1. “— Neste lugar, disse o mineiro apontando para o pomar, todos os dias se juntam tamanhos bandos de graúnas, que é um barulho dos meus pecados. Nocência gosta muito disso e vem sempre coser debaixo do arvoredo.” (valor:1,0 ponto) Nesta passagem, há duas palavras, de mesma classificação gramatical, empregadas pelo locutor para indicar a proximidade ou distância do elemento a que se referem. Cite essas palavras e identifique sua classificação gramatical. Transcreva o trecho em que uma dessas palavras se refere a uma informação presente no próprio texto. Gab: (n)este (d)isso Pronomes demonstrativos Nocência gosta muito disso Leia o texto abaixo: Metamorfose Ambulante Prefiro ser essa metamorfose ambulante Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Eu quero dizer agora o oposto do que eu disse antes Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Sobre o que é o amor Sobre que eu nem sei quem sou Se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor Lhe tenho amor Lhe tenho horror Lhe faço amor eu sou um ator... É chato chegar a um objetivo num instante Eu quero viver nessa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Sobre o que é o amor Sobre que eu nem sei quem sou Se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor Lhe tenho amor Lhe tenho horror Lhe faço amor eu sou um ator... Eu vou desdizer aquilo tudo que eu lhe disse antes Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha velha velha velha opinião [formada sobre tudo... Do que ter aquela velha velha opinião formada sobre tudo... Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo... (Raul Seixas, Os grandes sucessos de Raul Seixas) 2. No verso de número 12, o autor utiliza dois pronomes (“te” e “lhe”) para se referir ao interlocutor. Que tipo de pronomes são esses? (valor:1,0 ponto) 3. Considerando que, no verso de número 12, Raul Seixas, adotando o uso popular, empregou os pronomes te e lhe para referir-se a uma mesma pessoa, apresente duas alternativas que teria o poeta para escrever esse verso segundo a norma culta. (valor:1,0 ponto) Gabarito: “Se hoje eu te odeio amanhã tenho amor a ti ” (melhor do que cometer o cacófato “te tenho amor”, que, contudo, seria gramaticalmente aceitável). “Se hoje eu o (ou a ) odeio amanhã lhe tenho amor”. Leia atentamente: A poesia, ao contrário da filosofia, não é um conhecimento teórico da natureza humana, mas imita, narrativa ou dramaticamente, ações e sentimentos, feitos e virtudes, situações e vícios dos seres humanos. No entanto, a poesia é diferente da história, embora esta também seja uma narrativa de feitos humanos e de situações, das virtudes e dos vícios dos humanos narrados. A diferença está no fato de que AQUELA visa, por meio de uma pessoa ou de um fato, a falar dos humanos em geral (cada pessoa […] não é ela em sua individualidade, mas é ela como exemplo universal, positivo ou negativo, de um tipo humano) e a falar de situações em geral (por meio, por exemplo, do relato dramático de uma guerra, fala sobre a guerra), enquanto ESTA se refere à individualidade concreta de cada pessoa e de cada situação. A poesia trágica não fala de Édipo ou de Eletra, mas de um destino humano; a epopéia não fala de Helena, Ulisses ou Agamenon, mas de tipos humanos. A história, ao contrário, fala de pessoas singulares e situações particulares. Por isso, diz Aristóteles, a poesia está mais próxima da filosofia do que da história, já que esta nunca se dirige ao universal. (Marilena Chauí, Introdução à História da Filosofia. pp. 336-337) 4. As palavras que estão em maiúsculas foram introduzidas no trecho acima em substituição a duas palavras-chave para a exposição que faz M. Chauí das idéias de Aristóteles referentes a distintas formas de conhecimento. Um leitor atento será capaz de identificar as palavras que estavam no texto original, a partir apenas da leitura do trecho aqui apresentado. Assim, substitua as palavras em maiúsculas pelas palavras que estavam no texto original. (valor:1,0 ponto) Gab: O termo “AQUELA” substitui “a poesia”, enquanto “ESTA” substitui “a história”. Vingança Eu gostei tanto, Tanto quando me contaram Que lhe encontraram Bebendo, chorando Na mesa de um bar. E que quando os amigos do peito Por mim perguntaram Um soluço cortou sua voz, Não lhe deixou falar. Eu gostei tanto, Tanto quando me contaram Que tive mesmo de fazer esforço P’ra ninguém notar. O remorso talvez seja a causa Do seu desespero Ela deve estar bem consciente Do que praticou, Me fazer passar tanta vergonha Com um companheiro E a vergonha É a herança maior que meu pai me deixou; Mas, enquanto houver voz no meu peito Eu não quero mais nada De p’ra todos os santos vingança, Vingança clamar, Ela há de rolar qual as pedras Que rolam na estrada Sem ter nunca um cantinho de seu P’ra poder descansar. (Lupicínio Rodrigues. Vingança. 1951.) Olhos nos Olhos Quando você me deixou, meu bem Me disse pra ser feliz e passar bem Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci Mas depois, como era de costume, obedeci Quando você me quiser rever Já vai me encontrar refeita, pode crer Olhos nos olhos, quero ver o que você faz Ao sentir que sem você eu passo bem demais E que venho até remoçando me pego cantando Sem mais nem porquê E tantas águas rolaram Quantos homens me amaram Bem mais e melhor que você Quando talvez precisar de mim ‘Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim olhos nos olhos, quero ver o que você diz quero ver como suporta me ver tão feliz. (Chico Buarque. Letra e música. 1989.) (Glauco. Casal Neuras. Folha de S.Paulo, 05.06.2005.) 5. Em ambas as letras o eu-lírico se refere à ex-companheira (letra de Lupicínio) e ao ex-companheiro (letra de Chico), sendo diferente, porém, a forma gramatical de fazerem essa referência. Examine atentamente o emprego dos pronomes pessoais e de tratamento nas duas letras e, a seguir, a) determine a forma de tratamento pela qual a personagem feminina faz referência ao ex-companheiro na letra de Chico Buarque; (valor:1,0 ponto) b) considerando que em versões mais recentes da letra de Vingança alguns editores, provavelmente influenciados pelo emprego de “lhe” na primeira estrofe, substituem na segunda estrofe “ela” por “você”, justifique a razão dessa troca. (valor:1,0 ponto) Gab: a) A personagem feminina usa o pronome de tratamento da 3ª p. s. você (também em sua forma reduzida ’cê). b) O pronome pessoal oblíquo lhe pode ser usado para se referir ao receptor e também ao referente da mensagem. Ao se substituir o pronome ela por você, na segunda estrofe, entendeu-se que o pronome lhe caracteriza o receptor, isto é, a quem o eu-lírico se dirige (a amada), e não o referente, ou seja, de quem ele fala. A DIFERENÇA ENTRE TU E VOCÊ O diretor-geral está preocupado com um executivo que, após trabalhar sem folga, passa a ausentar-se muito. Chama um detetive. - Siga o Lopes, durante uma semana – disse. Após cumprir o que lhe fora pedido, o detetive informa: - Lopes sai normalmente ao meio dia, pega o seu carro, vai à sua casa almoçar, beija a sua mulher ... e regressa ao trabalho. - Ah, bom. Não há nada de mal nisso. O detetive observa o diretor com olhar fixo e comenta: - Desculpe. Posso tratá-lo por tu? - Sim, claro – responde o diretor. - Bom. Lopes sai ao meio-dia, pega o teu carro, vai a tua casa almoçar, beija a tua mulher ... e regressa ao trabalho. (Texto adaptado) Os textos humorísticos constantemente trabalham com elementos gramaticais (sintáticos ou morfológicos, por exemplo) que são construídos de modo a produzirem efeitos de sentido não esperados pelo leitor, resultando daí a sua comicidade. Nesse sentido, analise a piada acima e responda: a) Por que o detetive faz a modificação do VOCÊ pelo TU? (valor:1,0 ponto) b) Que efeitos de sentido são ocasionados por essa modificação? (valor:1,0 ponto) Leia o trecho a seguir e responda ao que se pede. Omar se dirigiu à mãe, abriu os braços para ela, como se fosse ele o filho ausente, e ela o recebeu com uma efusão que parecia contrariar a homenagem a Yaqub. Ficaram juntos, os braços dela enroscados no pescoço do Caçula, ambos entregues a uma cumplicidade que provocou ciúme em Yaqub e inquietação em Halim. “Obrigado pela festa”, disse ele, com um quê de cinismo na voz. “Sobrou comida para mim?” “Meu Omar é brincalhão”, Zana tentou corrigir, beijando os olhos do filho. “Yaqub, vem cá, vem abraçar o teu irmão.” HATOUM, Milton. Dois irmãos. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p.24. Na Língua Portuguesa, dependendo do contexto, os pronomes ditos “possessivos” nem sempre indicam relação de posse entre entidades (possuidor/coisa possuída). Quanto ao uso de “meu” e “teu” na fala de Zana, que tipo de relações semânticas cada um desses elementos expressa? (valor:1,0 ponto) Gab: O uso de “meu Omar” expressa uma relação de parentesco, uma relação familiar, entre Zana e seu filho Omar e expressa ainda a preferência de Zana pelo filho Omar. (Relação de afeto, carinho, da mãe pelo filho/demonstração de orgulho, da mãe pelo filho) e o uso de “teu irmão” apresenta uma relação de parentesco entre Omar e Yakub, destacando a relação de irmandade entre os filhos de Zana e, ainda, reforçando o desejo de Zana em aproximar os dois irmãos. OU Em ambos os casos, têm-se o sentido possessivo-afetivo. No primeiro caso, “meu” trata-se da aproximação da mãe para com seu filho; no segundo, de seu afastamento pela atribuição do vínculo afetivo aos filhos. OU O uso do “meu” indica proximidade física e afetiva entre Zana e Omar, revelando a preferência da mãe por esse filho. O uso de “teu” indica afastamento afetivo da mãe em relação ao filho Yakub, reforça a tentativa de Zana em aproximar os dois irmãos. Os pronomes “meu” e ‘teu” na fala de Zana denunciam seus sentimentos em relação aos seus filhos e a diferença de tratamento que a mãe dispensa a cada um deles. Concebido como uma homenagem ao escritor João Guimarães Rosa, no cinquentenário de Grande Sertão: Veredas, o romance Nhô Guimarães, de Aleilton Fonseca, apresenta uma linguagem de forma imaginativa, em que o personagem, ao narrar histórias e causos em boa parte inspiradas no imaginário popular brasileiro e no vasto universo rosiano, relembra seu velho amigo Nhô Guimarães. TEXTO I O senhor… mire, veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam, verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra montão. Guimarães Rosa, Grande Sertão:Veredas. TEXTO II Ah, meu senhor, a vida é cheia de espanto. A gente pisca, uma coisa acontece! Já lhe aconteceu de sua natureza amarrar, empatando fazer uma coisa? Isso tem gente que repele. Eu não insisto se dentro de mim uma voz me fala. Desmanchar viagem, desistir de negócio, mudar de caminho, descobrir a intenção de certos amigos. É uma voz da gente, lá dentro, tentando dizer o futuro. Eu digo e repito ao senhor: escute seu pressentimento. É um conselho que a gente dá de si para si mesmo, ou revela aos outros, para prevenir certos fatos. Aleilton Fonseca. Nhô Guimarães. a) Os Textos I e II apresentam marcas linguístico-discursivas que caracterizam uma interlocução do narrador. Transcreva, de cada um dos textos, um fragmento que apresenta essas marcas de interlocução, identifique-as e justifique seu emprego. (valor:0,5 ponto) b) Na progressão de sentido no fragmento de Nhô Guimarães (Texto II), há uma frase do narrador que sintetiza o seu discurso. Transcreva essa frase e explique o seu sentido no texto. (valor:0,5 ponto) Gab: a) Entre outras possibilidades de exemplos, destacamos: Nos dois textos, as marcas de interlocução são expressas pelo emprego do pronome como vocativo: Texto I: O senhor… mire, veja: o emprego do pronome de tratamento como vocativo e o emprego de formas no imperativo identificando a interlocução entre as pessoas do discurso. Texto II: Ah, meu senhor, a vida é cheia de espanto. Ocorre o emprego de formas no imperativo identificando a interlocução entre as pessoas do discurso: No Texto I “… mire, veja” No Texto II “escute seu pressentimento” No Texto II: o emprego do pronome de terceira pessoa “Já lhe aconteceu” que equivale a “você”/ “a ti” e de tratamento “digo e repito ao senhor” que são elementos discursivos de interlocução b) Eu digo e repito ao senhor: escute o seu pressentimento. Explicação: O argumento de evitar fazer coisas, mudar de caminho, por causa de uma “voz da gente, lá dentro, tentando dizer o futuro” desemboca no conselho do narrador: “escute o seu pressentimento”.