possíveis ligações de movimentos artísticos nacionais e internacionais com as obras
arquitetônicas e as parcerias entre arquitetos e artistas locais no período estudado, além de analisar
os espaços que abrigam estas relações. A fim de identificar as relações entre artes plásticas e
arquitetura, esta pesquisa submeteu os espaços que as abrigam à visão do filósofo Maurice MerleauPonty e, principalmente, dos teóricos Juhani Pallasmaa e Evaldo Coutinho. Assim, este trabalho
busca mostrar que a arquitetura e outras formas de arte devem caminhar juntas e fazer parte uma da
outra.
Palavras-chave: arquitetura moderna, artes plásticas, integração das artes.
ABSTRACT
Integration of the arts is a theme that has been discussed since the Arts & Crafts movement
and that has been resumed several times in national and international conferences, especially during
the decades of 1930 and 1950. In Pernambuco, these discussions’ reverberations can be observed
mainly between 1950 and 1980, a period that encompasses most of the state’s modern production.
Additionally, many theorists note mutual enrichment between the fine arts and architecture, and that
buildings’ final volume also characterizes a larger work of art (a set of integrated architecture and
property). This study sought to identify the relationship between the fine arts and architecture in the
state of Pernambuco (Brazil) from 1950 to 1980 by observing possible links of national and
international artistic movements with architectural work and the partnerships between local architects
and artists during the period studied, as well as to analyze the spaces that house these relationships.
In order to identify the relationship between the fine arts and architecture, this study submitted the
spaces that house them to the point of view of the philosopher Maurice Merleau-Ponty and,
particularly, of the theorists Juhani Pallasmaa and Evaldo Coutinho. Thus, this study seeks to show
that architecture and other forms of art must go together and be part of each other.
Keywords: modern architecture, fine arts, integration of the arts.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 (esq.) – Pórtico das Cariátides, Atenas – Grécia (construído entre 421 e 406 a.C.). Fonte:
DAMAZ, 1956. p.24.
Figura 2 (dir.) – Vitral da Saint-Chappelle, Paris - França. Fonte: http://pt.wikipedia.org/. Acesso em
04-09-10.
Figura 3 (esq.) – Igreja de São Carlos das Quatro Fontes, projeto de Francesco Borromini, Roma –
Itália. Fonte: http://.wikimedia.org/. Acesso em 10-08-10.
Figura 4 (centro) – Igreja de Nossa Senhora do Rosário, frontispício e empenas de Manuel Francisco
de Araújo, Minas Gerais – Brasil. Fonte: CASTEDO, 1969, p.189.
Figura 5 (dir.) – Igreja da Terceira Ordem de São Francisco de Assis da Penitência, projeto de
Aleijadinho, Minas Gerais – Brasil. Fonte: CASTEDO, 1969, p.195.
Figura 6 – Manifesto da Bauhaus. Fonte: DROSTE, 2006. p.18.
Figura 7 – Estruturação do curso da Bauhaus. Fonte: WINGLER, 1962. p. 34.
Figura 8 – Anúncio de empresa para venda de mobiliário produzido pela Bauhaus. Fonte: WINGLER,
1962. p.56.
Figura 9 – Comparação de tela de Picasso com Edifício da Bauhaus. Fonte: GIEDION, 2004. p.522523.
Figura 10 – Paul Cézanne. Vue panoramique (1874). Fonte: www.flickr.com.
Figura 11 – Pablo Picasso. Natureza-morta com cadeira de palha, 1911-12. Fonte: DEMPSEY, 2003.
p.84.
Figura 12 (esq.) – Cartaz produzido por Samokhvalov, 1924. Fonte:
http://www.artesanatonarede.com.br/. Acesso em: 13 de Setembro de 2010.
Figura 13 (dir.) – Vladimir Tátlin. Monumento à Terceira Internacional (1919). Fonte: DEMPSEY,
2003. p.107.
Figura 14 – El Lissitzky. Proun 2 (1920). National Gallery, Washington-D.C. Foto: Fernando Diniz.
Figura 15 (esq.) – Theo Van Doesburg. Relação entre planos horizontais e verticais, 1920. Fonte:
GIEDION, 2004. p. 178.
Figura 16 (dir.) – Theo Van Doesburg e Van Eesteren. Projeto para uma villa, 1923. Fonte: Relação
entre planos horizontais e verticais, 1920. Fonte: GIEDION, 2004. p. 470.
Figura 17 (esq.) – Gerrit Rietveld. Casa Schröeder (1924). Imagem Externa. Foto: Fernando Diniz.
Figura 18 (dir.) – Gerrit Rietveld. Casa Schröeder (1924) - Imagem Interna. Fonte: OVERY, 1991.
p.122.
Figura 19 – Max Bill. Ritmo em quatro quadrados. Fonte: DEMPSEY, 2003. p.160.
Figura 20 – Lygia Clark. Maquete para interior nº 1 (1955). Fonte: http://www.mac.usp.br/. Acesso em
30 de Janeiro de 2008.
Figura 21 – Le Corbusier. Plano para a cidade de Chandigarh. Fonte: http://www.unb.br/. Acesso em:
06 de Novembro de 2007.
Figura 22 (esq.) – Biblioteca Central da UNAM. Mosaico de pedra de Juan O’Gorman. Foto: Carla
Cortês.
Figura 23 (dir.) – Mural de pedra da Biblioteca Central da UNAM. Foto: Carla Cortês.
Figura 24 - Estádio Universitário da Universidade do México. Mosaico de pedra de Diego Rivera.
Fonte: http://bicentenario.com.mx/. Acesso em 01 de Novembro de 2010.
Figura 25 – Edifício de Medicina da Universidade do México. “Fire, Earth, Air and Water – Life and
Death”. Mosaico de vidro de Francisco Eppens. Fonte: http://www.munlochygmvigil.org.uk/.
Acesso em: 13 de Novembro de 2007.
Figura 26 – Planta baixa da Área Central do Campus da UNAM. No centro, vê-se a praça coberta e a
Aula Magna. Fonte: VILLANUEVA; PINTÓ, 2000. p.74.
Figura 27 – Carlos Raúl Villanueva. Universidade de Caracas – movimentos (I, II, III, IV e V). Fonte:
VILLANUEVA; PINTÓ, 2000. p.75.
Figura 28 (esq.) – Praça coberta. Painel de Pascual Navarro. Foto: Fernando Diniz.
Figura 29 (dir.) – Praça coberta. Painel de placas metálicas móveis, de Victor Vasarely. Foto:
Fernando Diniz.
Figura 30 (esq.) – Alexander Calder. Croquis para a Aula Magna (1952). Fonte: BRILLEMBOURG,
2004. p.07.
Figura 31 (dir.) – Alexander Calder; Carlos Raúl Villanueva. Interior da Aula Magna (1952). Fonte:
BRILLEMBOURG, 2004. p.06.
Figura 32 (esq.) – Quadro e tapeçaria na “Exposição de uma casa modernista e de arte moderna”.
Foto de 1930. Por: Monica Kaneko.
Figura 33 (dir.) – Interior da Casa modernista com mobiliário moderno, de Gregory Warchavchik. Foto:
O Globo.
Figura 34 – Capa do catálogo da 1ª Exposição de Arte Moderna da SPAM. Foto: Francisco Gregório.
Figura 35 (esq.) – Baixo-relevo de Albert Freyhoffer para o Monumento Rodoviário, 1936. Foto: Arthur
Ramalho.
Figura 36 (dir.) – Baixo-relevo de Albert Freyhoffer para o Monumento Rodoviário, 1936. Foto: O
Globo.
Figura 37 – Localização das obras de arte do Ministério de Educação e Saúde. 01 – “Prometeu”
(Jacques Lipchitz); 02 e 03 – Painéis de Azulejos (Portinari); 04 – “Monumento à Juventude”
(Bruno Giorgi); 05 – Revestimento de Azulejos (Portinari); 06 – Painéis “Aula Canto
Orfeônico” e “A Energia Nacional” (Portinari); 07 – Painel “Meninos de Brodósqui” (Portinari);
08 – “Os Quatro Elementos” (Portinari); 09 – “Os doze ciclos econômicos” (Portinari); 10 –
“Mulher Brasileira” (Adriana Janacopulos). Esquema baseado na ilustração de ROSA, 2005.
p.43.
Figura 38 (esq.) – Cândido Portinari. Painel "Meninos de Brodósqui". Foto: Fernando Diniz.
Figura 39 (dir.) – Adriana Janacopulos. Escultura "Mulher Brasileira". Foto: Fernando Diniz.
9
Figura 40 (esq.) – Ministério de Educação e Saúde. Painel de azulejos de Portinari. Foto: Fernando
Diniz.
Figura 41 (dir.) – Ministério de Educação e Saúde. Azulejos de Portinari e estrutura destacada. Foto:
Fernando Diniz Moreira.
Figura 42 (esq.) – Vista do interior do pavilhão com as telas de Portinari ao fundo. Fonte:
www.jobim.org.
Figura 43 (dir.) – Escultura “Mulher Reclinada”, de Celso Antônio. Fonte: www.jobim.org
Figura 44 (esq.) – Residência Olivo Gomes. Fonte: Acervo Digital Rino Levi / FAU PUC-Campinas.
Figura 45 (dir.) – Painel de Roberto Burle Marx para a Residência Olivo Gomes. Fonte:
www.flickr.com.
Figura 46 - Pavilhão da I Bienal do Museu de Arte Moderna, Trianon, Avenida Paulista, 1951. Foto:
Hans Günter Flieg. In: AMARAL, 1987. p.267.
Figura 47 (esq.) – Vilanova Artigas. Residência Rubem Mendonça. Painel de Mário Gruber. Fonte:
Masao Kamita.
Figura 48 (dir.) – Vilanova Artigas. Escola de Guarulhos. Painel de Mário Gruber. Fonte: Masao
Kamita.
Figura 49 (esq.) – Oscar Niemeyer. Igreja Nossa Senhora de Fátima. Azulejos de Athos Bulcão. Foto:
A autora.
Figura 50 (dir.) – Athos Bulcão. Azulejos para a Igreja Nossa Senhora de Fátima. Foto: A autora.
Figura 51 (esq.) – Oscar Niemeyer. Teatro Nacional. Painel de Athos Bulcão. Foto: A autora.
Figura 52 (dir.) – Blocos do painel externo do Teatro Nacional. Foto: A autora.
Figura 53 (esq.) – Roberto Burle Marx. Jardins do Teatro Nacional. Fonte: MONTERO, Marta. Burle
Marx – El paisaje lírico. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 2001. p. 133.
Figura 54 (dir.) – Athos Bulcão. Painel de mármore para o Teatro Nacional. Foto: A autora.
Figura 55 (esq.) – Vicente do Rego Monteiro. A Lua, 1920. Grafite e aquarela sobre papel. 30x10cm.
Col. Paula e Jones Bergamin. In: TREVI, 2006, p.40.
Figura 56 (dir.) – Vicente do Rego Monteiro. A Lua, 1920. Ilustração para o livro Légendes, croyances
et talismans dês indiens de l’Amazone. In: TREVI, 2006, p.41.
Figura 57 (esq.) – Vicente do Rego Monteiro. Motivo indígena, 1922. Óleo sobre madeira. 37x49,5cm.
Coleção particular, Fortaleza – CE. In: TREVI, 2006, p.42.
Figura 58 (dir.) – Vicente do Rego Monteiro. O atirador de arco, 1925. Óleo sobre tela. 65x81cm.
Acervo Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.43.
Figura 59 – Vicente do Rego Monteiro. Mulher diante do espelho, 1922. Óleo sobre tela.
98,3x69,3cm. Coleção particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.44.
Figura 60 (esq.) – Joaquim do Rego Monteiro. América do Sul, 1927. Óleo sobre tela. 73x92cm.
Acervo Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.47.
10
Figura 61 (dir.) – Joaquim do Rego Monteiro. La Rotonde, 1927. Óleo sobre tela. 73x92cm. Acervo
Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.47.
Figura 62 (esq.) – Joaquim do Rego Monteiro. Sem título, s/d. Óleo sobre tela. 72x72cm. Coleção
particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.48.
Figura 63 (dir.) – Joaquim do Rego Monteiro. Sem título, s/d. Óleo sobre tela. 65x80cm. Coleção
particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.48.
Figura 64 – Luiz Nunes. Projeto do Hospital da Força Pública de Pernambuco. Fonte: Acervo Arquivo
Público do Estado de Pernambuco. In: MENEZES, José Luiz da Mota. O moderno e o
modernismo em Pernambuco: Arquitetura e Urbanismo. Apud TREVI, Op. cit. 2006, p.82.
Figura 65 – Painel de Cícero Dias, Auditório da Secretaria da Fazenda. Foto: Eduardo Aguiar In:
NASLAVSKY, 2004. p.62.
Figura 66 (esq.) – Delfim Amorim. Azulejos do Edifício Acaiaca. Foto: A autora.
Figura 67 (dir.) – Acácio Gil Borsoi. Elementos vazados para o Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 68 – Vital Pessoa de Melo - Tramas. (A) Exemplo de processo para execução de uma trama;
(B) Trama nº12A - Agreste; (C) Trama nº4A – Colméia I. Fonte: MELO, 1989. Com alteração
da autora.
Figura 69 (esq.) – Capa do catálogo da 1ª Exposição da Galeria de Arte do Recife. Fonte: Acervo
Anchises Azevedo.
Figura 70 (dir.) – Texto de apresentação escrito por Abelardo da Hora para o catálogo da 1ª
Exposição da Galeria de Arte do Recife. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Figura 71 – Capa do catálogo de Novembro de 1961 da Galeria de Arte da Ribeira, com obras de
Maria Carmen, Anchises Azevedo e João Câmara. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Figura 72 – Capa do catálogo da Oficina Pernambucana, ocorrida em 1967 no Museu de Arte
Contemporânea da Universidade de São Paulo. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Figura 73 (esq.) – Capa do catálogo do IV Salão de Arte Moderna do Distrito Federal. Fonte: Acervo
Anchises Azevedo.
Figura 74 (dir.) – Texto explicativo do júri sobre a decisão da premiação de João Câmara, Anchises
Azevedo e Hélio Oiticica. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Figura 75 – Dinauro Esteves. Gárgulas escultóricas para o Edifício Sede da CHESF. Foto: Aristóteles
Cantalice II.
Figura 76 – Dinauro Esteves. Painel de placas de cimento para o Edifício Sede da CHESF. Foto:
Aristóteles Cantalice II.
Figura 77 (esq.) – Mural do Edifício Barão de São Borja – vista da rua da parte lateral esquerda. Foto:
A autora.
Figura 78 (dir.) – Mural do Edifício Barão de São Borja – vista interna da parte lateral direita. Foto: A
autora.
Figura 79 – Vitral de Ferreira para o restaurante da CHESF. Foto: Marcio Capelini.
Figura 80 – Processo de análise do espaço através do corpo. Fonte: A autora.
11
Figura 81 – Tabela das obras selecionadas. AP – Artista plástico / ARQ – Arquiteto. Fonte: a autora.
Figura 82 – Heitor Maia Neto. Biblioteca de Casa Amarela. Fonte: Museu da Cidade do Recife (com
alteração da autora).
Figura 83 (esq.) – Vista externa da Biblioteca de Casa Amarela. Foto: Alexandre Braz de Macedo.
Figura 84 (dir.) – Detalhe do painel de Helio Feijó - Biblioteca de Casa Amarela. Foto: Ana Clara
Salvador.
Figura 85 (esq.) – Heitor Maia Neto. Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
Figura 86 (dir.) – Escultura de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: Mônica
Luize Sarabia.
Figura 87 – Painel de Reynaldo Fonseca para a Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
Figura 88 – Ladrilho cerâmico de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: A
autora.
Figura 89 (esq.) – Heitor Maia Neto. Residência Torquato de Castro – planta baixa. Desenho: a
autora.
Figura 90 (dir.) – Distribuição dos ladrilhos cerâmicos de Corbiniano Lins, passando do interior para o
exterior da edificação. Foto: A autora.
Figura 91 (esq.) – Delfim Amorim. Edifício Acaiaca. Foto: A autora.
Figura 92 (dir.) – Delfim Amorim. Detalhe dos azulejos do Edifício Acaiaca, desenhados pelo
arquiteto. Foto: A autora.
Figura 93 – Detalhe das diferentes texturas dos materiais. Foto: A autora.
Figura 94 (esq.) – Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A autora.
Figura 95 (dir.) – Painel de Reynaldo Fonseca para a Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A
autora.
Figura 96 (esq.) – Mural de mosaico para a Residência Isnard de Castro e Silva. Autor não
identificado. Foto: A autora.
Figura 97 (dir.) – Vista aproximada do mural de mosaico para a Residência Isnard de Castro e Silva.
Autor não identificado. Foto: Fernando Diniz.
Figura 98 (esq.) – Biblioteca Central da UFPE. Foto: Aristóteles Cantalice II.
Figura 99 (dir.) – Vista externa do vitral da Biblioteca Central da UFPE. Foto: A autora.
Figura 100 (esq.) – Recuo da faixa de pastilhas afastadas do vitral da Biblioteca Central da UFPE.
Foto: A autora.
Figura 101 (dir.) – Vista do vitral da Biblioteca Central da UFPE a partir de um dos corredores. Foto: A
autora.
Figura 102 (esq.) – Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 103 (dir.) – Detalhe dos elementos vazados do Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
12
Figura 104 (esq.) – Painel de tijolos do Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 105 (dir.) – Portão-painel de Corbiniano Lins para o Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 106 – Corte transversal do Edifício Santo Antônio mostrando a clarabóia e os mezaninos com
patamares das escadas. Fonte: Borsoi Arquitetos Associados. In: NASLAVSKY, Op. cit.,
2004. p.195.
Figura 107 (esq.) – Edifício Santo Antônio. Vista do vazio iluminado pela clarabóia a partir do último
pavimento. Foto: Borsoi Arquitetos Associados.
Figura 108 (dir.) – Edifício Santo Antônio. Vista do vazio iluminado pela clarabóia a partir do hall do
térreo. Foto: A autora.
Figura 109 (esq.) – Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 110 (dir.) – Piso com cerâmica de Brennand para o Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 111 (esq.) – Painel de placas de concreto em baixo-relevo para o Edifício Sede da SUDENE.
Foto: A autora.
Figura 112 (dir.) – Painel da biblioteca do Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 113 (esq.) – Edifício Sahara. Foto: A autora.
Figura 114 (dir.) – Painel de cimento para o Edifício Sahara. Foto: A autora.
Figura 115 – Edifício Sahara. Vista do painel de Anchises Azevedo a partir da rua. Foto: Fernando
Diniz.
Figura 116 (esq.) – Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 117 (dir.) – Vista do jardim de Burle Marx para o Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 118 (esq.) – Painel de Neves para o edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 119 (dir.) – Painel de Brennand para o edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 120 – Locação do Edifício Sede da CELPE. Fonte: VRF Arquitetura.
Figura 121 – Edifício Sede da CELPE, Fachada Noroeste. Fonte: VRF Arquitetura.
Figura 122 (esq.) – Edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
Figura 123 (dir.) – Painel de Brennand para o edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
Figura 124 – Armando de Holanda. Plano Geral para o Parque Histórico Nacional dos Guararapes.
Fonte: Universidade Federal de Pernambuco. Parque Histórico Nacional dos Guararapes:
projeto físico. Recife: UFPE, 1975. p.27.
Figura 125 – Armando de Holanda. Croqui para explicação da formação das cascas as das estruturas
do Parque Histórico Nacional dos Guararapes. Fonte: Universidade Federal de
Pernambuco. Op.cit.. Recife: UFPE, 1975. p.45.
Figura 126 – Pavilhão de acesso do PHNG. Foto: A autora.
Figura 127 (esq.) – Bloco de administração do PHNG. Foto: A autora.
13
Figura 128 (dir.) – Blocos da lanchonete do PHNG. Foto: A autora.
Figura 129 (esq.) – Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 130 (dir.) – Croqui que mostra a relação cheio/vazio do Edifício Sede da CHESF. Fonte:
Aristóteles Cantalice II
Figura 131 (esq.) – Escultura de Corbiniano Lins para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 132 (dir.) – Painel de Mirella Andreotti para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 133 (esq.) – Painel de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 134 (dir.) – Vitral de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 135 (esq.) – Edifício Gropius. Foto: A autora.
Figura 136 (dir.) – Painel de Athos Bulcão para o Edifício Gropius. Foto: A autora.
Figura 137 (esq.) – Serpenteamento do painel de Athos Bulcão para o Edifício Gropius. Foto: A
autora.
Figura 138 (dir.) – Detalhe da caixa de concreto sacada, de uma das esquadrias da fachada lateral.
Foto: A autora.
Figura 139 – Quadro com a distribuição das obras em relação às classificações. Fonte: a autora.
Figura 140 (dir.) – Detalhe da diversidade de materiais - azulejo, pedra, elemento vazado, pastilha
cerâmica, vidro. Foto: A autora.
Figura 141 (esq.) – PHNG - detalhe dos azulejos do bloco de administração. Foto: A autora.
Figura 142 (dir.) – PHNG - observação macro dos elementos da lanchonete – módulo-padrão e
módulo branco. Foto: A autora.
Figura 143 – PHNG - repetição dos módulos do bloco de acesso. Foto: A autora.
Figura 144 – Observação micro das pastilhas do Edifício Gropius. Foto: A autora.
Figura 145 – Residência Torquato de Castro - vista do painel de azulejos de Corbiniano Lins. Foto: A
autora.
Figura 146 – Painel de Ferreira para o edifício sede da CHESF. Foto: Léo Caldas.
Figura 147 (esq.) – Vitral da Biblioteca Central da UFPE. Foto: A autora.
Figura 148 (dir.) – Biblioteca Central/UFPE. Detalhe da junção do patamar da escada com o vitral .
Foto: A autora.
Figura 149 – Croqui sobre a observação do vitral de Francisco Brennand para o edifício Sede da
CHESF. Desenho: a autora.
Figura 150 (esq.) – Recuo do revestimento da parede lateral em relação ao vitral de Brennand para o
Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 151 (dir.) – Observação externa do vitral de Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A
autora.
14
Figura 152 (esq.) – Contato do vitral de Brennand para o Edf. Sede da CHESF, em um jardim de
seixos. Foto: A autora.
Figura 153 (dir.) – Contato do vitral da Biblioteca Central da UFPE com o piso, terminando em uma
estrutura metálica que repousa diretamente no mesmo. Foto: A autora.
Figura 154 (esq.) – Detalhe dos metais retorcidos do portão-painel para o Edifício Santo Antônio.
Foto: A autora.
Figura 155 (dir.) – Portão-painel do Edifício Santo Antônio repousando sobre a parede de tijolos. Foto:
A autora.
Figura 156 (esq.) – Planta baixa do hall do Edifício Santo Antônio com as locações das obras de arte.
Desenho: a autora.
Figura 157 (dir.) – Edifício Santo Antônio. Vista do espaço que abriga o portão-painel e o painel de
tijolos a partir da galeria. Foto: Fernando Diniz.
Figura 158 (esq.) – Edf. Santo Antônio – detalhe de variações do módulo-padrão. Foto: A autora.
Figura 159 (dir.) – Edifício Santo Antônio - detalhe saques/recuos do módulo e moldura com
assinatura do arquiteto. Foto: A autora.
Figura 160 (esq.) – Detalhe de baixo relevo na lateral do bloco de apoio do Edf. Sede da SUDENE.
Foto: A autora.
Figura 161 (dir.) – Edf. Sede da SUDENE. Ritmos aleatórios da malha reguladora e dos módulos em
baixo relevo do painel do bloco anexo (lateral direita). Desenho: a autora.
Figura 162 (esq.) – Painel da biblioteca do Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 163 (dir.) – Detalhe de uma das aberturas trapezoidais do painel da biblioteca do Edf. Sede da
SUDENE. Foto: A autora.
Figura 164 – Corte dos módulos do painel do Edifício Sahara. Foto: A autora.
Figura 165 (esq.) – Edifício Sahara. Barras verticais de cimento no alisar da porta vizinha ao painel.
Foto: A autora.
Figura 166 (dir.) – Edifício Sahara. Cerâmica do piso do hall de elevadores invadindo o rasgo e blocos
flutuantes do painel. Foto: A autora.
Figura 167 (esq.) – Detalhe do painel do Edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
Figura 168 (dir.) – Edifício Sede da RFFSA. Detalhe de uma das garras de concreto inferior. Foto: A
autora.
Figura 169 (esq.) – Edifício Sede da RFFSA. Textura das peças do painel de cerâmicas. Foto: A
autora.
Figura 170 (dir.) – Edifício Sede da RFFSA. "Mordida" das cerâmicas na lateral do painel. Foto: A
autora.
Figura 171 – Croqui sobre a localização da escultura em relação à fachada. Fonte: a autora.
Figura 172 (esq.) – Escultura de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: A
autora.
15
Figura 173 (dir.) – Escultura de Corbiniano Lins para o Edifício Sede da CHESF. A seta indica o
percurso para a porta principal. Foto: A autora.
Figura 174 (esq.) – Mosaico da Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A autora.
Figura 175 (dir.) – Vista do mosaico da Residência Isnard de Castro e Silva a partir do acesso lateral.
Foto: A autora.
Figura 176 (esq.) – Vista do painel de Francisco Brennand no Edifício Sede da CELPE. Foto: A
autora.
Figura 177 (dir.) – Detalhe do englobamento do painel de Francisco Brennand na parede do Edifício
Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 178 – Painel de Brennand no Edifício Sede da RFFSA.Foto: A autora.
Figura 179 (esq.) – Relação visual do painel de Reynaldo para a Residência Torquato de Castro com
os ambientes adjacentes. Foto: A autora.
Figura 180 (dir.) – Painel da Residência Isnard de Castro e Silva - detalhe da moldura. Foto: A autora.
Figura 181 – Detalhe de parte do painel do Edifício Sahara - descolamento piso e teto. A esquadria
metálica e as cerâmicas acima e abaixo do painel são intervenções posteriores e que
prejudicam a contemplação da obra. Foto: A autora.
Figura 182 (esq.) – Painel de P. Neves no Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 183 (dir.) – Painel de P. Neves no Edifício Sede da CELPE - detalhe da superfície vitrificada.
Foto: A autora.
Figura 184 (esq.) – Painel de Mirella para o Edifício Sede da CHESF - vista para a entrada principal.
Foto: A autora.
Figura 185 (dir.) – Painel de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
16
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 18
1. ARTE E ARQUITETURA NA ERA MODERNA ....................................................................... 23
1.2 O Pós-guerra, Monumentalidade e Civismo ............................................................................... 43
1.3 Arte, Arquitetura e a América Latina ........................................................................................... 46
2. ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA MODERNAS NO BRASIL ........................................ 57
2.1 O Ministério de Educação e Saúde – meados da década de 1930 até 1950 ............................. 61
2.2 A década de 1950 e a integração das artes ............................................................................... 68
2.3 Herança da Escola Carioca e a fundação de Brasília – década de 1960 .................................. 73
3. PERNAMBUCO ..................................................................................................................... 80
3.1 Arte no Recife/Olinda .................................................................................................................. 80
3.2 A relação arquiteto-artista plástico ............................................................................................ 100
4. A INTEGRAÇÃO DAS ARTES NA PRODUÇÃO MODERNA PERNAMBUCANA ................. 109
4.1 Arte, espaço e corpo em Pallasmaa e Coutinho ....................................................................... 109
4.2 A análise do espaço .................................................................................................................. 114
4.2.1 Espaço interno x espaço externo .......................................................................... 116
4.3 Apresentação das obras ........................................................................................................... 118
4.4 Análise da integração entre arte e arquitetura .......................................................................... 140
CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 170
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................................... 175
ANEXOS .................................................................................................................................. 179
INTRODUÇÃO
Em meados de 2006, ainda estudante de graduação, participei de uma pesquisa
sobre Arquitetura Moderna em Pernambuco, coordenada pelo Professor Fernando
Diniz na qual tive a oportunidade de conhecer mais a fundo a obra do arquiteto
pernambucano Vital Pessoa de Melo. O interesse pela sua obra, e particularmente
pela forma como integrava o trabalho de artistas e como tratava os materiais,
resultou no meu trabalho de graduação, Arte e Ética na obra de Vital Pessoa de
Melo, 1960-1980. Motivada pelo anseio de conhecer melhor as relações entre artes
plásticas e arquitetura, comecei a me questionar sobre a situação atual da
arquitetura desenvolvida no estado. A meu ver, muitos arquitetos atuais não se
preocupam em criar espaços que sejam apropriados para receber uma obra de arte
ou colocam obras que não possuem relação com a edificação. Em conversas com
artistas plásticos e arquitetos, comecei a perceber que no passado, particularmente
nas décadas de 1950 a 1980, os profissionais possuíam um cuidado maior entre arte
e espaço, resultando em trabalhos conjuntos que merecem atenção e devem ser
reconhecidos como espaços que conferem maior valor artístico e cultural ao edifício.
Poderíamos pensar que as obras produzidas entre 1950 e 1980 em Pernambuco
que possuem obras de artes plásticas, a fazem puramente por atendimento à
legislação municipal, que obriga edifícios com mais de 2.000m² (dois mil metros
quadrados) a possuir uma obra de arte. Esta afirmação é derrubada principalmente
por dois motivos: primeiro, porque a lei em questão foi redigida em 1960 e entrou em
vigor em 1961; segundo, porque ela se limitava à cidade do Recife. Os arquitetos
desta época produziram obras que comunicam com as artes plásticas antes de
1960, a exemplo da Biblioteca de Casa Amarela ou a Residência Torquato de Castro
e, mesmo após a data de implantação da lei, os arquitetos continuaram a produzir
obras integradas com as artes plásticas em locais fora do polígono de
obrigatoriedade.
Daí surge a questão: de onde veio esta necessidade de se unir os diferentes tipos
de arte? No sistema clássico, arte e arquitetura não eram vistas como elementos
separados, tudo era integrado resultando numa obra maior. A historiografia
demonstra que após a revolução industrial, novos materiais e técnicas foram
desenvolvidos, resultando numa crise que gerou reações desde meados do século
XIX, como o Arts & Crafts, por exemplo. O século XX também assistiu vários
episódios que questionaram a racionalização em contraposição ao sentido
emocional das produções. Movimentos como a Deutscher Werkbund e Bauhaus
surgiram procurando incluir a arte nas produções em série integrando o trabalho dos
diferentes profissionais. O Arbeitsrat für Kunst e Construtivismo Russo tentaram unir
arquitetos, pintores, escultores, e outros profissionais em prol de uma verdadeira
reforma social em seus países. Já movimentos como o Neoplasticismo ou a Arte
Concreta, se fixaram na geometrização, tanto na arquitetura quanto nas artes
plásticas. Assim a arte e arquitetura modernas sofreram transformações em relação
ao século XIX e antes, e encontraram novas formas de integração entre si.
As preocupações de união das artes apareceram em vários encontros, como os
Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM) de 1933 e 1947 ou
Congresso Internacional dos Artistas de 1952. Vários textos começam a ser
produzidos, questionando a posição separada entre artistas plásticos e arquitetos.
Estas discussões não se limitaram à Europa, acontecendo também na América
Latina, cujos grandes exemplos de integração entre as artes podem ser vistos nas
cidades universitárias do México e Caracas, e no edifício do Ministério de Educação
e Saúde, no Rio de Janeiro.
Diante das discussões nacionais e internacionais sobre a integração das artes,
alguns questionamentos surgiram sobre como a relação entre artes plásticas e
arquitetura ocorreu em Pernambuco. Como era a relação entre o espaço
arquitetônico e a obra de arte? Como a obra de arte é apreciada? Como era o
diálogo entre artistas plásticos e arquitetos? Como a obra de arte pode conferir valor
ao edifício? Existia unidade entre arte e arquitetura? Dessa forma, este trabalho tem
como objetivo investigar como se deu a relação entre artes plásticas e arquitetura
em Pernambuco dentro do período de 1950 a 1980, limitando-se a obras realizadas
dentro da Região Metropolitana do Recife e a obras de arte que compreendessem
murais, painéis e esculturas. Através de entrevistas com arquitetos e artistas,
detalhes sobre as parcerias desenvolvidas foram levantados.
Faz-se necessário deixar claro que o objeto desta pesquisa não é a arte
(movimentos, artistas) nem a arquitetura (princípios, arquitetos). Tomamos como
consenso que Pernambuco sediou uma produção artística e arquitetônica digna de
19
nota neste período, com ricos espaços de integração. Assim, as formas de
integração ocorrentes nesses espaços é que realmente é o objeto da pesquisa.
O recorte do período escolhido (1950-1980) se deu principalmente por quatro
motivos: 1- a chegada de Delfim Fernandes Amorim, Mário Russo e Acácio Gil
Borsoi para a consolidação da arquitetura moderna no estado e a presença destes
arquitetos na escola de arquitetura; 2- A unidade em torno de alguns princípios
projetuais e formais mantidas pela produção arquitetônica deste período; 3- A
efervescência ocorrida nas artes plásticas, pois artistas como Corbiniano Lins,
Reynaldo Fonseca e Francisco Brennand tiveram a oportunidade de realizar uma
grande produção, incluindo obras feitas para as edificações; e 4- A maior ligação
entre artistas plásticos e arquitetos. Grupos pequenos se formaram, proporcionando
trocas entre os profissionais e contribuindo para as parcerias entre eles.
Para viabilizarmos a análise do espaço, procurou-se estabelecer uma forma de
interpretar o espaço de integração utilizando como arcabouço teórico os conceitos
desenvolvidos por Maurice Merleau-Ponty em Fenomenologia da Percepção,
Juhanni Pallasmaa em Os Olhos da Pele e Evaldo Coutinho em O Espaço da
Arquitetura. Os três autores destacam a importância da interpretação dos sentidos
para a apreensão do espaço, e baseado nisso, criou-se uma metodologia de análise
fincada nos dois sentidos mais ligados à dimensão material: o tato e a visão e
aplicou-se esta metodologia em treze obras selecionadas.
Para a seleção das obras, levamos em consideração os seguintes pontos: a
importância da edificação para a arquitetura local, pois muitas são ícones da
arquitetura moderna do estado; o arquiteto (selecionamos obras de professores e
alunos formados entre a primeira e segunda gerações pós chegada de Delfim,
Borsoi e Russo); a localização da obra, limitando-se à Região Metropolitana de
Recife; os usos, restringidos a residências unifamiliares, multifamiliares e edifícios
públicos; e, por fim, o tipo de obra de arte que o edifício abriga, limitados em murais,
painéis e esculturas.
Dessa forma, este trabalho foi dividido em quatro capítulos. O primeiro capítulo, Arte
e Arquitetura na Era Moderna, teve como objetivo pontuar como foi a relação entre
artes plásticas e arquitetura desde antes do modernismo até a sua afirmação, com
20
foco na Europa e América Latina. O segundo capítulo, Artes Plásticas e Arquitetura
Modernas no Brasil, procura prover um panorama das artes plásticas e arquitetura,
procurando focar em marcos da integração das artes no Brasil. O terceiro capítulo,
Pernambuco, procura fazer um apanhado dos acontecimentos artísticos e
arquitetônicos no estado, como também busca mostrar detalhes gerais sobre o
relacionamento dos arquitetos com os artistas plásticos locais. Como se acredita que
a maior parte dos futuros leitores desta dissertação sejam arquitetos que estes já
detenham certo conhecimento sobre o desenvolvimento da arquitetura moderna no
estado, privilegiamos neste panorama os acontecimentos nas artes plásticas. Por
fim, o quarto capítulo, A integração das artes na produção moderna Pernambucana,
é o ponto central da dissertação. Nele, buscou-se mostrar como aconteceu a
integração entre artes plásticas e arquitetura em algumas obras selecionadas em
Pernambuco através da análise destas de acordo com os conceitos extraídos da
base teórica. Ao fim de cada capítulo procurou-se fazer uma conclusão parcial para
situar o leitor sobre os principais pontos vistos.
Dessa forma, espera-se que esta pesquisa contribua para o entendimento da
integração entre artes plásticas e arquitetura na produção moderna de Pernambuco,
além de mostrar que a arquitetura e outras formas de arte devem sempre caminhar
juntas, fazendo parte uma da outra.
21
CAPÍTULO 1
ARTE E ARQUITETURA NA ERA MODERNA
1. ARTE E ARQUITETURA NA ERA MODERNA
Eu não peço ao meu pintor que seja discreto. Digo-lhe: Aqui você tem a
1
palavra; fale! (Le Corbusier).
A integração das artes plásticas e arquitetura foi um tema muito debatido,
principalmente a partir de meados do século XIX com o Arts & Crafts de William
Morris até o início da década de 1960, com o Congresso Internacional de Críticos de
Arte (1959). Acreditamos que essas discussões foram provocadas pela mesma
razão: a percepção de um distanciamento entre artes plásticas e arquitetura na era
moderna, algo que não ocorria antes, pois até então arquitetura e artes plásticas
eram consideradas inseparáveis, sendo as catedrais góticas um dos exemplos mais
evidentes desta integração. Naquele período, o ato de construir ia muito além da
questão prática, pois era símbolo da coletividade, havia um senso de cooperação,
resultando na união dos mais diferentes profissionais e na conseqüente união das
artes.
Paul Damaz, em sua obra Art in European Architecture – Synthese des Arts
demonstra que a relação entre artes plásticas e arquitetura antes do século XIX não
foi tão estável, se modificou ao longo dos anos. Na Grécia Antiga a relação entre as
artes era bastante forte. Pintura e escultura estavam tão ligadas aos edifícios que
chegavam inclusive a substituir elementos estruturais. As cariátides são os exemplos
mais conhecidos dessa ligação.
Ainda segundo Damaz, do Período Romano ao Barroco, a relação entre as
diferentes formas de arte se modificou e passou por um período de crise na qual a
obra de arte é considerada uma obra decorativa. Mesmo assim, houve momentos
em que algumas formas de arte se reaproximaram da arquitetura. No período
Bizantino a pintura mural voltou a ser importante, destacando principalmente temas
religiosos. Já no período da arte Romanesca a pintura foi utilizada como decoração
de superfícies, mas a escultura foi utilizada nas estruturas das edificações,
integradas principalmente em colunas e capitéis. Na Arquitetura gótica, houve a
grande contribuição da escultura nas estruturas e superfícies e o trabalho com
1
CORBUSIER, Le. A Arquitetura e as Belas-Artes. In: Revista do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional nº19, 1984. p.66.
vitrais. As estruturas também assumiram papéis artísticos. Os contrafortes e arcos
estavam associados a esculturas e à marcação das aberturas.
Figura 1 (esq.) – Pórtico das Cariátides, Atenas – Grécia (construído entre 421 e 406 a.C.). Fonte: DAMAZ,
1956. p.24.
Figura 2 (dir.) – Vitral da Saint-Chappelle, Paris - França. Fonte: http://pt.wikipedia.org/. Acesso em 04-0910.
O período do Renascimento sofreu com a individualidade do artista, mesmo assim, a
obra de arte, isolada ou não, cumpriu seu papel de enriquecer e completar um todo
e os artistas tinham um bom senso de composição, perspectiva, unidade e
proporções artísticas.
Após este longo período de afastamento e aproximação entre artes plásticas e
arquitetura, o Barroco surgiu como o momento onde houve o ápice da integração
entre as diferentes formas de arte. Damaz afirma que no Barroco arquitetura,
pintura, escultura e decoração “eram tão intimamente ligados que às vezes era difícil
de perceber onde o trabalho de arquitetura terminava e onde o do escultor
começava.”2 No Brasil, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Ouro Preto, Minas
Gerais, é apontada por Leopoldo Castedo como o primeiro momento da arte
brasileira em que arquitetura e escultura se fundem, sendo o prenúncio de um
duradouro estilo nacional3. A autoria da planta é desconhecida, já o frontispício e a
empena são atribuídos a Manuel Francisco de Araújo. Como outros exemplos do
2
DAMAZ, Paul. Art in European Architecture – Synthese des Arts. New York: Reinhold, 1956. p.27.
“In the Rosário, this scheme of undulating walls, in the style of Borromini, reaches a point where it
should properly be considered a molded form. This is the first time in Brazilian art that the concepts of
architecture and sculpture fuse, and it is a harbinger of the enduring national style”. Fonte: CASTEDO,
Leopoldo. A History of Latin American Art and Architecture: from Pre-Columbian times to the present.
New York: Frederick A. Praeger, 1969. p.190. Tradução da autora.
3
24
Barroco, podemos citar os trabalhos do arquiteto Francesco Borromini, na Itália e do
escultor Aleijadinho, no Brasil.
Figura 3 (esq.) – Igreja de São Carlos das Quatro Fontes, projeto de Francesco Borromini, Roma – Itália.
Fonte: http://.wikimedia.org/. Acesso em 10-08-10.
Figura 4 (centro) – Igreja de Nossa Senhora do Rosário, frontispício e empenas de Manuel Francisco de
Araújo, Minas Gerais – Brasil. Fonte: CASTEDO, 1969, p.189.
Figura 5 (dir.) – Igreja da Terceira Ordem de São Francisco de Assis da Penitência, projeto de Aleijadinho,
Minas Gerais – Brasil. Fonte: CASTEDO, 1969, p.195.
Wölfflin também destaca a noção de conjunto que havia no Barroco e a questão da
monumentalidade das obras:
Torna-se costume conceber o belo apenas como colossal. A variedade e
delicadeza cedem lugar a uma simplificação, que só procura grandes
massas, e toda a obra é percorrida por um traço unificador, que não deve
4
parecer constituída de elementos isolados.
Do século XVII em diante, considerando o universo latino-americano, a inclusão do
Barroco no Brasil aconteceu de forma mais fluida, pois diferentemente do que
aconteceu no México ou Peru (colonizados pela Espanha), os colonizadores não
encontraram em território brasileiro um trabalho indígena com grande tradição
artística construída, portanto não houve nenhum choque cultural quanto à linguagem
das novas construções.5 É nos templos e igrejas onde se encontram os melhores
exemplos da união das artes, pois estas sempre foram consideradas símbolo do
trabalho coletivo para com o divino.
4
"Es habitual no pensar en lo belo más que como algo colosal. Variedad y delicadeza dejan paso a
una simplificación, que no busca sino las grandes masas y en su totalidad adquiere un aire de
uniformidad y grandiosidad, que no debe dar la impresión de estar consituída de elementos aislados."
In: WOLFFLIN, H. Renacimiento y Barroco. Barcelona: Paidós Ibérica, 1986. p.40. Tradução da
autora.
5
CASTEDO, Op. cit. 1969, p.181.
25
Como demonstram Damaz e Castedo, a relação entre as artes plásticas e
arquitetura sempre existiu, mesmo que de formas diferentes em cada período, ou
seja, foi uma relação oscilatória. Ora a escultura recebeu mais atenção que a
pintura, ora o contrário.
A partir de meados do século XIX com o início da Revolução Industrial, novas
técnicas construtivas e novos materiais apareceram, e juntamente com estes, novas
demandas de edificações. Ainda segundo Damaz, o academicismo do século XIX
contribuiu para uma nova tensão na relação entre as artes. O emprego de novos
materiais e técnicas exigiu do trabalho do arquiteto uma racionalidade que afetou
esta relação entre a obra de arte e arquitetura.
Depois do academicismo do século XIX, arte e arquitetura se
desenvolveram e direções opostas. Pouco a pouco, pintura e escultura
abandonaram o mundo externo e figurativo. [...] Arquitetura se tornou
produto da lógica, enquanto a pintura e escultura estavam se isolando no
6
campo da metafísica.
1.1 Arte e Arquitetura Modernas
O período moderno assistiu a várias tentativas de reaproximação entre arquitetura e
outras artes. Os novos materiais e técnicas construtivas juntamente com a
industrialização chegaram ao século XX numa atmosfera de separação entre os
profissionais e desvalorização do trabalho artesanal. Assim, vários movimentos
surgiram buscando reestruturar esta relação entre artes plásticas e arquitetura em
prol de um trabalho único resultante do trabalho integrado dos diferentes
profissionais.
A partir de meados do século XIX, a Revolução Industrial provocou uma crise entre o
trabalho manual e a produção em massa. Esta foi a discussão principal dos artistas
e críticos em torno do Arts & Crafts (1880-1910), movimento liderado por John
Ruskin na Inglaterra da segunda metade do século XIX, com o intuito de recuperar e
revalorizar o trabalho artesanal em contraste com a produção industrial, por eles
considerada mecânica e sem qualidade artística. Durante sua existência, o
movimento criticou a produção industrial que favorecia a quantidade à qualidade e
6
“After the academicism of the nineteenth century, art and architecture evolved in opposite directions.
Little by little, painting and sculpture abandoned the external and figurative world. [...] Architecture has
become the product of logic, while painting and sculpture were isolating themselves in the field of
metaphysics.” In: DAMAZ, Paul. Op. cit.1956, p.19. Tradução da autora.
26
buscou incentivar o respeito pelos materiais e tradições populares. Os participantes
do Arts & Crafts (artistas, arquitetos, designers, artesãos, etc.) afirmavam que a
produção em massa das indústrias não possuía valor artístico, eram apenas objetos
produzidos por máquinas, desprovidos do sentimento do artista. O movimento de
Ruskin acabou por abrir portas a uma série de outros movimentos de vanguarda que
buscavam a integração das artes, como é o caso da Deutscher Werkbund (19071938) ou da Bauhaus (1919-1933), ambas na Alemanha.
Assim como o Arts & Crafts, a Deutscher Werkbund tinha como finalidade o trabalho
conjunto dos diferentes profissionais, mas diferentemente do primeiro, a Werkbund
não se opôs à mecanização, e sim procurou se aliar a esta através de tentativas de
inserção da arte na indústria. Segundo Amy Dempsey, o movimento buscou o
“aperfeiçoamento do trabalho profissional mediante a cooperação da arte, da
indústria e do artesanato, da educação, da publicidade e de atitudes unificadas em
relação a questões pertinentes.”7
Os profissionais da Deutscher Werkbund trabalhavam em todas as escalas de
projeto, abrangendo desde o projeto de arquitetura até o desenho industrial dos
objetos utilitários. O arquiteto Hermann Muthesius era o principal integrante, mas o
movimento teve a participação de outras figuras importantes mais diretamente
ligadas à arquitetura, como Peter Behrens e Josef Hoffmann. Diferentemente do Arts
& Crafts, a Deutscher Werkbund chegou a projetar mobiliários para serem
produzidos de forma mecânica. Isso tornava o preço acessível e facilitava as vendas
das peças.
Doze anos depois da fundação da Deutscher Werkbund, a Bauhaus foi fundada para
ser, como o próprio nome diz, uma “casa/escola de construção” com a possibilidade
de formação de oficiais (especialista em algum material) ou jovens mestres (formado
em arquitetura). O grande desafio enfrentado pela Bauhaus era o de justamente
inserir as preocupações do Arts & Crafts em uma escala industrial. Em 1919 foi
lançado por Walter Gropius o manifesto de fundação da Bauhaus que trazia como
ilustração uma catedral gótica, símbolo da união entre as artes.
7
DEMPSEY, Amy. Estilos, escolas e movimentos. São Paulo: Cosac Naify, 2003. p.80.
27
A Bauhaus visa juntar todo esforço criativo num todo, para reunificar todas
as disciplinas da arte prática – escultura, pintura, artesanatos e os ofícios –
8
como componentes inseparáveis de uma nova arquitetura.
Figura 6 – Manifesto da Bauhaus. Fonte: DROSTE, 2006. p.18.
A ilustração da catedral gótica pode ser interpretada como uma forma de exteriorizar
um dos objetivos principais da Bauhaus: a união entre as artes. A escola sempre
buscou formar profissionais que trabalhassem de forma integrada – arquitetura,
escultura, pintura, tecelagem, etc. – e que tivessem o domínio para atuar em
qualquer área. Segundo Frampton, os princípios de proclamação da Bauhaus de
1919 tinham sido antecipados por Bruno Taut, no seu programa para o movimento
Arbeitsrat für Kunst. Publicado no final de 1918, Taut afirmou seu pensamento de
que cada ofício deveria contribuir para uma nova obra de arte única, resultante da
8
Walter Gropius: Programme of the Staatliches Bauhaus in Weimar. “The Bauhaus strives to bring
together all creative effort into one whole, to reunify all the disciplines of practical art – sculpture,
painting, handicrafts, and the crafts – as inseparable components of a new architecture.” In:
CONRADS, Ulrich. Progams and manifestoes on 20th-century architecture. Cambridge: MIT Press,
1999. p.50. Tradução da autora.
28
união entre estas diferentes disciplinas: “A essa altura, escreveu, não existirão
fronteiras entre os ofícios, a escultura e a pintura; tudo será uma coisa só, a
Arquitetura.”9
Para que a Bauhaus atingisse seus objetivos, a estrutura do curso era diferenciada e
dividida em três partes principais. Primeiro, o Curso de Aprendizes ou Preliminar,
que tinha duração de seis meses e era baseado na experimentação. Nele, os alunos
tinham contato com todo tipo de material e buscavam descobrir novas formas de
manuseio destes através de experimentos. Segundo, o Curso de Oficiais ou
Específico, que tinha duração de três anos e onde o aluno procurava se especializar
em um dos ateliês (madeira, metal, tecidos, pintura, vidro, argila, pedra, outros). Por
meio de aulas práticas e teóricas sobre os materiais e técnicas, os alunos buscavam
criar novas soluções e peças, tudo com o objetivo da padronização e reprodução
industrial com valor artístico. Por fim, existia o Curso de Jovens Mestres ou de
Arquitetura que possuía uma duração variável. Para a escola, não se poderia fazer
uma boa arquitetura sem a união de todas as formas de arte e esta deve estar
presente em todas as escalas – desde os detalhes de mobiliários até a escala do
edifício.
Figura 7 – Estruturação do curso da Bauhaus. Fonte: WINGLER, 1962. p. 34.
9
Programa arquitetônico de Bruno Taut para o Arbeitsrat für Kunst, publicado em fins de 1918. In:
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
p.147.
29
Os meios de ensino possibilitavam aos alunos um contato contínuo com a realidade
de trabalho, ou seja, o ensino visava sempre o mercado e suas necessidades. Os
docentes eram extremamente criativos e encorajavam os alunos a pensar, criar, e
não ficar pensando em nada que fora produzido anteriormente. Os projetos tinham
como base o custo dos produtos, e visavam integrar o design à padronização
(standartização). Em 1922, a Bauhaus recebeu a visita de Theo van Doesburg, uma
das principais figuras do Neoplasticismo e esta visita causou grande impacto na
escola. Segundo Curtis, “a partir deste momento, formas influenciadas pelo De Stïjl
se tornaram a base de uma linguagem geral do design e uma grande ênfase na
reintegração entre forma e indústria foi novamente trazida à tona.”10 Este momento
de orientação mais forte em direção à standartização levou à saída dos primeiros
professores da escola mais ligados ao expressionismo, como Johannes Itten e
Lyonel Feininger
Figura 8 – Anúncio de empresa para venda de mobiliário produzido pela Bauhaus. Fonte: WINGLER,
1962. p.56.
A formação do profissional só era possível mediante a cooperação e conhecimento
dos profissionais das diferentes áreas. As artes plásticas tinham seu papel na
arquitetura, e elas não deveriam ser desvinculadas do espaço. Inclusive, a
10
CURTIS, William J. R. Modern Architecture since 1900. Oxford: Phaidon Press, 1987. p.125.
30
arquitetura é uma arte plástica. Esta preocupação com os profissionais e o papel da
arte na arquitetura foi bem ilustrada por Walter Gropius:
A finalidade de qualquer atividade decorativa é a arquitetura. Em outros
tempos, a missão mais sublime das artes figurativas era decorar os
edifícios, e portanto, formavam parte inseparável da grande arquitetura. Na
atualidade, se encontram num estado de isolamento autárquico, do qual só
é possível escapar mediante uma colaboração consciente de todos aqueles
que atuam neste campo. Arquitetos, pintores e escultores tem de aprender
novamente a conhecer e compreender a completa forma da arquitetura, em
sua totalidade, em suas partes, com a qual poderão restituir às suas obras
aquele espírito arquitetônico que se perdeu com a arte de salão.
[...]
Arquitetos, escultores, pintores, todos temos que voltar ao artesanato!
[...]
Apostemos todas nossa vontade, nossa inventividade, nossa criatividade na
nova atividade construtora do futuro, que será toda em uma só forma:
arquitetura e escultura e pintura, e que milhares de mãos de artesão se
elevarão aos céus como símbolo cristalino de uma nova fé que está
11
surgindo.
Alguns estudiosos afirmam que a Bauhaus teve diferentes fases, estando entre elas
a chamada de expressionista (primeira fase), de 1919 a 1923, quando a escola se
localizava em Weimar e estava sob a direção de Walter Gropius. Neste momento,
fizeram parte da escola figuras como Johannes Itten, que possuía uma postura
ligada muito à emoção e ao espiritual, sendo considerada por alguns uma postura
mística12; Lazlo Móholy-Nagy, importante designer, fotógrafo e pintor muito
influenciado pelo construtivismo russo; Paul Klee e Wassily Kandinsky como artistas
plásticos e professores que contribuíram para a elaboração de um método para a
forma de projetar que leva a uma arquitetura simples, com formas puras e racionais
e o arquiteto Marcel Breuer, que tentou conseguir uma boa estética reduzindo tudo
ao mínimo, aspecto que se assemelha ao objetivo do Neoplasticismo.
A fase seguinte durou de 1927 a 1929, quando a escola estava localizada em
Dessau e construiu seu edifício sede, considerado como um verdadeiro manifesto da
escola. Hannes Meyer assumiu a direção (1928) e a racionalização foi ainda mais
enfatizada. Mais uma vez, este fato fez com que alguns saíssem da Bauhaus sob a
11
GROPIUS, Walter. Programa de la Bauhaus Estatal de Weimar. (1919). In: WINGLER, Hans M.. La
Bauhaus – Weimar, Dessau, Berlin – 1919-1933. Barcelona: Gustavo Gili, 1962. p.40.
12
FRAMPTON, Kenneth. Op. Cit. 1997, p.149.
31
justificativa de que era uma contradição favorecer o racionalismo se a proposta
inicial era a união da racionalidade e artesanato.
As oficinas existentes sofreram alterações, foram fechadas e/ou novas foram
criadas. Meyer reformulou a estrutura da escola, que passou a possuir quatro
departamentos principais: arquitetura, publicidade, produção em madeira e metal, e
têxteis.13 Em 1930, Mies van der Rohe assumiu a direção e em 1932 a Bauhaus foi
para Berlim, onde foi fechada pelos nazistas em 1933.
Pouco antes da Bauhaus ter sido forçada a encerrar suas atividades, Sigfried
Giedion publicou em seu livro “Espaço, Tempo e Arquitetura” uma imagem do
edifício-manifesto da Bauhaus (Dessau) disposto lado a lado com uma tela cubista
do pintor Pablo Picasso. A imagem do edifício destaca uma nova concepção do
espaço, que utiliza simultaneidade de pontos de vista e a perda do espaço
perspectival.
Figura 9 – Comparação de tela de Picasso com Edifício da Bauhaus. Fonte: GIEDION, 2004. p.522-523.
13
ibidem, p.154.
32
A contraposição com a tela de Picasso faz uma ligação entre as realizações da
Bauhaus e as discussões feitas no Cubismo (1907-1914), décadas antes. Esta
vanguarda que não teve muitas realizações na arquitetura mostrou-se no início no
fim do século XIX como responsável por uma das maiores revoluções na questão da
representação pictórica da época. As investigações do cubismo se iniciaram com
uma pintura de Cézanne, Casa y granja em Jas des Bouffan (1885-1887), onde
deformações e perspectivas não centradas estão presentes, assim como a ênfase
na individualidade do objeto e o menosprezo do espaço envolvente.
Segundo Marchán Fiz, foi a partir deste momento que a pintura começou a ser
representada por perspectivas espaciais simultâneas e heterogêneas, em vários
tempos diferentes com angulações onde se rompem os planos estáticos do fundo a
favor dos dinâmicos da arquitetura.14 Nestas telas, assim como várias outras
paisagens de Cézanne, a paisagem em si não era o mais importante a ser retratado,
mas sim uma composição geométrica de planos e cores que ganhava autonomia
frente à própria paisagem.
Figura 10 – Paul Cézanne. Vue panoramique (1874). Fonte: www.flickr.com.
Alguns anos depois, com Braque e Picasso, o cubismo ganhou força e se tornou um
dos movimentos de maior importância da arte moderna. A proposta de seus
14
MARCHÁN FIZ, Simon. Contaminaciones Figurativas. Madrid: Alianza Editorial, 1986. p.173-174.
33
membros era de romper com a visão conservadora da perspectiva e incluir vários
pontos de vista de um mesmo objeto na mesma representação. Seria um processo
de desconstrução espacial. Para Picasso, segundo Amy Dempsey, o desafio do
cubismo consistia em representar três dimensões na superfície bidimensional da
tela. Braque, por outro lado, queria explorar a pintura do volume e da massa no
espaço.15
O Espaço tridimensional do Renascimento é o espaço da geometria
euclidiana. Por volta de 1830, foi criado um novo tipo de geometria, que
diferia daquele de Euclides, ao empregar mais do que três dimensões. Tais
geometrias continuaram a se desenvolver até os dias de hoje, quando
atingem um estágio em que os matemáticos lidam com formas e dimensões
que não podem ser apreendidas pela imaginação.
[...]
Percebe os objetos relativamente: isto é, a partir de vários pontos de vista,
nenhum deles tendo predomínio absoluto sobre os demais. Ao dissecar os
objetos, percebe-os simultaneamente, por todos os lados – por cima e por
baixo, por dentro e por fora, circundando-os e penetrando-os. Dessa
maneira, às três dimensões do Renascimento, que haviam se mantido como
fatos constituintes por tantos séculos, é acrescentada uma quarta – o
16
tempo.
É justamente esta questão da nova espacialidade, do uso de diferentes planos de
visão superpostos que Giedion chamou atenção em relação à arquitetura moderna.
A utilização de planos transparentes cria novas possibilidades de observação, os
planos exteriores e interiores podem ser apreciados ao mesmo tempo. É como se
houvesse uma quarta dimensão na arquitetura: o tempo, e que esta dimensão
pudesse permitir ao observador ter várias visadas num mesmo instante, como numa
colagem cubista de Braque ou Picasso.
15
DEMPSEY, Amy. Op. cit., 2003. p.84.
GIEDION, Sigfried. Espaço, tempo e arquitetura: o desenvolvimento de uma nova tradição. São
Paulo, Martins Fontes, 2004. p.464.
16
34
Figura 11 – Pablo Picasso. Natureza-morta com cadeira de palha, 1911-12. Fonte: DEMPSEY, 2003. p.84.
A preocupação das vanguardas em relação à industrialização era bastante evidente,
e alguns movimentos que aconteceram principalmente nos países que estavam em
situação financeira abalada precisavam se reerguer com a imagem de progresso e
modernidade. A imagem da máquina, das indústrias, foi utilizada na arte como
instrumento social em movimentos como o Arbeitsrat Für Kunst (1918-1921), e
Construtivismo Russo (1919-1923). Ambos os movimentos tinham cunho político e
social bastante trabalhado e defenderam a inclusão da arte nas tarefas de toda a
sociedade.
Fundado em Berlim, em 1918/19 e presidido por Walter Gropius, César Klein e Adolf
Behne, o movimento Arbeitsrat Für Kunst (Conselho dos Trabalhadores da Arte)
tinha, como muitos outros um objetivo político, pois procurava criar uma nova
arquitetura que fosse voltada para a nova sociedade que estava se reerguendo após
a Primeira Guerra Mundial, mas seu objetivo principal era unir as diferentes formas
de arte numa obra maior: a arquitetura.
O Conselho dos Trabalhadores da Arte espera poder atingir num futuro
próximo os objetivos formulados no extrato de programa que se segue: ‘A
arte e o povo devem formar uma unidade. A arte não deve mais ser o
privilégio de uma minoria, mas a alegria e a vida das massas. Nosso
17
objetivo é a integração das artes em uma grande arquitetura’.
A arte e o povo precisam formar uma entidade. A arte não mais será o luxo
18
de uns poucos, mas deve ser apreciada e vivenciada por amplas massas.
17
KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. São Paulo: Ed. Nobel,
1990. p.28.
18
Trecho do manifesto do Arbeitsrat für Kunst. In: DEMPSEY, Amy. Op. cit., 2004. p.126.
35
Precisamos querer, imaginar e criar o novo conceito arquitetônico em
cooperativa. Pintores, escultores, derrubem as barreiras que cercam a
arquitetura e transformem-se em participantes de uma mesma construção,
bem como em companheiros de armas em prol do objetivo fundamental da
arte: a idéia criativa da Catedral do Futuro [Zukunftskathedrale], que mais
uma vez a tudo abarcará em uma única forma – arquitetura, escultura e
19
pintura.
Um ano após a fundação do Arbeitsrat Für Kunst, surgiu na Rússia o Construtivismo
Russo. Liderado por Vladimir Tátlin, o movimento defendeu o geometrismo abstrato
na construção unido à questão da industrialização e do uso de novos materiais
(metal, vidro, etc.), e foi claramente influenciado pelo cubismo e futurismo, assim
como afirma Krauss (2007):
Os pintores vanguardistas russos já haviam tomado conhecimento dos
movimentos futurista e cubista; na verdade, o primeiro Manifesto Futurista
fora traduzido para o russo e começara a surtir efeito nos círculos artísticos
20
moscovitas em 1910.
Como a situação econômica do país não era favorável, o Construtivismo funcionaria
como um movimento de sonhos, que visava levantar a moral do povo russo
utilizando a arte como instrumento de transformação social.
Figura 12 (esq.) – Cartaz produzido por Samokhvalov, 1924. Fonte: http://www.artesanatonarede.com.br/.
Acesso em: 13 de Setembro de 2010.
Figura 13 (dir.) – Vladimir Tátlin. Monumento à Terceira Internacional (1919). Fonte: DEMPSEY, 2003.
p.107.
19
Trecho da introdução escrita por Walter Gropius para a Exposição de Arquitetos Desconhecidos,
1919. FRAMPTON, Kenneth. Op. cit., p.141.
20
KRAUSS, Rosalind. E. Caminhos da escultura moderna. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2007.
p.65.
36
Tátlin afirmava que a arte deveria produzir obras que servissem para o povo, a
escultura e a pintura deveriam ter uma funcionalidade e deveriam ser construídas
com materiais da arquitetura, pois tudo é construção e não representação. A função
deveria ficar à mostra. "Para Tátlin, a arte poderia e deveria exercer um impacto
sobre a sociedade."21
Com a Revolução Bolchevique, em 1917, surgiram novas oportunidades para os
artistas construtivistas. A proposta da criação de uma nova sociedade animou a
todos para unir trabalhadores, cientistas e engenheiros. Em 1919, Tátlin apresentou
o Monumento à Terceira Internacional que era, segundo ele, “a união de formas
puramente artísticas (pintura, escultura e arquitetura) tendo em vista um propósito
utilitário.”22
Os anos 1920 marcaram o auge do construtivismo. Foi nesta década que os artistas
começaram a produzir desde cerâmica até mobiliário aplicando a arte abstrata a
objetos práticos. Neste momento, El Lissitzky lançou o proun, abreviatura de “ProUnovis” (a escola para a nova arte), que serviu de título para muitas de suas
composições. As produções construtivistas foram muito utilizadas para um fim social,
como alguns cartazes colocados nas portas de fábricas conclamando e encorajando
os trabalhadores para a construção da nova ordem.
Figura 14 – El Lissitzky. Proun 2 (1920). National Gallery, Washington-D.C. Foto: Fernando Diniz.
No campo da arquitetura pode-se destacar Ivan Leonidov, Konstantin Mélnikov, os
irmãos Aleksandr, Leonid e Victor Vesnin como figuras principais. A arquitetura
21
22
DEMPSEY, Amy. Op. cit. 2003. p.106.
Vladmir Tátlin. In: Idem.
37
construtivista não se concretizou, mas foi bem explorada em projetos. Eram projetos
ousados, com materiais industriais e com ênfase na transparência da função. Seria
uma forma de legitimação do novo regime, utilizando a arquitetura como um
instrumento a serviço da construção de um novo mundo. Para isso, a arte deveria
comunicar, externar a força da construção, mostrar os novos materiais e técnicas,
existia a incorporação de grandes letreiros, anúncios e relógios, tudo incorporado ao
edifício.
Outros movimentos também tiveram como objetivo principal a busca de uma arte
geométrica, racional, e chegaram a extremos como basear-se em cálculos. Foi o
caso do Neoplasticismo (ou De Stïjl) (1917-1932). Surgido na Holanda, o De Stïjl
defendeu uma arte abstrata onde o volume tridimensional seria reduzido ao plano,
restando apenas os seus elementos mais puros. Para o movimento, o plano era um
novo elemento de plasticidade onde seriam explorados os traços essenciais da
composição plástica por meio de linhas verticais e horizontais e o uso das cores
primárias, procurando assim a uma linguagem mais simples e pura para a pintura. O
movimento teve como principais atores o pintor holandês Piet Mondrian, o também
pintor e arquiteto Theo Van Doesburg e o arquiteto Gerrit Ritveld.
Mondrian e Doesburg, em seus artigos na revista De Stïjl, rejeitaram a idéia de arte
como representação, a textura, a linha curva e a modelagem, e tudo isso deveria ser
representado com um jogo de contrastes: linhas pretas x planos brancos; planos
abertos x fechados, linhas finas x espessas. Os integrantes do movimento
realizaram várias experimentações em busca de apresentar “as formas elementares
da arquitetura” e, em 1920, Doesburg produziu o desenho “Relação entre planos
horizontais e verticais”, que mostra planos suspensos estabelecendo relações
espaciais. Seria a migração dos princípios neoplásticos para campos concretos,
como o da arquitetura. Tempos depois, Doesburg fez alguns estudos com o
arquiteto Van Eesteren para construções. Juntos, produziram desenhos e maquetes
de casas arrojadas, com planos que se interceptavam, fragmentação da massa
compacta e uso das cores primárias.
38
Figura 15 (esq.) – Theo Van Doesburg. Relação entre planos horizontais e verticais, 1920. Fonte:
GIEDION, 2004. p. 178.
Figura 16 (dir.) – Theo Van Doesburg e Van Eesteren. Projeto para uma villa, 1923. Fonte: Relação entre
planos horizontais e verticais, 1920. Fonte: GIEDION, 2004. p. 470.
Para o Neoplasticismo, o espaço não deveria conter a arte, este espaço era a
verdadeira arte, como afirmaram Van Doesburg e Van Eesteren:
É preciso entender que a vida e arte deixaram de ser domínios separados.
É por isso que a “idéia” da “arte” como uma ilusão separada da vida real
deve ser banida. A palavra “arte” não significa mais nada para nós. Em seu
lugar exigimos a construção de nosso ambiente segundo leis criativas
baseadas em um princípio fixo. Essas leis, seguindo as da economia, da
matemática, da técnica, do saneamento, etc., estão levando a uma nova
23
unidade plástica.
No campo da arquitetura, os ideais neoplasticistas foram evidenciados através de
tetos planos, ângulos retos, linhas retas, planos em diferentes níveis que se
interceptavam criando um volume fragmentado e complexo, com grande rigor
geométrico e cores primárias. A edificação que melhor ilustra a materialização dos
princípios neoplásticos é a Casa Schröder (1924), em Utrecht, de Gerrit Rietveld.
Percebe-se o rigor da ortogonalidade dos volumes, a ausência de simetria, o
deslocamento das aberturas para as esquinas dos volumes, e as cores primárias.
No interior percebemos que os princípios da interpenetração de planos, cores
primárias e ortogonalidade permanecem. Seria como se o usuário penetrasse num
quadro de Mondrian ou num dos estudos para casas de Theo Van Doesburg. Sobre
a casa, Frampton destaca:
A casa estava de acordo com os ditames do arquiteto, pois era elementar,
econômica e funcional; não-monumental e dinâmica; anticúbica em sua
forma e antidecorativa em sua cor. Seu principal nível habitacional no andar
superior, com sua ‘planta transformável’ aberta, exemplificava, apesar de
23
Trecho do ensaio Vers une construction collective (Por uma construção coletiva), publicado em
1924. Fonte: FRAMPTON, Kenneth. Op.cit., p.177.
39
sua construção tradicional em alvenaria e madeira, seu postulado de uma
arquitetura dinâmica liberada do empecilho de paredes estruturais e das
24
restrições impostas por aberturas.
Figura 17 (esq.) – Gerrit Rietveld. Casa Schröeder (1924). Imagem Externa. Foto: Fernando Diniz.
Figura 18 (dir.) – Gerrit Rietveld. Casa Schröeder (1924) - Imagem Interna. Fonte: OVERY, 1991. p.122.
Por volta de 1924, Doesburg começou a inserir em suas experimentações a linha
rotacionada a 45º, alteração esta que o artista denominou como Elementarismo.
Segundo Dempsey, “Van Doesburg passou a investigar as possibilidades da linha
diagonal em relação ao elementarismo e com seu manifesto intitulado ‘A base da
arte concreta’ (1930), tornou-se o fundador da Arte concreta, que se desenvolveria
mais amplamente após a sua morte, ocorrida em 1931.”25
No manifesto da arte concreta, Doesburg continuou a defender a arte geométrica, ou
seja, uma arte não-figurativa:
Declaramos: 1. A arte é universal. 2. A obra de arte deve ser inteiramente
concebida e formada pela mente antes de sua execução. Ela não deve
receber nada das propriedades formais da natureza ou da sensualidade e
do sentimentalismo. Queremos excluir o lirismo, a dramaticidade, o
simbolismo etc. 3. O quadro deve ser construído inteiramente a partir de
elementos puramente plásticos, isto é, superfícies e cores. Um elemento
pictórico não possui outro significado além de ‘si mesmo’. 4. A construção
do quadro, bem como seus elementos, deve ser simples e controlável
visualmente. 5. A técnica deve ser mecânica, isto é, exata e
26
antiimpressionista. 6. Esforço visando absoluta clareza .
Assim como o Neoplasticismo, os artistas que seguiram a arte concreta se basearam
no puro racionalismo, às vezes até em fórmulas matemáticas e conceitos científicos.
24
ibidem, p.175.
DEMPSEY, Amy. Op. cit., 2003. p.123.
26
Manifesto “As bases da arte concreta”, escrito por Theo van Doesburg e publicado no primeiro
número da revista Art Concret, em abril de 1930. In: ibidem, p.159.
25
40
Tudo era bastante claro, haveria uma predileção por formas geométricas puras e
superfícies homogêneas.27 Em 1936, o arquiteto e ex-aluno da Bauhaus Max Bill
reelaborou o conceito de arte concreta como uma arte objetiva, regida pela
matemática. Bill afirmou que o quadro concreto seria a “concretização de uma idéia”,
uma “realidade que pode ser controlada e observada.”28
Na década de 1950, Bill fundou a Hochschule für Gestaltung (Escola Superior da
Forma), em Ulm, com a idéia de que ela fosse uma continuação da Bauhaus. A
Escola de Ulm tentou levar adiante o princípio de que “a matemática é o meio mais
eficiente para o conhecimento da realidade objetiva e uma obra plástica deve ser
ordenada pela geometria e pela clareza da forma.”29 A partir desta escola, a arte
concreta passou a ser considerada um movimento ou uma tendência artística, ou
seja, o Concretismo. Como exemplo deste movimento, pode-se citar a composição
Ritmo em quatro quadrados, de Max Bill.
Figura 19 – Max Bill. Ritmo em quatro quadrados. Fonte: DEMPSEY, 2003. p.160.
O movimento continuado por Max Bill influenciou vários artistas, inclusive no Brasil,
onde se desenvolveram grupos descendentes da vanguarda européia. No Rio de
Janeiro a artista Lygia Clark fez experimentos em maquetes e publicou textos que
externavam o anseio da migração dos ideais dos movimentos para a arquitetura
através da união do trabalho dos arquitetos e artistas plásticos, o que será tratado
mais a fundo no capítulo 2 deste trabalho.
27
ibidem, p.160.
SOUSA, Cíntia G. S. Desdobramentos: artista-obra-público. In: Congresso Nacional e II Regional
do Curso de História, 2008, Jatai. Uma Corte Européia nos Trópicos, 2008. p.07.
29
Fonte: http://www.itaucultural.org.br/. Acesso em: 13 de Setembro de 2007.
28
41
Figura 20 – Lygia Clark. Maquete para interior nº 1 (1955). Fonte: http://www.mac.usp.br/. Acesso em 30
de Janeiro de 2008.
Naquele momento, fim dos anos 1940 e início da década de 1950, outros
movimentos, debates e publicações de textos sobre a integração das artes plásticas
e arquitetura e o estímulo à junção entre os profissionais das diferentes áreas
continuaram a ocorrer. Foi o caso das tentativas de André Blóc, pintor francês, que
juntamente com Le Corbusier fundou em Paris no ano de 1949 a Associação por
uma Síntese das Artes Plásticas, que objetivava a colaboração entre arquitetos e
artistas. Em 1951, Blóc fundou o Groupe Espace, grupo que incluiu artistas como
Victor Vasarely e Edgard Pillet e arquitetos, como Richard Neutra. O grupo realizou
uma série de pesquisas pictóricas através dos ideais do construtivismo e
neoplasticismo para aplicá-los ao urbanismo. Para os integrantes do Groupe
Espace, pintura, escultura, arquitetura e as artes em geral eram um fenômeno
social, e, como seu próprio nome diz, os artistas estavam preocupados com o
espaço na arte, arquitetura e planejamento urbano.30
Em 1952 ocorreu em Veneza o Congresso Internacional de Artistas, onde Le
Corbusier apresentou sua comunicação intitulada Canteiro de Síntese das Artes
Maiores. Neste texto, Corbusier destacou a pintura e escultura como elementos que
provocam a emoção, além de propor que as obras fossem realizadas como num
canteiro, onde houvesse plena integração de profissionais e trocas de
conhecimentos entre pintores, escultores e arquitetos, atingindo assim o canteiro de
síntese das artes maiores.
30
WALKER, John A. Glossary of Art, Architecture & Design since 1945. New York: G. K. Hall, 1992.
42
Com este breve panorama, percebemos que a relação entre artes plásticas e
arquitetura foi algo discutido em muitos dos movimentos de vanguarda do século
XX. Os primeiros questionamentos sobre a questão da inclusão e resgate do sentido
artísticos das obras desde a revolução industrial e o Arts & Crafts passou por
movimentos dentro do século XX que tinham principalmente funções sociais, de
mobilização da população e de igualdade de classes. Movimentos como Bauhaus,
Deutscher Werkbund, Arbeitsrat für Kunst, Concretismo, entre outros, fizeram apelo
à integração dos diferentes ofícios e atingiram as classes operárias com a
disseminação e repercussão de seus manifestos e propostas. Novas concepções
espaciais foram criadas, ocorreu um distanciamento da arte figurativa, da arte de
cavalete e dos espaços convencionais para a afirmação de uma arte integrada, arte
como parte do edifício, sem desvinculação. Tudo deveria ser planejado em todas as
escalas, desde o detalhe do corrimão da escada até o edifício como um todo. Seu
espaço resultante de todos estes detalhes formaria a obra-total, o edifício. Portanto,
todos estes movimentos procuraram quebrar barreiras, colocando os diferentes
profissionais num mesmo patamar, como colaboradores em prol de um objetivo
único: uma obra de arte maior, a arquitetura.
1.2 O Pós-guerra, Monumentalidade e Civismo
Como visto há pouco, a arte no período entre meados do século XIX e o fim da
segunda guerra mundial foi influenciada por vários eventos. Muitas discussões
acontecidas a partir da Revolução Industrial recorreram à arte como meio de
expressão dos problemas sociais e isto nos faz perceber que a integração entre
artes plásticas e arquitetura apareceu repetidas vezes como um tema digno de
preocupação e de necessidade.
Na primeira metade do século XX, marcada pelas duas guerras mundiais, a
reconstrução dos países afetados era algo emergencial, sobretudo no que se referia
às construções habitacionais. Neste momento, começaram a surgir questionamentos
sobre o como construir/reconstruir estas cidades. Algumas sociedades buscaram na
arte uma nova identidade para reconstruir seus países, já outras focaram na busca
da reprodução de meios extremamente lógicos e matemáticos para a rápida
reconstrução, sem levar em conta a dimensão artística nas construções.
43
Considerando o universo dos acontecimentos do século XX, o período que
compreendeu as décadas de 1930 até 1960 mostra-se como o de maior
efervescência no cenário internacional sobre a questão da integração das artes. É
durante este intervalo que apareceu um maior número de discussões em várias
partes do globo e em algumas destas foram produzidos importantes textos sobre o
assunto. Os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, CIAM, foram palco
de muitas dessas discussões. No IV CIAM (Atenas, 1933), Fernand Léger
apresentou seu texto intitulado “A parede, o arquiteto, o pintor”, onde ele refletiu
sobre o uso da cor na arquitetura e propôs o trabalho conjunto entre arquitetos e
pintores.31 Léger defendia que a cor tem o poder de mudar o espaço. Em seu texto
publicado em 1946 intitulado “A arquitetura moderna e a cor – ou – A criação de um
novo espaço vital”, ele ilustrou bem a influência da cor no espaço:
“Como criar um sentimento de espaço, de ruptura dos limites? Pela cor,
simplesmente, por paredes de cores diferentes.
O apartamento que chamarei de ‘retângulo habitável’, vai se transformar em
‘retângulo elástico’. Uma parede azul-clara recua, uma parede preta avança.
Uma parede amarela desaparece (destruição da parede). As novas
possibilidades são múltiplas. Um piano preto, por exemplo, contra uma
parede amarelo-clara, cria um choque visual que pode diminuir o sentimento
32
de dimensão.”
E sobre a colaboração entre as três artes maiores, destacou:
“A arquitetura moderna tem um trabalho considerável a realizar neste
domínio. Seria atingir, construir, inventar o grande monumento popular, a
obra harmoniosa nova, em que as três artes maiores devem colaborar:
33
arquitetura, pintura, escultura.”
Em 1943, Sigfried Giedion, Fernand Léger e Josep Lluis Sert escreveram um
manifesto intitulado Nove Pontos da Monumentalidade, apresentado no VI CIAM, em
Bridgwater – Inglaterra (1947). O manifesto criticou o favorecimento do
funcionalismo da arquitetura moderna e a revolução técnica desenvolvidos no
período entre guerras em sobreposição aos valores emocionais das cidades, e esta
busca objetivou justamente resgatar estes valores da arquitetura e o conseqüente
senso de monumentalidade. Através da união dos artistas como arquitetos,
urbanistas, pintores, escultores e paisagistas poder-se-ia atingir uma
31
FERNANDES, F. Síntese das Artes e cultura urbana. Relações entre arte, arquitetura e cidade. In:
8º Seminário DOCOMOMO Brasil. Rio de Janeiro, 2009.
32
LEGER, Fernand. Funções da pintura. São Paulo: Ed. Nobel, 1989. p.111.
33
Idem.
44
monumentalidade que expressasse valores cívicos, ou seja, a integração das artes
foi apontada por eles como uma das formas de se recuperar este senso.
“[...]
7) As pessoas querem que os edifícios que representam sua vida social e
comunitária proporcionem algo além da mera satisfação funcional. Elas
querem satisfazer seus desejos pela monumentalidade, diversão, orgulho e
alegria.
As condições seguintes são essenciais: um monumento como sendo a
integração do trabalho do planejador, arquiteto, pintor, escultor, e paisagista
precisa de uma colaboração conjunta entre todos eles. Essa colaboração
tem fracassado nos últimos cem anos. A maioria dos arquitetos modernos
não foi treinada para esse tipo de trabalho integrado. As tarefas
monumentais não foram confiadas para eles.
[...]
8) Locais para os monumentos devem ser planejados. Isso é possível logo
que replanejar é comprometer-se em larga escala, o que resulta em
grandes espaços abertos nas áreas decadentes existentes das nossas
cidades. Nestes espaços abertos, a arquitetura monumental vai encontrar a
localização apropriada que, no momento, não existe. Edifícios monumentais
serão então capazes de se erguer no espaço, ao contrário de, como árvores
e plantas, edifícios monumentais não podem ser povoados sobre qualquer
lote único ou em qualquer região. Apenas quando este espaço é concluído,
34
os novos centros urbanos podem tornar à vida.[...]”
Além da questão da integração das artes, a busca pela nova monumentalidade
enfatizou muito a questão da vida comunitária, democrática e popular. Defendeu a
criação de centros cívicos e, segundo Rodrigues, as comunidades urbanas se
identificariam com as obras erguidas pela nova monumentalidade, uma vez que
estas representariam o povo, e não o Estado Centralizador.35 Os conceitos
defendidos por esta busca de uma nova monumentalidade estão expressos, por
exemplo, em Chandigarh, cidade projetada por Le Corbusier, em 1953. O centro
cívico se encontra em local planejado e os edifícios foram pensados como um
conjunto. O caráter monumental dos edifícios é ressaltado até mesmo em questão
de escala. Os edifícios têm todo um planejamento estético, com aplicação de
diferentes texturas e possuem diálogo com painéis e formas esculturais.
34
SERT, J. L. LEGER, F. GIEDION, S. Nine Points on Monumentality (1943). In: Harvard Architecture
Review, 1984. p.62. Tradução da autora.
35
RODRIGUES, C. M. Cidade, monumentalidade e poder. In: Revista GEOgraphia, vol. 3, nº. 6,
Disponível em: http://www.uff.br/geographia/ojs/index.php/geographia/article/view/65/63. Acesso em:
02 de junho de 2010.
45
Figura 21 – Le Corbusier. Plano para a cidade de Chandigarh. Fonte: http://www.unb.br/. Acesso em: 06
de Novembro de 2007.
1.3 Arte, Arquitetura e a América Latina
As discussões sobre arte e arquitetura modernas não se limitaram somente à
Europa. Estes debates sobre a relação entre artes plásticas e arquitetura geraram
realizações importantes dentro da América Latina. Alguns debates ocorridos na
America Latina sobre a integração das artes chegaram a anteceder o manifesto de
Léger, Sert e Giedion, como aconteceu na Argentina e Uruguai (debates da região
de Rio de La Plata).
Como exemplos de realizações de grande importância na relação entre artes
plásticas e arquitetura, e, conseqüentemente relação entre artistas plásticos e
arquitetos, Paul Damaz e Carlos Brillembourg apontam as cidades universitárias da
Cidade do México (México) e de Caracas (Venezuela) e o edifício do Ministério de
Educação e Saúde, no Rio de Janeiro (Brasil). Este último será tratado mais
profundamente no próximo capítulo. Já as cidades universitárias do México e de
Caracas são obras em uma escala maior e que possuem como diferencial,
respectivamente, o uso de murais e esculturas em consonância com as edificações.
Ambas foram reconhecidas como Patrimônio da Humanidade nos anos de 2007
(México) e 2009 (Caracas).
A integração das artes foi uma das qualidades mais celebradas na
arquitetura moderna brasileira, como se pode perceber nas decorações
aplicadas e na participação colaborativa de um time de pintores, escultores,
arquitetos e paisagistas na criação do Ministério de Educação do Rio de
Janeiro. A inauguração da Cidade Universitária do México e da praça
coberta de Caracas no início dos anos 1950 deu um novo impulso a essa
tendência, que Henry-Russel Hitchcock considerou uma característica
46
latino-americana, pois as elites locais “esperam mais dos arquitetos do que
36
puramente ‘soluções funcionais’”.
O campus da universidade do México se destaca bastante pela sua escala e pelos
seus grandes murais coloridos. O projeto é composto por vários edifícios e murais
concebidos por diferentes arquitetos e artistas que ressaltaram em suas obras a arte
pré-colombiana do México. Edward Burian considera o campus como uma obra de
arte total (gesantkunstwerk), que busca uma forma de atingir o sentido de uma obra
autêntica e “[...] introduzir o espírito da nação e os valores culturais através da
participação dos artistas.”37
Figura 22 (esq.) – Biblioteca Central da UNAM. Mosaico de pedra de Juan O’Gorman. Foto: Carla Cortês.
Figura 23 (dir.) – Mural de pedra da Biblioteca Central da UNAM. Foto: Carla Cortês.
A questão cultural é o ponto crucial para se entender o projeto da Cidade
Universitária do México (UNAM). Segundo Burian, “a arquitetura representa a
contradição de ser moderno ao mesmo tempo que mostra sua identidade nacional.
[...] O sonho do homem mexicano representa o paradoxo de ser, ao mesmo tempo,
moderno e Mexicano, internacional e nacional”38. A UNAM é um verdadeiro tributo
36
“Integration of the arts was one of the most celebrated qualities of Brazilian modern architecture, as
evidenced in the use of applied decoration and the collaborative participation of a team of painters,
sculptors, architects, and landscape experts in the creation of Rio de Janeiro’s Ministry of Education.
The inauguration of the University City in Mexico and the covered plaza in Caracas in the early 1950s
gave another boost to this trend, which Henry-Russell Hitchcock would consider a Latin American
characteristic because local elites ‘expect more from architects than purely ‘functional solutions’.”
LIERNUR, Jorge Francisco. Abstraction, architecture and the ‘Synthesis of arts’ – Debates on the Rio
de la Plata – 1936-1956. In: BRILLEMBOURG, Carlos. Latin American Architecture 1929-1960:
Contemporary Reflections. New York: The Monacelli Press, 2004. p.80. Tradução da autora.
37
“The integration of artists, artisans, and architects proclaimed by the Bauhaus was the logical way in
Mexico of introducing the nation's spirit and cultural values through the participation of artists.”
ZAMBRANO, Celia E. A. Modernity in Mexico: The casa of the Ciudad Universitaria. In: BURIAN,
Edward. Modernity and the Architecture of México. Austin: University of Texas Press, 1997. p.102.
Tradução da autora.
38
ibidem, p.92-93.
47
ao passado do México, que se expressa através do seu modernismo carregado de
simbolismo e cultura locais.
O plano urbanístico da UNAM é essencialmente modernista. Os edifícios são
grandes blocos soltos, há separação dos sistemas de circulação e zoneamento de
atividades.
[...] [A UNAM] foi construída como uma porção da cidade para o uso
exclusivo dos pedestres. O campus foi dividido em quatro partes pelo
sistema de vias. O campus principal, localizado ao norte, contém todas as
escolas e seus apoios. As estruturas esportivas estão ao sul, enquanto o
Estádio Olímpico e as habitações para os estudantes estão a oeste e leste,
39
respectivamente.
Apesar dos projetos obedecerem a um plano, os arquitetos e artistas tiveram
bastante liberdade na questão da concepção das edificações, o que trouxe uma falta
de unidade entre os edifícios, mas que não diminuiu seus respectivos valores pela
questão da união entre arte e arquitetura. As edificações que mais se destacam são
o Edifício da Reitoria, a Biblioteca Central, o Estádio e o Edifício de Medicina. Em
todas estas obras, os arquitetos trabalharam juntamente com muralistas, pintores e
escultores e produziram obras que comunicam fortemente através de símbolos e
imagens a vasta cultura do povo mexicano. Além disso, a localização destes
edifícios foi pensada de forma a se respeitar uma ordem funcional e simbólica:
Conceitos racionais e místicos estão expressos no desenho do campus. A
disposição dos edifícios principais estão na grande praça e o eixo central
responde à questões funcionais e de importância simbólica. A torre da
reitoria está localizada na parte mais importante do campus, perto da via de
acesso rápido e atua como um elemento de boas-vindas na composição. A
Bilbioteca Central, que possui um mural multicolorido de Juan O’Gorman,
descreve o passado do México e apresenta o conhecimento ofertado ao
novo mexicano. A Escola de Ciências, que possui um mural localizado no
seu centro, representa a evolução do conhecimento científico que está
dentro do desenvolvimento do México. Esta organização revela que mesmo
sendo o campus inspirado na relação com a cidade moderna, ele foi
40
disposto a uma carga simbólica que prevalece na composição.
39
“[UNAM] was built as, and still remains, an isolated portion of the city for the exclusive use of
pedestrians. The campus was divided into four parts by its road system. The main campus, located to
the north, contains all the schools and their facilities. The sport facilities were to the south, while the
Olympic Stadium and the dormitories were to the west and east, respectively.” In: ibidem, p.95-96.
Tradução da autora.
40
“Rational and mythical concepts seem to merge in the site design of the campus. The disposition of
the main buildings located on the great plaza and central axis responds to both their functional and
symbolic importance. The Rector’s Tower is set on the highest, most predominant part of the campus,
close to the main highway, and acts as a gateway and welcoming element in the composition. The
Main Library, with its multicolored mural by John O’Gorman, depicts Mexico’s past and present
wisdom available to the new Mexican. The School of Science with its mural, located in the center of
the scheme, represents the evolution of scientific knowledge that’s is available for Mexico’s
48
Acima de sua função decorativa, a obra de arte foi utilizada nas edificações da
UNAM, sobretudo, pelo seu poder social. Há um comprometimento da arte com a
sociedade, a obra de arte comunica, rege as construções e conta a história do povo
mexicano. Assim, pode-se fazer um paralelo com o conceito de monumentalidade do
manifesto de Giedion, Sert e Léger no que se diz respeito à função social da cidade,
à questão dos edifícios representarem a vida dos seus habitantes.
Figura 24 - Estádio Universitário da Universidade do México. Mosaico de pedra de Diego Rivera. Fonte:
http://bicentenario.com.mx/. Acesso em 01 de Novembro de 2010.
Figura 25 – Edifício de Medicina da Universidade do México. “Fire, Earth, Air and Water – Life and Death”.
Mosaico de vidro de Francisco Eppens. Fonte: http://www.munlochygmvigil.org.uk/. Acesso em: 13 de
Novembro de 2007.
Entrando na análise do Campus da Universidade de Caracas, é interessante
destacar a seguinte passagem de Damaz:
[A cidade universitária de Caracas] é o único exemplo no mundo que traz
trabalhos de arquitetura, pintura, escultura e vitrais complementando um ao
outro para formar um organismo arquitetural-escultural-pictórico sem
41
nenhum elemento sendo menos importante em relação a outro.
Inicialmente, o plano inicial de Villanueva para a universidade era bastante
tradicional, partindo de um grande eixo central e um arranjo lateral simétrico dos
edifícios. Em 1952, o plano foi completamente alterado, acompanhando a adesão de
development. This organization reveals that even though the campus was inspired in relationship to a
modern city, a symbolic arrangement seems to prevail in the composition.” In: ibidem, p.96-97.
Tradução da autora.
41
"[University City of Caracas] “it is the only important example in the world that shows architecture,
painting, sculpture and stained glass work complementing one another to form “a new architecturalsculptural-pictorial organism in which no element is of minor importance.” In: DAMAZ, Paul F. Art in
Latin American architecture. New York: Reinhold, 1963. p.94. Tradução da autora.
49
Villanueva a arte e arquitetura modernas por meio de uma organização livre com um
urbanismo “multifocal” (vários núcleos), possuindo a fluidez como ponto essencial:
“Villanueva levou a sério o ditado corbusiano de que Arquitetura é Circulação” 42. O
grande espaço livre criado por Villanueva é preenchido com trabalhos de vários
artistas:
Villanueva fala da importância dos artistas completarem o trabalho dos
arquitetos, e coloca em prática sua idéia em relação à síntese das artes. A
seu ver, arquitetura é interna e externa, escultura e também pintura. Existe
uma clara identidade para cada arte plástica, mas elas se juntam para tomar
43
a forma de arquitetura, que se encontra na mais alta hierarquia.
[...] é necessário que pintores e escultores devam ter uma idéia mais ou
menos clara da forma como os arquitetos trabalham, das suas
possibilidades como artista e das suas determinações como técnico. A visão
espacial que é típica do arquiteto deve ser entendida e utilizada pelo pintor.
Da mesma forma, o arquiteto terá que levar em conta o meio em particular
com qual o pintor ou o escultor trabalha. Seja em superfícies ou volumes,
ele deve respeitar o seu método de criação. Há uma diferença substancial
44
entre uma peça de trabalho de integração e uma tentativa de decoração.
Figura 26 – Planta baixa da Área Central do Campus da UNAM. No centro, vê-se a praça coberta e a Aula
Magna. Fonte: VILLANUEVA; PINTÓ, 2000. p.74.
42
“Villanueva took to heart Corbu’s dictum Architecture Is Circulation”. In: BRILLEMBOURG, Carlos.
ibidem, p.65.
43
“Villanueva speaks of the importance of artists informing the work of architects, and he put into
practice his idea about the synthesis of arts. In his view, architecture is internal and external, sculpture
and also painting. There exists a precise identity for each plastic art, but they all come together to
reinforce the position of architecture, at the top of the hierarchy”. In: Idem.
44
VILLANUEVA, Carlos Raúl. The Integration of the Arts. In: BLASI, Ivan; TOSTÕES, Ana. (org.) Art
and Architecture. DOCOMOMO Journal, nº42, Summer 2010. p.54.
50
Confrontando-a com a UNAM, a Universidade de Caracas possui uma escala menor
e, talvez por isso tem-se a sensação de uma maior relação entre os edifícios. A
organização da planta é fluida, a dimensão das obras que interagem com os
edifícios são mais humanas, feitas para ser observadas de perto e são locadas tanto
num local externo, quanto nas faces das edificações, de forma a balizar o
movimento do transeunte. A relação entre as artes é mais “respeitosa”, não há
agressão ou carregamento de uma arte sobre outra. Estão em equilíbrio. Os murais,
pinturas e esculturas se destacam ao mesmo tempo em que ressaltam as formas e
estruturas arquitetônicas.
Villanueva dividiu a cidade universitária em grupos de obras de arte, onde ele definiu
cada grupo como sendo um “movimento”, como se o conjunto fosse uma música que
é dividida em partes que formam um todo e que deve ser apreciada por quem anda
no campus. Os edifícios são dispostos de forma solta, criando fluidez de espaço e
até uma praça pública. Ao todo são cinco movimentos:
Figura 27 – Carlos Raúl Villanueva. Universidade de Caracas – movimentos (I, II, III, IV e V). Fonte:
VILLANUEVA; PINTÓ, 2000. p.75.
O primeiro movimento localiza-se no início do percurso com dois murais de
mosaicos de Armando Barrios e Oswaldo Vigas. Estes murais, segundo Villanueva,
estão interagindo para desarticular os volumes do Museu e para destruir as
superfícies através dos transparentes e fluidos meios pictóricos. Já o segundo
movimento seria um “preparatório” composto por três murais de mosaico de vidro
executados por Oswaldo Vigas. Ele se localiza entre a entrada e o centro do espaço
51
cultural. Os murais já recebem um papel mais funcional, mais interativo com a
edificação, pois destacam a estrutura dos edifícios de Comunicações e de
Administração.
O terceiro movimento está num local de convivência social, a praça coberta. Neste
movimento estão os trabalhos do maior número de artistas, sendo sete ao total:
Jean Arp, Mateo Manaure, Pascual Navarro, Victor Vasarely, Alexander Calder,
Fernand Léger e Henri Laurens. As formas de como as obras de arte estão situadas
não é a mais tradicional. As esculturas e murais são dispostos de forma solta, mas
em locais cuidadosamente estudados, permitindo que não se perca a relação entre
as obras e edificações circundantes. Esta relação entre as obras de arte, Villanueva
chamou de “conceito contemporâneo de tempo-espaço”. São exploradas as várias
visadas, jogos de claro-escuro, além de ser preparadas surpresas para os
transeuntes a cada mudança de perspectiva.
O quarto movimento também se localiza numa área coberta, mas a experiência do
transeunte se torna mais dinâmica e visual. Neste movimento se localiza um painel
de Victor Vasarely com paletas giratórias de alumínio que filtram a luz de formas
diferentes, dependendo da posição das paletas. Além do painel de paletas, existem
dois murais de Pascual Navarro e Mateo Manaure e uma escultura de bronze de
Balthazar Lobo. As cores dos painéis se harmonizam com a escultura
monocromática.
Figura 28 (esq.) – Praça coberta. Painel de Pascual Navarro. Foto: Fernando Diniz.
Figura 29 (dir.) – Praça coberta. Painel de placas metálicas móveis, de Victor Vasarely. Foto: Fernando
Diniz.
No quinto movimento, Villanueva diz que “encontrou a característica abstrata da
música” na relação entre a escultura de bronze de Antoine Pevsner e o mural de
52
cerâmica de Victor Vasarely. Encontram-se também neste movimento o mural de
Fernand Léger e Jean Barillet e várias outras obras de artistas como os murais
abstratos de Carlos Bogen e Pascual Navarro, dois painéis de mosaico de Alirio
Oramas e uma escultura de bronze de Francisco Narvaez.
Dentro dessa organização livre dos espaços, a grande praça coberta, localizada no
3º movimento, serve de lobby para o auditório da universidade. No conjunto, este
edifício se destaca como o mais importante em relação à integração com as artes. A
Aula Magna, como é chamado, foi resultado da associação de Villanueva, o artista
plástico Alexander Calder e os engenheiros Bolt Beranek e Newman.45 Inicialmente,
Villanueva idealizou a obra de Calder locada na praça coberta. Mais tarde, Calder
propôs a Villanueva fazer uma obra interna, que participasse tanto funcional quanto
artisticamente. Desenhos foram desenvolvidos e dentro do auditório, o artista
transportou para o meio tridimensional várias estruturas que flutuam no teto da
edificação, funcionando como anteparo acústico. Seria como a penetração de uma
tela abstrata dentro do espaço. Segundo Brillembourg, o trabalho de Calder possui
influência do Neoplasticismo de Mondrian e do Surrealismo, mais especificamente
de Juan Miró.46 As “nuvens” criadas por Calder proporcionam sensação de
movimento.
Figura 30 (esq.) – Alexander Calder. Croquis para a Aula Magna (1952). Fonte: BRILLEMBOURG, 2004.
p.07.
Figura 31 (dir.) – Alexander Calder; Carlos Raúl Villanueva. Interior da Aula Magna (1952). Fonte:
BRILLEMBOURG, 2004. p.06.
Moldando o espaço artística e acusticamente, Villanueva acabou percebendo que o
espaço da Aula Magna era diferente, pois transformava a perspectiva retilínea usual
45
46
BRILLEMBOURG, Carlos. Op. cit., 2004. p.66.
ibidem, p.71.
53
em uma forma esférica, como se fosse a visão de um peixe. Isso o inspirou tanto
quanto Calder. As cores são fortes, inspiradas nos corais. As diferentes posições do
observador mudam a percepção da composição. É realmente uma concepção
espacial inovadora. Villanueva chamou esse novo tipo de espaço de ‘elemento
quadrimensional’, pois o tempo seria considerado um elemento concreto do espaço.
Ainda sobre o edifício, Brillembourg destaca: “Aula Magna – a escultura e a
arquitetura são a mesma coisa. Uma verdadeira síntese das artes é criada pela
perfeita interação da acústica, escultura e espaço47”.
A integração das artes foi um tema particularmente importante nos debates latinoamericanos. Segundo Liernur, “[...] a incorporação da ‘arte’ dentro da arquitetura foi
considerada umas das melhores maneiras de se recuperar a retórica dos ‘valores
espirituais’ abandonados pelos efeitos devastadores da revolução racional, funcional
e mecanicista.”48
A partir da década de 1950, começaram a acontecer as Bienais Internacionais de
Artes de São Paulo, o que proporcionou a vinda de importantes artistas e arquitetos,
como Max Bill e Siegfried Giedion. Em 1953-54, na II Bienal, o crítico de arte Mário
Pedrosa falou sobre a invasão muralista nas ruas de São Paulo, e que foi bastante
criticada por Max Bill:
Sou contra a pintura mural na arquitetura moderna. O mural só teve razão
de ser numa época em que poucos sabiam ler; sua função sempre foi
ilustrativa, [...] Hoje existem outros meios - como por exemplo os jornais, as
revistas, o cinema - capazes de dar a todos, e com muito maior eficiência
uma visão completa e moral da vida. O mural moderno sempre seria feito
de tal maneira que somente os intelectualizados poderiam copreendê-lo
49
[...].
Em 1959, aconteceu o Congresso Internacional de Críticos de Arte nas cidades
brasileiras de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Este encontro teve como tema:
“Cidade Nova, Síntese das Artes”, se referindo a Brasília como cidade-obra de arte.
Falaremos deste encontro no capítulo a seguir.
***
47
“this project, the sculpture and the architecture arte one and the same. A true synthesis of the arts is
created by perfect intertwining of the acoustics, the sculpture, and the space”. In: ibidem, p. 70.
48
LIERNUR, Jorge Francisco. Abstraction, architecture and the ‘Synthesis of arts’ – Debates on the
Rio de la Plata – 1936-1956. In: ibidem, p.80.
49
AQUINO, Flávio de. Max Bill critica a nossa moderna arquitetura. In: Revista Manchete nº 60, Rio
de Janeiro, 13 jun. 1953. p.38.
54
Após este breve panorama, percebemos o quão é complexo a questão da
integração das artes. Vimos que, ao longo da história, artes plásticas e arquitetura
ora andaram juntas, ora separadas, ou seja, sempre existiu uma relação oscilatória
entre as duas formas de arte. A busca pela inserção da arte nos edifícios e os
debates ocorridos destacando os problemas gerados pela separação entre as artes
nos mostra que esta relação é importante para as sociedades, por mais diferentes
que estas sejam umas das outras.
A partir da Revolução Industrial, o favorecimento da máquina criou uma grande
preocupação em relação ao artesanato e ao sentido emocional das produções,
desde a escala de objetos utilitários até a escala das cidades. Para a arquitetura não
era diferente. Durante o século XX, vários movimentos surgiram em prol da
reaproximação dos diferentes tipos de arte. As duas guerras mundiais também
causaram novas discussões que envolviam arte e o modo de reconstrução das
cidades tendo em vista a inserção da arte como instrumento de reforma social, de
mobilização da população e de igualdade de classes.
Era um momento de busca a novas concepções espaciais. Procurou-se
distanciamento da arte figurativa e a arte deveria ser vista como parte integrante do
edifício. O objetivo de se atingir uma grande unidade artística – obra de arte total –
tão buscada por movimentos como a escola da Bauhaus começava a ser colocada
em prática. Estas experiências artísticas e espaciais (artes plásticas e arquitetura)
surgiram com importantes realizações, não apenas na Europa – o grande berço das
discussões – mas também dentro da América Latina, como os exemplos vistos das
Cidades Universitárias do México e de Caracas. Em escalas maiores (escalas da
cidade), mas em configurações diferentes, as duas obras demonstram a força que a
união entre as artes provoca na sociedade. A Cidade Universitária do México retrata
a cultura e histórias mexicanas, enquanto a de Caracas possui uma organização
fluida e a participação ativa das obras de arte. Nas duas obras, a arte funciona como
instrumento de melhoramento social e representam um momento no qual as
sociedades latino-americanas procuraram reinventar a si próprias por meio da
educação, da cultura e da arte.
55
CAPÍTULO 2
ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA MODERNAS NO BRASIL
2. ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA MODERNAS NO BRASIL
Apesar do Brasil não ter passado pela necessidade de reconstrução do pós-guerra
como muitos países europeus, o país passou pelo projeto de construção de uma
identidade nacional que tinha começado a ser colocado em prática desde os anos
1930. A arquitetura moderna teve um papel preponderante na construção de uma
imagem nacional, culminando na construção de Brasília, e no período de afirmação
dessa arquitetura no Brasil, o convívio entre artes plásticas e arquitetura mostrou-se
algo essencial.
Na Semana de 22, evento que marcou o surgimento da arte moderna no país, havia
uma intenção dos organizadores de comporem um quadro das artes, incluindo-se a
arquitetura, embora esta tenha tido um caráter periférico na mostra. Segundo
Amaral, “o momento real da arquitetura, mesmo para aqueles que então se
consideravam ousados, era o neocolonial amaneirado [...]”.50 A Semana de 22 serviu
para se explorar caminhos diferentes do que se havia fazendo na arquitetura.
Conhecido como o “arquiteto da Semana”, Antônio Garcia Moya foi uma figura
revolucionária na Semana de 22:
De qualquer forma, naquele momento histórico, na Semana de 22, Moya foi,
indubitavelmente, o elemento destruidor na seção de Arquitetura, com seus
projetos plenos de atmosfera, revolucionários como concepção por seu
51
caráter de rompimento com a convenção.
Segundo o engenheiro Guilherme Malfatti, nenhum dos projetos de Moya
apresentados no evento foram construídos “pois naquela época tudo era
imaginação, o importante era se propor algo contrário ao que se fazia”.52
No ano anterior, Moya foi apontado como um arquiteto preocupado com a questão
subjetiva da arquitetura. Preocupava-se com detalhes, composição, subjetividade,
assim como também com a noção de conjunto entre arquitetura e outras artes:
[...] os estudos de Moya, o jovem e brilhante arquiteto paulista, procuram
resolver o problema capital de harmonizar a escultura com a arquitetura,
fundidas numa harmonia integral e íntima, de modo que uma resulte de
53
outra naturalmente, sem acusar o aplicado, o postiço, o artificioso, o fútil.
50
AMARAL, Aracy A. Artes plásticas na Semana de 22. São Paulo: Ed. 34, 1998. p.151.
ibidem, p.157.
52
Depoimento telefônico de Guilherme Malfatti à Aracy Amaral. In: Idem.
53
Trecho do artigo de Helios intitulado “Um arquiteto” In: Correio Paulistano, 20 de julho de 1921.
apud. ibidem, p.153.
51
A década de 1930 contemplou uma série de acontecimentos importantes dentro da
arquitetura e das artes plásticas que por vezes demonstrou uma preocupação de se
unir estes diferentes campos da arte. Exposições que mostravam o desenvolvimento
da arte moderna eram trazidas de outros países enquanto outras eram montadas em
várias partes do território brasileiro, principalmente dentro do eixo Rio-São Paulo.
Em 1930, aconteceu no Rio de Janeiro e São Paulo uma exposição de livros e Artes
Gráficas da Alemanha, com a presença dos principais artistas do Expressionismo
Alemão. No ano anterior, houve uma mostra da Deutscher Werkbund.54 É
interessante perceber que, assim como visto no capítulo anterior, estas duas
vanguardas alemãs modernas que visitaram o Brasil em 1929 e 1930 tinham
preocupação em relação à união de diferentes profissionais. É importante destacar
também que em 1930 ocorreu a “Exposição de uma Casa Modernista e de Arte
Moderna” de Gregori Warchavchik55, em São Paulo. Esta exposição mostrava a
busca de integração entre mobiliário, arquitetura, paisagismo e artes plásticas,
embora a arquitetura tenha tido um papel mais ativo neste evento.
Figura 32 (esq.) – Quadro e tapeçaria na “Exposição de uma casa modernista e de arte moderna”. Foto de
1930. Por: Monica Kaneko.
Figura 33 (dir.) – Interior da Casa modernista com mobiliário moderno, de Gregory Warchavchik. Foto: O
Globo.
Em 1931 ocorreu o Salão Nacional de Belas Artes. Este ficou conhecido como o
Salão Moderno, e teve a participação de vários artistas como a paulista Tarsila do
Amaral, o carioca Emiliano Di Cavalcanti, o pernambucano Cícero Dias, entre outros.
No fim de 1932 foram fundadas a Sociedade Pró-Arte Moderna (SPAM) e o Clube
dos Artistas Modernos (CAM), grupos que tinham como objetivo, assim como seus
54
AMARAL, Aracy A. Arte pra quê?: A preocupação social na arte brasileira, 1930-1970: subsídios
para uma história social da arte no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Ed. Nobel, 1987. p.382.
55
Idem.
58
próprios nomes afirmam, promover a arte moderna. Em 1933 a SPAM organiza a 1ª
Exposição de Arte Moderna e traz além de obras de artistas brasileiros, obras de
grandes nomes internacionais, como Fernand Léger e Pablo Picasso. Dois anos
mais tarde, em 1935, foi criado o Instituto de Artes da Universidade do Distrito
Federal, que possuía como professores figuras como o arquiteto Lúcio Costa e o
artista plástico Cândido Portinari.56
Figura 34 – Capa do catálogo da 1ª Exposição de Arte Moderna da SPAM. Foto: Francisco Gregório.
O mesmo ano em que Andre Blóc fundou a “União pela Arte” (1936) em Paris foi de
grande importância para a arquitetura e arte modernas no Brasil. Textos que relatam
a importância da integração entre as artes plásticas e arquitetura são publicados,
como “Arquitetura e as Belas Artes”, de Le Corbusier , que como arquiteto e pintor
admite uma maior participação do artista plástico na arquitetura:
“Prefiro admitir que as ocasiões serão excepcionais, quando então o grande
pintor, digno da arquitetura, será encarregado de alguma tarefa.
[...]
Eu não peço ao meu pintor que seja discreto. Digo-lhe: ‘Aqui você tem a
57
palavra; fale!’"
Em “Razões da nova arquitetura”, escrito em 1934 por Lúcio Costa para um curso de
pós-graduação do Instituto de Artes na antiga Universidade do Distrito Federal, mas
56
57
ibidem, p.384-386.
CORBUSIER, L. Op.cit., p.65-66.
59
publicado em 1936, há um enaltecimento do artista como aquele capaz de sintetizar
os anseios de uma sociedade:
É livre a arte; livres são os artistas; a receptividade deles é, porém, tão
grande quando a própria liberdade [...] os artistas, independente de
qualquer coação, inconscientemente quase, e precisamente porque são
artistas, captam essa vibração coletiva e a condensam naquilo que se
58
convencionou chamar obra de arte, seja esta de que espécie for.
Para Costa, artes plásticas e arquitetura devem formar uma unidade indissociável:
Nesses raros momentos felizes, densos de plenitude, a obra de arte adquire
um rumo preciso e unânime: arquitetura, escultura, pintura, formam um só
59
corpo coeso, um organismo vivo de impossível desagregação.
[...] poderemos alcançar, como os antigos, com a ajuda da simetria, formas
superiores de expressão, contando para isso com a indispensável
colaboração da pintura e da escultura, não no sentido regional e limitado do
ornamento, mas em um sentido mais amplo. Os grandes panéis de parede,
tão comuns à arquitetura contemporânea são um verdadeiro convite à
expansão pictórica, aos baixos-relevos, à estatuária como expressão
60
plástica pura, integrada ou autônoma.
Em defesa da pintura mural, o artista plástico carioca Eugênio Sigaud publicou o
texto “Por que é esquecida entre nós a decoração mural?”.61 Também em 1936,
Cândido Portinari realizou seus primeiros murais62, quatro ao todo, localizados no
Monumento Rodoviário erguido na estrada Rio-São Paulo, por encomenda do então
diretor do DNER, Iedo Fiuza. No mesmo monumento há oito baixos-relevos do
escultor francês Alfred Freyhoffer que mostram a evolução dos meios de transporte
no Brasil
Figura 35 (esq.) – Baixo-relevo de Albert Freyhoffer para o Monumento Rodoviário, 1936. Foto: Arthur
Ramalho.
Figura 36 (dir.) – Baixo-relevo de Albert Freyhoffer para o Monumento Rodoviário, 1936. Foto: O Globo.
58
COSTA, Lúcio. Lúcio Costa: registro de uma vivência. São Paulo: Empresa das Artes, 1995. p.109.
Idem.
60
ibidem. p.115.
61
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. p.388.
62
Idem.
59
60
Ainda em 1936, o Brasil recebeu uma importante visita: Le Corbusier. Segundo
Fernandes o encontro do arquiteto europeu com Lúcio Costa propiciou a confluência
de idéias e de experiências que levaram a concepção do edifício do Ministério de
Educação e Saúde (MES), fruto do “trabalho conjunto de arquitetos, pintores,
escultores e de um inovador paisagismo.”63 É importante ressaltar que a construção
do edifício do MES e a vinda de Le Corbusier ao Brasil não foram fatos isolados,
mas sim a afirmação de um movimento que já havia sido iniciado com a ação de
Warchavchik e Flávio de Carvalho.64
2.1 O Ministério de Educação e Saúde – meados da década de 1930 até 1950
O edifício do MES fazia parte do projeto de Vargas e foi construído como símbolo de
um novo homem brasileiro, representando a brasilidade e o novo através da
linguagem do modernismo.
O papel das artes plásticas dentro do edifício do MES era bem definido, mesmo
antes da visita de Le Corbusier. O edifício marco da arquitetura moderna brasileira
seria como o próprio ministro Capanema queria: uma casa de arte que mostrasse os
valores do homem brasileiro. Mesmo sendo um edifício que possuía uma linguagem
completamente diferente do que se havia fazendo, ele simbolizava o progresso, e
utilizou-se da arte para conectar-se à tradição, como está claro no trecho do
memorial descritivo da primeira proposta do MES, mostrado a seguir:
Pinturas murais nos salões de conferências e recepção, baixos-relevos na
entrada principal e duas grandes figuras em granito nas fachadas norte e
sul retomarão, naturalmente o lugar que lhes compete no conjunto, e o
ministério a cujo cargo se acham os destinos da arte no país terá dado,
assim - na construção da própria casa - o exemplo a seguir, restituindo à
arquitetura, depois de mais de um século de desnorteio, o verdadeiro rumo 65
fiel em seu espírito aos princípios tradicionais.
Segundo Elisabeth Harris, desde o início do projeto, o ministro Capanema imaginara
a sede do Ministério como “um local de trabalho e como uma casa de arte”66. Por
todo o edifício encontram-se obras de arte que foram projetadas por grandes artistas
63
FERNANDES, F. Arquitetura no Brasil no Segundo pós-guerra – a síntese das artes. In: 6º
Seminário DOCOMOMO Brasil. Niterói, 2005. p.02. Disponível em: http://www.docomomo.org.br/.
Acesso em: 2 de Dezembro de 2009.
64
ROSA, R. B. da. Arquitetura, a síntese das artes: um olhar sobre os pontos de contato entre arte e
arquitetura na modernidade brasileira. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: Faculdade de
Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005. p.40.
65
Trecho do memorial descritivo do primeiro projeto desenvolvido pela equipe brasileira antes da
visita de Le Corbusier ao Brasil. In: ROSA, R. B. da. Op.cit., 2005. p.42-43.
66
HARRIS, Elisabeth. Le Corbusier: Riscos Brasileiros. São Paulo: Ed. Nobel, 1987. p.153.
61
como Cândido Portinari, Celso Antônio e Jacques Lipchitz. Outros novos artistas,
como Adriana Janacopulos e Bruno Giorgi tiveram a chance de mostrar seu talento
através de suas esculturas, o que lhes abriu portas para trabalhos posteriores. Além
da pintura e escultura, podem-se destacar também o trabalho do paisagista Roberto
Burle Marx e os móveis desenhados por Oscar Niemeyer.
A relação do edifício com as obras de arte pode ser ilustrada através da localização
em planta das obras espalhadas no edifício. Observemos o esquema a seguir:
Figura 37 – Localização das obras de arte do Ministério de Educação e Saúde. 01 – “Prometeu” (Jacques
Lipchitz); 02 e 03 – Painéis de Azulejos (Portinari); 04 – “Monumento à Juventude” (Bruno Giorgi); 05 –
Revestimento de Azulejos (Portinari); 06 – Painéis “Aula Canto Orfeônico” e “A Energia Nacional”
(Portinari); 07 – Painel “Meninos de Brodósqui” (Portinari); 08 – “Os Quatro Elementos” (Portinari); 09 –
“Os doze ciclos econômicos” (Portinari); 10 – “Mulher Brasileira” (Adriana Janacopulos). Esquema
baseado na ilustração de ROSA, 2005. p.43.
De Portinari o edifício recebeu painéis em têmpera, a óleo e de azulejos. O gabinete
do ministro recebeu painéis realistas que retratavam os doze principais ciclos
econômicos do Brasil, tudo isto com cores tropicais que simbolizam o calor e
umidade do clima brasileiro. A sala de espera principal recebeu uma têmpera
abstrata intitulada de “Meninos de Brodósqui”, e retratava crianças com brinquedos
tradicionais. Já nos escritórios encontram-se quatro pinturas a óleo abstratas que
retratam os quatro elementos (ar, fogo, terra e água). Por fim, as paredes externas
do edifício receberam azulejos com motivos relacionados ao tema “A vida que
desperta para a luz do dia emergindo do mar”. A simplicidade dos motivos entra em
harmonia com a pureza do volume do edifício. As grandes paredes cegas têm sua
“agressividade” atenuada pelos painéis de azulejo, ficam mais humanas, leves. A
estrutura do edifício é destacada dos planos dos painéis, respeitando-os e
trabalhando em conjunto, demonstrando suas funções: estruturas e vedação.
62
Figura 38 (esq.) – Cândido Portinari. Painel "Meninos de Brodósqui". Foto: Fernando Diniz.
Figura 39 (dir.) – Adriana Janacopulos. Escultura "Mulher Brasileira". Foto: Fernando Diniz.
Figura 40 (esq.) – Ministério de Educação e Saúde. Painel de azulejos de Portinari. Foto: Fernando Diniz.
Figura 41 (dir.) – Ministério de Educação e Saúde. Azulejos de Portinari e estrutura destacada. Foto:
Fernando Diniz Moreira.
O escultor Celso Antônio produziu, “Mãe” e “Figura Reclinada”, nus compostos por
volumes geométricos com contornos suaves e feições estilizadas. A escultura para a
praça foi confiada a Bruno Giorgi, que a batizou de “Monumento à Juventude”. Esta
obra é composta por duas figuras jovens em movimento e com feições realistas
simplificadas e deu início a outros trabalhos de Giorgi com Niemeyer em Brasília.
63
Adriana Janacopulos executou a escultura “Mulher Brasileira” para compor com o
terraço-jardim do ministro.
Como dito anteriormente, o paisagismo e o desenho industrial também fazem parte
do acervo artístico do Ministério. Burle Marx executou os projetos do jardim do
ministro, o terraço-jardim, a praça do edifício, além de ajudar Niemeyer com o
desenho do tapete do gabinete do ministro, reprodução do desenho do jardim do
pavimento térreo. Os jardins exuberantes são verdadeiras pinturas abstratas
tridimensionais que se expressam por meio de cores, textura e desenho, e foi com o
projeto do MES que Burle Marx teve a oportunidade de trabalhar com grandes
nomes da arquitetura e arte brasileiras:
Durante a construção do edifício do Ministério de Educação e Saúde, Burle
Marx teve um tipo de pós-graduação informal em pintura, como assistente
de Portinari para seus afrescos e em paisagismo, sob a orientação de Lúcio
67
Costa.
Niemeyer é outra figura que também estava incluída na construção do MES.
Segundo Harris, a curva de Niemeyer apareceu de maneira distinta nas
escrivaninhas do pavimento do ministro e nos balcões da recepção do andar
térreo.68
Percebe-se que as obras de arte percorrem todos os caminhos do Ministério,
principalmente as áreas mais acessíveis ao público. Há uma preocupação dos
projetistas em aproximar as pessoas da arte. A própria volumetria do edifício
juntamente com os altos pés-direitos do térreo, o recuo do edifício e a sua planta em
“T” criam praças e galerias que convidam as pessoas a passar por entre o espaço
das obras. Por vezes, pode-se passar pelo local sem perceber todos os detalhes dos
painéis de azulejos, ou de todas as linhas sinuosas dos jardins de Burle Marx, mas
este é mais um fato que nos faz acreditar que tudo está integrado em perfeita
harmonia, pois nada nos “salta aos olhos”.
Esta relação do edifício e obras de arte faz do edifício do MES um marco para a
arquitetura e arte modernas. A construção deste projeto abriu portas para uma série
67
“During the construction of the Ministry of Education and Health building, Burle Marx had a sort of
na informal post-graduation in painting, as Portinari’s frescoes assistant, and in landscaping, with the
guidance of Lúcio Costa.” In: CAVALCANTI, Lauro. Roberto Burle Marx: Painting, Architecture and
Landscaping in the Creation of a New Language for Gardens. apud: BLASI, Ivan; TOSTÕES, Ana.
Op. cit., Summer 2010. p.70.
68
HARRIS, Elisabeth. Op.cit., p.165.
64
de parcerias entre artistas e arquitetos que foram desenvolvidas anos depois e a
relação entre artes plásticas e arquitetura se mostrou presente muitas outras obras.
Paralelamente ao projeto e construção do edifício do MES, as discussões sobre
integração das artes continuavam. Em 1937, foi criado o Sindicato dos Artistas
Plásticos de São Paulo. Em 1939, o artista Lívio Abramo propôs aos artistas do III
Salão de Maio sugerirem ao então prefeito de São Paulo, Prestes Maia, a
participação dos artistas plásticos na edificação de prédios e logradouros públicos
tendo como objetivo aproximar as pessoas da arte através da inserção dos murais e
esculturas nas edificações. Há ainda no mesmo ano, a execução de três painéis de
Portinari para o Pavilhão Brasileiro da Feira Mundial de Nova Iorque, projetados por
Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, que também tinha a escultura “Mulher Reclinada”, do
escultor Celso Antônio.
Figura 42 (esq.) – Vista do interior do pavilhão com as telas de Portinari ao fundo. Fonte: www.jobim.org.
Figura 43 (dir.) – Escultura “Mulher Reclinada”, de Celso Antônio. Fonte: www.jobim.org
Entre 1942-44, Oscar Niemeyer projetou o Conjunto da Pampulha, em Belo
Horizonte, que possui em seus edifícios colaboração com artistas como Cândido
Portinari, Alfredo Ceschiatti, August Zamoisky, Roberto Burle Marx, Tomás Santa
Rosa, Percy Deane, José Pedrosa e Paulo Werneck. Quirino Campofiorito, em seu
texto “As artes plásticas na arquitetura moderna brasileira” destaca a importância do
Conjunto da Pampulha em relação à síntese das artes.
65
O edifício do Ministério da Educação e Saúde é o marco dessa mesma
quebra [o predomínio dos velhos padrões acadêmicos] na arquitetura. [...] O
Conjunto da Pampulha (em Belo Horizonte), o edifício da Associação
Brasileira de Imprensa (Rio de Janeiro) e exemplos que surgem no Recife e
em São Paulo afirmam definitivamente o compromisso de uma atuação
69
inventiva e criadora por parte de nossos arquitetos.
No ano de 1945, ocorreu o I Congresso Brasileiro de Arquitetos. Neste evento, o
arquiteto Carlos da Silva Prado apresentou seu texto intitulado “Da boa vizinhança
entre as Artes Plásticas” que enfatizava a necessidade de padronização e
industrialização dos materiais de construção, sem, contudo perder de vista o bem
estar do homem e suas aspirações estéticas, aqui representadas pela integração
das artes.70
Ainda no mesmo ano, aconteceu na Galeria Askanasy, no Rio de Janeiro, uma
exposição intitulada “Arte Condenada pelo III Reich” com a presença de nomes
como Wassily Kandinsky e Paul Klee. Além disso, é neste ano que Portinari
completa os últimos painéis para o edifício do MES.
Em 1947, o arquiteto Affonso Eduardo Reidy projeta o Conjunto Habitacional do
Pedregulho, que recebe obras de Cândido Portinari (painel da fachada do ginásio) e
Roberto Burle Marx (painel em mosaico no corredor térreo), elogiados por Max Bill,
em 1953, e por Le Corbusier em sua visita ao Brasil, em 1962.71 Sobre o painel de
Portinari, Yves Bruand destaca:
[...] a massa do ginásio é aliviada pela estrutura fina de sua cobertura, que
reestabelece a unidade de expressão, e esta é ainda reforçada pela hábil
disposição cruzada dos elementos decorativos: ao admirável painel de
azulejos de Portinari, onde crianças que brincam de pular carniça correm
por uma grande composição abstrata determinada pelas variações nas
tonalidades de azul do fundo, corresponde a parede vazada do corredor da
escola, enquanto a simples parede de tijolos nus do lado menor da escola
faz contraponto à austeridade das grandes fachadas da construção
72
esportiva.
Em 1948, o artista plástico americano Alexander Calder visitou o Brasil. Exposições
sobre a obra de Calder aconteceram no Rio de Janeiro e no MASP, em São Paulo, e
69
CAMPOFIORITO, Quirino. As artes plásticas na arquitetura moderna brasileira. In: XAVIER, Alberto
(org.). Depoimentos de uma geração: Arquitetura Moderna Brasileira. São Paulo: Cosac & Naify,
2003. p.323.
70
PRADO, C. S. Da Boa Vizinhança entre as Artes Plásticas. 1º Congresso Brasileiro de Arquitetos.
In: Revista Acrópole n.83. Março 1945, p. 301-302. apud. FERNANDES, F. Op.cit., 2005. p.05.
Disponível em: http://www.docomomo.org.br/. Acesso em: 2 de Dezembro de 2009.
71
SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no BrasIl, 1900-1990. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 1997. p.119.
72
BRUAND, Yves. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2005. p.229.
66
o crítico de arte Mário Pedrosa fez uma conferência sobre o artista no auditório do
Ministério de Educação e Saúde. Este fato reforça a importância do edifício do MES
na relação entre artes plásticas e arquitetura. À convite da Associação Paulista de
Medicina, o arquiteto paulista Rino Levi apresentou uma palestra intitulada Técnica
Hospitalar e Arquitetura. Apesar do foco na questão da arquitetura hospitalar, Levi
falou sobre o papel do arquiteto, afirmou a arquitetura como arte social e o mais
importante: falou sobre critica o a separação entre artes plásticas e arquitetura.73
Não é descabido frisar um ponto de máxima importância: o fato lamentável,
hoje, da pouca possibilidade para o arquiteto realizar nas suas obras
trabalhos em colaboração com pintores e escultores. No passado, essa
colaboração era íntima e normal.
[...] existe hoje inexplicável preconceito contra o afresco, um mosaico ou
um motivo esculpido. À primeira vista, esse preconceito poderá parecer
medida de economia; no entanto encontramos freqüentemente obras
construídas com materiais até excessivamente suntuosos em relação ao
74
objetivo plástico.
O apelo de Levi nos mostra que, mesmo numa época em que a arquitetura brasileira
estava iniciando colaborações importantes entre artistas e arquitetos, este era um
objetivo que não estava consolidado. No mesmo ano em que o texto de Levi é
publicado na L’Architecture d’Aujourd’hui, outras colaborações importantes
continuaram a aparecer. Neste mesmo ano, trabalharam juntamente com Portinari
para a confecção de um painel para o Banco Moreira Salles, em Paris, os artistas
Mário Gruber, Luís Ventura e Otávio Araújo.75
73
O texto sobre esta palestra foi publicado inicialmente na revista francesa L’Architecture
d’Aujourd’hui nº27, em dezembro de 1949, e posteriormente, foi publicada em português em:
ARANHA, Maria Beatriz de C. Rino Levi: Arquitetura como ofício. In: Revista Oculum. Campinas,
nº03, p.46-52, março, 1993.
74
LEVI, Rino. A arquitetura é arte e ciência. In: XAVIER, Alberto (org.). Op.cit., 2003. p.317.
75
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. p.410.
67
2.2 A década de 1950 e a integração das artes
No ano de 1950 aconteceu uma exposição de pinturas, esculturas e projetos de
arquitetura de Max Bill, no Museu de Arte de São Paulo.76 Houve também a 1ª
Exposição da Oficina de Artes, no IAB-SP. Neste encontro, o arquiteto paulista Rino
Levi fez uma exposição com um novo apelo por uma integração entre pintura e
arquitetura no Brasil.77 Foi nesta época que Levi projetou a Residência Olivo Gomes
(1949-51), que uniu o trabalho do arquiteto ao do artista plástico e paisagista
Roberto Burle Marx. Nesta residência destaca-se um grande painel de Burle Marx no
térreo, ocupando uma parede inteira, como se a obra de arte substituísse o
elemento arquitetônico, fazendo parte da arquietura.
Figura 44 (esq.) – Residência Olivo Gomes. Fonte: Acervo Digital Rino Levi / FAU PUC-Campinas.
Figura 45 (dir.) – Painel de Roberto Burle Marx para a Residência Olivo Gomes. Fonte: www.flickr.com.
Como visto no fim do capítulo anterior, a partir de 1951 começou a acontecer as
Bienais Internacionais de Artes de São Paulo e, segundo Ferreira Gullar, foi depois
do encontro de 1951 que ocorreu a redescoberta da arte abstrata que deriva de
vanguardas como o Neoplasticismo de Mondrian de Doesburg. Esta redescoberta
“iria, daí em diante, desbancar, particularmente no Brasil, a arte figurativa de
Portinari. Segall, Di Cavalcanti, Bruno Giorgi, Guinard e Pancetti.”78
Entre as duas bienais, no também discutido Congresso Internacional de Artistas
(1952) ocorrido em Veneza, Lúcio Costa apresentou o texto “A crise da arte
contemporânea”, onde criticava a postura de alguns artistas de usarem a arquitetura
76
AMARAL, Aracy (coord.). Arte construtiva no Brasil: Coleção Adolpho Leirner. São Paulo: DBA,
1998. p. 284.
77
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. loc. cit.
78
GULLAR, Ferreira. O Grupo Frente e a Reação Neoconcreta. In: AMARAL, Aracy (coord.). Op. cit.,
1998. p. 144.
68
como um pano de fundo para suas obras, sem uma relação maior com essa. Ou
seja, Costa criticou os artistas que:
[...] às vezes imaginam a arquitetura como uma espécie de background ou
de cenário construído expressamente para a valorização da arte verdadeira:
ou senão, que aspiram a uma fusão um tanto cenográfica das artes, no
79
sentido, por exemplo, da arte barroca.
Como antídoto contra esse equívoco, defendeu que:
[...] a arquitetura seja concebida como consciência plástica, isto é, que o
próprio arquiteto deve ser artista. Porque só então a obra plástica do pintor
e do escultor poderá integrar-se no conjunto da composição arquitetural
como um de seus elementos constitutivos, embora dotada de valor plástico
80
e autônomo.
Figura 46 - Pavilhão da I Bienal do Museu de Arte Moderna, Trianon, Avenida Paulista, 1951. Foto: Hans
Günter Flieg. In: AMARAL, 1987. p.267.
Foi visto também no capítulo anterior que em 1953-54, ocorreu a II Bienal de São
Paulo. Este evento ficou conhecido como a “Bienal Guernica” e trouxe retrospectivas
sobre o trabalho de importantes artistas modernos, como Pablo Picasso, Alexander
Calder, Piet Mondrian, Paul Klee e outros. Havia também exposição sobre os
trabalhos do arquiteto Walter Gropius.81
Assim como nestes eventos, foi também no início da década de 1950 que no Brasil
houve a consolidação do Concretismo (1952), movimento que defendeu
explicitamente a relação entre arquitetura e artes plásticas. O ideal plástico
79
COSTA, L. A crise da Arte Contemporânea. In: Arquitetura Contemporânea (revista bimestral). Rio
de Janeiro. Agosto-Setembro de 1953. p.02-03. apud. FARIAS, A. A. C. Athos Bulcão, conhecido e
ignorado. In: Pensar Athos: Olhares Cruzados. Brasília: Fundação Athos Bulcão, 2008. p.14.
80
Idem.
81
AMARAL, Aracy (coord.). Op. cit., 1998. p. 289.
69
concretista privilegiou a organização dos espaços, a estruturação de formas e cores
desvinculadas de conteúdos extra-pictóricos e explorou o pensamento geométrico
migrando para o espaço. Esta vanguarda chegou ao Brasil através de grupos de
artistas em São Paulo, como o Ruptura, liderado por Waldemar Cordeiro e Geraldo
de Barros, e com a presença de artistas como Luiz Sacilotto, Lothar Charoux, Anatol
Wladyslaw, Kazmer Féjer e Leopold Haar e pelo Grupo Frente, fundado no Rio de
Janeiro no final de 1953, e que tinha como líder Ivan Serpa, e que fez quatro
exposições, ao todo.82 Na segunda mostra, ocorrida em 1955, o Grupo Frente
demonstrou mais claramente sua linguagem construtivo-geométrica e buscou,
principalmente através do trabalho de Lygia Clark, integrar a pintura à arquitetura.
Em 1956, após mais duas exposições, o Grupo Frente se dissolveu e deu origem ao
Movimento Neoconcreto (1959).
Os dois grupos concretistas, desenvolvidos respectivamente em São Paulo e Rio de
Janeiro tinham diferenças entre si, como lembra Ferreira Gullar:
[a situação da arte concreta em São Paulo na primeira metade da década
de 1950] assume uma posição mais radical do conceito puramente visual da
forma através de uma preocupação maior com a dinâmica visual e os
efeitos da construção seriada do que os cariocas do Grupo Frente, que
mostravam uma preocupação pictórica de cor e matéria e não obedeciam a
um código estético rígido, tendo a linguagem geométrica como um campo
83
aberto à experimentação e indagação.
Em 1956, Lygia Clark publicou um texto intitulado “Uma experiência de integração”,
onde destacou algumas preocupações do movimento, como a integração das artes:
Para desenvolver bem todas as possibilidades seria necessário, antes de
mais nada, uma aplicação prática da idéia, tendo como colaboradores um
arquiteto e um escultor (que trabalharia, a meu ver, no sentido funcional,
84
projetando móveis, esculturas em forma de apliques para luz, etc.).
E lembrou aos arquitetos a importância da interação com outros artistas:
[...] acho importantíssimo que vocês, arquitetos moços, procurem um
contato mais estreito com os artistas plásticos para estudar e aprofundar
82
Da mostra inaugural, ocorrida em junho de 1954, participaram os pintores Aluísio Carvão, Carlos do
Val, Décio Vieira, Ivan Serpa, João José da Silva Costa, Lygia Clark, Lygia Pape e Vicente Ibberson.
Já da segunda, ocorrida no ano seguinte participaram mais sete artistas, sendo eles: Abraham
Palatnik, César Oiticica, Elisa Silveira Martins, Eric Baruch, Franz Weissmann, Hélio Oiticica e Rubem
Ludolf. Fonte: GULLAR, Ferreira. O Grupo Frente e a Reação Neoconcreta. In: AMARAL, Aracy
(coord.). Op. cit., 1998. p. 146.
83
GULLAR, Ferreira. Etapas da Arte Contemporânea: do cubismo à arte neoconcreta. Rio de Janeiro:
Revan, 1998. apud: ROSA, R. B. da. Op.cit., 2005. p.28.
84
CLARK, Lygia. Uma Experiência de Integração. In Brasil-Arquitetura Contemporânea nº.8, Rio de
Janeiro, 1956.
70
essa e outras experiências já feitas neste mesmo sentido. Não chamem o
85
artista no fim de um projeto, tendo com ele essa atitude ‘patriarcal’...
O Movimento Neoconcreto teve início na inauguração da I Exposição de Arte
Neoconcreta, ocorrida em 1959 no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro,
evento que marcou também o lançamento do manifesto da vanguarda. Este
manifesto foi assinado pelos artistas: Aluísio Carvão, Almicar de Castro, Franz
Weissmann, Lygia Clark, Lygia Pape, Reynaldo Jardim, Theon Spanudis e Ferreira
Gullar. A exposição de Lygia Clark pareceu demarcar o momento exato da transição
do Grupo Frente para o Movimento Neoconcreto. Segundo Ferreira Gullar, Clark
migrou do espaço bidimensional, e passou para a terceira dimensão, evoluindo suas
telas à serie “Bichos”:
[Clark] extrapola do espaço da tela para incluir na composição a própria
moldura. Esse fato – a que nem ela mesma havia dado atenção – parecia
deixar evidente o início do rompimento com a tela enquanto espaço
pictórico – espaço de representação simbólica – e a proposta de torná-la um
86
objeto da pintura.
Além da realização do Concretismo e da formação do Neoconcretismo, a década de
1950 foi marcada por importantes realizações da integração das artes na produção
da arquitetura moderna paulista, principalmente na chamada brutalista. Assim como
já foi citado, a arquitetura paulista, neste momento, estava recebendo a invasão
muralista e isto pode ser ilustrado pelas imagens de várias fotos de importantes
obras da época. Várias parcerias entre arquitetos e artistas começaram a ser
desenvolvidas neste momento, como foi o caso de Vilanova Artigas e Mário Gruber
e que pode ser exemplificada através do projeto da Residência Rubem Mendonça
(1958) ou da Escola de Guarulhos (1960).
85
Idem.
GULLAR, Ferreira. O Grupo Frente e a Reação Neoconcreta. In: AMARAL, Aracy (coord.). Op.cit.,
1998. p.156.
86
71
Figura 47 (esq.) – Vilanova Artigas. Residência Rubem Mendonça. Painel de Mário Gruber. Fonte: Masao
Kamita.
Figura 48 (dir.) – Vilanova Artigas. Escola de Guarulhos. Painel de Mário Gruber. Fonte: Masao Kamita.
A Residência Rubem Mendonça possui um grande painel de Mário Gruber que
ocupa toda a fachada para a rua. A fachada é marcada pelos triângulos brancos e
azuis, e o painel não deve ser visto como adorno na fachada, assim como Buzzar
afirma:
Como as fotos revelam, a idéia de painéis que adornam a fachada é
totalmente equivocada. Há uma materialidade na geometria espacial
interior, nos detalhes dos degraus, teto e pilares, que tornam os triângulos
representações de seriação, mas sobretudo, de criação, como a indicar que
87
a padronização é o início de uma elaboração artística e não o seu fim.
Assim, percebemos que a obra de arte faz realmente parte da obra arquitetônica. As
duas caminham juntas, uma completa a outra, e não podem ser vistas separadas.
Percebe-se que o painel está tão integrado com a edificação que ele substitui a
superfície da arquitetura – ele não está na parede, ele é a parede.
Já na Escola de Guarulhos, o painel de Gruber se localiza na parte interna. Ele
proporciona cor e constitui o fechamento do espaço. Ele substitui uma parede de
vedação, de limitação do espaço, ou seja, para o entendimento do espaço e suas
limitações, o painel assume esta função. Outro ponto importante é a sua localização:
num grande espaço de concentração de pessoas. Tanto na Residência Rubem de
Mendonça quanto na Escola de Guarulhos a obra de arte se localiza em locais de
fácil acesso aos observadores, contribuindo para o embelezamento da cidade e
facilitando mais uma função: a comunicação.
Percebemos então que após o edifício do MES, várias tentativas de se integrar arte
e arquitetura foram buscadas, e muitas conseguiram se firmar como realizações de
87
BUZZAR, Miguel A.Triângulos e a casa: Uma promenade pela Casa Rubens Mendonça. In: Risco Revista de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo, v.4, 2006. p.260.
72
grande importância para a arquitetura nacional. Segundo Mário Barata, em seu texto
“A arquitetura como plástica e a importância atual da síntese das artes”, escrito em
1956, a atuação de muitos arquitetos brasileiros mostram esta procura da união
entre as artes plásticas. Segundo ele, a busca da obra de arte total estava sendo
perseguida.
A atuação brasileira das equipes de Niemeyer, de Reidy e de outros
profissionais se situa nessa transformação de posições estéticas, relativas
ao princípio da comunhão das artes. [...] há uma noção de grande
importância que passa despercebida à consciência do nosso tempo, mas
age nas decisões e na realização objetiva de arquitetos e outros artistas: A
idéia profunda da arquitetura como arte total, isto é, não como construção,
mas no papel de geradora e incorporadora de várias artes, que lhe ficam
subsidiárias. É o problema da integração das artes na arte “maior”, [...] ou o
88
da integração recíproca das mesmas.
2.3 Herança da Escola Carioca e a fundação de Brasília – década de 1960
No mesmo ano em que o Movimento Neoconcreto surgiu, em 1959, aconteceu o
Congresso Internacional de Críticos de Arte, que teve como palco três cidades
brasileiras: a recém-construída Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro, e como tema:
“Cidade Nova, Síntese das Artes”. O tema fez referência a Brasília como uma cidade
obra de arte coletiva que coloca em prática a idéia da síntese das artes em toda sua
escala.
Ao tomar Brasília, a cidade nova, como uma obra de arte coletiva,
queremos com isso dizer que a arte se introduz na vida de nossa época,
não mais como obra isolada, mas como um conjunto das atividades
89
criadoras do homem.
A união de esforços criativos coordenados pelo Plano significa a integração
da arte num projeto político cultural, o que implica na participação da esfera
mais ampla da sociedade, envolvendo artistas, Estado, indústria e
90
trabalhadores.
Este congresso teve participação de importantes figuras, como André Bloc, Giulio
Carlo Argan e Bruno Zevi.91 Em linhas gerais, sobre o encontro podemos destacar:
Segundo Pedrosa, o congresso se colocava com a dupla finalidade de
pensar Brasília no panorama geral do país e também de situá-la como
88
BARATA, Mário. A arquitetura como plástica e a importância atual da síntese das artes. In:
XAVIER, Alberto (org.). Op.cit., 2003. p.320.
89
PEDROSA, Mário. Dos Murais de Portinari aos Espaços de Brasília. São Paulo, Editora
Perspectiva, 1981. p.356.
90
KAMITA, João Masao. Arquitetura Moderna e Neoconcretismo: uma experiência da geometria. In:
SEGRE, Roberto (et al.). Arquitetura+arte+cidade: um debate internacional. Rio de Janeiro: Viana &
Mosley, 2010. p.223.
91
FERNANDES, F. Op.cit., 2005. p.09-11. Disponível em: http://www.docomomo.org.br/. Acesso em:
2 de Dezembro de 2009.
73
símbolo de nossa época no quadro da situação mundial. [...] O tema do
Congresso – A cidade nova. Síntese das Artes, recolocava a questão da
integração das artes em toda sua escala , tendo em vista uma cidade
inteiramente planejada e pensada a serviço do homem. A partir do tema
central os trabalhos se desenvolveram em função das seguintes sessões
temáticas: A cidade nova; urbanística, técnica e expressividade, arquitetura,
artes plásticas, artes industriais, educação artística, situação das artes na
92
idade moderna.
Embora Brasília fosse a cidade para onde os olhares estavam voltados, algumas
outras colaborações entre arquitetos e artistas, inclusive fora do território brasileiro
foram citadas, como no caso da exposição de André Bloc:
André Bloc inicia sua comunicação destacando o fato de que a arquitetura
brasileira muitas vezes se valeu da colaboração de artistas como na obra da
Pampulha de Oscar Niemeyer e também no Conjunto Residencial de
Pedregulho, projeto de Afonso Eduardo Reidy. Destaca também outros
exemplos da adoção dessa solução em território Latino-americana como a
Cidade Universitária de Caracas, projeto do arquiteto Villanueva que
recorreu colaboração de artistas abstratos como Fernand Leger e Henri
Laurens. Relaciona a concepção dessa obra às proposições do Grupo
Espaço de Paris baseadas na arte abstrata e ainda outras experiências na
região parisiense com a utilização de estudos de policromia em fábricas e
prédios.
Bloc propõe também um olhar retrospectivo aos movimentos de vanguarda
que estabeleceram estreita relação entre pintura e arquitetura contribuindo
para a concepção da linguagem abstrata na arquitetura. Destaca as
pesquisas realizadas nesse campo pelo neoplasticismo holandês e também
por Le Corbusier, que preconizam a utilização da cor com diretrizes
bastante diferentes. Sob o título de síntese das artes Le Corbusier propõe a
policromia arquitetural, certas composições murais e mesmo o emprego de
93
relevos de cimento armado.
Segundo Fernandes, as diferentes apresentações ocorridas no congresso
abrangeram as várias dimensões possuídas pela questão da síntese das artes, e
acabaram recaindo no conhecido confronto entre arte e estética x indústria e
tecnologia do século XX, entretanto, este fato não nos impede de concluir que
Brasília possui uma arquitetura que mantém o diálogo entre arte e arquitetura.94
A década de 1960 se iniciou numa ambiência de uma fervorosa produção artística e
busca de progresso. Brasília, cidade discutida no ano anterior no Congresso
Internacional de Críticos de Arte, expôs em seus edifícios as mais variadas obras de
arte.
92
ibidem. p.09.
ibidem. p.13-14.
94
ibidem. p.15.
93
74
Sob a égide de formar uma cidade-escultura, cidade-pintura e cidadearquitetura, Brasília foi a experiência mais intensa na relação entre as artes
95
plásticas e a arquitetura na modernidade brasileira.
Em Brasília, a dimensão artística poderia ser analisada em duas escalas diferentes:
a urbanística e a do edifício. Visto que esta pesquisa busca analisar a escala do
edifício, nesta, em relação à Brasília, os edifícios reúnem obras de vários artistas.
Destas parcerias desenvolvidas, merece maior destaque aquela firmada entre Oscar
Niemeyer e Athos Bulcão. A atuação de Athos Bulcão em Brasília é algo ímpar.
Athos acreditava no “sentido pedagógico da reaproximação entre as artes e em
sintonia com o ‘espírito coletivo’ comum a todos os artistas e arquitetos
encarregados de erguer a nova capital.”96
Os painéis de Athos Bulcão em Brasília trabalham a questão da percepção
como base para sua construção formal, em que primeiro se tem a
percepção do todo, depois das partes e finalmente da relação entre os
elementos que compõe. Esse sentido didático-pedagógico, somado com a
expansão pictórica do muralismo identificam-se profundamente com a
proposição de Brasília e resulta em um novo momento na relação entre as
artes plásticas e arquitetura, ao menos no muralismo como forma de
97
conectá-las.
Diferentemente dos painéis de Portinari ou Di Cavalcanti, Athos Bulcão possui uma
linguagem abstrata, podendo-se fazer uma aproximação com a produção do
concretismo, principalmente em relação ao uso de módulos-padrão. O artista
desenvolveu sua obra principalmente em murais de azulejos com módulos
combinados, às vezes de forma aleatória. Estes murais poderiam “desmaterializar”
os planos onde estavam inseridos. Apenas no painel da Igreja de Nossa Senhora de
Fátima (1957) Athos utilizou uma linguagem figurativa, e segundo Sérgio Duarte,
este é um sinal da reminiscência da colaboração com Portinari, iniciada dez anos
antes.98 Neste painel, o artista revestiu as paredes com azulejos em tons de azul e
branco apresentando desenhos geometrizados da “Pomba do Divino” e da “Estrela
da Natalidade”.
95
ROSA, R. B. da. Op.cit., p.63.
ibidem. p.64.
97
ibidem. p.65.
98
DUARTE, Sérgio. Sentido e Urbanidade. In: CABRAL, Valéria M. L. (org.) Athos Bulcão. Brasília:
Fundação Athos Bulcão, 2009. p.19.
96
75
Figura 49 (esq.) – Oscar Niemeyer. Igreja Nossa Senhora de Fátima. Azulejos de Athos Bulcão. Foto: A
autora.
Figura 50 (dir.) – Athos Bulcão. Azulejos para a Igreja Nossa Senhora de Fátima. Foto: A autora.
Vários outros edifícios em Brasília possuem murais de Athos, como é o caso do
Aeroporto Juscelino Kubistchek, Palácio do Itamaraty ou Palácio do Planalto, mas foi
no Teatro Nacional que Athos realizou um de seus trabalhos mais importantes. A
pedido de Niemeyer, Athos fez uma intervenção por meio de um mural
tridimensional, com blocos padronizados em três diferentes tamanhos e organizados
em posições diferentes.
No Teatro Nacional, Niemeyer ficou descontente com a empena cega
daquela pirâmide semi-enterrada. Ele pediu a Athos uma solução e este
99
trouxe aqueles relevos em forma de cubo, algo genial.
Figura 51 (esq.) – Oscar Niemeyer. Teatro Nacional. Painel de Athos Bulcão. Foto: A autora.
Figura 52 (dir.) – Blocos do painel externo do Teatro Nacional. Foto: A autora.
Segundo Rosa, o mural tridimensional de Athos ajudou a eliminar o excesso de peso
do volume. Para o interior, o artista também projetou painéis com baixo-relevo,
99
Entrevista com Agnaldo Farias concedida a Evelise Grunow e publicada na Revista
PROJETODESIGN, edição 345, Novembro de 2008.
76
enquanto que Burle Marx projetou os jardins. Todas estas junções fazem do Teatro
Nacional um dos melhores exemplos de integração das artes em Brasília. Para o
arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé), o painel é parte integrante do edifício: “Athos
interfere de tal forma na arquitetura que seria impossível pensar o Teatro Nacional
sem os elementos que ele estudou para a fachada. [...] A integração se dá na
medida em que a arte proposta por Athos responde às exigências do projeto de
arquitetura.”100
Figura 53 (esq.) – Roberto Burle Marx. Jardins do Teatro Nacional. Fonte: MONTERO, Marta. Burle Marx –
El paisaje lírico. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 2001. p. 133.
Figura 54 (dir.) – Athos Bulcão. Painel de mármore para o Teatro Nacional. Foto: A autora.
A união da obra de Athos com os edifícios é tão forte que chegou a ser comparada
por André Correia do Lago com as obras das Cidades Universitárias do México e de
Caracas. Segundo este autor, Athos Bulcão chegou próximo a Biblioteca Central da
Universidade do México no Teatro Nacional de Brasília:
Athos chegou próximo a isso no Teatro Nacional de Brasília. As fachadas
laterais, uma das quais é a que está voltada para a Esplanada dos
Ministérios, estão totalmente dominadas pelo alto-relevo do artista,
monocromática e que, dependendo da luz do dia, apresenta efeitos variados
101
de luz e sombra.
***
Dessa forma, podemos observar que a arquitetura moderna, foi utilizada como meio
de simbolizar o progresso, o novo, como também para reaproximar a arquitetura das
artes plásticas. A construção do Ministério de Educação e Saúde na década de 1930
100
Entrevista concedida pelo arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé) à Cláudia Estrela Porto, publicada
em: PORTO, Cláudia E. Athos Bulcão: a linha tênue entre arte e arquitetura. In: CABRAL, Valéria M.
L. Op.cit., 2009. p.35.
101
LAGO, André C. Athos Bulcão. In: CABRAL, Valéria M. L. Op.cit., 2009.
77
com a utilização da arte como elemento comunicador e aglutinador do homem em
relação à cultura demonstra a importância que a união entre as artes plásticas e
arquitetura representa para a sociedade. As parcerias entre arquitetos e artistas
plásticos contribuíram para a construção da imagem de um novo homem brasileiro e
assumiram seu papel de melhoramento social através da arte. Muitas outras obras
perseguiram o mesmo objetivo, a exemplo das construções do Conjunto da
Pampulha ou do Conjunto Habitacional do Pedregulho. As explorações realizadas
pelos grupos concretos e neoconcretos foram de grande valia para a integração dos
diferentes tipos de arte, sobretudo da pintura e arquitetura. A construção de Brasília
também foi um acontecimento essencial para comprovar que arte e arquitetura
devem caminhar juntas, e estes grandes acontecimentos acabaram por influenciar
arquitetos e artistas de todo o país. Em Pernambuco não foi diferente, como
veremos no capítulo a seguir.
78
CAPÍTULO 3
PERNAMBUCO
3. PERNAMBUCO
Assim como ocorreu no eixo Rio de Janeiro – São Paulo, o estado de Pernambuco
também assistiu a uma rica interação entre artistas e arquitetos já no nascimento de
sua arquitetura moderna. No fim dos anos 1920, Recife já apresentava discussões
modernistas. O Congresso Regionalista em 1926, os Salões de Belas Artes de
Pernambuco de 1929 e 1930, e a primeira exposição de arte moderna do Recife em
1933 foram alguns eventos que comprovaram a riqueza e intensidade desses
debates. Aracy Amaral destaca vários acontecimentos em seu livro Arte pra que?: a
preocupação social na arte brasileira 1930-1970 que citam como palco a cidade de
Recife.
O Modernismo pernambucano, com seus fundamentos na modernidade,
não passou necessariamente pelos canais da Semana de Arte Moderna.
102
Teve seus critérios, seu campo específico e desdobramentos próprios.
Dessa forma, procuraremos neste capítulo, situar o leitor sobre alguns
acontecimentos principais dentro das artes ocorridos no período estudado e nas
cidades de Recife e Olinda. Como acreditamos que os leitores dessa dissertação
serão na maior parte arquitetos, o foco principal da primeira parte será nas artes
plásticas, embora a arquitetura também esteja incluída.103 Este item foi realizado por
meio de pesquisa bibliográfica e entrevistas. Contudo, as entrevistas nos revelaram
vários detalhes gerais importantes sobre as relações arquitetos-artistas plásticos, o
que nos motivou a criar uma segunda parte para tratar especificamente destes
dados.
3.1 Arte no Recife/Olinda
No fim do século XIX, a Escola do Recife era o centro da cultura pernambucana, que
proporcionou as bases para as primeiras décadas do século XX. Era nela que
aconteciam as mais diversas discussões, seja sobre temas de correntes filosóficas,
sociológicas, literárias ou jurídicas. Estavam incluídos no seio da Escola do Recife
102
HERKENHOFF, Paulo. Do Recife, para o mundo: O Pernambuco Moderno antes do Modernismo.
In: TREVI, Carlos (coord.) Pernambuco Moderno. Recife: Instituto Cultural Bandepe, 2006. p.28.
103
Caso o leitor queira aprofundar seu conhecimento sobre a arquitetura moderna em Pernambuco,
consultar autores como: Fernando Diniz Moreira, Geraldo Gomes da Silva, Luiz do Eirado Amorim,
Guilah Naslavsky, entre outros.
pensadores como Tobias Barreto e Graça Aranha, este último um dos organizadores
da Semana de Arte Moderna.104
Em 1924, Oswald de Andrade escreveu uma carta relatando a Joaquim Inojosa sua
surpresa ao conhecer a cidade do Recife. Ficou impressionado com as belezas da
cidade e criticou aqueles que a ignoram:
Linda a cidade, o Recife. Foi uma surpresa para mim. Como é que no Brasil
existe uma cidade de aspecto tão encantador [...] e a ignora a maioria dos
105
sulistas?
Sobre a produção artística da cidade, Andrade fala da importância dos artistas de
outras cidades conhecê-la:
[...] para a formação da pintura, da arquitetura e da poesia brasileira, tem o
artista de visitar o Recife, porque aqui encontrará fontes emocionais de
106
primeira grandeza.
No início dos anos 1920 a cidade do Recife já mostrava traços da modernidade.
Bairros como Boa Viagem e Derby estavam em expansão. Souza Barros destaca a
importância do Recife para a região:
O movimento modernista do Nordeste localizou-se quase exclusivamente
no Recife. [...] Era uma cidade com emulação, com um porto de região, com
livrarias que se orgulhavam de acompanhar o vient-de-paraitre de Paris e
107
de outras Capitais européias.
Neste ano de 1922, o Recife estava sendo tomado por uma arte nova, com motivos
nacionais. “Em 1922, Recife já tinha sua lente moderna para ver o mundo e já tinha
sua fala própria com as mudanças urbanísticas, a pintura dos irmãos Rego Monteiro,
a poesia de Manuel Bandeira, o cordel e o frevo modernos e a sociologia de Gilberto
Freyre.”108
Em 1922, Freyre publicava seu primeiro artigo, Vida social no Brasil em
meados do século XIX, um corte epistemológico em nossas ciências
sociais. 1922 é o ano do primeiro tempo modernista, marcado pela pulsão
de atualização internacional das linguagens no Brasil. Em 1922, os
104
HERKENHOFF, Paulo. Do Recife, para o mundo: O Pernambuco Moderno antes do Modernismo.
In: TREVI, Carlos (coord.). Op. cit., 2006. p.28-29.
105
Entrevista a Joaquim Inojosa em Jornal do Commercio, Recife, 21 de Junho de 1924. In: O
movimento modernista em Pernambuco. Rio de Janeiro, Gráfica Tupy, 1968, vol.01. p. 142-43. Apud:
Idem.
106
ibidem. p.29.
107
BARROS, Souza. A década de 20 em Pernambuco. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do
Recife, 1985. p.154.
108
HERKENHOFF, Paulo. Do Recife, para o mundo: O Pernambuco Moderno antes do Modernismo.
In: TREVI, Carlos (coord.). Op. cit., 2006. p.30.
81
pernambucanos já haviam antecipado o segundo tempo, vinculado à
109
elaboração de uma arte nacional.
Em 1922, não havia um ateliê no Brasil, no Rio ou São Paulo, com tão
110
intensa invenção como naquele dos irmão Rego Monteiro.
Durante a Semana de 22, Gilberto Freyre encontra-se em Paris, onde mantém
contato com modernistas brasileiros, inclusive freqüentando o ateliê dos irmãos
Rego Monteiro. Também é em Paris que Freyre conhece Tarsila do Amaral,
Brecheret e Oswald de Andrade: “Em Paris, estive muito com Vicente do Rego
Monteiro, Tarsila do Amaral, Brecheret, todos em fase de assimilarem
vanguardismos europeus para transferirem para o Brasil.”111
Quando Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral chegaram em Paris, em 1923,
encontram Vicente do Rego Monteiro com uma produção baseada em questões
indígenas. Vicente havia iniciado um estudo sobre objetos da arqueologia
amazônica, em 1920. Deste estudo surgiram desenhos que retratam lendas
indígenas e que foram exibidos entre 1919 e 1921 no Recife, São Paulo e Rio de
Janeiro. Segundo Herkenhoff, “este é um marco inicial do processo de formulação
da brasilidade”.112 “Assim, é Vicente do Rego Monteiro quem ensina ao casal
Oswald e Tarsila a arte de transformar o Brasil em questão plástica da arte
moderna.”113
109
ibidem. p.38.
HERKENHOFF, Paulo. 1922, um ano sem arte moderna. In: Arte brasileira na coleção Fadel – da
inquietação do moderno à autonomia da linguagem. Rio de Janeiro: CCBB, 2002. p.30-67. apud
Idem.
111
Trecho do livro Tempo morto e outros tempos (1922), de Gilberto Freyre. In: REZENDE, Antônio
Paulo. (Des)Encantos modernos: histórias da cidade do Recife na década de vinte. Recife:
FUNDARPE, 1997. p.151.
112
HERKENHOFF, Paulo. Do Recife, para o mundo: O Pernambuco Moderno antes do Modernismo.
In: TREVI, Carlos (coord.) Op.cit., 2006. p.38.
113
ibidem, p.42.
110
82
Figura 55 (esq.) – Vicente do Rego Monteiro. A Lua, 1920. Grafite e aquarela sobre papel. 30x10cm. Col.
Paula e Jones Bergamin. In: TREVI, 2006, p.40.
Figura 56 (dir.) – Vicente do Rego Monteiro. A Lua, 1920. Ilustração para o livro Légendes, croyances et
talismans dês indiens de l’Amazone. In: TREVI, 2006, p.41.
Figura 57 (esq.) – Vicente do Rego Monteiro. Motivo indígena, 1922. Óleo sobre madeira. 37x49,5cm.
Coleção particular, Fortaleza – CE. In: TREVI, 2006, p.42.
Figura 58 (dir.) – Vicente do Rego Monteiro. O atirador de arco, 1925. Óleo sobre tela. 65x81cm. Acervo
Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.43.
83
Além dos temas indígenas, geometrização, desfiguração e radicalidade começaram
a aparecer em obras como A mulher diante do espelho, de 1922. As linhas se
assemelham bastante às cubistas, com quebras e planos deformados. “O reflexo é a
escuridão. Não vemos o rosto no espelho, mas o vazio obscuro da interioridade.”114
Figura 59 – Vicente do Rego Monteiro. Mulher diante do espelho, 1922. Óleo sobre tela. 98,3x69,3cm.
Coleção particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.44.
Já a figura de seu irmão, Joaquim do Rego Monteiro, é, por muitos, desconhecida.
Viveu em Paris, desde o início dos anos 1920 até sua morte, em 1934. Neste meio
tempo, morou em Recife entre 1923 e 1925 e durante este tempo expôs suas obras
em Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. Possui uma obra muito mais geométrica que
a do seu irmão, e não se dedicava a temas nacionalistas. Estas razões são lançadas
por Herkenhoff como possíveis razões do não conhecimento de sua produção. Não
se sabe o paradeiro de muitas de suas obras, mas existem duas pinturas abstratas,
datadas de 1927, que são consideradas obras-primas do Modernismo brasileiro115:
América do Sul e La Rotonde, pertencentes à coleção do MAMAM – Museu de Arte
Moderna Aloísio Magalhães. Sobre o La Rotonde, Herkenhoff destaca:
114
115
Idem.
ibidem. p.45.
84
o espaço é raso e diagramático, destituídos de alusões à perspectiva. [...]
Pessoas e coisas estão reduzidas a sinais, denotativos de suas ações em
cena. Em La Rotonde, a anatomia mínima indica a faina: cumprimento,
beijo, trabalho, o bistrô, uma moderna galeria de arte. As pessoas se
116
movem na geometria.
Figura 60 (esq.) – Joaquim do Rego Monteiro. América do Sul, 1927. Óleo sobre tela. 73x92cm. Acervo
Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.47.
Figura 61 (dir.) – Joaquim do Rego Monteiro. La Rotonde, 1927. Óleo sobre tela. 73x92cm. Acervo Museu
de Arte Moderna Aloísio Magalhães. In: TREVI, 2006, p.47.
Há também outras pinturas abstratas de Joaquim não datadas, mas que evidenciam
a questão da abstração geométrica, como podemos observar nos exemplos a
seguir:
Figura 62 (esq.) – Joaquim do Rego Monteiro. Sem título, s/d. Óleo sobre tela. 72x72cm. Coleção
particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.48.
Figura 63 (dir.) – Joaquim do Rego Monteiro. Sem título, s/d. Óleo sobre tela. 65x80cm. Coleção
particular, Rio de Janeiro. In: TREVI, 2006, p.48.
Em 1930 ocorreu por iniciativa de Vicente do Rego Monteiro e Géo Charles, a
Exposição da Escola de Paris em Recife, Rio de Janeiro e São Paulo, com os
116
ibidem. p.45-46.
85
maiores nomes da arte moderna.117 O fato de obras de grandes nomes como Pablo
Picasso, Georges Braque e Fernand Léger estarem na cidade foi criticada por Mário
de Andrade. Em carta à Manuel Bandeira, ele escreveu:
“[...] não é possível esnobismo nessa mulataria do Brasil, só mesmo em São
Paulo, terra européia, cafezistas ricaços, etc. [...] Rego Monteiro tinha
primeiro que vir a São Paulo, mas essa gente inda vive sonhando com a
terra natal, parece incrível! Ora imagine você o Recife do sr. Gilberto Freyre,
comprando um desenho do Picasso por três contos (de catálogo)!!!! Depois,
não quisesse de banda o coração, então fosse pra terra natal, fazer
118
abluções sagradas no Capibaribe.”
Dois anos depois, (em 1932) a Escola de Belas Artes de Pernambuco (EBAP) foi
instituída, fruto do esforço de pintores, escultores, desenhistas e intelectuais. A
escola ofereceu então cursos superiores de “Arquitetura, Pintura, Escultura ainda
cadeiras livres de Composição de Arquitetura, Pintura e Perspectiva, Artes
Decorativas, Aplicadas, Modelagem, Desenho Geométrico, de Ornatos, Figurado e
Modelo Vivo.”119 Esta aglutinação de profissionais permitiu trocas entre arquitetos e
artistas plásticos. Foi graças à EBAP que o artista Abelardo da Hora conheceu
Augusto Reynaldo. Na época, da Hora cursava artes plásticas e Augusto arquitetura,
e desta amizade surgiu parcerias, na qual criou obras de arte para os projetos de
Reynaldo, anos depois.120 Na arquitetura, foi nesta década que Luiz Nunes realizou
os primeiros projetos que prenunciaram a instituição da arquitetura moderna no
estado, mas a relação entre artes plásticas e arquitetura ainda não estivesse
presente em suas obras.
117
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. p.382.
MORAES, Marcos Antônio de. (org.) Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. São
Paulo, EDUSP, 2001. p.446. apud. HERKENHOFF, Paulo. Do Recife, para o mundo: O Pernambuco
Moderno antes do Modernismo. In: TREVI, Carlos (coord.) Op.cit., 2006. p.31.
119
MARQUES, Sônia. Maestro Sem Orquestra. Recife, 1983. Dissertação de Mestrado. Recife:
Faculdade de Sociologia, Universidade Federal de Pernambuco, p.164. apud: NASLAVSKY, Guilah. .
Arquitetura moderna em Pernambuco, 1951-1972: as contribuições de Acácio Gil Borsoi e Delfim
Fernandes Amorim. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade de São Paulo, 2004. p.65.
120
Entrevista concedida pelo artista plástico Abelardo da Hora à autora, realizada no dia 21/06/2011.
118
86
Figura 64 – Luiz Nunes. Projeto do Hospital da Força Pública de Pernambuco. Fonte: Acervo Arquivo
Público do Estado de Pernambuco. In: MENEZES, José Luiz da Mota. O moderno e o modernismo em
Pernambuco: Arquitetura e Urbanismo. Apud TREVI, Op. cit. 2006, p.82.
Em 1937 foi instituído o Estado Novo, o que gerou uma quebra da liberdade dentro
das artes. Isto durou até 1945, ano em que houve a quebra desta política de
governo. Neste meio-tempo, em 1939, o engenheiro-arquiteto Fernando Saturnino
de Brito, ex-integrante da DAU (Diretoria de Arquitetura e Urbanismo) chefiada por
Luiz Nunes, projetou o edifício da Secretaria da Fazenda e Pernambuco. Segundo
Naslavsky, este edifício representa “a síntese e maturidade das propostas de
arquitetura moderna quer pelo seu caráter de monumento, quer pela sua importante
localização no contexto urbano (na Praça da República), quer pelas suas excelentes
qualidades arquitetônicas, ou ainda pela conjuntura que envolveu a sua
realização.”121 Neste edifício encontramos painéis abstratos de Cícero Dias, e neste
momento, ainda nos primórdios da arquitetura moderna no Estado, já percebemos
um prenúncio da integração das artes.
Embora alguns anos antes, em 1935, Di Cavalcanti tenha feito um painel para ser
colocado no edifício do Quartel da Polícia Militar122, no Derby, o edifício da
Secretaria da Fazenda, se mostra como uma tentativa de integração das artes um
pouco diferenciada, pois o edifício foi projetado com a inserção do painel,
diferentemente do Quartel do Derby, que já existia e recebeu a obra de arte
posteriormente. A partir de 1940, percebemos que inúmeras obras de arquitetura já
mostravam tentativas de integração e parcerias entre artistas e arquitetos:
121
122
NASLAVSKY, Guilah. Op. cit., 2004. p.43.
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. p.386.
87
Pinturas, murais, painéis decorativos, esculturas, ladrilhos cerâmicos com
motivos regionais são algumas contribuições das artes plásticas nas obras
modernas elaboradas na cidade no período. Artistas como Hélio Feijó, Lula
Cardoso Ayres, Reynaldo Fonseca, Corbiniano Lins e outros contribuem
para a modernização da arquitetura.
Tais relações também estão claras nas pinturas murais, partes integrantes
de inúmeras obras arquitetônicas neste período. Os murais, gênero de
pintura muito comum na época, necessitam de uma maior integração entre
arte e arquitetura, com espaços amplos e um trabalho integrado entre
arquitetos e artistas, tanto Lula Cardozo Ayres como Hélio Feijó vão fazer
inúmeros murais para edifícios importantes e residências abastadas.
Desenhistas remanescentes da experiência modernista de Luiz Nunes, a
exemplo de Hélio Feijó e de Augusto Reynaldo (ex-desenhista de Heitor
Maia Filho), aliam-se aos pintores e artistas plásticos e estão engajados em
123
prol da arte moderna.
Figura 65 – Painel de Cícero Dias, Auditório da Secretaria da Fazenda. Foto: Eduardo Aguiar In:
NASLAVSKY, 2004. p.62.
Entre 1946 e 1951, os periódicos locais, colunas de arte e outras publicações
relataram que as exposições de arte moderna tinham se tornado mais freqüentes,
assim como Naslavsky destacou:
Periódicos locais, colunas de arte, publicações relatam eventos ocorridos
entre 1946-1951, evidenciando a integração entre artes plásticas e da
arquitetura. Alguns eventos merecem nosso destaque: em maio de 1945,
Reynaldo Fonseca realizou no Grande Hotel a primeira exposição de pintura
com temas com Máscaras e Abstração; em 1946, Lula Cardozo Ayres
expõe na Faculdade de Direito uma coletânea das expressões mais
destacadas da moderna pintura brasileira, desde os motivos folclóricos
passando ao artesanato popular do barro até a fase na qual fixou os nossos
costumes antigos; em 1947, Percy Lau expõe seus trabalhos e em 1948,
Aberlardo da Hora, o jovem escultor, na sede dos Sindicatos dos
Empregados do Comércio, expõe suas esculturas, patrocinado pela
123
NASLAVSKY, Guilah. Op. cit., 2004. p.60-61.
88
Diretoria de Documentação e Cultura, com grande êxito devido ao
ineditismo de suas formas; também em 1946 o Recife é palco da Primeira
124
Exposição de Arte Fotográfica.
Em 1948 foi fundada a SAMR (Sociedade de Arte Moderna do Recife), fruto do
esforço de vários artistas modernistas, como Abelardo da Hora. O objetivo da
fundação da SAMR era organizar os artistas em defesa da categoria e da arte
moderna. Foi desta sociedade que grandes artistas apareceram, como Adão
Pinheiro, Samico e outros. Em janeiro de 1950, o crítico Abaeté de Medeiros
publicou no jornal Diário de Pernambuco uma nota que afirmava o IV Salão de Arte
Moderna como moderno de fato.125 Apesar dos arquitetos não terem participado do
IV Salão de Arte Moderna, eles estavam ensinando na Escola de Belas Artes de
Pernambuco, havendo assim um intercâmbio entre artistas e arquitetos, como nos
mostram os exemplos dos projetistas e pintores Helio Feijó e Augusto Reynaldo,
também integrantes da SAMR. Em 1952, foi fundado o Atelier Coletivo, com
iniciativa de um grupo de artistas liderados por Abelardo da Hora. Sobre esta
iniciativa, pode-se destacar:
Entre 1952-1957, congregou uma série de artistas para experiências
inovadoras. O Atelier Coletivo foi importante catalisador de experiências
diversas no campo das artes plásticas, foi escola de desenho e artes
plásticas de futuros arquitetos,[...]. O Atelier Coletivo esteve ligado às
principais vanguardas internacionais desse período, principalmente, aos
muralistas do México e à pintura de cunho social. Seu principal idealizador
foi o escultor Abelardo da Hora, envolvido com as questões sociais da arte e
com o movimento mexicano; [...]
Embora não possamos avaliar a real influência do Atelier Coletivo para o
desenvolvimento da arquitetura moderna, sabemos que alguns arquitetos
(Delfim Amorim, Lúcio Estelita, Waldecy Pinto, Marcos Domingues, José
Fernandes, Maria de Jesus, ainda estudante de arquitetura e outros)
freqüentaram o Atelier e, portanto, se relacionavam com os artistas lá
126
reunidos.
A partir desta declaração, podemos mostrar a ligação da efervescência artística que
acontecia em Recife com o que destacamos anteriormente com Giedion, os debates
sobre a Nova Monumentalidade e os acontecimentos ocorridos em outras partes do
mundo, como a produção muralista no México. Em 1952 José Cláudio discutiu um
livro sobre as obras do muralista mexicano Diego Rivera com outros artistas dentro
do Ateliê Coletivo e as imagens do muralismo mexicano chegaram aos artistas
124
ibidem. p.58.
ibidem. p.59.
126
ibidem. p. 62-63.
125
89
recifenses antes mesmo das realizações de Portinari, como destacou Wellington
Virgulino à Aracy Amaral:
A problemática social nos chegou antes por influência mexicana que por
Portinari e nós aqui não conhecíamos nada de Portinari, nunca víramos
coisas suas. Em compensação chegara-nos às mãos, nem sei através de
127
quem, um livro sobre Rivera, que muito nos impressionou.
Foi nesta mesma década de 1950 que a chamada Escola Pernambucana foi
consolidada e embasada nos ensinamentos e nas atividades projetuais de Delfim
Amorim e Acácio Gil Borsoi. Neste momento, arquitetura moderna começou a ser
produzida no estado, sempre levando em consideração, principalmente, a questão
dos detalhes e da adequação ao clima local. Os próprios mestres com seus
discípulos, figuras como Frank Svensson, Reginaldo Esteves, Glauco Campello,
Wandenkolk Tinoco e Vital Pessoa de Melo, provaram que esse grupo não estava
isolado e cristalizado, mas continuamente aberto à assimilação de impulsos
artísticos e arquitetônicos, nacionais e internacionais.
Além disso, neste período a cidade já mostrava certo desenvolvimento de um centro
artístico. Em 1953 é criada a Escolinha de Artes do Recife e em 1954 aconteceu o
primeiro Salão do Ateliê Coletivo e a criação do Gráfico amador. Neste mesmo ano,
Abelardo da Hora e o Ateliê de Recife participaram do I Congresso Nacional de
Intelectuais, em Goiânia, ao lado do Clube dos Amigos do Museu de Arte de São
Paulo, Museu de Arte de Goiânia, Carlos Scliar e outros artistas. Segundo Aracy
Amaral, o encontro teve como principais tópicos a serem discutidos: a) a defesa da
cultura brasileira e estímulo ao seu desenvolvimento, preservando-se as suas
características essenciais; b) o intercâmbio cultural com todos os povos; e c) discutir
os problemas éticos e profissionais dos intelectuais.128
Na arquitetura, a questão da adequação ao clima local também favoreceu o uso de
elementos que recebem um papel artístico, como os azulejos, tão utilizados por
Delfim Amorim que ele mesmo desenhou, ou os elementos vazados, que por vezes
formaram verdadeiros painéis, como no caso do Edifício Santo Antônio, de Borsoi. É
interessante destacar como os arquitetos lidavam com a arte em relação à
arquitetura. Em alguns momentos, não havia artista plástico convidado para fazer
127
128
Depoimento de Wellington Virgulino à Aracy Amaral, realizado em Recife, no dia 17/01/1979.
AMARAL, Aracy A. Op. cit., 1987. p.418.
90
uma obra para ser colocada no edifício, e os próprios arquitetos acabaram
desenvolvendo elementos que podem ser considerados arquitetura e arte plástica ao
mesmo tempo.
Figura 66 (esq.) – Delfim Amorim. Azulejos do Edifício Acaiaca. Foto: A autora.
Figura 67 (dir.) – Acácio Gil Borsoi. Elementos vazados para o Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Sobre a questão dos azulejos, o arquiteto Delfim Amorim realizou várias obras em
que os utilizavam não apenas como elementos de proteção, mas também como
elementos decorativos. Em muitas das obras, ele mesmo desenhou os módulospadrões até por conta da sua insatisfação com a linha industrial produzida na época.
Além disso, a sua preocupação estética era bastante clara, pois nem todas as
paredes recebiam o elemento desenhado por ele, pelo contrário, os seus azulejos
dialogavam com vários outros materiais, como pedras, tijolo, concreto, entre outros.
O fato de todas as paredes externas não serem revestidas de azulejos e a
preocupação de desenhar os motivos específicos para cada caso, induzem
à conclusão de que Amorim teria sido conquistado pela capacidade
decorativa desse elemento tradicional da arquitetura, mais do que qualquer
outro argumento. Na realidade, o azulejo comparece, não somente nas
residências, como também em edifícios de maior porte, coexistindo com
outros materiais tais como: a pedra, o reboco, o concreto aparente, o tijolo à
vista, em que é evidente a intenção da composição de elementos com
129
texturas diversas.
Amorim estava preocupado em projetar o azulejo e aplicar o elemento
adequadamente à cada obra. Após seu uso no edifício Acaiaca, ele passou a utilizar
em outros casos:
Em outros casos revestem somente os guarda-roupas que sacam em
relação ao paramento das fachadas (edifício Barão do Rio Branco).
129
GONDIM, D. O.; Instituto de Arquitetos do Brasil. Delfim Amorim: arquiteto. Recife: Instituto de
Arquitetos do Brasil, 1981. p.61.
91
Comparecem ainda, como moldura de duas fachadas inteiras, compostas
de elementos pré-fabricados de concreto armado (Edifício Independência).
Funcionam como fundo onde se aplicou, de maneira pioneira, caixas de
concreto armado para instalação de aparelhos de ar condicionado (Edifício
130
Santa Rita).
Além dos elementos artísticos aplicados à arquitetura, é importante destacar que
falar de obra de arte não é apenas falar de painéis, esculturas, etc. A arquitetura
também deve ser considerada uma obra de arte. Vital Pessoa de Melo, numa
entrevista concedida em 2007 destacou bem esta idéia:
Eu considero arquitetura um trabalho cultural. [...] o próprio material, a
131
textura, a escolha, já é uma confecção de uma obra de arte, [...].
Isto nos faz refletir sobre o edifício como uma grande escultura, uma escultura que
possui uma função utilitária, que cria um espaço para ser vivenciado e criar
sensações. Essa “escultura” por ter uma função e por transmitir sensações é
chamada de arquitetura, e esse constante choque entre o escultural – a superfície
palpável (paredes, fachadas) – e o espaço é que faz a arquitetura ser interessante.
É como Evaldo Coutinho afirmou:
Para mim, o ambiente interno parece ser o ponto verdadeiramente filosófico
na questão da arquitetura. Em geral, as pessoas vêem a arquitetura por
meio de sua volumetria, das fachadas, do teto, do edifício todo. Mas a
arquitetura à qual me reporto é o ambiente interno, que se vale da escultura
para ter sua existência. É preciso não confundir a escultura com o vazio
interno. O arquiteto se vale da escultura, que são as paredes da construção,
para projetar o interior.
Os livros mostram sempre belas fachadas, mas pouco apresentam do
espaço interno, porque ele é irrepresentável. Quem quiser conhecê-lo, terá
de ir a ele. A arquitetura tem essa singularidade. Já a pintura, não. Podemse ver fotos tão perfeitas de uma obra de Goya quanto as que estão em um
museu. O mesmo ocorre com a escultura, que pode ser evidenciada por
uma fotografia. A importância do espaço interno é que ele é projetado para
132
o convívio de pessoas.
Para o cenário da arquitetura em Pernambuco, Evaldo Coutinho foi uma figura
bastante importante, pois ele influenciou vários arquitetos que atuaram durante o
período deste estudo, como é o caso de Marcos Domingues. Em entrevista,
Domingues atribui à Evaldo Coutinho toda a sua base de fundamentação, de pensar
130
ibidem. p.62.
Entrevista concedida pelo arquiteto Vital Pessoa de Melo à autora, realizada no dia 14/12/2007.
132
Entrevista com Evaldo Coutinho concedida à Eride Moura e publicada na Revista
PROJETODESIGN, Ed.286 de Fevereiro de 2004.
131
92
a arquitetura e entender sua essência: o espaço e a sua dimensão filosófica.133 Essa
importância de Coutinho também foi destacada por Vital Pessoa de Melo.134
Retomando a afirmação de Vital sobre a escolha dos materiais e texturas fazer parte
da confecção de uma obra de arte, o cuidado com a composição de volumes e
escala (que formam o edifício como um todo) é papel do arquiteto, que procura
sempre fazer algo harmônico e que pode ser considerado, de certo ponto, obra de
arte.
As gerações de arquitetos seguintes a Amorim e Borsoi também desenvolveram
parcerias com artistas e também fizeram realizações dentro das artes plásticas,
como esculturas, painéis ou desenhos de azulejos. Além de ter sido apaixonado por
arquitetura, Vital Pessoa de Melo também se interessou por desenho industrial e
artes. No seu livro Tramas, mostrou as infinitas composições entre módulos-padrão
(dois trapézios simétricos) e os resultados ao se combinar as posições das peças e
aplicar diferentes cores sobre elas.
O trabalho mostra a preocupação de Vital em relação à economia de meios
e à racionalização dos processos de uma maneira que não se perca o
sentido artístico das experimentações. Tramas oferece uma chave de leitura
essencial para se entender a obra de Vital. As peças cerâmicas funcionam
como um módulo que aponta as possibilidades de integração da arte com a
arquitetura, estabelecendo conexões com o mundo industrial,
particularmente com o desenho industrial e também com o concretismo
135
paulista, especialmente com o de Lygia Clark.
Vital também desenhou azulejos e fez painéis e esculturas, sem contar com as
parcerias que fez com diversos artistas, como Anchises Azevedo e Athos Bulcão.
133
Entrevista concedida pelo arquiteto Marcos Domingues à autora, realizada no dia 04/06/2011.
Conversa informal com o arquiteto Vital Pessoa de Melo, realizada no dia 19/03/2008.
135
HOLANDA, A. C. O. MOREIRA, F. D. Arte e ética dos materiais na obra de Vital Pessoa de Melo,
1968-1976. In: Revista Risco EESC-USP, nº8, Segundo semestre de 2008. p.62.
134
93
Figura 68 – Vital Pessoa de Melo - Tramas. (A) Exemplo de processo para execução de uma trama; (B)
Trama nº12A - Agreste; (C) Trama nº4A – Colméia I. Fonte: MELO, 1989. Com alteração da autora.
No fim dos anos 1950 (1957/59) as atividades do Ateliê Coletivo foram encerradas.
A década de 1960 se iniciou num grande clima de liberdade e houve a fundação do
Movimento de Cultura Popular (MCP) – 1960, sob o qual Abelardo da Hora ficou
responsável pelas artes plásticas e artesanato. Neste período a arte local teve como
tema principal os problemas sociais. O MCP criou, no mesmo ano, a Galeria de Arte
do Recife, e na exposição de inaugração, estavam obras dos seguintes artistas:
Abelardo da Hora, Adão Pinheiro, Aloisio Magalhães, Anchises Azevedo, Antônio
Cavalcanti, Alves Dias, Celina Verde, Corbiniano Lins, Elezier Xavier, Fédora
Monteiro, Francisco Brennand, Gilvan Samico, Hélio Feijó, Iris Ribeiro, Ivan
Carneiro, Jorge Martins, José Cláudio, Ladjane Bandeira, Lenine Medeiros, Lula
Cardoso Ayres, Mário Nunes, Montez Magno, Renato Melo, Reynaldo Fonseca,
Sílvia Barreto, Tereza Gondim, Vicente Monteiro, Vilaghan, Wellington Virgolino e
Wilton de Souza. O catálogo da exposição recebeu um texto de apresentação de
Abelardo da Hora, que mostrava o interesse de se socializar a arte, tornando-a mais
próxima da população.
94
Figura 69 (esq.) – Capa do catálogo da 1ª Exposição da Galeria de Arte do Recife. Fonte: Acervo Anchises
Azevedo.
Figura 70 (dir.) – Texto de apresentação escrito por Abelardo da Hora para o catálogo da 1ª Exposição da
Galeria de Arte do Recife. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Em meio a esses acontecimentos, por sugestão do artista plástico Abelardo da Hora,
foi incluído no Código de Obras e Urbanismo da cidade do Recife (Lei 7.427/1961) o
artigo 950136 em seu corpo, que diz que todo edifício com mais de 2000m² de área
construída, pertencente ao município de Recife deve conter obras originais de valor
artístico “as quais farão parte integrante deles“137. Para Abelardo, esta lei foi uma
grande conquista para a arte e arquitetura pernambucanas. O objetivo foi de
aproximar a arte das pessoas e valorizar a cultura de Pernambuco. Segundo esta
lei, os artistas deveriam se inscrever na prefeitura para que ficassem permitidos a
realizarem obras integradas à arquitetura produzida em Recife.138 Esta iniciativa
demonstra um esforço por parte dos artistas de incluírem seus trabalhos às obras
dos arquitetos locais.
136
Este artigo é conhecido como “Lei Abelardo da Hora”.
Lei 7.427 de 19 de outubro de 1961. Trecho retirado de: VELOSO, M.; VIEIRA, N. Arte Moderna
na Arquitetura e no Urbanismo recifenses – síntese e paradoxos no ontem e no hoje: uma análise
através de algumas das obras de Abelardo da Hora e Francisco Brennand. In: 8º Seminário
DOCOMOMO Brasil. Rio de Janeiro, 2009.
138
Entrevista concedida pelo artista plástico Abelardo da Hora à autora, realizada no dia 21/06/2011.
137
95
Os periódicos locais também refletiram a efervescência cultural vivida nesta época e
receberam em seus corpos de edição artistas plásticos para coordenar colunas
sobre arte. Ladjane Bandeira se tornou editora e redatora do Jornal do Commercio e
do Diário da Noite, enquanto João Câmara escreveu artigos para o Diário de
Pernambuco. A Revista de Belas Artes, de caráter acadêmico, era dirigida por
Vicente do Rego Monteiro. Já a Revista Nordeste era dirigida por Esmaragdo
Manoquim e Ladjane Bandeira. Editada pelo Jornal do Commercio, possuía uma
linha mais moderna.139
No início dos anos 1960 o ensino das artes plásticas recebeu um impulso
importante. Foi instituído na UFPE o curso de artes plásticas e Vicente do Rego
Monteiro, Lula Cardoso Ayres e Murilo La Greca foram alguns importantes artistas
que integram o corpo docente. Na Escolinha de Artes do Recife foram oferecidos
cursos de pintura e desenho. Em 1964, com o golpe militar, o Movimento de Cultura
Popular suspendeu suas atividades e iniciou-se um novo momento de censura. Com
o encerramento do Ateliê Coletivo e a suspensão das atividades do MCP, Olinda se
tornou o refúgio dos artistas.140
Em Olinda, o período dos anos 1960 até 1970 foi bastante movimentado em relação
à criação e fechamentos de ateliês. Assim que os primeiros artistas chegaram à
cidade, criou-se o Movimento Ribeira, onde os participantes utilizaram-se mercado
para expor suas produções, transformando aquele espaço em uma galeria. Os
artistas participantes eram Adão Pinheiro, Guita Charifker, José Barbosa, José
Tavares, Montez Magno, José Cláudio, João Câmara, Ypiranga Filho, Anchises
Azevedo, Roberto Amorim e Tiago Amorim. Mais tarde constituiu-se a “Galeria do
Mercado da Ribeira”, mas em Agosto de 1965 os militares encerram as atividades
do Ateliê.
139
ROSEMBERG, André (coord.). Pernambuco 5 décadas de arte. Recife: Quadro Publicidade e
Design Ltda.. 2003. p.27.
140
Desde meados do século XIX Olinda tinha ficado à parte do dinamismo econômico que tinha seu
centro no Recife, o que levou, por um lado, a uma estagnação econômica do município – e a
conseqüente baixa nos preços dos imóveis – mas, por outro lado, a manutenção de seu acervo
construído, os preços baixos dos imóveis e a atmosfera da cidade atraíram muitos artistas neste
período.
96
Figura 71 – Capa do catálogo de Novembro de 1961 da Galeria de Arte da Ribeira, com obras de Maria
Carmen, Anchises Azevedo e João Câmara. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Em Setembro de 1965 houve a abertura da “Oficina 154”, na Rua de São Bento, que
funcionava como um ateliê escola. Neste mesmo ano, aconteceu a abertura do
“Ateliê mais 10”, que se localizava na Rua do Amparo. Eram artistas integrantes do
Ateliê mais 10: João Câmara, Anchises Azevedo, José Tavares, Delano, Liedo
Maranhão, Maria Carmem e Vicente do Rego Monteiro. Em 1966 o Museu de Arte
Contemporânea de Olinda (MAC) foi inaugurado. Em 1967, aconteceu a Semana de
Arte de Olinda e neste mesmo ano foram abertas as galerias Sobrado 7, Varanda,
Casarão e Galeria Três Galerias. Assim, percebe-se a efervescência que se vivia na
cidade de Olinda, onde havia uma liberdade maior e um maior apoio à arte.141
De 24 de Maio a 21 de Junho de 1967, ocorreu a mostra da Oficina Pernambucana
no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. Nesta mostra
aconteceu a exposição de obras de Abelardo da Hora, Anchises Azevedo, João
Câmara, Maria Carmen, Gilvan Samico e Wellington Virgolino. A apresentação dos
artistas do catálogo ficou a cargo de José Cláudio, que logo no início fala da criação
da SAMR e do Ateliê Coletivo e cita a influência que ele sofreu com a obra de
Orozco e Rivera. José Cláudio fez um panorama sobre a pintura moderna em
141
ROSEMBERG, André (coord.). Op. cit., 2003. p.32.
97
Pernambuco inclusive enfocando que no início, a arte moderna era privilégio das
classes abastadas e graças às iniciativas tomadas por Abelardo para a socialização
da arte, ele passou a atingir um público mais amplo:
"De Abelardo pra cá, [...] nossa pintura mudou de dono, de assunto, de cara
e de tamanho. Mudou de dono porque deixou de ser privilégio e lazer de
uma classe abastada para ser o estribo, o meio de expressão, a via de
ascensão de uma classe mais baixa; mudou de assunto porque deixou de
ser um jogo de estilos, uma batalha de serpentinas, para ser panfletária,
reinvidicatória, filosófica; mudou de cara porque deixou de ser colorística,
deleitável, sacrificando tais valores ao gosto pelo gesto largo,
desinteressado de combinações caleidoscópicas; de tamanho porque, sem
falar da ambição maior de transformar o mundo, deixou de ser o quadro que
se pendura na parede do quarto para ser o que se bota em saguão, solene,
142
dirigido ao público, sinfônico.”
Figura 72 – Capa do catálogo da Oficina Pernambucana, ocorrida em 1967 no Museu de Arte
Contemporânea da Universidade de São Paulo. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
De Dezembro de 1967 a Fevereiro de 1968, aconteceu o IV Salão de Arte Moderna
do Distrito Federal. Neste evento, o júri de seleção e premiação foi composto por
Clarival do Prado Valadares, Mário Barata, Walter Zanini, Mário Pedrosa e Frederico
Morais. A decisão do júri para a grande premiação foi, relatada no próprio catálogo
do Salão, bastante difícil, pois eles estavam indecisos entre dois pintores de
142
José Cláudio sobre a pintura moderna pernambucana no catálogo da exposição da Oficina
Pernambucana, ocorrida no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, em 1967.
Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
98
Pernambuco (João Câmara e Anchises Azevedo) e o carioca Helio Oiticica.
Decidiram por fim dar o prêmio a Câmara, e completando a premiação concedendo
o primeiro prêmio de pintura a Anchises e destacando o nome de Oiticica para a
referência especial.
Figura 73 (esq.) – Capa do catálogo do IV Salão de Arte Moderna do Distrito Federal. Fonte: Acervo
Anchises Azevedo.
Figura 74 (dir.) – Texto explicativo do júri sobre a decisão da premiação de João Câmara, Anchises
Azevedo e Hélio Oiticica. Fonte: Acervo Anchises Azevedo.
Em 1970 a arte pernambucana perdeu Vicente do Rego Monteiro, Cícero Dias
continuava na Europa e Lula Cardoso Ayres se aposentou da UFPE. Neste mesmo
ano, iniciaram-se os questionamentos de Paulo Bruscky e Daniel Santiago sobre a
utilidade da arte, seus valores e motivações. As manifestações de Bruscky e
Santiago sempre foram marcadas pela polêmica e algumas atitudes dos artistas não
eram toleradas pelo governo. Em 1974, inspirados pelos desenvolvimentos da arte
conceitual, Bruscky e Santiago lideraram um movimento que eles intitularam de
nadaísta. Em 1976, os mesmos artistas tentaram fazer uma nova Exposição de
Artes Plásticas do Bairro do Recife, que foi fechada pelos militares no dia da
abertura. Bruscky e Santiago ficaram presos durante um mês.143
143
Entrevista concedida pelo artista plástico Paulo Bruscky, realizada no dia 30/06/2010.
99
Entre meados da década de 1970 e início de 1980, foram construídos dois parques
de escultura em Pernambuco: o Parque de Esculturas Monumentais Nilo Coelho (em
Fazenda Nova) e a Fábrica de Brennand, no bairro da Várzea, Recife. Também foi
durante esta época que novas galerias foram criadas, como a Gatsby, Degrau,
Abelardo Rodrigues, Futuro 25, Officina, entre outras. A década de 1970 teve certo
apoio do governo para a criação de novos museus. Em 1975, foi criado o Museu do
Homem do Nordeste e, em 1977, o Museu de Arte Sacra de Pernambuco – MASPE.
Em 1979 houve a criação da Fundação de Cultura da Cidade do Recife e da Oficina
Guaianases de Gravura.144
O início dos anos 1980 foi marcado pela Bienal de Veneza (1981), onde se estava
buscando um novo espírito na pintura, ou seja, uma revalorização do ato de pintar.
Neste momento as telas em grandes dimensões voltaram a ser valorizadas. No
diário oficial de 1983 foi publicado uma matéria sobre o XXXVI Salão de Artes
Plásticas de Pernambuco, que possuiu uma Sala especial para o artista Anchises
Azevedo. Conhecido por seu abstracionismo e por seus grandes rolos de tela, o
jornal destaca a aproximação do artista com obras de arquitetura, que passou a
“produzir com maior perfeição em painéis para edifícios, esculturas de concreto, sem
abandonar a pintura."145
3.2 A relação arquiteto-artista plástico
Após essa breve descrição dos principais acontecimentos, percebe-se que a cidade
de Recife teve uma participação efetiva no cenário das artes plásticas e arquitetura
em nível nacional. Embora não haja publicações que tenham um enfoque direto
sobre o relacionamento entre artistas e arquitetos, a produção moderna
pernambucana demonstra que havia uma preocupação em se unir as duas formas
de arte, mesmo que o objetivo não tenha sido de unir as arte plásticas e arquitetura
nos mesmo moldes de movimentos como a Arbeitsrat für Kunst ou Bauhaus. Este
fato foi confirmado nas entrevistas realizadas, tanto com artistas plásticos quanto
com arquitetos. Entretanto, o cenário pernambucano nunca foi completamente
favorável para que houvesse uma integração completa entre artes plásticas e
arquitetura. Haviam dificuldades, mas mesmo assim os artistas e arquitetos
144
145
ROSEMBERG, André (coord.). Op. cit., 2003. p.41.
Anchises é destaque do Salão de Artes Plásticas. In: Diário Oficial, 19/10/1983.
100
persistiram em fazer um trabalho culturalmente rico e em muitas vezes foram bem
sucedidos.
O mercado para a inserção da produção dos artistas nas edificações sempre foi
complicado. Não é objetivo desta pesquisa procurar as razões deste fato, mas
provavelmente há uma relação com a questão de educação da sociedade, que não
possui grande sensibilidade artística e que portanto não valoriza a inserção da arte
no cotidiano. Arte é vista, pela maioria das pessoas, como algo não compreensível e
por muitas vezes supérfluo, uma posição que nos dias atuais ainda não mudou. Em
entrevista com o arquiteto Antônio Carlos Maia146, filho de Heitor Maia Neto,
acredita-se que nos anos 1950 a sociedade tinha uma maior sensibilidade em
relação às artes.
Os incorporadores também possuem sua parcela de culpa na separação entre arte e
arquitetura de hoje em dia. Não há mais o mesmo interesse dos incorporadores em
se incluir nos edifícios obras de arte com qualidade como havia há trinta ou quarenta
anos atrás. O que acontece muito é a colocação de obras que não possuem
nenhuma relação com o edifício, inclusive sem um espaço apropriado para ser
apreciada. Arquitetos como Reginaldo Esteves, Dinauro Esteves, Marcos
Domingues, Heitor Maia Neto, Antônio Carlos Maia e artistas como Anchises
Azevedo e Abelardo da Hora confirmam este fato. Para Abelardo, a questão não é
financeira, pois, segundo ele, “se as construtoras destinassem 10% (dez por cento)
do que perdem com desperdício de material em obra para aplicarem na compra de
uma obra de arte de qualidade para o edifício, a cidade estaria, culturalmente e
artisticamente, muito mais rica.”147
Isto não diz respeito apenas à clientela. Pode-se dizer que grande parte dos
arquitetos nos últimos vinte anos, além de uma frágil formação artística e cultural,
têm uma visão muito focada no mercado imobiliário. Artisticamente, os arquitetos
são mal-formados ou mal-informados, diferentemente do que ocorria nos anos 1950
e 1960. Com a chegada de figuras como Acácio Gil Borsoi (1924-2009), Delfim
Fernandes Amorim (1917-1972) e Mário Russo (1917-1996), tínhamos um corpo
docente formado à moda européia. Borsoi, carioca, formado pela Faculdade
146
147
Entrevista concedida pelo arquiteto Antônio Carlos Maia à autora, realizada no dia 07/06/2011.
Entrevista concedida pelo artista plástico Abelardo da Hora à autora, realizada no dia 21/06/2011.
101
Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil - FNA (1949), Amorim vindo de
Portugal e formado na Escola de Arquitetura do Porto (1947) e Mário Russo, italiano,
formado na Escola Superior de Arquitetura de Nápoles (1942). Além disso, há a
importância de professores artistas plásticos na Escola de Belas Artes de Recife.
Para Heitor Maia Neto, os exercícios de composição passados pelo então professor
Lula Cardoso Ayres foram de suma importância para que ele desenvolvesse seu
senso de composição e também o aproximou das artes plásticas148.
A criação da Sociedade de Arte Moderna do Recife (SAMR) foi outro fato importante
para a relação entre artistas e arquitetos. Segundo o artista plástico Anchises
Azevedo, a SAMR lutou bastante para conseguir colocar as artes plásticas dentro
das edificações, hábito que não existia antes, mas acontecia ocasionalmente em
projetos particulares, quando este era um anseio do cliente ou algo do tipo.149 Ainda
segundo Azevedo, os ateliês dos artistas era outra porta de comunicação entre
artistas e arquitetos. Os arquitetos por vezes visitavam os ateliês dos artistas à
procura de obras de arte para serem colocadas em suas edificações.
O Movimento de Cultura Popular (MCP), também foi outro importante acontecimento
para a socialização das artes plásticas. Abelardo da Hora sempre esteve envolvido
com a questão social, principalmente com a busca da aproximação da arte e a
população. Suas iniciativas juntamente com o Ateliê Coletivo, SAMR, MCP e a
criação da Lei Abelardo da Hora demonstram bem isso. De fato seu esforço foi
essencial para que uma aproximação entre artes plásticas e arquitetura se
concretizasse.
Em entrevista, o artista plástico Paulo Bruscky150 afirmou que a “Lei Abelardo da
Hora” não foi sempre cumprida. O período entre seu lançamento em 1961 até o
início dos anos 1980 havia uma resistência dos incorporadores em não respeitar a
lei, e isto foi facilitado pela falta de fiscalização rígida por meio da prefeitura. Nos
anos 1980, Bruscky, envolvido com o Patrimônio Histórico e com a Prefeitura do
Recife, conseguiu fazer com que as fiscalizações se tornassem assíduas e multas
àqueles que não estavam cumprindo a lei fossem aplicadas.
148
Entrevista concedida pelo arquiteto Antônio Carlos Maia à autora, realizada no dia 07/06/2011.
Entrevista concedida pelo artista plástico Anchises Azevedo à autora, realizada no dia 10/05/2011.
150
Entrevista concedida pelo artista plástico Paulo Bruscky, realizada no dia 30/06/2010.
149
102
Descobri um esquema que algumas construtoras faziam para não respeitar
a lei, que era os rodízios de obras de artes, como as esculturas. Fui a um
hotel em Boa Viagem, e como conheço a produção artística produzida aqui,
[...] observei uma escultura que Abelardo havia feito para um outro edifício e
que estava lá, no hotel. Foi aí que percebi que as construtoras levavam as
obras de arte para os edifícios só para não haver problema com a
fiscalização. Quando conseguiam o habite-se, trocavam a obra de arte de
151
lugar e ficava por isso mesmo.
Com o esforço de Bruscky a lei passou a ser seguida à risca a partir dos anos 1980,
embora o artista acredite que nestes últimos anos, a fiscalização tenha voltado a
enfraquecer.
O momento de contato entre o arquiteto e artista plástico também é importante para
entender-se a relação entre eles. Enquanto Lygia Clark fazia um apelo em 1956
sobre os arquitetos não chamarem os artistas no fim de um projeto, a prática mais
comum em Recife era o contato entre os profissionais quando o projeto arquitetônico
já estava concluído. Entretanto, a relação entre o artista plástico e o arquiteto
relatado nas entrevistas não era inflexível. Em alguns casos o arquiteto já
encomendava ao artista um painel ou uma escultura, já em outros, era discutido com
o artista plástico qual a melhor obra de arte para tal espaço ou qual espaço ele
gostaria de utilizar para seu trabalho.
Algumas vezes o artista projetava a obra de arte sendo contratado pelo
incorporador. Foi o que aconteceu com muitas obras de Abelardo da Hora. Grande
parte de sua produção foi feita para edifícios construídos pela Construtora Queiroz
Galvão. Em quase todos o artista não teve contato com o arquiteto. O local da obra
de arte já era previamente escolhido e quando o contato era feito, todo o projeto
arquitetônico já estava concluído. Mesmo assim, Abelardo afirma que suas obras
sempre foram desenvolvidas para cada edifício, inspiradas principalmente em seus
temas, que na sua maioria das vezes eram nomes de mulheres.152
Havia casos também da interferência do artista no projeto arquitetônico, com o
pedido de alterações de paredes como aconteceu na parceria Anchises Azevedo –
Vital Pessoa de Melo no Edifício Sahara. Vital convidou Anchises para realizar o
painel do edifício e separou uma grande parede do hall de entrada, permitindo que o
artista decidisse qual a melhor forma de se fazer o painel, quanto ele deveria ocupar
151
152
Idem.
Entrevista concedida pelo artista plástico Abelardo da Hora à autora, realizada no dia 21/06/2011.
103
de parede e como deveria ocupar. Anchises pediu para que se fosse feito um rasgo
vertical na parede, permitindo assim a entrada de luz e seu derramamento sob a
superfície do painel de cimento.153 A forma de execução deste painel foi discutida
entre artista e arquiteto objetivando a forma ideal para construir a obra de arte.
Dinauro Esteves também afirma que, mesmo antes da obrigatoriedade de se colocar
obras de arte nos edifícios, Reginaldo Esteves sempre teve esta preocupação.
Inclusive, nos seus projetos que participou juntamente com Maurício Castro, Dinauro
afirma que os artistas plásticos convidados sempre tiveram liberdade para sugerir
alguma mudança. A obra de arte era discutida com os arquitetos, havia troca de
informações e sugestões entre os profissionais. Dinauro também destaca que
sempre houve preocupação dos próprios arquitetos em criar elementos
arquitetônicos com grande teor escultural. Gárgulas, placas de concreto, elementos
vazados, tudo era solucionado de forma a tornar aquele elemento construtivo em
algo escultórico.154 Ou seja, a questão da escultura como trabalho na superfície
arquitetônica também era trabalhada pelos arquitetos. Dinauro chegou a fazer
painéis de placas de concreto para este edifício.
Figura 75 – Dinauro Esteves. Gárgulas escultóricas para o Edifício Sede da CHESF. Foto: Aristóteles
Cantalice II.
Figura 76 – Dinauro Esteves. Painel de placas de cimento para o Edifício Sede da CHESF. Foto:
Aristóteles Cantalice II.
Anchises destaca a importância de se colocar a obra de arte em um local
privilegiado, mas sempre de forma que ela faça parte da edificação. Assim como o
153
154
Entrevista concedida pelo artista plástico Anchises Azevedo à autora, realizada no dia 10/05/2011.
Entrevista concedida pelo arquiteto Dinauro Esteves à autora, realizada no dia 27/06/2011.
104
painel do Edifício Sahara, o mural do Edifício Barão de São Borja (também de
Anchises em parceria com Vital Pessoa de Melo) possui localização privilegiada. O
mural é dividido em duas partes, sendo interrompido pelo bloco vertical do edifício.
Ocupa toda a parede de garagem e se volta inteiramente para a rua. Portanto ele
comunica não apenas com quem está dentro do edifício, mas é uma grande
apresentação aos transeuntes que se encontram circulando nas proximidades.
Figura 77 (esq.) – Mural do Edifício Barão de São Borja – vista da rua da parte lateral esquerda. Foto: A
autora.
Figura 78 (dir.) – Mural do Edifício Barão de São Borja – vista interna da parte lateral direita. Foto: A
autora.
Os artistas normalmente eram escolhidos pelos arquitetos. Para o Edifício Sede da
Rede Ferroviária, projetado por Frank Svensson e Marcos Domingues, o artista
plástico Francisco Brennand foi convidado pelo próprio Domingues, por ele saber
que Brennand estava envolvido com os projetos da Rede Ferroviária e, portanto,
seria o artista mais apropriado para criar uma obra de arte para o edifício daquela
empresa.155
Ainda sobre a escolha do artista plástico, o arquiteto Dinauro Esteves comentou que
este fato também envolve o reconhecimento do artista no cenário local e nacional,
além de questões de relacionamento. Para o edifício sede da CHESF, artistas
renomados como Francisco Brennand, Corbiniano Lins e Mirella Antreotti foram
convidados para compor as obras localizadas no acesso principal do edifício. Para o
restaurante, o artista plástico e amigo de Maurício Castro, Ferreira (José Ferreira de
Carvalho) produziu o grande vitral localizado naquele ambiente.
155
Entrevista concedida pelo arquiteto Marcos Domingues à autora, realizada no dia 04/06/2011.
105
Figura 79 – Vitral de Ferreira para o restaurante da CHESF. Foto: Marcio Capelini.
A figura do incorporador foi citada em algumas das entrevistas realizadas como
limitadores em alguns projetos. A relação artista-arquiteto-incorporador sofria várias
interferências em vários estágios de execução. Por vezes a obra de arte era alterada
ou sofria limitações de execução por exigências do incorporador do edifício,
modificando o resultado final esperado, tanto pelo artista plástico, quanto pelo
arquiteto. Foi até mencionado por artistas plásticos que em algumas situações até o
nome do edifício era mudado pelos incorporadores, fazendo com que a obra de arte
planejada em cima daquele tema ficasse sem sentido.
***
Após este panorama sobre artes e arquitetura em Pernambuco, percebe-se que, no
período de 1950 a 1980, se desenvolveu no estado uma rica integração entre
artistas plásticos e arquitetos, além de ser importante destacar também a
aproximação dos arquitetos com os trabalhos artísticos, levando alguns a criar
elementos e desenvolver desenhos para completarem o sentido artístico de suas
obras arquitetônicas.
No próximo capítulo, veremos por meio de algumas obras qual foi o resultado
dessas parcerias e da aproximação dos arquitetos em relação às artes plásticas.
Procurar-se-á analisar os espaços projetados pelos arquitetos para receber as obras
106
dos artistas. Dessa forma, buscaremos compreender como foi desenvolvida a
relação entre arte plástica e arquitetura na cidade de Recife, entre os anos 1950 e
1980.
107
CAPÍTULO 4
A INTEGRAÇÃO DAS ARTES NA PRODUÇÃO MODERNA PERNAMBUCANA
4. A INTEGRAÇÃO DAS ARTES NA PRODUÇÃO MODERNA PERNAMBUCANA
Após esta breve revisão das artes plásticas e arquitetura a nível internacional,
nacional e local, partir-se-á à questão central do trabalho: a integração das artes no
cenário local. Neste momento, é importante destacar que este estudo se limitou a
analisar casos de integração entre artes plásticas que compreendem painéis, murais
e esculturas, dentro da produção moderna produzida na Região Metropolitana do
Recife, no período de 1950-1980. Procurou-se, primeiramente definir um olhar para
se analisar a integração entre as artes. Este olhar compreende extrair dos conceitos
defendidos por Merleau-Ponty e que encontramos relação destes nas obras The
Eyes of the Skin, de Juhani Pallasmaa, e O Espaço da Arquitetura, de Evaldo
Coutinho, algumas diretrizes básicas para se criar uma forma de organizar a
observação do espaço que abriga a relação entre artes plásticas e arquitetura.
Assim, procuraremos aplicar estas diretrizes para entender como se deu a relação
entre artes plásticas e arquitetura dentro de alguns edifícios significativos da
produção moderna de Pernambuco.
4.1 Arte, espaço e corpo em Pallasmaa e Coutinho
Eu não poderia apreender a unidade do objeto sem a mediação da
156
experiência corporal. (Maurice Merleau-Ponty)
Procurar transpor para palavras a relação existente entre arte e arquitetura é uma
tarefa um tanto quanto desafiadora. A relação da obra de arte com o edifício implica
uma dimensão espacial, e o primeiro passo para se entender essa relação é
procurar apreender o próprio espaço que a abriga.
O espaço só pode ser apreendido quando há a presença humana, o
desenvolvimento do corpo neste espaço. Este só tem sentido através do corpo. A
dimensão corporal foi bastante utilizada pelo filósofo francês Maurice Merleau-Ponty
em sua obra Fenomenologia da Percepção. A obra de Merleau-Ponty é bastante
extensa e profunda, mas o que mais nos interessa é a questão da experimentação
para se compreender o espaço.
Segundo o filósofo, para se apreender o espaço é necessário a experiência, e esta
só é possível através da interação entre corpo e espaço e captadas pelos sentidos,
156
MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1994.
p.273.
109
lembrando que a apreensão do espaço não é imediata (visão), e sim gradual,
através da leitura captada pela junção da interpretação de todos os cinco sentidos.
Estes funcionam como captadores espaciais.
[...] todos os sentidos são espaciais, e a questão de saber qual é o sentido
que nos dá o espaço deve ser considerada ininteligível se refletimos no que
157
é um sentido.
Outro ponto importante é a questão da comunicação entre sentidos. Como
acabamos de afirmar, a apreensão do espaço é captada pela interpretação dos
cinco sentidos, ou seja, não basta um ou outro sentido para se entender tal espaço.
Até mesmo para se perceber a propriedade física de um material, apenas o tato não
é suficiente. Num caso desses, o som pode ser essencial. Para saber se uma
superfície é lisa ou áspera, a visão pode responder. Precisa-se de uma combinação
de sentidos, de uma comunicação. É o que Merleau-Ponty destaca na sua
passagem:
Os sentidos comunicam-se entre si e abrem-se à estrutura da coisa. Vemos
a rigidez e a fragilidade do vidro e, quando ele se quebra com um som
cristalino, este som é trazido pelo vidro visível. Vemos a elasticidade do aço,
a maleabilidade do aço incandescente, a dureza da lâmina em uma plaina,
a moleza das aparas. A forma dos objetos não é seu contorno geométrico:
ela tem uma certa relação com sua natureza própria e fala a todos os
nossos sentidos ao mesmo tempo em que fala à visão. A forma de uma
prega em um tecido de linho ou de algodão nos faz ver a flexibilidade ou a
secura da fibra, a frieza ou o calor do tecido. Enfim, o movimento dos
objetos visíveis não é o simples deslocamento das manchas de cor que lhes
correspondem no campo visual. No movimento do galho que um pássaro
acaba de abandonar, lemos sua flexibilidade ou sua elasticidade, e é assim
que um galho de macieira e um galho de bétula imediatamente se
distinguem.Vemos o peso de um bloco de ferro que se afunda na areia, a
fluidez da água, a viscosidade do xarope. [...] Se se pode duvidar de que a
audição nos dê verdadeiras “coisas”, pelo menos é certo que ela nos
oferece, para além dos sons no espaço, algo que “rumoreja” e, através
158
disso, ela se comunica com os outros sentidos.
Esta discussão sobre a relação corpo-espaço de Merleau-Ponty é encontrada em
obras de dois autores que interessam diretamente a esta pesquisa: o arquiteto
finlandês Juhani Pallasmaa e o filósofo recifense Evaldo Coutinho. Ambos
desenvolveram trabalhos que se rebatem diretamente na arquitetura e que
mencionam a utilização dos sentidos para a percepção do espaço. É importante
destacar que não foi encontrada nenhuma referência direta de Evaldo Coutinho à
157
158
ibidem. p.294.
ibidem. p.308-309.
110
obra de Merleau-Ponty, mas percebe-se uma relação entre conceitos desenvolvidos
por ambos.
Além disso, embora Coutinho e Pallasmaa sejam teóricos de épocas e contextos
distintos, ambos possuem um rebatimento essencial para esta pesquisa. Coutinho
por ter se envolvido diretamente com o universo de estudo (Recife), e influenciado
na formação dos arquitetos da atual UFPE, inclusive ministrando a disciplina de
Teoria da Arquitetura por vários anos; e Pallasmaa, finlandês, por ser arquiteto e um
dos críticos mais reconhecidos da atualidade. Além disso, a figura de Pallasmaa se
torna importante pelo fato de esta dissertação ter sido desenvolvida hoje, portanto,
nada mais legítimo que este procure responder as inquietações de críticos da
arquitetura contemporâneos. O trabalho de Pallasmaa se detém justamente na
questão da arquitetura e os sentidos, além de criticar uma arquitetura sem raízes ou
ligação cultural.
Autor de vários títulos importantes, Evaldo Coutinho escreveu O Espaço da
Arquitetura (1977), um livro bastante profundo que abrange temas como a questão
do espaço da arquitetura – assim como seu título sugere –, a intuição do artista, a
autonomia dos gêneros artísticos ou a criatividade. Em muitas partes ele faz
paralelos entre diferentes tipos de arte procurando demonstrar as relações
existentes entre elas, destaca a relação entre obra e lugar, como também fala dos
sentidos – ponto que mais aproxima sua obra de Merleau-Ponty e Pallasmaa –
destacando a importância dos outros sentidos em relação à visão e a relação corpoespaço.
Sobre estes destaques feitos por Coutinho em relação à junção dos diferentes tipos
de arte podemos destacar alguns trechos como, por exemplo, em relação à noção
de conjunto provocada no observador quando este experimenta um espaço com
esculturas inerentes às estruturas do edifício: “[...] a presença da estátua esculpida e
inerente à estrutura mesma do prédio, tal o caso das cariátides, significa algo que
suscitará no observador [...] o reconhecimento de que se impôs a unidade da
concepção [...]”159
159
COUTINHO, E. O Espaço da Arquitetura. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1977. p.1.
111
Sobre o local que deve ser planejado para receber a obra de arte a passagem
seguinte é fundamental, pois nos faz perceber a importância do planejamento do
espaço para receber aquela obra de arte. Caso a obra seja retirada do seu local de
origem, não mais será possível compreendê-la na sua completude:
[ ...] está a obra agregada a seu âmbito, demorada em permanente abrigo,
mas indicando ao espectador a feição com que deve ser olhada, sem ir a
disseminações que conturbam o idêntico de si mesma, nessa atitude
prevalecendo o sentido grego de óptica: a existência de ponto de mira a que
terá que obedecer o passeante, segundo determina a obra para efeito de
ser diligenciadamente vista.
Esse lugar escolhido, pretendido necessariamente pelo autor, é indigitado
pela mesma obra, ela não se deixando contemplar sem manter o próprio
espectador no local devido; tal a orientação proveniente do jeito com que se
160
revelam, na fachada do templo, as colunas das extremidades.
Este seria um ponto que precisa ser considerado quando acontece a relo cação de
uma obra de arte. Este processo necessita de bastante cuidado e planejamento para
que a apreciação da obra não seja prejudicada, embora que se formos considerar a
observação de Coutinho ao pé da letra, o deslocamento nunca poderia acontecer,
pois este fato alteraria fatalmente a apreciação e o propósito da obra de arte.
Sobre a questão da percepção captada pelos sentidos, Coutinho relata o privilégio
dado à visão, e o conseqüente ofuscamento da interpretação dos outros captadores:
Nota-se a predominância do sentido visual, como habitualmente sucede nos
encontros entre a pessoa e o recinto, e muito mais freqüente nas
explanações acerca da arquitetura; devendo-se à prestigiosa visibilidade o
assíduo conspecto das esculturações que ofuscam, aos menos sensíveis, o
161
reconhecimento de outras captações; [...]
Embora todos estes pontos sejam abordados por Coutinho, a essência do seu
trabalho em relação ao espaço da arquitetura é a questão da matéria. Assim como
destacamos no capítulo anterior, o espaço é a matéria da arquitetura, e este espaço
é limitado pelos elementos concretos (piso, teto, paredes) – o invólucro, ou seja,
pela escultura. “A escultura encerra o que, para mim, é a arquitetura propriamente
dita.”162
Retomando a relação da apreensão do espaço através dos sentidos, a obra de
Juhani Pallasmaa, The Eyes of the Skin (1996) trata mais especificamente da
160
ibidem. p.19.
ibidem. p.155-156.
162
Entrevista com Evaldo Coutinho concedida à Eride Moura e publicada na Revista
PROJETODESIGN, Ed.286 de Fevereiro de 2004.
161
112
arquitetura em relação aos nossos sentidos. O próprio título de sua obra, traduzida
como “Os olhos da pele” já nos dá uma idéia do que seu trabalho procura
demonstrar: o relacionamento dos sentidos, assim como foi visto há pouco com a
passagem de Merleau-Ponty.
Pallasmaa é considerado um dos maiores críticos da atualidade, sobretudo por
retomar uma nova concepção de entendimento da arquitetura que envolve o estudo
do espaço e os sentidos, desafiando a ênfase cenográfica que desde os anos 1980
foi incorporada na cena arquitetônica internacional. Ele defende que a arquitetura,
mais do que efeitos visuais, deve provocar sensações que estimulam todos os
sentidos, não apenas a visão. Há no início do livro uma grande crítica ao
prevalecimento da visão acima dos outros sentidos, e da arquitetura “retiniana”, que
seria aquela apenas visual, não-sensível, para o deleite dos olhos, sem maior
aprofundamento. Chega a chamar a arquitetura atual de narcisista e niilista.
Toda experiência tocante da arquitetura é multi-sensorial; a qualidade de
espaço, matéria e escala são mensuradas igualmente pelo olho, ouvidos,
163
nariz, pele, língua, esqueleto e pelos músculos.
A arquitetura atual tende a ser 'retiniana', pois se dirige aos olhos; é
'narcisista' porque coloca a ênfase no arquiteto, no indivíduo; e é 'niilista'
porque não fortalece as estruturas culturais; ao contrário, as aniquila. Hoje,
um pequeno grupo de arquitetos constrói em todo o mundo, e os mesmos
edifícios estão em toda parte. Assim, é difícil que a Arquitetura possa
164
reforçar alguma ou qualquer cultura.
Pallasmaa mostra a necessidade de uma arquitetura que reflita seus valores
culturais, que se ligue ao local, que não seja apenas mera reprodução de um “estilo”
internacional. Mesmo não sendo objetivo deste trabalho, acreditamos que a
arquitetura produzida em Pernambuco não se enquadre naquilo que Pallasmaa
chama de arquitetura narcisista e niilista, pois vimos no capítulo anterior, que a
arquitetura local teve, particularmente no período estudado, como uma de suas
maiores preocupações a adaptação ao local, utilizando-se de elementos e soluções
de projeto que adequem a construção ao clima quente da cidade. Além disso, sabe-
163
“Every touching experience of architecture is multi-sensory; qualities of space, matter and scale are
measured equally by the eye, ear, nose, skin, tongue, skeleton and muscle.” In: PALLASMAA, Juhani.
The Eyes of the Skin. Architecture and the Senses. John Wiley: New York, 2005. p.41. Tradução da
autora.
164
Entrevista concedida a Anatxu Zabalbeascoa. Publicada originalmente no suplemento Babelia de
El Pais, edição de 12 de agosto de 2006, sob o título "La arquitectura de hoy no es para la gente".
Disponível em: http://www.vivercidades.org.br/. Acesso em: 09 de setembro de 2009. Tradução da
autora.
113
se que muitas influências culturais permanecem nas casas pernambucanas, como
por exemplo, a disposição em planta dos diferentes setores (social, íntimo e serviço).
Apoiados em Pallasmaa e Coutinho, procuraremos definir uma forma de se analisar
o espaço que abriga a relação entre a obra de arte e o edifício. Mensurar algo
subjetivo é praticamente impossível, mas buscou-se encontrar uma forma de
sistematizar as análises baseada na questão principal da apreensão dos espaços
destacados tanto por Merleau-Ponty, quanto por Evaldo Coutinho ou Juhani
Pallasmaa: a captação dos sentidos. Trata-se de um trabalho com base na
experimentação e nas sensações provocadas pelo espaço analisado. Assim,
veremos no tópico a seguir, como se estruturou a base de análise das obras
selecionadas que demonstram relações entre artes plásticas e arquitetura.
4.2 A análise do espaço
Assim como visto dito no tópico anterior, o espaço só pode ser compreendido
através da experimentação feita através do corpo. Esta é assimilada através dos
captadores (sentidos). Dessa forma observemos o esquema a seguir:
Figura 80 – Processo de análise do espaço através do corpo. Fonte: A autora.
A figura acima ilustra o processo que ocorre, de forma bastante simplificada, quando
o corpo procura apreender o espaço. O corpo, através dos seus captadores
(sentidos) identifica a dimensão material que compõe a obra total165 e interpreta a
relações entre os materiais. Essa captação nos concede a percepção da dimensão
física dos limites, o invólucro de Evaldo Coutinho (escultura). A obra de arte
arquitetônica, formada pelo vazio, pelo espaço delimitado pela sua escultura –
materiais e limites – unida com as artes plásticas – elemento neste caso não
165
Entende-se por obra total a obra maior que corresponde ao trabalho dos arquitetos e artistas
plásticos juntos.
114
adicionado, mas componente da dimensão escultural da arquitetura, ou seja, parte
integrante – e as relações entre estas duas partes constituem o espaço que procura
ser apreendido. Este espaço é o que chamamos de obra total, pois ele resulta da
junção da obra arquitetônica com a obra de artes plásticas.
Dessa forma, temos a dimensão material como ponto que faz a intermediação entre
o corpo e o espaço. É através da percepção da escultura que se inicia a apreensão
do espaço.166 A dimensão material é estudada pelos captadores do corpo (sentidos).
O espaço composto pela obra total se expressa para o corpo através desta relação
de materiais e não-materiais167. Esta relação delimita e define o construído e o nãoconstruído, a escultura ou invólucro, constituindo o espaço.
Como forma de sintetizar este esquema em uma forma de aplicá-la
metodologicamente a um espaço, foram identificados três eixos de análise principais
e alguns questionamentos sobre eles, sendo:
a. Dimensão sensorial
Quais os sentidos estimulados? Como? Como se encontra o aspecto tátil das
superfícies arquitetônicas (pisos, paredes, teto) em relação à obra de arte? Como se
dá a relação a obra de arte plástica com os transeuntes/habitantes? Que sensações
esta relação desperta?
b. Dimensão material
Quais os elementos presentes? Qual o tipo de obra de arte plástica? Os materiais
utilizados e as formas de tratamento das superfícies da obra total. Quais são os
tratamentos utilizados? Quais as texturas? Qual a forma de contato da obra de arte
plástica com a arquitetura?
c. O espaço da obra total
Como está organizado o invólucro? Como a obra de arte plástica está inserida no
espaço? Há alguma preocupação em elementos como o piso para direcionar o olhar
para a obra de arte plástica? Quais as delimitações do espaço de admiração? Qual
a relação deste espaço com outros? Quais as possibilidades de apreciação da obra
166
167
Diga-se inicia porque o espaço também envolve outras dimensões, que não apenas material.
Não-materiais = vazio.
115
de arte plástica? Luz. O trabalho com a iluminação. De que forma o ambiente recebe
a influência da luz/sombra? Cores. De que forma a cor é utilizada no espaço criado
para a apreciação da obra de arte plástica? Há incorporação da obra de arte plástica
no cumprimento de atividades rotineiras do dia-a-dia, como, por exemplo, dirigir-se
ao elevador?
A partir destas questões, foi desenvolvida uma ficha (anexo 1) para ser aplicada aos
estudos de caso. A ficha contém primeiramente uma área de preenchimento básica
com os dados da obra de arquitetura e a obra de arte. A seguir têm-se três caixas
básicas que se referem aos eixos de análise identificados há pouco e outra área
para observações adicionais.
É importante frisar que na caixa da análise sensorial foi feita um recorte, deixando
esta com a análise de dois sentidos: tato e visão. Embora tenhamos visto que a
crítica maior de Pallasmaa seja sobre o prevalecimento da visão sobre os outros
sentidos, destacamos aqui que foi decidido fazer este recorte apenas a fim de
simplificar a pesquisa de leitura do espaço, e o tato e a visão foram os sentidos
eleitos por estarem mais ligados à dimensão material. Lembremos que, segundo
Coutinho, é a escultura que encerra a matéria da arquitetura, o espaço, reforçando
mais uma vez a nossa defesa de que os sentidos mais ligados à questão material
podem nos ajudar a entender o vazio, mesmo que de forma mais simplificada.
Vale salientar também que através desta análise utilizando-se de dois sentidos, não
estamos, de forma alguma, afirmando que alguns sentidos são mais ou menos
importantes que outros, apenas estamos simplificando o estudo a ser feito. Além
disso, sabe-se que a criação e aplicação de fichas não conseguem dar conta da
complexidade de relações que existe para se apreender um espaço, mas este se
mostrou como um meio viável para a sistematização dos dados.
4.2.1 Espaço interno x espaço externo
À medida que as visitas foram sendo realizadas, muitos outros questionamentos
surgiram, e a questão do espaço externo apareceu como um impasse. Como
analisar o espaço que não é delimitado fisicamente como um ambiente de um hall
de um edifício ou uma sala de visitas? Onde está a escultura (invólucro) do espaço
externo? Sabe-se que as formas de artes plásticas escolhidas para serem
116
analisadas neste estudo limitam-se a painéis, murais e esculturas, e em alguns
momentos encontramos painéis de azulejos que revestem toda ou parte da fachada
de um edifício, ou uma escultura que está localizada na área externa da construção.
Sabe-se que este trabalho procura entender como a integração entre obra de arte
plástica e o edifício acontece através da interpretação do espaço que faz a
integração entre os objetos de artes plásticas e o edifício, como se fosse algo
limitado, criado para acolher este diálogo entre as artes. Assim sendo, como ficaria
esta questão dentro de um espaço não delimitado pelo edifício, um espaço externo?
Para esta pesquisa acredita-se que resposta está na escala da análise. Em casos de
painéis que revestem toda uma fachada, continua-se a ter a obra do artista
interagindo com a obra do arquiteto dentro de um espaço, e esta relação atinge os
olhos de quem está observando a curta distância (como uma observação micro da
obra, na escala dos detalhes), ao mesmo tempo de quem está longe, observando o
volume do edifício numa escala macro, do observador da rua, da cidade. Sobre as
paredes divisórias dos lotes, Coutinho destaca:
As devessas que separam as secções do território sem arquitetura, são
meramente convencionais em sua condição de sebes, desprovidas de
meios para fomentar, nos trechos que elas delimitam, a coordenação de
seus elementos; diferem, portanto, das paredes que configuram um ser
precisamente definido, com elas, além de sua função demarcatória, a
colaborarem no concerto dos penetrantes valores, ora fechando-se em
mural, ora entreabrindo-se em vazaduras, consoante exija a combinação
daqueles valores. Assim, o lugar arquitetônico, instituindo-se em face dos
vindouros recheios, incorporando a ritualidade que será a mesma enquanto
persistir o prédio, é o resumo de universalizadora franquia; sendo a cidade a
aglomeração de ensejos em que aprimoram as relações entre pessoa e o
local, e o acúmulo de estadias que transcendem dos atuais ocupantes e as
168
positiva, em contemporaneidade única.
Desta passagem podemos concluir que as paredes que delimitam o lote sem
nenhum tratamento ou nenhum outro objetivo que não seja a função de dividir, não
configuram um espaço arquitetônico. Já no caso daquelas que recebem um
tratamento especial, artístico, estas conformam a base para a obra de arte, quase
como a tela branca para o artista pintar, e só assim ela deixa de ser uma parede
meramente divisória e passa a ser um objeto de arte inserido num espaço para ser
observada. No caso de uma fachada de um edifício que recebe o revestimento de
um painel em todo o seu plano de extensão, pode-se definir o lote do terreno como o
espaço onde a obra se insere (considerando a face do edifício como a base de
168
COUTINHO, E. O Espaço da Arquitetura. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1977. p.214.
117
aplicação da obra de arte) e esta relação pode ser observada de perto (micro –
dentro do lote) ou de longe (macro – de fora do lote, ou da rua).
Assim, a forma de se analisar o espaço interno ou externo será a mesma,
considerando-se apenas uma escala de observação a mais (macro), o que não
acontece nos casos de espaços internos.
A partir da experimentação dos espaços e do preenchimento das fichas foram
eleitos alguns eixos de classificação em relação a como se dá a relação da obra de
arte com a arquitetura. Estes serão apresentados no fim do tópico a seguir.
4.3 Apresentação das obras
Para o estudo, foram eleitas treze edificações produzidas entre os anos de 1951 e
1976, compreendendo edifícios públicos e privados, com diferentes programas e que
possuem significativos espaços de integração entre arte e arquitetura:
Ano
Obra
Arquiteto
Uso original
Tipo
Obra de arte
Autor
1951
Biblioteca de Casa
Amarela
Heitor Maia
Neto
Biblioteca
Público
Painel externo
Hélio Feijó (AP)
Painel interno
Reynaldo
Fonseca (AP)
1955
Residência
Torquato de Castro
Heitor Maia
Neto
Residência
unifamiliar
Privado
1957
Edifício Acaiaca
Delfim Amorim e
Lúcio Estelita
Residência
multifamiliar
1958
Residência Isnard
de Castro e Silva
José Norberto
Castro Silva
Residência
unifamiliar
Privado
1960
Biblioteca Central /
UFPE
Valdecy Pinto e
Antônio Didier
Biblioteca
Público
1960
Edifício Santo
Antônio
Acácio Gil
Borsoi
Edifício de
lojas e
escritórios
Privado de
uso público
1968
1972
Edifício Sede da
SUDENE
Edifício Sahara
Maurício Castro
e equipe
Vital Pessoa de
Melo
Privado
Edifício
público –
administrativo
Público
Residência
multifamiliar
Privado
Painel externo
(ladrilhos
cerâmicos)
Escultura
externa
Painéis de
azulejos
(fachadas)
Corbiniano Lins
(AP)
Corbiniano Lins
(AP)
Delfim Amorim
(ARQ)
Painel interno
Reynaldo
Fonseca (AP)
Mosaico
externo
Não identificado
Vitral
Painel interno
Portão-painel
Painéis de
baixo relevo
(anexo e
biblioteca)
Piso do pav.
térreo
Painel interno
Baldini (AP),
Aurora (AP)
Acácio Borsoi
(ARQ)
Corbiniano Lins
(AP)
Paulo Roberto
(AP/ARQ)
Francisco
Brennand (AP)
Anchises
Azevedo (AP)
118
1972
Edifício Sede da
CELPE
1972
Edifício Sede da
RFFSA
1973
Edificações do
Parque Histórico
Nacional dos
Guararapes
1975
Edifício Sede da
CHESF
Vital Pessoa de
Melo e
Reginaldo
Esteves
Frank Svensson
e Marcos
Domingues
Armando de
Holanda
Maurício Castro
e Dinauro
Esteves
Edifício
público –
administrativo
Público
Edifício
público –
administrativo
Público
portaria /
administração
/ lanchonete
Edifício
público –
administrativo
Público
Público
Painel interno
Neves (AP)
Painel interno
Francisco
Brennand (AP)
Painel interno
Francisco
Brennand (AP)
Painéis de
azulejos das
fachadas –
administração
e lanchonete
Escultura
externa
Vitral bloco
principal
Painel interno
Painel interno
1976
Edifício Gropius
Vital Pessoa de
Melo
Residência
multifamiliar
Privado
Athos Bulcão
(AP)
Corbiniano Lins
(AP)
Francisco
Brennand (AP)
Francisco
Brennand (AP)
Mirella Andreotti
(AP)
Vitral
restaurante
Ferreira (AP)
Painel fachada
Athos Bulcão
(AP)
Figura 81 – Tabela das obras selecionadas. AP – Artista plástico / ARQ – Arquiteto. Fonte: a autora.
As obras visitadas foram selecionadas levando em consideração a localização
(Região Metropolitana de Recife), a sua importância para a arquitetura local (muitas
delas são ícones da produção moderna do estado), o seu autor (para que houvesse
variedade, a amostra compreende obras de quatorze arquitetos), os usos (procurouse incluir edificações residenciais unifamiliares, multifamiliares e edifícios públicos) e
o tipo de obra de arte que o edifício abriga (limitando-se a painéis, murais e
esculturas). Sabe-se que existem muitos outros edifícios que poderiam ser incluídos
na nossa análise. É importante frisar que os edifícios escolhidos não são mais nem
menos importantes do que outros que poderiam estar presentes na lista.
Voltando para a análise das obras selecionadas, para cada edifício a ficha de
análise (anexo 01) foi preenchida, procurando identificar o que o observador (no
caso, a autora desta pesquisa) conseguiu captar em relação aos três eixos de
análise apresentados no item 4.2. O anexo 02 mostra um exemplo de uma dessas
fichas preenchidas. Portanto, estamos diante de uma percepção fenomenológica
extensa captada pelo observador. Antes de entrarmos em detalhes das análises dos
espaços de integração, é interessante que façamos uma breve apresentação das
obras selecionadas:
119
4.3.1 Biblioteca de Casa Amarela (1951)
Figura 82 – Heitor Maia Neto. Biblioteca de Casa Amarela. Fonte: Museu da Cidade do Recife (com
alteração da autora).
Figura 83 (esq.) – Vista externa da Biblioteca de Casa Amarela. Foto: Alexandre Braz de Macedo.
Figura 84 (dir.) – Detalhe do painel de Helio Feijó - Biblioteca de Casa Amarela. Foto: Ana Clara Salvador.
A Biblioteca de Casa Amarela foi projetada pelo arquiteto Heitor Maia Neto, em
1951, e é fruto de um concurso vencido pelo ainda estudante em 1950. O edifício se
localiza num terreno de esquina e possui na fachada voltada para a rua principal um
painel de azulejos do artista plástico Hélio Feijó. A edificação é formada pela
articulação de blocos com claros traços modernistas, sobretudo da Escola Carioca: o
telhado em borboleta, o uso de platibandas, as empenas trapezoidais, o uso do
elemento vazado e uma fina marquise sustentada por tubos de aço. Segundo
Naslavsky: “Artes plásticas, arquitetura e desenho de mobiliário integram-se: painel
de azulejos de Hélio Feijó e mobiliário elaborado pelo próprio arquiteto. Esse projeto
120
evidencia a difusão da obra de Oscar Niemeyer em solo pernambucano.“169 O
edifício sofreu reformas e alguns elementos externos foram adicionados, como
grades metálicas, que foram fixadas por cima de algumas peças do painel. Mesmo
assim, tanto o edifício quanto a obra de artes plásticas mantém sua integridade.
4.3.2 Residência Torquato de Castro (1955)
Figura 85 (esq.) – Heitor Maia Neto. Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
Figura 86 (dir.) – Escultura de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: Mônica Luize
Sarabia.
Figura 87 – Painel de Reynaldo Fonseca para a Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
Figura 88 – Ladrilho cerâmico de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
A residência Torquato de Castro foi projetada pelo arquiteto Heitor Maia Neto, em
1955, e assim como na Biblioteca de Casa Amarela, esta residência possui claros
traços do modernismo brasileiro, sobretudo influências de Lúcio Costa. Maia Neto se
preocupou bastante com a ventilação dos ambientes, tirando partido de soluções de
169
NASLAVSKY, Guilah. Op.cit., 2004. p.136.
121
treliças de madeira, elementos vazados e pergolados. Há também o uso de um
grande septo na fachada principal que penetra no grande bloco trapezoidal da
edificação, criando uma composição com formas assimétricas. A edificação recebeu
obras de dois artistas plásticos: Corbiniano Lins (ladrilhos cerâmicos e escultura
externa) e de Reynaldo Fonseca (painel interno).
Internamente a residência possui quatro níveis diferentes. Estes níveis são
articulados a partir da sala de jantar, que possui acesso do exterior, e se encontra no
centro da casa possuindo um grande pé-direito. As salas de estar estão num nível
mais alto, e é no ambiente que chamamos de estar TV que se localiza o painel de
Reynaldo Fonseca, podendo este ser observado de vários ambientes e ângulos de
visão diferentes. Os ladrilhos cerâmicos de Corbiniano encontra-se no estar, e passa
para o exterior do terraço do térreo, permitindo que seja observado tanto interna
quanto externamente. Note-se também que todas as obras de arte estão localizadas
em áreas que desempenham função social.
Figura 89 (esq.) – Heitor Maia Neto. Residência Torquato de Castro – planta baixa. Desenho: a autora.
Figura 90 (dir.) – Distribuição dos ladrilhos cerâmicos de Corbiniano Lins, passando do interior para o
exterior da edificação. Foto: A autora.
122
4.3.3 Edifício Acaiaca (1957)
Figura 91 (esq.) – Delfim Amorim. Edifício Acaiaca. Foto: A autora.
Figura 92 (dir.) – Delfim Amorim. Detalhe dos azulejos do Edifício Acaiaca, desenhados pelo arquiteto.
Foto: A autora.
O edifício Acaiaca foi projetado por Delfim Amorim e Lúcio Estelita em 1957 e é
considerado um grande símbolo do bairro de Boa Viagem. Lançado como residência
de veraneio, é um conjunto apartamentos de dois e três quartos dispostos
paralelamente à praia, criando um grande bloco prismático. Este prisma é solto sob
pilotis e tem os cantos chanfrados. Apresenta um volume elíptico destinado a abrigar
a circulação vertical e a portaria original. Neste projeto, percebem-se elementos da
arquitetura moderna brasileira aliada à utilização de panos de azulejos, que neste
caso, foram desenhados por Delfim Amorim e que remetem tanto à adoção moderna
brasileira dos azulejos após o edifício do MES, quanto à própria postura tradicional
da arquitetura portuguesa. Segundo Luiz Amorim, Delfim utilizava o azulejo em suas
obras desenvolvidas em Portugal, pois como se sabe o azulejo é um elemento da
arquitetura tradicional do país.170 Além disso, o arquiteto não tinha nenhuma
pretensão em ser confundido com um artista plástico, apenas realizava os desenhos
dos módulos como parte da própria edificação. Ou seja, ele não enxergava o grande
pano de azulejo como um painel mural adicionado ao edifício. O azulejo é parte do
edifício.171 Mesmo não havendo pretensão do arquiteto em realizar uma obra de
arte, não podemos desconsiderar o valor artístico destes elementos. Segundo
Naslavsky: “Eis uma verdadeira obra de arte mural de dimensões urbanas que
170
171
Entrevista concedida pelo arquiteto Luiz Amorim, filho de Delfim Amorim, realizada em 28/06/2011.
Idem.
123
tomou um papel fundamental em sua obra, uma verdadeira marca.”172 O azulejo
também é utilizado como artifício de proteção das superfícies, como bem destaca
Gomes:
Amorim recorre à tradição para resolver um problema que não tem idade.
Recupera o uso do azulejo, criando padrões decorativos para cada uma de
suas obras. Vale-se de peças industriais, invariavelmente brancas, [...] que
pinta artesanalmente, com máscaras apropriadas. Limita-se a usar dois tons
de azul mas, em alguns casos, acrescenta uma segunda cor.
No Edifício Acaiaca (1958) reveste inteiramente as empenas e, com o
mesmo azulejo, cria duas barras horizontais, uma na base e outra no topo
173
do edifício, obtendo uma moldura para o quadro composto pelas janelas.
Além do azulejo, o peitoril ventilado é outro elemento que adequa o edifício ao clima
local. Este artifício para substituição das venezianas foi “criado e incorporado à
arquitetura pernambucana por Augusto Reynaldo”174 e continuou a ser utilizado por
Amorim e por vários arquitetos da região.
Figura 93 – Detalhe das diferentes texturas dos materiais. Foto: A autora.
172
NASLAVSKY, Guilah. Op. cit., 2004. p.122.
SILVA, Geraldo Gomes da. Delfim Amorim. In: Revista AU nº57. São Paulo, dez.94-jan/95, p. 77.
174
NASLAVSKY, Guilah. Op. cit., 2004. p.120.
173
124
4.3.4 Residência Isnard de Castro e Silva (1958)
Figura 94 (esq.) – Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A autora.
Figura 95 (dir.) – Painel de Reynaldo Fonseca para a Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A autora.
Figura 96 (esq.) – Mural de mosaico para a Residência Isnard de Castro e Silva. Autor não identificado.
Foto: A autora.
Figura 97 (dir.) – Vista aproximada do mural de mosaico para a Residência Isnard de Castro e Silva. Autor
não identificado. Foto: Fernando Diniz.
A Residência Isnard de Castro e Silva foi projetada pelo ex-integrante da DAU, José
Norberto Castro Silva em 1958, e sua linguagem mostra a influência da arquitetura
da Escola Carioca: empenas trapezoidais e o uso de elementos vazados, que neste
caso são de louça. A residência representa um programa típico de residências locais
dos anos 1950: um volume solto para os quartos no pavimento superior por cima de
uma área de estar que se integra com o exterior e jardins através de grandes panos
de esquadrias. Os setores eram bem definidos. Originalmente, o térreo abrigaria a
área social e de serviço, e o pavimento superior abrigaria o setor íntimo.
125
Os revestimentos são variados, há uso de pastilhas cerâmicas e pedras naturais. A
cor é também outro elemento muito utilizado. Os tons de marrom nas pastilhas
cerâmicas e nas esquadrias de madeira se juntam aos elementos vazados azuis,
aos panos de vidro e aos coloridos cacos de azulejo que formam o painel de
mosaico do jardim externo. Uma grande esquadria de vidro interliga este jardim à
antiga sala da casa, que por sua vez, recebe um painel de pintura do artista plástico
Reynaldo Fonseca. As duas obras de arte são figurativas. O mosaico retrata
elementos nordestinos e o painel de pintura retrata uma cena de família.
4.3.5 Biblioteca Central da UFPE (1960)
Figura 98 (esq.) – Biblioteca Central da UFPE. Foto: Aristóteles Cantalice II.
Figura 99 (dir.) – Vista externa do vitral da Biblioteca Central da UFPE. Foto: A autora.
Figura 100 (esq.) – Recuo da faixa de pastilhas afastadas do vitral da Biblioteca Central da UFPE. Foto: A
autora.
Figura 101 (dir.) – Vista do vitral da Biblioteca Central da UFPE a partir de um dos corredores. Foto: A
autora.
126
O edifício da Biblioteca Central da Universidade Federal de Pernambuco foi
projetado pelos arquitetos Valdecy Pinto e Antônio Didier em 1960. Seu volume
resulta de uma planta “H”, formada por uma estrutura de pilares, brises e vigas de
concreto aparente e vedação em tijolos maciços também aparentes. Recebe brises
verticais e horizontais e um grande vitral de autoria de Baldini e Aurora, executado
na própria escola de Artes da UFPE. Este vitral marca o volume da circulação
vertical do edifício. Os patamares da escada encontram-se rentes à face interna do
vitral, não interrompendo assim a continuidade do plano da obra de arte.
4.3.6 Edifício Santo Antônio (1960)
Figura 102 (esq.) – Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 103 (dir.) – Detalhe dos elementos vazados do Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 104 (esq.) – Painel de tijolos do Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
Figura 105 (dir.) – Portão-painel de Corbiniano Lins para o Edifício Santo Antônio. Foto: A autora.
127
O Edifício Santo Antônio foi projetado por Acácio Gil Borsoi em 1960. É um edifício
de escritórios, sendo estes dispostos nos quatro pavimentos da edificação. Localizase numa área central, de intensa circulação de pessoas e nos fundos do terreno do
Convento Franciscano. O edifício obedece às diretrizes do entorno, adequando-se
ao gabarito e possuindo galerias e ruas internas convidativas aos pedestres e que
servem também como acesso para o corpo eclesiástico do convento.
O térreo é de lojas com um acesso principal à parte posterior do terreno, o
que dá acesso ao corredor interno do térreo, que possui, abaixo de sua laje,
uma coberta de pergolado de placa de concreto com um sutil coletor de
175
ventos e uma iluminação transversal.
A fachada principal, voltada para o poente, recebeu tratamento especial do arquiteto,
que tomou partido de elementos vazados de concreto, moldados in-loco. O sistema
de encaixe das peças acabou por compor um plano de elementos retangulares que
saltam e recuam da fachada, permitindo a constituição de uma segunda pele do
edifício e a conseqüente passagem constante de ventilação.
Internamente, na portaria e hall de acesso para os escritórios, o edifício recebe um
portão-painel de Corbiniano Lins, formado de materiais metálicos e que retrata a
figura de Santo Antônio. Mais resguardado, na parede posterior do hall, de frente
para os elevadores e ao lado do acesso da escada tipo espinha-de-peixe, localiza-se
um painel de tijolos aparentes, projetado pelo próprio arquiteto. O ambiente do hall
de elevadores recebe luz zenital, permitida pelos mezaninos dos patamares das
escadas que passa por todos os pavimentos e que se encerra por uma grande
clarabóia, criando assim um ambiente dramático e especial.
Figura 106 – Corte transversal do Edifício Santo Antônio mostrando a clarabóia e os mezaninos com
patamares das escadas. Fonte: Borsoi Arquitetos Associados. In: NASLAVSKY, Op. cit., 2004. p.195.
175
CANTALICE II, Aristóteles S. C. Um Brutalismo Suave: Traços da Arquitetura em Pernambuco
(1965-1980). Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano da
Universidade Federal de Pernambuco, 2009. p.64.
128
Figura 107 (esq.) – Edifício Santo Antônio. Vista do vazio iluminado pela clarabóia a partir do último
pavimento. Foto: Borsoi Arquitetos Associados.
Figura 108 (dir.) – Edifício Santo Antônio. Vista do vazio iluminado pela clarabóia a partir do hall do
térreo. Foto: A autora.
4.3.7 Edifício Sede da SUDENE (1968)
Figura 109 (esq.) – Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 110 (dir.) – Piso com cerâmica de Brennand para o Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 111 (esq.) – Painel de placas de concreto em baixo-relevo para o Edifício Sede da SUDENE. Foto:
A autora.
Figura 112 (dir.) – Painel da biblioteca do Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
129
O edifício Sede da SUDENE foi projetado por uma equipe de profissionais liderada
por Maurício Castro em 1968. A escala do edifício é monumental e este se resume a
um prisma retangular, que recebe ondulações e que é segmentado, formando um
bloco serpenteado em forma de “S” e que possui planos mais recuados e mais
avançados. Segundo Cantalice, no edifício em questão, “aliou-se o peso da estrutura
e base de concreto armado, com amplos pilares, enquanto que no edifício, foi
utilizada uma leve inclinação no volume final, aliando-se as empenas finais com
revestimentos cerâmicos de vedação, encontrados e utilizados em Pernambuco.”176
As fachadas principal e posterior recebem elementos de concreto aparente
(elementos vazados na fachada principal e brises na fachada posterior). Estes
elementos proporcionam uma ventilação contínua no interior do edifício.
Para o bloco anexo, o arquiteto e artista plástico Paulo Roberto Silva projetou baixos
relevos nas fachadas laterais. Para o bloco da biblioteca uma outra composição do
arquiteto evidencia ritmos irregulares e realiza cortes trapezoidais. Para o piso do
pavimento térreo do bloco principal, encontram-se cerâmicas de Francisco
Brennand.
4.3.8 Edifício Sahara (1972)
Figura 113 (esq.) – Edifício Sahara. Foto: A autora.
Figura 114 (dir.) – Painel de cimento para o Edifício Sahara. Foto: A autora.
176
CANTALICE II, Aristóteles S. C. Op. cit., 2009. p.64
130
Projetado por Vital Pessoa de Melo em 1972, o Edifício Sahara está localizado num
terreno de esquina, no cruzamento entre a Rua dos Navegantes – paralela à
Avenida Boa Viagem (beira-mar) – e a Rua Bruno Veloso. Seu volume abriga um
apartamento por andar, sendo duplex o último apartamento. Possui 2.161,00m² de
área construída e o concreto aparente e pastilhas cerâmicas como os materiais de
maior utilização. Destaca-se por conter esquinas angulosas, marcados com linhas
horizontais dos peitoris ventilados, linhas verticais das placas de concreto moldadas
in-loco e as aberturas deslocadas para as arestas. Segundo Vital, diante do entorno
imediato, o deslocamento das aberturas para as quinas do volume foi uma forma de
garantir a vista para o mar, visto que já se previa a construção de edifícios altos em
todo o entorno do Sahara. No lobby do pavimento pilotis o edifício recebe um painel
abstrato do artista plástico Anchises Azevedo, feito de placas de cimento. O espaço
é bastante fluido e, visando eliminar a sensação de “paliteiro” resultante dos
inúmeros pilares que poderiam estar presentes no pavimento pilotis, o arquiteto
lançou mão do que chamou de pilares-septos. Estes septos que têm função
estrutural são posicionados de forma a também conduzir a ventilação para dentro do
edifício e delimitar a área de observação do painel. Em relação à rua, o pavimento
pilotis se encontra elevado, permitindo fácil visualização do painel a partir da
calçada.
Figura 115 – Edifício Sahara. Vista do painel de Anchises Azevedo a partir da rua. Foto: Fernando Diniz.
131
4.3.9 Edifício Sede da CELPE (1972)
Figura 116 (esq.) – Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 117 (dir.) – Vista do jardim de Burle Marx para o Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 118 (esq.) – Painel de Neves para o edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 119 (dir.) – Painel de Brennand para o edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Projetado por Vital Pessoa de Melo e Reginaldo Esteves em 1972, o Edifício Sede
da CELPE é formado por um bloco principal que é rotacionado e interceptado por
blocos menores. Localiza-se no bairro da Boa Vista e possui 18.997,00m² de área
construída. Como materiais mais utilizados estão o concreto aparente e o vidro.
Foram feitos estudos de cartas solares para definir a angulação dos brises verticais
e horizontais de todas as fachadas, estabelecendo horários e locais específicos de
iluminação. A característica marcante desse edifício é sua fachada principal curva,
que cria uma espécie de bolsão para abrigar um grande jardim projetado por Burle
Marx. Este recuo do bloco do edifício cria uma espécie de praça que convida as
pessoas a adentrarem o edifício. O acesso é dado por uma plataforma elevada, que
permite que o usuário observe o edifício e o jardim de diferentes ângulos de visão.
132
Figura 120 – Locação do Edifício Sede da CELPE. Fonte: VRF Arquitetura.
Figura 121 – Edifício Sede da CELPE, Fachada Noroeste. Fonte: VRF Arquitetura.
A fachada principal recebeu brises horizontais e verticais em toda a sua extensão,
criando uma espécie de “grelha” à frente do pano de vidro e conferindo profundidade
à fachada. Sobre a composição dos volumes, a sede da CELPE possui dois blocos
principais que se interceptam e possuem alturas diferentes. O bloco principal sofre
uma rotação, rebatida nas plantas dos outros blocos do edifício. Internamente, o
edifício possui dois painéis, no subsolo – do artista plástico Neves – e no pavimento
térreo – de Francisco Brennand. Ambos os painéis se localizam em áreas sociais,
em frente ao elevador dos diretores (Neves) e no grande hall de entrada, que
também serve como foyer de um auditório (Brennand).
133
4.3.10 Edifício Sede da RFFSA (1972)
Figura 122 (esq.) – Edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
Figura 123 (dir.) – Painel de Brennand para o edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
O edifício sede da RFFSA foi projetado por Marcos Domingues e Frank Svensson,
em 1972, e sua concepção e implantação foi definida por Cantalice como:
“[...] desenvolve-se a partir de um grande bloco parcialmente quadrangular
com em media três pavimentos que possui um amplo pátio interno. Dentro
desse pátio está implantado o corpo vertical da edificação, [...]. Os volumes
mais baixos comportam-se como uma miríade de blocos, ora com
177
reentrâncias, ora com saliências, ora mais baixos e ora mais altos.”
A edificação desenvolve-se em níveis diferentes, e na articulação entre o corpo
vertical e o bloco de apoio que abriga a garagem de funcionários, recebe um
extenso painel do artista plástico Francisco Brennand. O painel de cerâmica
combina suas cores da terra com o cinza das abundantes superfícies de concreto
aparente, ao mesmo tempo que mascara a visão dos automóveis estacionados. A
textura disforme das figuras retratadas provoca reentrâncias que diferem dos planos
lisos de concreto aparente. O painel está localizado num plano elevado em relação
ao jardim e blocos vizinhos, tornando o espaço do painel mais valorizado
hierarquicamente.
177
CANTALICE II, Aristóteles S. C. Op.cit., 2009. p.221.
134
4.3.11 Edificações do Parque Histórico Nacional dos Guararapes (1973)
Figura 124 – Armando de Holanda. Plano Geral para o Parque Histórico Nacional dos Guararapes. Fonte:
Universidade Federal de Pernambuco. Parque Histórico Nacional dos Guararapes: projeto físico. Recife:
UFPE, 1975. p.27.
Projetado por Armando de Holanda em 1973, o Parque Histórico Nacional dos
Guararapes (PHNG) previa a construção de várias estruturas de apoio ao longo de
sua distribuição, tendo sido construídos apenas o pavilhão de acesso, bloco de
administração, mirante e lanchonete. O parque foi construído entre os montes que
testemunharam as Batalhas dos Guararapes de 1648 e 1649, importante fato
histórico da expulsão dos holandeses do Brasil. As estruturas de Holanda ficaram
conhecidas pelas suas finas cascas “parabolóides hiperbólicas” resultantes de
estudos feitos pelo arquiteto acerca de formas geométricos e de fôrmas de fibra de
vidro para a exploração da plasticidade do concreto. São cascas abobadadas que
possuem 5cm (cinco centímetros) de espessura. Além do estudo para estas
estruturas, seus pontos sobre Roteiro para Construir no Nordeste estão presentes.
Ventilação e sombra são elementos bastante explorados, tornando as estruturas
bastante adequadas ao local. Para proteger as fachadas dos blocos das
135
intempéries, mesmo estas estando recuadas em relação às cobertas, azulejos
desenhados pelo artista plástico Athos Bulcão em azul e branco foram aplicados
(exceto no mirante), conferindo contraste das paredes de vedação e as estruturas
em concreto aparente.
Figura 125 – Armando de Holanda. Croqui para explicação da formação das cascas as das estruturas do
Parque Histórico Nacional dos Guararapes. Fonte: Universidade Federal de Pernambuco. Op.cit.. Recife:
UFPE, 1975. p.45.
Figura 126 – Pavilhão de acesso do PHNG. Foto: A autora.
136
Figura 127 (esq.) – Bloco de administração do PHNG. Foto: A autora.
Figura 128 (dir.) – Blocos da lanchonete do PHNG. Foto: A autora.
4.3.12 Edifício Sede da CHESF (1975)
Figura 129 (esq.) – Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 130 (dir.) – Croqui que mostra a relação cheio/vazio do Edifício Sede da CHESF. Fonte: Aristóteles
Cantalice II
Projetado por Maurício Costa e Dinauro Esteves em 1975, o Edifício Sede da Chesf
possui distribuição semelhante às desenvolvidas por Aldo Van Eyck, Smithsons e
Team X, onde há blocos com recuos e saliências, desenvolvendo a idéia de cluster.
Resume-se a três blocos prismáticos, que recebem recortes e adições e que são
interligados por meio de passarelas, criando um grande pátio central. Por todo o
edifício pode-se encontrar obras de arte, inclusive realizadas por Dinauro Esteves,
como foi visto no capítulo anterior, no caso dos painéis de cimento com angulações
de 45º e nas gárgulas escultóricas (ver figuras 75 e 76). Além destas realizações do
arquiteto, obras foram feitas para o edifício em parceria com artistas plásticos.
Dentre os edifícios selecionados para este estudo, a CHESF é a obra detentora do
maior número de obras de arte. Na entrada do bloco principal, tem-se uma escultura
137
de Corbiniano Lins e de frente para o balcão de informação há um grande painel de
Mirella Andreotti. Na face oposta ao painel de Mirella, encontramos um painel de
cerâmica de Francisco Brennand. Já tomando toda a fachada do bloco de
circulação, há um grande vitral do mesmo artista. A última obra se localiza no
restaurante do edifício: o vitral de Ferreira, mostrado no capítulo anterior.
Figura 131 (esq.) – Escultura de Corbiniano Lins para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 132 (dir.) – Painel de Mirella Andreotti para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 133 (esq.) – Painel de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 134 (dir.) – Vitral de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
138
4.3.13 Edifício Gropius (1976)
Figura 135 (esq.) – Edifício Gropius. Foto: A autora.
Figura 136 (dir.) – Painel de Athos Bulcão para o Edifício Gropius. Foto: A autora.
Projetado por Vital Pessoa de Melo em 1976, o edifício se localiza no bairro de Boa
Viagem. Possui 3.403,00m² de área construída e abriga dois apartamentos por
andar e cobertura. O volume é bastante simples e racional e possui aberturas
sacadas em relação ao plano da fachada lateral, que abrigam peitoris ventilados e
esquadrias. A pastilha cerâmica é o material mais utilizado, inclusive transformandose (na fachada principal) no painel do artista plástico Athos Bulcão. Este painel
abstrato de cerâmicas brancas e alaranjadas confunde o olhar do observador não
havendo lógica na organização das cores e tornando a superfície do edifício mais
leve. É interessante de perceber também a continuidade assimétrica das varandas.
O painel serpenteia toda a fachada e termina em um coroamento com pastilhas na
mesma cor da lateral do corpo do edifício. O “serpenteamento” do edifício não é
bidimensional, o painel recebe uma espécie de moldura que é “dobrada” nas laterais
do edifício, funcionando como se fosse um encaixe da tampa de uma caixa de
sapatos.
139
Figura 137 (esq.) – Serpenteamento do painel de Athos Bulcão para o Edifício Gropius. Foto: A autora.
Figura 138 (dir.) – Detalhe da caixa de concreto sacada, de uma das esquadrias da fachada lateral. Foto:
A autora.
Assim como no edifício Acaiaca ou nas estruturas do PHNG, no Edifício Gropius os
materiais da arquitetura e artes plásticas se fundem, pois o painel é a própria
superfície da fachada, toda coberta pelas cerâmicas brancas e alaranjadas. O painel
recebe uma moldura branca demarcando o seu limite. A integração é tão grande que
muitos nem percebem que o painel é, de fato, uma obra de arte, estando assim
completamente integrado à arquitetura.
4.4 Análise da integração entre arte e arquitetura
Após discorrer sobre as obras isoladamente, semelhanças foram buscadas entre as
formas de integração que encontramos nas obras juntamente com a compilação de
informações que as fichas proporcionaram. Dessa forma, foi possível perceber que
as obras de arte muitas vezes receberam algum outro tipo de função, excetuando-se
a sua função básica (estética).
140
A
B
C
D
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Painel da fachada (Athos Bulcão)
Vitral (Ferreira)
Vitral (Brennand)
Painel interno (Brennand)
Painel interno (Mirella Andreotti)
Edifício Gropius – 1976
Edifício Sede da CHESF – 1975
Edificações do PHNG – 1973
Painéis de azulejos (Athos Bulcão)
Escultura externa (Corbiniano Lins)
Edifício Sede da RFFSA – 1972
Edifício Sede da CELPE – 1972
Edifício Sahara – 1972
Edifício Sede da SUDENE – 1968
Edifício Santo Antônio – 1960
Biblioteca Central / UFPE – 1960
Res. Isnard de Castro e Silva – 1958
Edifício Acaiaca – 1957
Res. Torquato de Castro – 1955
Biblioteca de Casa Amarela – 1951
Painel interno (Brennand)
Painel interno (Brennand)
Painel interno (P. Neves)
Painel interno (Anchises Azevedo)
Piso do pavimento térreo (Brennand)
Painéis de baixo-relevo (Paulo Roberto)
Painel interno (Acácio Gil Borsoi)
Portão-painel (Corbiniano Lins)
Vitral (Baldini / Aurora)
Mosaico externo (Não identificado)
Painel interno (Reynaldo Fonseca)
Painéis de azulejos (Delfim Amorim)
Escultura externa (Corbiniano Lins)
Painel ladrilhos (Corbiniano Lins)
Painel interno (Reynaldo Fonseca)
Painel externo (Hélio Feijó)
Sabe-se que esta questão do ornamento ou obra de arte receber uma função é algo
bastante recorrente na produção moderna geral, e considerando o universo das
obras analisadas, foram identificadas 04 (quatro) classificações de relação arte-
arquitetura, sendo estas: (a) revestimento de proteção; (b) vedação; (c)
contemplação pura; e (d) desmaterialização do plano. A fim de facilitar a
compreensão da distribuição das obras em relação às classificações, foi montado o
quadro a seguir:
X
X
X
X
Figura 139 – Quadro com a distribuição das obras em relação às classificações. Fonte: a autora.
a. Revestimento de proteção
Como o próprio nome denuncia, a obra de arte incluída nesta categoria, além de sua
função estética/contemplativa, recebe a função de revestimento. Neste caso,
141
normalmente ocupam grandes áreas, chegando até a ocupar planos completos.
Dentro do nosso universo de obras a serem analisadas, foi encontrada esta
característica em seis obras, sendo elas:
 Biblioteca de Casa Amarela – painel externo de Hélio Feijó;
 Residência Torquato de Castro – painel de ladrilhos, de Corbiniano Lins;
 Edifício Acaiaca – azulejos da fachada, desenhados por Delfim Amorim;
 Edifício Sede da SUDENE – piso do pavimento térreo, desenhado por Francisco
Brennand;
 PHNG – azulejos dos módulos do bloco de acesso, administração e lanchonete,
desenhados por Athos Bulcão;
 Edifício Gropius – painel da fachada principal, desenhado por Athos Bulcão.
Através das fotos das obras, percebe-se que há casos em que o módulo-padrão
(azulejo, cerâmica, etc.): (1) se repete numa organização simétrica ou homogênea,
(2) se repete sem uma organização assimétrica ou heterogênea, (3) não se repete
ou (4) possui uma distribuição mista.
Dentre as seis obras que se apresentaram nesta categoria apenas a Biblioteca de
Casa Amarela está incluída no tipo 3 – onde o módulo não se repete. O painel
formado pelos azulejos de Hélio Feijó não recebem um desenho padrão que é
repetido como uma unidade básica. Cada módulo possui sua independência que,
conjuntamente, forma uma composição – o painel. É como se a base do módulopadrão (azulejo) servisse de tela para a composição do artista. (ver figuras 83 e 84).
Este painel abstrato está localizado na fachada do edifício, num jardim, voltado para
a rua, ou seja, está numa área pública, e embora não haja área de permanência
junto ao painel, possui visão privilegiada. Está num plano reservado, abrigado pela
moldura da edificação, que se projeta para o exterior e ao lado se limita pela
esquadria de madeira. Assim, o painel ocupa todo o plano de parede cega, do piso
ao teto, mascarando a parede e revelando a distinção entre estrutura e vedação e
distinguindo-se também através da textura de sua superfície – lisa e brilhosa.
142
Nos outros casos, o arquiteto ou artista plástico utilizou-se de um desenho padrão e
o repetiu diversas vezes, seja de forma homogênea ou heterogênea. A forma de
organização homogênea é a mais comum e foi encontrada nos Edifícios Acaiaca
(ver figura 92), SUDENE (ver figura 110) e nas estruturas do Parque Histórico
Nacional dos Guararapes – bloco de acesso principal, administração e lanchonete
(ver figuras 126, 127 e 128, respectivamente).
É neste uso de módulos padrão repetidos que encontramos os dois tipos de
observação, explicados no item 4.2.1 deste capítulo. No Edifício Acaiaca e nas
estruturas do PHNG, encontramos claramente estas duas formas de observação: a
observação macro e a observação micro.
Notemos que na observação macro do Edifício Acaiaca, a malha formada pelos
azulejos se desmaterializa, tornando-se praticamente planos de azuis bastante
claros (ver figura 91). Para o observador, o volume principal possui ainda
diferenciação dos materiais, pois a cor azul clara continua a se destacar dos outros
materiais, como o vidro ou o concreto aparente e as pastilhas dos peitoris das
janelas. Já na observação micro a malha desenhada pelo arquiteto se revela. Os
módulos são organizados em grupos de 4, formando desenhos em três níveis:
grelha (azul claro), plano escuro (azul escuro) e trevo de quatro folhas (branco).
Figura 140 (dir.) – Detalhe da diversidade de materiais - azulejo, pedra, elemento vazado, pastilha
cerâmica, vidro. Foto: A autora.
143
Nas estruturas do PHNG as observações macro e micro também aparecem. Alguns
detalhes do desenho do azulejo só aparecem na observação micro, como é o caso
das pétalas das “flores” formadas por finas linhas amarelas reveladas apenas de
perto no bloco da administração do parque. No bloco de acesso ao PHNG e nos
blocos da lanchonete há outro caso interessante: o artista utiliza o mesmo módulo
da administração e inclui o módulo branco. No pavilhão de acesso os módulos são
organizados de forma quase heterogênea (ver figura 126) e nos blocos da
lanchonete, a organização é homogênea (assim como na administração).
Figura 141 (esq.) – PHNG - detalhe dos azulejos do bloco de administração. Foto: A autora.
Figura 142 (dir.) – PHNG - observação macro dos elementos da lanchonete – módulo-padrão e módulo
branco. Foto: A autora.
Figura 143 – PHNG - repetição dos módulos do bloco de acesso. Foto: A autora.
Ainda sobre o painel do septo do pavilhão de acesso do PHNG, seu desenho cria
uma textura que confere ainda mais leveza à casca de concreto da coberta. O
afastamento existente entre o septo e a coberta gera uma sombra que quando
144
juntamos visualmente a textura dos azulejos, o liso ondulado da fina linha da coberta
contrastando com a massa verde e o céu azul, e a sombra entre os dois elementos
parece fazer a coberta flutuar.
A organização puramente heterogênea acontece no edifício Gropius (ver figuras 135
e 136). O painel é do mesmo artista dos painéis do PHNG, Athos Bulcão.
Diferentemente do PHNG, os módulos do Edifício Gropius são menores, e não são
azulejos, e sim pastilhas cerâmicas. Sua organização consegue ser mais
heterogênea que no bloco de acesso do PHNG, pois não conseguimos identificar
nenhum padrão de repetição nem na observação micro, nem na macro. Já os
detalhes dos módulos, assim como no Edifício Acaiaca, só se revelam na
observação micro, já que na macro o plano se transforma numa espécie de textura
ou cor homogênea. Diferentemente do Gropius, se voltarmos o olhar para a
observação macro do bloco de acesso do PHNG, percebemos que existe uma
malha de módulos que se repetem numa escala maior fato que de perto, não é
percebido.
Figura 144 – Observação micro das pastilhas do Edifício Gropius. Foto: A autora.
Por fim, temos a organização mista, quando existe uma repetição em um trecho
homogêneo e em outro trecho heterogêneo. É o caso do painel do bloco que faz a
transição do interior da casa para o terraço da Residência Torquato de Castro. Os
azulejos desenhados por Corbiniano partem de uma das paredes internas, passam
para a parte externa da casa, contornam um volume curvo que se localiza num
terraço e adentra novamente na casa. Sua distribuição possui um ritmo variado, ora
homogêneo, ora heterogêneo. A sensação atrai o olhar do observador que procura
145
encontrar a lógica de organização dos módulos à medida que percorre a lateral e o
terraço da casa.
Figura 145 – Residência Torquato de Castro - vista do painel de azulejos de Corbiniano Lins. Foto: A
autora.
Depois da análise sobre o uso de obras de arte com função de revestimento,
percebemos que por ser um tipo de obra que normalmente ocupa áreas maiores,
acaba por formar verdadeiros panos de módulos que podem ser apreendidos de
diferentes formas, dependendo da distância do observador e da organização dos
módulos de revestimento.
b. Vedação
Os elementos de vedação, como seu próprio nome diz, são elementos artísticos que
possuem a função de fechamento de uma área, de delimitação. Em algumas obras
visitadas, observou-se que o elemento se transforma na parede que poderia existir
em tal parte substituindo-a, ou seja, sua função de fechamento faz com que a obra
de arte se transforme no plano arquitetônico vertical (a parede).
Foram identificadas esta função em seis obras visitadas. São elas:
 Biblioteca Central da UFPE – vitral de Baldini e Aurora.
 Edifício Santo Antônio – portão-painel da portaria e painel interno do hall.
 Edifício Sede da SUDENE – painéis do bloco anexo / painel biblioteca, do
arquiteto e artista plástico Paulo Roberto Barros.
146
 Edifício Sahara – painel de Anchises Azevedo
 Edifício Sede da RFFSA – painel de Francisco Brennand.
 Edifício Sede da CHESF – vitral de Francisco Brennand e vitral de Ferreira.
Os vitrais são os exemplos mais claros de obras de arte com função de vedação.
Diferentemente dos painéis, que normalmente repousam sobre as paredes, os vitrais
as substituem, transformando-se nela e, por isso, a sua integração com o edifício –
que neste caso possui função de fechamento – é mais fácil de ser percebida. Tanto
na Biblioteca Central da UFPE, quanto no Edifício Sede da CHESF, os vitrais
transmitem ao observador toda a sua dramaticidade através da sua cor projetada
pela luz que recebe do exterior. No caso dos vitrais da Biblioteca Central e no de
Francisco Brennand para a CHESF, ambos estão localizados numa área de
circulação vertical, permitindo atrair o olhar do observador a cada instante que este
se desloca verticalmente. Já o vitral de Ferreira se localiza na área do Restaurante,
podendo ser observado também do exterior, ou seja, encontra-se também numa
área de circulação.
Figura 146 – Painel de Ferreira para o edifício sede da CHESF. Foto: Léo Caldas.
147
No caso do edifício da Biblioteca Central, o vitral de Baldini e Aurora substitui a
parede de vedação e se localiza rente aos patamares da escada, tomando toda a
área de circulação vertical, permitindo que o usuário aprecie a obra de arte à medida
que circula nos corredores e escada. Externamente, vê-se um plano único. As
paredes possuem o revestimento de pastilhas afastado do vitral, estando apenas
uma faixa de concreto pintado junto do painel, como se o revestimento da parede
mantivesse uma relação de respeito com a obra de arte (ver figura 100). Sobre as
cores utilizadas internamente encontramos tons pastéis, o que confere mais
destaque ao vitral por criar um contraste com suas cores vivas. Como visto no item
4.3.5, a planta da biblioteca é em forma de H e o bloco de circulação vertical se
localiza na ligação entre as duas massas, ou seja, as massas frontal e posterior
abrigam as atividades que exigem concentração. O trecho de ligação que abriga o
vitral funciona como ambiente de passagem, que conduz o usuário às áreas de
permanência da biblioteca e confere também um momento de descanso e
atratividade visual para o transeunte.
Figura 147 (esq.) – Vitral da Biblioteca Central da UFPE. Foto: A autora.
Figura 148 (dir.) – Biblioteca Central/UFPE. Detalhe da junção do patamar da escada com o vitral . Foto: A
autora.
Semelhante ao vitral da Biblioteca Central, a organização do vitral de Brennand para
o edifício Sede da CHESF também substitui todo o plano da fachada do bloco de
circulação vertical e os revestimentos das paredes internas recuam em relação à
obra de arte. A diferença é em relação à escala do painel e à escada, que se
148
encontra afastada do vitral. Sua localização estratégica recebe os usuários que
percorrem os pavimentos e os que passam nas áreas sociais próximas e que podem
observá-lo de diferentes ângulos de visão.
Figura 149 – Croqui sobre a observação do vitral de Francisco Brennand para o edifício Sede da CHESF.
Desenho: a autora.
Figura 150 (esq.) – Recuo do revestimento da parede lateral em relação ao vitral de Brennand para o
Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
Figura 151 (dir.) – Observação externa do vitral de Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A
autora.
O contato do vitral de Brennand com o piso também é diferenciado em relação ao
vitral da Biblioteca Central. No primeiro caso, há um jardim de seixos que recebe o
contato do painel com o piso de forma mais branda, como se o vitral brotasse do
piso. Já na Biblioteca Central, este contato é mais seco, estando o vitral tocando a
base do piso diretamente.
149
Figura 152 (esq.) – Contato do vitral de Brennand para o Edf. Sede da CHESF, em um jardim de seixos.
Foto: A autora.
Figura 153 (dir.) – Contato do vitral da Biblioteca Central da UFPE com o piso, terminando em uma
estrutura metálica que repousa diretamente no mesmo. Foto: A autora.
Já os casos do Edifício Santo Antônio e do Edifício Sede da RFFSA são um pouco
diferentes. No primeiro, as duas obras de arte possuem função de fechamento: o
portão-painel do artista Corbiniano Lins foi criado para fazer o isolamento da área de
portaria do edifício ao mesmo tempo que faz alusão ao santo que dá nome à
edificação e o painel de tijolos se forma a partir da mutação dos módulos-padrão da
própria parede (tijolos) resultando na composição artística de autoria do arquiteto.
O portão-painel está no lugar de uma esquadria comum que poderia existir, e recebe
uma função artística de comunicação ao mesmo tempo que cumpre sua função de
elemento delimitador. É formado por uma estrutura metálica pintada de preto, que
serve como uma espécie de moldura, e as figuras são formadas por fios retorcidos.
As diferentes texturas foscas e brilhosas estimulam o anseio de tocar a obra: fios,
partes semelhantes a pedras transparentes e placas metálicas, todas trabalhando
em conjunto. Quando fechado, este portão substitui a parede de fechamento ou a
esquadria que interromperia o acesso ao interior do bloco. Quando aberto, funciona
como um verdadeiro painel sobre a parede de tijolos, convidando as pessoas a
150
adentrarem no edifício. É completamente vazado, o que permite a visualização e
ventilação permanentes e não toca o teto nem o piso.
Figura 154 (esq.) – Detalhe dos metais retorcidos do portão-painel para o Edifício Santo Antônio. Foto: A
autora.
Figura 155 (dir.) – Portão-painel do Edifício Santo Antônio repousando sobre a parede de tijolos. Foto: A
autora.
A locação do portão-painel, bem como do painel de tijolos, é estratégica, visto que
as obras estão nos locais de recepção do público. Para acessar os escritórios é
inevitável não passar pelas obras de arte. Da galeria interna o observador consegue
visualizar as duas obras ao mesmo tempo.
Figura 156 (esq.) – Planta baixa do hall do Edifício Santo Antônio com as locações das obras de arte.
Desenho: a autora.
Figura 157 (dir.) – Edifício Santo Antônio. Vista do espaço que abriga o portão-painel e o painel de tijolos
a partir da galeria. Foto: Fernando Diniz.
151
A importância do painel interno de tijolos se dá principalmente por dois aspectos.
Primeiro por ser um painel desenhado pelo próprio arquiteto – Acácio Gil Borsoi –
através das diferentes disposições dos tijolos. Segundo, pelo fato de os elementos
utilizados para compor o painel são os mesmos utilizados para a conformação da
parede. O tijolo aparente trabalhado como módulo-padrão, ora saca da parede, ora
recua, e chega até a possuir variações, recebendo curvas ou recortes e angulações
de 45 graus. O espaço que abriga este painel recebe de uma clarabóia a luz que é
derramada na escada tornando o ambiente dramático e, para alguns, divino. Quando
a luz se espalha por sobre o painel, as formas são ressaltadas através das
projeções das sombras, que revelam os diferentes desenhos. Este jogo de volumes
convida o observador ao toque. Como forma de destaque de que aquele trecho do
painel não é a simples parede, o arquiteto lança uma espécie de moldura também
composta pelos tijolos sacados. Por fim, a assinatura do arquiteto-artista, encontrase num dos módulos.
A forma de integração neste caso é máxima, pois a própria parede se altera e forma
o painel. Há um descortinamento do espaço, à medida que o transeunte adentra ao
na galeria e no hall tem uma surpresa. O observador é envolvido pelo espaço e
atraído pela luz que vem da escada. O painel de tijolos é o complemento ideal para
aquele espaço, pois ele contribui para a concentração do observador no vazio e no
descortinamento deste pela luz. O painel literalmente brota da superfície.Por não se
diferenciar da parede com cores (apenas com luz), por vezes o painel pode passar
despercebido, e esta falta de percepção deve ser considerada positiva, pois mostra
o quanto aquele trabalho de arte está integrado.
152
Figura 158 (esq.) – Edf. Santo Antônio – detalhe de variações do módulo-padrão. Foto: A autora.
Figura 159 (dir.) – Edifício Santo Antônio - detalhe saques/recuos do módulo e moldura com assinatura
do arquiteto. Foto: A autora.
No caso do Edifício Sede da SUDENE, encontramos dois exemplos de elementos de
vedação: as placas de concreto que revestem o bloco anexo e a fachada do bloco
da biblioteca. No caso do bloco anexo, a escala dos painéis é maior, podendo o
painel ser observado também de longe. As fachadas do bloco recebem uma malha
organizadora em ritmo irregular, e as quadrículas formadas ora permanecem lisas,
ora recebem desenhos em baixo-relevo que recebendo a luz do sol, destaca as
linhas do desenho com a projeção de suas sombras. Outro ponto importante é a
organização aleatória dos módulos que recebem desenhos. Esta “desorganização
proposital” pode ser vista também no piso, que possui núcleos de clarabóias junto ao
painel (ver figura 111). Já no bloco da biblioteca, o painel é formado de uma paredesepto de concreto que recebe rasgos e ranhuras organizadas de forma irregular.
Esta parede funciona como uma segunda pele do bloco, estando a pele de vidro
recuada em relação à parede-septo. O ritmo das aberturas e das linhas verticais
também é irregular e marcam a fachada como se fossem linhas de força que
provocam certa sensação de verticalidade no longo plano horizontal da parede.
153
Figura 160 (esq.) – Detalhe de baixo relevo na lateral do bloco de apoio do Edf. Sede da SUDENE. Foto: A
autora.
Figura 161 (dir.) – Edf. Sede da SUDENE. Ritmos aleatórios da malha reguladora e dos módulos em baixo
relevo do painel do bloco anexo (lateral direita). Desenho: a autora.
Figura 162 (esq.) – Painel da biblioteca do Edifício Sede da SUDENE. Foto: A autora.
Figura 163 (dir.) – Detalhe de uma das aberturas trapezoidais do painel da biblioteca do Edf. Sede da
SUDENE. Foto: A autora.
Nestes três exemplos (painel do Edf. Santo Antônio e painéis do Edf. Sede da
SUDENE), percebemos que a superfície vertical arquitetônica (parede) sofre
alterações em seu material constituinte para que ele se torne o objeto de obra de
arte.
Passando para o painel do Edifício Sahara, percebe-se que ele possui, assim como
os outros exemplos, uma malha reguladora, que permitiu a sua “divisão” e a
montagem mais simples, mas a diferença é que este painel repousa sobre a parede.
O painel se localiza num plano privilegiado de visão (abriga a relação entre exterior e
154
interior) e marca a área social do edifício, estando na transição do externo e interno,
ou social e privado (ver figuras 114 e 115). Saca da parede em que se encontra e
não toca o piso ou teto, destacando ainda mais a sua importância. As marcas das
divisões do painel foram deixadas à mostra, e o ritmo dos módulos é irregular
horizontalmente. O ponto que chamou mais atenção em relação à integração deste
painel com o edifício foi a forma como ele “invade” a parede, unidade puramente
arquitetônica. O painel possui um “rasgo” – solicitado pelo artista plástico – que
penetra na parede, cortando-a e permitindo a entrada de luz. Neste rasgo
atualmente há uma esquadria metálica, mas originalmente havia apenas uma pele
de vidro sem caixilho178. Este rasgo pode ser considerado como o ponto principal de
contato entre a obra de arte plástica e arquitetura, visto que o elemento artístico
“invade” e “modifica” o elemento de vedação arquitetônica (parede). No ambiente
interno há uma outra fenestração – determinada pelo arquiteto, assim que o artista
solicitou o rasgo do painel – que permite a entrada de luz do exterior, é filtrada pelo
ambiente e passa para o rasgo do painel, “banhando” a superfície da obra de arte
com a luz. As quinas da parede onde se encontra o painel recebem uma marcação
em cimento que dialoga com a obra de arte.
Figura 164 – Corte dos módulos do painel do Edifício Sahara. Foto: A autora.
O afastamento do painel em relação ao piso e teto era marcado originalmente pelas
faixas brancas de parede rebocada e pintada. Recentemente foi aplicada cerâmica
178
Entrevista concedida pelo artista plástico Anchises Azevedo à autora, realizada no dia 10/05/2011.
155
tamanho 10x10cm branca com rejunte cinza, o que prejudicou a apreciação da obra,
visto que uma nova malha em tamanho bem menor foi adicionada à visualização,
sem ter nenhuma relação com o ambiente. O piso e o teto continuam originais. O
teto de lambri e o piso de ardósia são escuros, assim como o painel, e acentuam as
linhas brancas acima e abaixo do painel. De certa forma esta faixa branca reflete
uma luminosidade, que destaca ainda mais a obra de arte.
O piso interno do hall de elevadores é revestido por cerâmica marrom, e este invade
o piso do pavimento pilotis externo através do rasgo do painel, fazendo mais uma
comunicação entre os dois ambientes, e demonstrando o convite da obra de arte
para que se adentre no edifício. Elementos do painel continuam no sentido do plano
da parede, como se flutuassem e se criasse um convite através do rasgo e, ao
mesmo tempo, uma noção de “parede imaginária” de fechamento.
Figura 165 (esq.) – Edifício Sahara. Barras verticais de cimento no alisar da porta vizinha ao painel. Foto:
A autora.
Figura 166 (dir.) – Edifício Sahara. Cerâmica do piso do hall de elevadores invadindo o rasgo e blocos
flutuantes do painel. Foto: A autora.
Já no caso do painel do Edifício Sede da RFFSA, o longo painel de Francisco
Brennand faz a separação entre o pavimento de garagem e o jardim que articula
dois blocos da edificação. Ele não substitui a parede que poderia existir,
principalmente por conta dos detalhes de “descolamento” do piso e do teto que ele
recebe – o que evidencia que ele é um elemento adicionado, e não uma parede
transformada, além disso, causa surpresa, pois o sistema de fixação do painel é feito
através de seis pilares da edificação que se encontram recuados, nos dando a
impressão de que o mesmo está flutuando no espaço. O afastamento do piso e teto
permite a passagem de luz e ventilação e acentua a sensação de leveza. Em cada
156
pilar há duas garras de concreto (uma acima e outra abaixo) que fixam o painel nos
pilares. O painel funciona como um septo para demarcação de duas áreas distintas
e mascaramento da garagem, além de receber uma função artística de
comunicação, ilustrando figuras de trens e linha férrea, objeto que simboliza a
empresa que era sediada na edificação.
Figura 167 (esq.) – Detalhe do painel do Edifício Sede da RFFSA. Foto: A autora.
Figura 168 (dir.) – Edifício Sede da RFFSA. Detalhe de uma das garras de concreto inferior. Foto: A
autora.
A locação do painel é privilegiada, visto que este se encontra numa área social que
se volta para uma área de jardins e está elevado em relação ao nível dos outros
blocos. Há uma passagem, embora que delgada, mas que pode ser considerada
como uma espécie de calçada na frente do painel, que possibilita o usuário de
observar seus detalhes e sentir as texturas da obra. As cerâmicas possuem baixosrelevos e o processo artesanal de produção das peças proporcionou uma textura
diferenciada em cada peça, que também estimula o observador a querer sentir a
superfície.
As cerâmicas não se limitam apenas ao plano frontal do painel, elas “mordem” a
espessura da parede, como se fosse uma forma de dizer que o painel faz parte da
vedação, e não está apenas adicionado ao edifício.
157
Figura 169 (esq.) – Edifício Sede da RFFSA. Textura das peças do painel de cerâmicas. Foto: A autora.
Figura 170 (dir.) – Edifício Sede da RFFSA. "Mordida" das cerâmicas na lateral do painel. Foto: A autora.
Percebe-se então que as obras de vedação possuem uma relação bastante forte
com a edificação. Por vezes as obras podem ser adicionadas ao espaço, servindo
como elemento separador de ambientes, como também podem substituir paredes de
delimitação, como no caso dos vitrais. Essa apropriação do papel da parede (plano
vertical arquitetônico) torna a integração da obra de arte com a edificação mais
simples de ser percebida.
c. Contemplação pura
Sabe-se que toda obra de arte foi feita para ser contemplada e em alguns edifícios
visitados foram encontradas obras de arte que não recebem uma função além da
pura contemplação. Os espaços a recebem como forma de criação de um ponto
focal de observação, fazendo com que o olhar do observador seja direcionado para
a obra de arte, mas ela não dialoga com o edifício no sentido de trabalhar junto em
alguma questão prática, como no caso de um revestimento ou elemento delimitador
(vedação). Foram encontrados elementos de contemplação pura em quatro
edificações visitadas. São elas:
 Residência Torquato de Castro – escultura externa de Corbiniano Lins.
 Residência Isnard de Castro e Silva – mosaico externo.
 Edifício Sede da CELPE – painel interno de Francisco Brennand.
 Edifício Sede da CHESF – escultura externa de Corbiniano Lins.
158
De forma geral, as esculturas têm papel de contemplação pura, pois, como são
elementos pontuais fisicamente independentes, elas desviam o olhar do observador
para si, chamando atenção para serem observadas. Isto acontece nas esculturas da
Residência Torquato de Castro e do Edifício Sede da CHESF. Nos dois casos as
esculturas se encontram em nichos de espaço externo criando nódulos de
observação. Estes nódulos normalmente preenchem espaços de “sobra” ou podem
ter um papel maior na composição, como no caso da escultura de Corbiniano para a
Residência Torquato de Castro.
O local destinado para a escultura foi estudado de forma a conferir equilíbrio à
composição da casa, mesmo sendo uma obra externa, desvinculada fisicamente da
edificação. A escultura completa a composição volumétrica da residência, tendo
papel fundamental no projeto. Visualmente, a escultura de Corbiniano se localiza
num ponto central em relação à assimetria da fachada.
Figura 171 – Croqui sobre a localização da escultura em relação à fachada. Fonte: a autora.
Para o edifício Sede da CHESF, a escultura foi localizada um trecho de jardins, ao
lado da calçada que conduz as pessoas à porta principal. O percurso é sugerido
pelos mastros das bandeiras e se encerra na escultura de Corbiniano, que recebe as
pessoas para que estas adentrem no edifício.
159
Figura 172 (esq.) – Escultura de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro. Foto: A autora.
Figura 173 (dir.) – Escultura de Corbiniano Lins para o Edifício Sede da CHESF. A seta indica o percurso
para a porta principal. Foto: A autora.
Na Residência Isnard de Castro e Silva encontra-se um mosaico externo que chama
a atenção de quem está dentro da edificação ou que se encontra no jardim em que o
mosaico se insere. Por se localizar no fundo do lote, ele possui o poder de
surpreender os usuários que só conseguem perceber sua existência ou através da
sala interna que tem comunicação visual com o jardim posterior, ou quando o
usuário percorre todo o caminho lateral e se depara com seus desenhos coloridos.
Como está num local aberto, a luz é sempre um elemento presente, que evidencia
as suas cores. Estas, por sua vez, dialogam com as cores utilizadas na casa. Em
frente ao mural há uma área gramada, como se pedisse para que o observador o
olhe a certa distância. Os cacos de azulejo são colados diretamente no muro
posterior e o contato com o piso é feito diretamente, como se a obra brotasse do
jardim. Como faz parte do muro, poderíamos incluir este mural na classificação de
vedação, pois ela de certa forma delimita o jardim posterior. Mesmo assim, é uma
obra pontual, pois ela sozinha não delimitaria nenhum dos dois espaços. Assim, sua
função mais apropriada seria de contemplação.
160
Figura 174 (esq.) – Mosaico da Residência Isnard de Castro e Silva. Foto: A autora.
Figura 175 (dir.) – Vista do mosaico da Residência Isnard de Castro e Silva a partir do acesso lateral.
Foto: A autora.
Dentre as obras visitadas, o último exemplo de contemplação pura encontra-se no 1º
pavimento do Edifício Sede da CELPE: um painel de Francisco Brennand. Ele está
localizado num ambiente de pé-direito duplo, no plano mais alto, chamando a
atenção dos usuários que permanecem naquele ambiente. É interessante perceber
que ele também serve de boas-vindas a todos que adentram no edifício (pois aquele
é o espaço onde a portaria de atendimento ao público está localizada), como
também recebe os usuários que utilizam o auditório lateral, pois o espaço também
serve de foyer para este ambiente. A forma como este painel se insere na parede
também chama a atenção, pois ele foi moldado de forma que está englobado pelo
plano vertical arquitetônico (parede), ele “invade” a parede, destacando-se da
superfície apenas visualmente, pela sua cor diferenciada proporcionada pelo
cimento queimado. Assim, a base do painel se integra fisicamente à arquitetura,
enquanto seus elementos cerâmicos fixados por suportes metálicos se projetam
para fora da base. O espaço que abriga este painel por vezes recebe exposições,
como se pode perceber na figura 171, embora estas estruturas acabem por
atrapalhar a apreciação do painel.
161
Figura 176 (esq.) – Vista do painel de Francisco Brennand no Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 177 (dir.) – Detalhe do englobamento do painel de Francisco Brennand na parede do Edifício Sede
da CELPE. Foto: A autora.
Assim, percebe-se que o elemento de contemplação pura não se resume apenas a
esculturas. Os painéis e murais podem funcionar também como elementos pontuais
de atração dos observadores. A forma como estas obras estão inseridas no espaço
e fazem relação com a edificação não é apenas de adição, mas também podem
fazer parte dos elementos arquitetônicos, como no caso da última obra analisada, o
painel de Francisco Brennand no Edifício Sede da CELPE.
d. Desmaterialização do plano
“Ela [a arte mural] é estática por sua própria expressão; ela respeita a
parede ao mesmo tempo que tem uma concepção dinâmica que, por sua
vez, destrói a parede.
Ela será a medida do equilíbrio”
179
“[...] há um acontecimento que assume uma importância cada vez maior – a
demanda da ‘pintura mural’. Ela vai se manifestar sob uma forma coletiva,
perde a moldura, o volume pequeno, a qualidade móvel e individual, para se
adaptar à parede, em ligação com o arquiteto que a encomenda.
O arquiteto se entenderá com pintor para situá-la e dosar seu interesse. Ela
180
pode ser acompanhamento da parede ou destruição da parede.”
Assim como Léger defende, os painéis podem modificar os espaços. Pode-se
imaginar um ambiente não muito amplo, mas com paredes compridas e
homogêneas. A sensação pode não ser muito interessante, pode pedir algo que
deixe estes planos mais humanos, menos austeros, secos, frios ou pesados e
aproximá-los do homem. Os painéis com seus desenhos, coloridos ou não, por meio
179
180
LEGER, Fernand. Funções da pintura. São Paulo: Ed. Nobel, 1989. p.82.
ibidem, p.120.
162
da possibilidade de criação de reentrâncias e saliências ou qualquer outra solução
que desmistifique a frieza de uma “página em branco” destroem o plano sem
expressão e caracterizam o que chamamos de “desmaterialização do plano”.
Ainda segundo Léger, “Uma parede nua é uma superfície morta. Uma parede
colorida torna-se uma superfície viva”.181 Muitas das obras que visitamos, inclusive
que já caracterizamos em outra categoria também está incluída no item
desmaterialização do plano. Como estamos falando de planos, fica claro que nesta
classificação estão inclusos apenas painéis ou murais. Dentre as obras visitadas,
sete delas apresentam obras que possuem a função de quebrar com um plano
contínuo e sem expressão. São elas:
 Biblioteca de Casa Amarela – painel de Hélio Feijó;
 Residência Torquato de Castro – painel de Reynaldo e painel de ladrilhos, de
Corbiniano Lins;
 Residência Isnard de Castro e Silva – Painel interno de Reynaldo;
 Edifício Sahara – painel de Anchises Azevedo;
 Edifício Sede da CELPE – painel de P. Neves;
 Edifício Sede da RFFSA – painel de Francisco Brennand;
 Edifício Sede da CHESF – painéis internos de Francisco Brennand e Mirella;
A desmaterialização do plano pode ser entendida se imaginarmos a simulação da
superfície do painel sem a sua presença, ou seja, lisa. Percebe-se que no caso do
painel da Biblioteca de Casa Amarela (ver figura 84), as figuras coloridas dão a
impressão de planos sobrepostos, como se migrassem para frente da fachada. É
assim que conseguimos compreender o poder da mudança espacial que os painéis
e murais possuem. Ao invés de termos um plano simples, sem cores, texturas ou
camadas imaginárias, possuímos o trabalho de um artista juntamente com um
arquiteto que resulta num plano que provoca diferentes sensações ao nosso corpo.
181
ibidem, p.108.
163
Dentre os exemplos das obras selecionadas que possuem a desmaterialização do
plano, sabe-se que apenas a Biblioteca de Casa Amarela possui o painel externo, na
fachada. Mesmo assim, não podemos afirmar que a desmaterialização do plano
acontece mais facilmente em obras internas. O número de obras selecionadas não é
suficiente para se afirmar que este é um item que se expressa preferencialmente em
ambientes internos ou externos.
O painel do Edifício Sede da RFFSA não se localiza na fachada externa do edifício,
mas como já vimos no item vedação, ele se encontra numa área de transição
externa-interna, entre uma área de jardim e o estacionamento coberto. Ao mesmo
tempo em que o painel de Brennand separa o externo do interno através de um
grande plano, ele não se expõe de modo a ser um grande ‘paredão’ agressivo ao
observador, pelo contrário, transmite uma sensação de leveza, principalmente pelo
fato de se separar do piso e do teto. A luz que passa por estes rasgos torna o painel
mais leve. As cerâmicas que abraçam lateralmente o painel e os encaixes explícitos
do painel nos pilares demonstram como é feito o ‘toque’ da obra de arte plástica com
o edifício. O tratamento brilhoso dado às cerâmicas, juntamente com as reentrâncias
e saliências dos módulos diferencia a textura da cerâmica do concreto liso aparente
e abundante e trazem curiosidade ao observador os convidando a tocar a superfície.
Ou seja, o grande painel é trabalhado com elementos que marcam a sua presença
embora que de forma não-agressiva, integrada, diferente do que se poderia ter caso
a superfície fosse de piso a teto e em cor única, uma “superfície morta”, segundo
Léger.
Figura 178 – Painel de Brennand no Edifício Sede da RFFSA.Foto: A autora.
164
Nas residências Torquato de Castro e Isnard de Castro e Silva os painéis de pintura
de Reynaldo também modificam a palidez e frieza de superfícies. No primeiro caso,
o painel encontra-se na sala de estar, recepciona as pessoas que entram pelo
terraço lateral e possui comunicação visual com os ambientes adjacentes, inclusive
o pavimento inferior, pois a sala funciona como uma espécie de mezanino. Está
sobre um canteiro de seixos e sua altura respeita a altura das esquadrias do
primeiro pavimento. Retrata elementos típicos do nordeste e é interessante de
perceber que o canteiro com pedras remete à aridez e seu desenho disforme faz
referência ao desenho do próprio painel. É como se parte do painel começasse a
invadir o espaço e fosse se tornar tridimensional (ver figura 87).
Já na Isnard de Castro e Silva, o painel vai de piso a teto e também se encontra num
ambiente de estar da casa. A obra faz a transição do fluxo jardim-edifício e deixa a
parede bem mais leve. O observador não percebe que a parede que ali está talvez
‘esmagasse’ o ambiente, e é entretido pela pintura retratada pelo artista. A atenção
fica nos elementos da pintura, que torna a parede extensão de uma cena em
perspectiva. Sobre a forma que o painel se relaciona com a construção é
interessante perceber que ambos os painéis recebem uma espécie de moldura,
menos evidente no primeiro exemplo – as marcações são apenas inferior e superior
– e mais evidente no segundo. O painel da Residência Isnard de Castro e Silva
recebe uma moldura circundante que demarca os limites da obra.
Figura 179 (esq.) – Relação visual do painel de Reynaldo para a Residência Torquato de Castro com os
ambientes adjacentes. Foto: A autora.
Figura 180 (dir.) – Painel da Residência Isnard de Castro e Silva - detalhe da moldura. Foto: A autora.
165
O painel de ladrilhos de Corbiniano Lins para a Residência Torquato de Castro
também se mostra como um exemplo de desmaterialização do plano. Apenas com
dois módulos-padrão (azulejos desenhados por Corbiniano e módulos brancos), o
painel recebe uma organização irregular, semelhante à organização vista no painel
do bloco de apoio para o Edifício Sede da SUDENE. Diferentemente de todos os
painéis selecionados, este é o único que não está num plano reto, pois acompanha
o volume curvo encontrado no térreo da residência. O ritmo aleatório dos azulejos
prende a atenção dos observadores, que tentam encontrar uma lógica na sua
organização, destruindo o plano inexpressivo que existiria caso a superfície fosse
homogênea (ver figura 145).
Discutido também no item ‘vedação’, o painel do Edifício Sahara, de Anchises
Azevedo também está incluído na desmaterialização do plano. O plano da parede do
pavimento pilotis recebe um trabalho volumétrico através da obra de arte plástica.
Volumes sacam, recuam, adentram a parede. A leitura não seria a mesma caso
aquele painel não estivesse ali. A forma como ele se relaciona com a edificação
também é interessante: as placas de cimento não tocam o piso e teto, se tornando
mais leve e marcando sua verdade – é um painel aplicado à parede, mas que ao
mesmo tempo faz parte dela, pois o painel acompanha os detalhes da parede, como
no caso da abertura vertical existente. O painel penetra na parede ao mesmo tempo
que alguns de seus elementos se projetam como se flutuassem sentido à
continuidade do plano principal (ver figura 166). A abertura permite que a luz filtrada
pelo hall de elevadores (ambiente vizinho) se derrame sobre a superfície do painel
destacando alguns dos seus volumes.
166
Figura 181 – Detalhe de parte do painel do Edifício Sahara - descolamento piso e teto. A esquadria
metálica e as cerâmicas acima e abaixo do painel são intervenções posteriores e que prejudicam a
contemplação da obra. Foto: A autora.
Por fim, temos o painel do Edifício Sede da CELPE (P. Neves) e os painéis do
Edifício Sede da CHESF (Francisco Brennand e Mirella). Todos estes painéis
possuem a função de amenizar a sensação de frieza das paredes que seriam
‘chapadas’ e desviam a atenção dos observadores. O painel de P. Neves do Edifício
Sede da CELPE faz a recepção das pessoas que descem do elevador, ao mesmo
tempo que delimita o fim de um grande corredor. Além disso, ele disfarça uma
parede cega que estaria próxima à descida das pessoas. Suas cores prendem a
atenção dos usuários e a superfície vitrificada cria interessantes efeitos visuais com
a luz que provocam o observador e o convidam a tocar na superfície. O piso brilhoso
reflete o painel. Já o forro não ajuda muito na integração. As placas metálicas, muito
comum em edifícios públicos e corporativos dos anos 1970, são pintadas de uma cor
clara, que acaba competindo com as cores do painel.
167
Figura 182 (esq.) – Painel de P. Neves no Edifício Sede da CELPE. Foto: A autora.
Figura 183 (dir.) – Painel de P. Neves no Edifício Sede da CELPE - detalhe da superfície vitrificada. Foto:
A autora.
Os painéis do Edifício Sede da CHESF também possuem a função de
desmaterialização do plano. O painel de Mirella se encontra logo na entrada
principal do edifício e toma toda a parede da sala de espera. Recebe finas faixas
laterais de concreto aparente que marcam discretamente o início e o fim do painel.
No painel de Brennand essa marcação do início e fim da obra também está
presente. O painel localiza-se em local social, num hall ou espaço de convergência
de pessoas (como foyer). É interessante de ver como os dois painéis da CHESF
fazem parte das paredes ao mesmo tempo em que recebem marcações que
demonstram o que é parede e o que é obra de arte.
Figura 184 (esq.) – Painel de Mirella para o Edifício Sede da CHESF - vista para a entrada principal. Foto:
A autora.
Figura 185 (dir.) – Painel de Francisco Brennand para o Edifício Sede da CHESF. Foto: A autora.
168
Após esta análise, percebemos que a desmaterialização do plano é uma função
presente em quase todos os exemplos de painéis ou murais. As superfícies
retratadas pelos artistas por meio de cores, formas e volumes modificam a simples
crueza das paredes que seriam lisas e sem expressão, prendendo a atenção dos
usuários e tornando as superfícies muito mais estimulantes.
***
Sabe-se que a compreensão da integração entre artes plásticas e arquitetura é algo
difícil de ser mensurado. A interpretação dos conceitos de Pallasmaa e Coutinho
aplicados ao espaço ajudou a encontrar uma forma de se analisar o espaço de
acordo com os sentidos. A ficha desenvolvida, embora se detenha ao tato e visão –
sentidos mais ligados à questão material – permitiu que os dados fossem
catalogados de forma a perceber que aquela obra de arte está bem integrada
quando além de sua função estética, possui uma função de influência no
funcionamento ou apreensão do espaço.
As quatro funções identificadas (Revestimento de proteção; Vedação; Contemplação
pura; e Desmaterialização do plano) não são exclusivas. Percebemos que uma obra
de arte pode estar presente em mais de uma categoria de função integradora ao
mesmo tempo. É interessante perceber também que conceitos e observações
desenvolvidas no início do século XX por Léger estiveram presentes nas obras
produzidas em Pernambuco e que tem fundamento muitas das suas observações
sobre a cor e a função da obra mural. Este tipo de obra, dentre as que estudamos,
são as que demonstram maior ligação com a edificação, provavelmente por sua
forma de expressão, sua constituição: um plano que substitui um elemento
puramente arquitetônico: um plano de fachada ou parede, ou até piso, precisando
esta obra de arte, além de sua função estética, cumprir com a função arquitetônica,
fazendo parte do edifício, não apenas sendo adicionada à ele.
Assim, percebe-se como é vasto o campo de formas de integração entre obras de
arte plástica e arquitetura, sendo os trabalhos realizados em parcerias entre artistas
e arquitetos componentes de uma obra de arte maior e única – que talvez, em
alguns casos desenvolvidos em Pernambuco, pudesse até ser considerada uma
tentativa de obra de arte total.
169
CONCLUSÃO
Assim como foi visto em cada um dos capítulos apresentados, a relação entre artes
plásticas e arquitetura foi algo que nunca se mostrou de forma estável. Há séculos
os estudiosos de arte demonstram como foi oscilatória esta relação entre os dois
tipos de arte, ora estando tão juntas que chega a ser difícil saber onde uma termina
e a outra começa, ora não havendo ligação entre si, estando as artes plásticas como
meros elementos decorativos que são dispostos nos espaços e aplicados às
superfícies arquitetônicas.
A primeira metade do século XX foi um período em que novas técnicas e materiais
foram desenvolvidos, que supostamente geraram um novo distanciamento entre
artes e arquitetura. As duas guerras trouxeram novas demandas, as construções
tinham que ser rápidas e baratas. Velocidade, tecnologia e industrialização foram
temas que receberam atenção durante este período. Em meio a este cenário,
movimentos de vanguardas surgiram com o objetivo de revisar os conceitos da
época e sugerir a reaproximação dos diferentes tipos de arte, chegando a utilizar a
arte como instrumento de reforma social, incluindo-se a arquitetura, e não apenas a
arquitetura isolada, mas de forma integrada às artes plásticas.
As realizações de união entre artes plásticas e arquitetura não se limitaram apenas à
Europa. A América Latina possui dois grandes exemplos reconhecidos atualmente
como Patrimônio da Humanidade: as cidades universitárias do México e de Caracas.
A utilização da arte e arquitetura como meios de enaltecimento e resgate da cultura
e história mexicanas estão presentes por todo o campus da UNAM, com o trabalho
resultante de uma grande equipe de arquitetos e artistas plásticos, sendo a arte
mural explorada de forma nunca antes vista pela historiografia. Em Caracas, a
iniciativa de Villanueva proporcionou a realização de um complexo com uma grande
praça fluida repleta de murais e esculturas, inclusive dentro das edificações,
recebendo funções antes atribuídas a elementos técnicos e arquitetônicos, como
aconteceu no caso das “nuvens flutuantes” de Alexander Calder para a Aula Magna.
O Brasil, país que se encontrava num momento de afirmação de uma nova
identidade nacional, estava em busca de simbolizar seu progresso, o novo, e adotou
a arquitetura moderna como linguagem, além de proporcionar a aproximação da
arquitetura e artes plásticas através de projetos importantes, como o edifício do
Ministério de Educação e Saúde ou os edifícios de Brasília.
A partir deste momento ocorreu uma série de parceria entre artistas plásticos e
arquitetos que podem ser mencionados. Burle Marx com Reidy ou Rino Levi,
Vilanova Artigas com Mário Gruber, e muitos outros. Obras ícones da arquitetura
brasileira foram elogiadas em revistas e encontros, como o Conjunto da Pampulha,
união de Oscar Niemeyer com vários artistas, a exemplo de Portinari e Ceschiatti, ou
o Conjunto Habitacional do Pedregulho, de Reidy, com grandes painéis de Portinari
e Burle Marx.
Vanguardas artísticas como o Concretismo e o Neoconcretismo também surgiram no
Brasil e fizeram apelos explícitos sobre a união entre artistas e arquitetos,
principalmente com a figura de Lygia Clark. A construção de Brasília também foi
outro marco na união entre artes plásticas e arquitetura brasileiras, principalmente
com a união de Athos Bulcão e Oscar Niemeyer, com seus grandes painéis de
azulejos e que chegam até a sair do plano bidimensional, como aconteceu no painel
de blocos de concreto para o Teatro Nacional.
Em meio a todo esse fervilhamento artístico e arquitetônico no Brasil, Pernambuco
também se destacou. Desde o fim do século XIX, a Escola do Recife se mostrava
como o centro das discussões que envolviam correntes filosóficas, sociológicas e
jurídicas. Já no início da década de 1920, o estado já mostrava traços de sua
modernidade na literatura e nas artes plásticas com figuras como os irmãos Rego
Monteiro, Gilberto Freyre ou Manuel Bandeira. Abstracionismo, racionalidade,
geometrização, temas nacionais, tudo isso começou a aparecer na produção
artística pernambucana ainda antes do prenúncio do modernismo realizado com Luiz
Nunes, na década de 1930.
A criação da Escola de Belas Artes do Recife é instituída em 1932 e em 1939 o
Edifício da Secretaria da Fazenda, de Saturnino de Brito já anunciava a integração
entre artes e arquitetura. Este esforço não era unilateral. Os artistas plásticos se
esforçaram bastante para socializar as artes plásticas, inclusive inserindo as suas
produções nos edifícios. Iniciativas como a Sociedade de Arte Moderna do Recife, o
171
Ateliê Coletivo, o Movimento de Cultura Popular e a “Lei Abelardo da Hora” são
alguns dos principais esforços em prol de uma arte mais próxima da população.
A formação dos arquitetos daquela época também foi outro fato que contribuiu para
que houvesse uma aproximação entre artes plásticas e arquitetura. O corpo de
professores com formação européia e o envolvimento de artistas plásticos no corpo
docente da Escola de Belas Artes contribuiu para que as gerações de arquitetos
formados tivessem uma preocupação em integrar os dois tipos de arte. A realização
de obras com parcerias entre artistas e arquitetos sem a obrigatoriedade da
legislação demonstra isso. A “Lei Abelardo da Hora” começou a ser aplicada na
década de 1960, e temos na década de 1950 várias obras com união do trabalho do
artista e arquiteto. Outro ponto interessante é a produção de obras de artes plásticas
pelos arquitetos. Azulejos, esculturas, painéis foram realizados pelos arquitetos,
inclusive em obras que já recebiam obras de arte de artistas plásticos, como vimos
no Edifício Sede da CHESF.
Após selecionarmos alguns edifícios que demonstram a preocupação em se unir as
duas formas de arte, surgiram os questionamentos sobre como analisar os espaços
de integração. As figuras dos teóricos Maurice Merleau-Ponty, Evaldo Coutinho e
Juhani Pallasma se mostraram úteis na questão de se discutir o espaço através da
experimentação. O ponto mais importante relatado pelos três teóricos foi a utilização
dos sentidos para a captação das informações. Sabendo-se que todos os sentidos
são necessários para o completo entendimento do espaço, foi baseando-se nisto
que se buscou aplicar a metodologia de análise dos casos selecionados, mesmo
que de forma reduzida, limitando-se ao tato e a visão.
O tato e visão se mostraram como os sentidos mais ligados à dimensão material,
que é justamente o que conforma o invólucro/escultura da arquitetura. Através da
interpretação dos dados colhidos em relação aos estímulos identificados, percebeuse que geralmente a obra de arte está mais integrada à edificação quando esta
recebe outra função além da função estética. Esta questão foi identificada
principalmente nos murais e painéis, pois eles normalmente substituem ou estão
sobre as superfícies puramente arquitetônicas: paredes, pisos ou tetos. Já para as
esculturas, este ponto não foi identificado claramente, embora a escultura crie uma
espécie de campo magnético, que acaba convergindo o olhar do observador para
172
um ponto específico. Comparando-se com os painéis e murais, a integração das
esculturas é bem mais compositiva que funcional.
O cuidado que os arquitetos e artistas tinham com o planejamento do espaço que
receberia a obra de arte foi essencial para criação de espaços integradores. O
manejo da luz, a disposição dos espaços em relação aos espaços adjacentes, a
ligação entre interior e exterior ou a colocação das obras em locais sociais, com
percursos próximos são alguns dos pontos que proporcionaram a realização de
espaços estimulantes e detentores de obras bem integradas.
Algumas “falhas” que provavelmente complicaram a relação entre artes plásticas e
arquitetura também foram identificadas. A falta de respeito de incorporadores quanto
ao cumprimento dos projetos dos artistas plásticos, como também à legislação
acabou prejudicando alguns trabalhos. As entrevistas revelaram que muitos
incorporadores interferiam no projeto de arquitetura, na obra de arte e até burlavam
a legislação e não adicionavam ao edifício as obras planejadas e exigidas pela
legislação municipal. Além disso, os apelos de várias vanguardas modernistas,
como é o caso dos concretistas sobre a integração do artista plástico e arquiteto
desde o momento do planejamento da edificação, normalmente não foram
atendidos. As entrevistas revelaram que quase sempre o artista plástico era
chamado quando o projeto arquitetônico estava completo. Muitos já estipulavam o
local e o tipo de obra de arte que iria existir para a edificação. Mesmo assim, esta
relação não era inflexível, pois de forma geral, os artistas tinham liberdade para
fazer modificações no projeto e trabalhavam nas suas obras em constante discussão
com os arquitetos. A escolha de materiais ou problemas de dimensionamento por
vezes não ajudaram também na integração da obra de arte com o edifício. As
junções de obras de arte que enfocam o caráter telúrico dos materiais por vezes se
chocaram com alguns materiais industrializados.
Por fim, embora em Pernambuco não tenha havido a integração perfeita, como
almejada pelos movimentos de vanguarda européias do início do século XX, o
esforço de alguns profissionais em unir seus trabalhos em prol de um espaço de
maior qualidade artística destaca esta produção, e constitui, inegavelmente, um
grande patrimônio para o Estado, não só das obras de artes plásticas ou da
173
arquitetura isoladamente, mas do conjunto formado pela união dessas duas formas
de arte.
174
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ANEXOS
ANEXO 01 – FICHA DE ANÁLISE
DADOS BÁSICOS:
1. OBRA ARQUITETURA:
ANO:
ARQUITETO:
2. OBRA ARTE PLÁSTICA:
ANO:
ARTISTA PLÁSTICO:
3. SOLICITADO POR:
4. HOUVE TROCAS ARQUITETO ↔ ARTISTA?
( ) SIM
( ) NÃO
Caso positivo, como?
ANÁLISE DO ESPAÇO:
SENSORIAL:
( ) VISÃO
PISO:
PAREDES:
TETO:
( ) TATO
PISO:
PAREDES:
TETO:
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MATERIAL:
ELEMENTOS:
( ) PAINEL
( ) MURAL
( ) ESCULTURA
MATERIAIS (PREENCHER COM ESCALA DE TEXTURA):
ESCALA TEXTURA: LISO (1); POUCO LISO (2); RUGOSO (3); MUITO RUGOSO (4)
ARQUITETURA:
ARTE PLÁSTICA:
FORMA DE CONTATO ARQUITETURA-ARTE PLÁSTICA:
ESPAÇO DA OBRA TOTAL:
LOCALIZAÇÃO RELAÇÃO ARQUITETURA-ARTE PLÁSTICA:
DELIMITAÇÃO DO ESPAÇO:
ÁREA:
ESQUEMA:
( ) PÚBLICA
( ) PRIVADA
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HÁ DIRECIONAMENTO DO CORPO PARA A OBRA DE ARTE?
( ) SIM
( ) NÃO
HÁ RELAÇÃO DESTE ESPAÇO COM OUTROS?
( ) SIM
( ) NÃO
QUAIS AS POSSIBILIDADES DE ADMIRAÇÃO?
LUZ:
DE QUE FORMA A OBRA DE ARTE SOFRE INFLUÊNCIA DA LUZ E SOMBRA?
CORES:
DE QUE FORMA A COR É UTILIZADA NO ESPAÇO CRIADO PARA A
APRECIAÇÃO DA OBRA DE ARTE PLÁSTICA?
OUTRAS OBSERVAÇÕES:
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Foto da autora
ANEXO 02 – FICHA DE ANÁLISE DO EDIFÍCIO SAHARA
DADOS BÁSICOS:
1. OBRA ARQUITETURA: Edifício Sahara ANO: 1972
ARQUITETO: Vital Pessoa de Melo
2. OBRA ARTE PLÁSTICA: Painel ANO: 1975
ARTISTA PLÁSTICO: Anchises Azevedo
3. SOLICITADO POR: Arquiteto
4. HOUVE TROCAS ARQUITETO ↔ ARTISTA?
(X) SIM
( ) NÃO
Caso positivo, como?
O arquiteto contactou o artista plástico quando o projeto arquitetônico já estava finalizado, e havia
separado um local para que se fosse feito um painel. Mesmo assim, perguntou o artista se um painel
seria o tipo de obra de arte mais indicado para aquele espaço. Assim definido, o artista teve liberdade
para decidir qual o tamanho do painel, como ele deveria ser feito e de que material iria ser construído.
O artista também teve liberdade para fazer modificações, como a incisão vertical existente na parede
do hall, que corta o painel. O painel, por sua vez penetra na parede. A melhor forma de se construir
as placas de concreto também foi bastante discutida entre os dois profissionais.
ANÁLISE DO ESPAÇO:
SENSORIAL:
(X) VISÃO
PISO: pedra escura (ardósia).
PAREDES: Antes  emassada e pintada na cor branca. Atualmente: cerâmica
0.10x0.10m na cor branca e rejuntes na cor cinza.
TETO: lambri de madeira escura e envernizada.
(X) TATO
PISO: pedras ardósias, causam sensação de superfície lisa pelo seu brilho mas ao
mesmo tempo idéia de uma rugosidade, pela superfície não-uniforme.
PAREDES: As diferentes texturas se misturam, principalmente antes (com as paredes
emassadas), pois a superfície era lisa e clara e se contrapunha com a textura do
cimento, escura e com marcas do processo de fabricação do painel. O rasgo central
do painel foi fechado, o que prejudica a proposta inicial.
TETO: ---
MATERIAL:
ELEMENTOS:
(X) PAINEL
( ) MURAL
( ) ESCULTURA
MATERIAIS (PREENCHER COM ESCALA DE TEXTURA):
ESCALA TEXTURA: LISO (1); POUCO LISO (2); RUGOSO (3); MUITO RUGOSO (4)
ARQUITETURA: piso ardósia (2); paredes – antes emassada (1), atualmente com cerâmica (2); teto
lambri (2).
ARTE PLÁSTICA: painel de cimento (1), mas com marcas do processo de fabricação. A visão tem
idéia de algo não-uniforme, mas o tato faz compreender a superfície lisa.
FORMA DE CONTATO ARQUITETURA-ARTE PLÁSTICA:
O painel se localiza num plano privilegiado de visão (abriga a relação entre exterior e interior) e marca
a área social do edifício. Estando na transição do externo e interno, ou social e provado. Saca da
parede em que se encontra e não toca o piso ou teto, destacando ainda mais a sua
importância.Possui um “rasgo” que penetra na parede, cortando-a e permitindo a entrada de luz e
ventilação (embora atualmente tenha se colocado uma esquadria para fechar a abertura). Este rasgo
pode ser considerado como o ponto principal de contato entre a obra de arte plástica e arquitetura,
visto que o elemento artístico “invade” e “modifica” o elemento de vedação arquitetônica (parede). No
ambiente interno há uma outra fenestração que permite a entrada de luz do exterior, é filtrada pelo
ambiente e passa para o rasgo do painel, “banhando” a superfície da obra de arte com a luz.As
quinas da parede onde se encontra o painel recebem uma marcação em cimento que dialoga com a
obra de arte. O piso interno do hall de entrada “molha” o piso do pavimento pilotis externo, fazendo
mais uma comunicação entre interior e exterior, e demonstrando o convite da obra de arte para que
se adentre no edifício. Elementos do painel continuam no sentido do plano da parede, como se
flutuassem e se criasse um convite através do rasgo e, ao mesmo tempo, uma noção de “parede
imaginária” de fechamento.
ESPAÇO DA OBRA TOTAL:
LOCALIZAÇÃO RELAÇÃO ARQUITETURA-ARTE PLÁSTICA:
Local privilegiado visualmente, elevado do nível da rua e permeável em relação ao exterior,
permitindo a apreciação do espaço interior pelo exterior. O painel encontra-se centralizado na parede
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principal do pavimento tornando-se ponto focal para o observador, inclusive está localizado de forma
central em relação às estruturas do edifício.
DELIMITAÇÃO DO ESPAÇO:
O espaço é delimitado pela projeção da edificação com a marcação na paginação do piso. As
estruturas ajudam a observar o painel como elemento central do espaço.
ÁREA:
( ) PÚBLICA
( ) PRIVADA
(X) MISTA
ESQUEMA:
HÁ DIRECIONAMENTO DO CORPO PARA A OBRA DE ARTE?
(X) SIM
( ) NÃO
Embora o fluxo seja localizado nas extremidades do painel, este se torna um elemento central de
observação dos transeuntes.
HÁ RELAÇÃO DESTE ESPAÇO COM OUTROS?
(X) SIM
( ) NÃO
É o espaço de transição entre exterior x interior, social x privado e se comunica inclusive através dos
rasgos  elemento de comunicação da obra com o espaço.
QUAIS AS POSSIBILIDADES DE ADMIRAÇÃO?
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No espaço exterior, observa-se o painel principalmente através dos seus saques e recuos. No
ambiente social do pavimento pilotis obtém-se mais detalhes em relação aos rasgos, texturas e
volume.
LUZ:
DE QUE FORMA A OBRA DE ARTE SOFRE INFLUÊNCIA DA LUZ E SOMBRA?
A luz externa destaca os saques dos volumes do painel. O rasgo central também recebe a luz filtrada
pelo hall de elevadores que chama a atenção e convida a entrada dos usuários.
CORES:
DE QUE FORMA A COR É UTILIZADA NO ESPAÇO CRIADO PARA A
APRECIAÇÃO DA OBRA DE ARTE PLÁSTICA?
Não há muita variação na paleta utilizada. As cores são em tons de pastéis claros e escuros, desde o
branco das paredes e escuros da ardósia do piso, lambri do teto e do cimento do painel. É este
contraste que dá destaque ao painel.
OUTRAS OBSERVAÇÕES:
A troca de revestimento das paredes prejudicou a visualização da parede principal, que antes
destacava o painel como único possuidor de texturas diferentes e da “grelha reguladora” (o painel é
marcado por uma grelha, é todo dividido em módulos menores). Os rejuntes das cerâmicas alteraram
a leitura do plano branco e liso (uniforme). A utilização da esquadria de fechamento do rasgo também
vai contra a proposta da comunicação interno x externo, mesmo estando recuada.
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