CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE PROFISSIONAL DA ENFERMAGEM

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CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE PROFISSIONAL DA ENFERMAGEM:
REVISÃO DE LITERATURA
Francine Cassol Prestes1
Carmem Lúcia Colomé Beck2
Rosângela Marion da Silva3
Bruna Sodré Simon4
Adelina Giacomelli Prochnow5
A identidade é formada e transformada continuamente em relação às formas
pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que
nos rodeiam, sendo reafirmada ao longo do tempo, de modo que sua unidade
permanece sempre incompleta (Hall, 2000). Para Gonzáles et al (2006) a
percepção do trabalho como mediador de integração social tanto no ponto de
vista econômico quanto cultural, demonstra sua importância na vida do sujeito,
a qual é ratificada ao percebermos o trabalho enquanto fornecedor de uma
identidade ao trabalhador, que de outra maneira, nem sempre consegue
alguma forma de se mostrar existindo e relacionando-se (GONZÁLES e BECK,
2002). Nesse sentido, Ribeiro et al (2006) explicitam que o trabalho da
enfermagem está localizado na interface de outros trabalhos na área da saúde
e possui caracteres que mais ou menos o identificam, bem como a seus
trabalhadores, dentre estes se encontram a forma como seus saberes são
constituídos, seus interesses, seus instrumentos e objetos de trabalho e suas
formas de organização (GOMES e OLIVEIRA, 2005). Segundo Oliveira (1995;
2006), às vezes, parece não existir, por parte da sociedade, uma diferenciação
entre enfermeiro e equipe de enfermagem o que certamente apresenta reflexos
nas representações, na auto-imagem e na auto(des)valorização das
profissionais acerca de seu trabalho e das funções sociais. Desta forma,
apresentamos um estudo sobre a construção da identidade profissional da
enfermagem, que tem por objetivo apresentar um panorama geral das
produções nacionais sobre a referida temática na última década. Pelo exposto,
tal estudo se justifica por retratar a realidade da profissão em diferentes
contextos, bem como por evidenciar desafios que se reconfiguram ao longo do
tempo sem serem completamente ultrapassados como a falta de
reconhecimento e autonomia profissional. Trata-se de uma pesquisa
bibliográfica referente à temática “construção da identidade profissional da
enfermagem”. Os dados foram obtidos por meio de pesquisa em artigos
científicos nacionais, publicados no período de 1997 a 2007, disponibilizados
no Sistema BIREME (MEDLINE, LILACS - Literatura Latino-Americana e do
Caribe em Ciências da Saúde; BDENF- Banco de Dados em Enfermagem e
SCIELO- Scientific Electronic Library Online). Para tal, foram utilizados os
seguintes descritores isolados: “enfermagem”, “estudantes de enfermagem”,
“identidade profissional”, “prática profissional”, ”auto-imagem” e “crise de
identidade”. Foram incluídos os artigos que apresentavam o desfecho
“construção da identidade profissional da enfermagem” e foram publicados em
periódicos nacionais indexados nas bases de dados supracitadas. Excluíram-
se os artigos que abordavam “imagem profissional”, mas não possuíam o
desfecho pretendido neste estudo e também as publicações que não possuíam
o texto completo disponível para acesso online. A análise dos dados foi
realizada após leitura dos mesmos, a partir das quais foram extraídas
informações específicas de cada artigo referentes ao objeto de estudo e ao
contexto histórico e social considerados. Posteriormente foi realizada uma
análise comparativa dos mesmos. Ao final da coleta, sete artigos se
adequaram aos critérios de inclusão. O resultado da busca encontra-se
sumarizado a seguir. A perspectiva histórica da construção da identidade
profissional da enfermagem remete a um estudo etnográfico sobre “as
sensações/percepções despertadas no exercício da profissão” durante a era
moderna, o qual subsidiou a discussão sobre o processo de construção da
identidade profissional da enfermagem com sua base feminina no referido
contexto histórico. O estudo revela que durante a instituição da enfermagem
profissional, o ato de cuidar remetia a pré-requisitos como: idoneidade moral,
devoção, despretendimento e submissão. O estudo afirma uma cultura
profissional em que dois dilemas encontram-se articulados: um imaginário
mimético com relação à medicina e um imaginário feminino de submissão e
inferioridade (MOREIRA, 1999). Com o intuito de conhecer e compreender as
imagens e o imaginário social que permeiam a escolha profissional de
enfermeiras brasileiras e peruanas foi realizado um estudo no qual se fez uma
única pergunta “porque escolheu a enfermagem como profissão?”.
Participaram doze enfermeiras brasileiras e oito peruanas e a análise dos
dados resultou na elaboração de três categorias que compõem a identidade
profissional da enfermeira: servil, vocacional e profissional. O estudo revelou a
imagem vocacional e servil da profissão mais presentes nas falas das
enfermeiras brasileiras, enquanto na fala das peruanas a imagem profissional
foi ressaltada (RIBEIRO et al, 2006). O estudo histórico a partir da análise
documental dos Anais dos Congressos Brasileiros de Enfermagem (CBEns)
entre 1977 e 1987, teve por objetivo analisar as “dispersões na produção do
conhecimento” e resultou em duas categorias centrais: imagem profissional e
identidade profissional, as quais originaram as subcategorias “status
profissional“ e “papel profissional”. Os resultados apontam a reforma do
Sistema Público de Saúde como um grande desafio para a enfermagem e
evidenciam a crise pela qual passava a profissão diante da indefinição de
identidade profissional e de uma imagem desfavorável da profissão na
sociedade (SILVA, PADILHA e BORESTEIN, 2002). Compreender o processo
de construção da identidade profissional dos enfermeiros no seu cotidiano de
trabalho foi o objetivo do estudo realizado com 22 trabalhadores (enfermeiros,
técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem, médico, secretária e
estudante do curso de medicina) da Rede Pública de Saúde. A partir da análise
foram constituídas quatro categorias empíricas: “a realidade do trabalho e o
processo de construção da identidade do enfermeiro”, “a definição do papel e o
processo de construção da identidade profissional do enfermeiro”, “o espelho
da identidade”, “as manifestações do ser”. Esse estudo traduz a identidade
como uma dinâmica construída por meio de movimentos de confirmação e
transformação (NETO e RAMOS, 2004). “A passagem pelos espelhos” foi a
metáfora utilizada em um estudo que teve como pretensões analisar a
construção da identidade profissional da enfermeira, a partir de suas
representações sociais sobre três períodos distintos: o anterior ao ingresso na
universidade, durante a formação e após a graduação, bem como discutir os
processos de construção/desconstrução/reconstrução de sua identidade
profissional. Participaram dez enfermeiros que exerciam a profissão há mais de
cinco anos em diferentes áreas de atuação. O primeiro espelho corresponde ao
período anterior à entrada na universidade e revela que a construção da
identidade profissional se inicia simultaneamente a construção da identidade
juvenil. No segundo espelho, as enfermeiras explicitaram a construção da
identidade de resistência, e na passagem pelo terceiro espelho se destacaram
as questões práticas do cotidiano da enfermagem, tais como a qualificação,
autonomia e reconhecimento profissional (OLIVEIRA, 2006). A Teoria das
Representações Sociais foi adotada como referencial teórico-metodológico na
realização de uma investigação, na qual foram descritas e analisadas as
imagens profissionais presentes nas representações de 30 enfermeiros
atuantes na área da saúde pública. Os resultados revelaram a distribuição dos
conteúdos em cinco categorias. Com relação à auto-imagem, três blocos de
significados emergiram na fala dos sujeitos: enfermeiro como referência para a
equipe de enfermagem, a auto-imagem inespecífica e a imagem de
argamassa. A heteroimagem foi subdivida em quatro categorias: administrador,
imagem invisível para a equipe de saúde, imagem positiva para a população e
de sobreposição de outros profissionais. O estudo explicita que os significados
conferidos à auto e heteroimagem estão intimamente ligados ao cotidiano e às
vivências (GOMES e OLIVEIRA, 2005). Compreender a construção da
identidade profissional de enfermeiras no exercício da gerência, a partir de um
paralelo com o processo de construção do conhecimento cognitivo segundo
Jean Piaget é o objetivo de outro estudo realizado com sete enfermeiras que
desempenhavam a função de gerência.
A construção da identidade
profissional da enfermeira gerencial, assim como a elaboração do
conhecimento, inclui três estágios: crise de identidade, fase de transição ou
adaptação e fase de equilíbrio representada por uma posição de centralidade
em relação à equipe multiprofissional (BRITO, 2006). Por meio deste estudo,
evidenciou-se o escasso número de produções sobre construção da identidade
profissional da enfermagem. Observaram-se algumas dificuldades em relação
à padronização dos descritores e impossibilidade de acesso on-line aos textos
completos de algumas publicações. A análise dos artigos comprova a
diversidade de abordagens acerca da temática, que convergem na tentativa de
explicar a complexidade que permeia a construção da identidade em diversas
realidades históricas, sociais, culturais, cotidianas e individuais. Merece
destaque o caráter inovador e revelador do estudo de Oliveira (2006) que
aborda a imagem do estudante de enfermagem, o qual “ressente-se da falta de
liberdade de expressão”, e evidencia a necessidade de realização de novos
estudos sobre a construção da identidade dos acadêmicos de enfermagem.
Palavras-chave: enfermagem; identidade profissional; pesquisa bibliográfica.
REFERÊNCIAS
Hall, S. A identidade cultural na Pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A. 4
ed, 2000, 102p.
1.
Gonzáles, R.M.B.; Beck, C.L.C.; Denardin, J.M.; Trindade, L. de L.
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implicações na saúde do trabalhador. Online Brazilian Journal of Narsing.
Vol. 5, n. 2, 2006.
2.
Gonzáles, R.M.B.; Beck, C.L.C. O sofrimento e o prazer no
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Florianópolis. V. 11. n. 1, p. 169-186. jan./abr. 2002.
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Ribeiro, A.A. de A.; Falcon, G.S.; Borestein, M.S.; Padilha, M.I.C. de S.
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Moreira, M.C.N. Imagens do espelho de Vênus: mulher,
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Netto, L.F.S de A.; Ramos, FRS. Considerações sobre o processo
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Rev Latino-am.Enfermagem vol.12 n.1 Ribeirão Preto Jan/ Feb.2004
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Brito, M.J.M. et al. Os estágios identitários de um enfermeiragerente: uma abordagem piagetiana. Texto Contexto Enferm, Florianópolis,
2006;15(2): 212-
1. Aluna do Curso de enfermagem da UFSM. Membro do Grupo de Pesquisa
Trabalho, Saúde, Educação e Enfermagem.
2. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem da UFSM. Doutora em
Enfermagem pela UFSC. Líder do Grupo de Pesquisa Trabalho, Saúde,
Educação e Enfermagem.
3. Enfermeira do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM). Mestranda de
Pós Graduação da UFSM. Membro do Grupo de Pesquisa Trabalho, Saúde,
Educação e Enfermagem.
4. Relatora. Aluna do Curso de enfermagem da UFSM. Rua Santana Piccini,
910, Santa Maria. Email [email protected] Telefone: 55-99787902
5. Doutora em Enfermagem pela UFRJ. Professora Adjunto da UFSM. Membro
do Núcleo de Pesquisa Educação, Gerência, Exercício Profissional
(NUPEGEPEn) da EEAN/UFRJ.
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