Experiência de Consumo em Espaço Natural Ambientado: como os elementos de um ambiente natural oferecem experiências ao consumidor 1 Considerações Iniciais Tendo em vista a atual vivência na Economia da Experiência e, consequentemente, a busca dos indivíduos por experiências de consumo hedônicas e memoráveis, as empresas mudaram seu foco para oferecer experiências holísticas para não só fidelizar velhos clientes como para conquistas novos. Uma das estratégias mais comuns adotadas pelas organizações é a elaboração de ambientes de consumo com apelos multissensoriais que provoquem emoções positivas nos consumidores. As pesquisas atualmente abordam a temática da atmosfera de loja, limitando-se aos ambientes de varejo e negligenciando outros tipos de estabelecimentos (DONOVAN et al, 1994; RICHARDSON et al, 1994; CARNEIRO et al, 2008; ESPINOZA et al, 2005). Este trabalho é parte de um projeto de dissertação desenvolvido no Programa de PósGraduação em Administração - PROPAD da Universidade Federal de Pernambuco. Traz uma abordagem diferenciada dos estudos já publicados ao investigar a dinâmica existente entre os elementos que compõem um ambiente de serviços construído em um meio ambiente natural (praia) e sua possível relação com a oferta de experiências positivas e hedônicas de consumo. O local escolhido para o desenvolvimento da pesquisa foi uma barraca de praia localizada na praia de Boa Viagem na cidade do Recife, por se diferenciar das demais que encontradas em seu entorno ao oferecer produtos e serviços mais elaborados e pela sua ambientação. 2 Revisão de Literatura 2.1 Economia da Experiência Um fenômeno contemporâneo constante no cenário organizacional é a adaptação de costumes, rotinas, serviços e produtos com o objetivo de se apossar de uma fatia cada mais extensa de um mercado até então em expansão (TONINI, 2009). Diversos estudos econômicos e de marketing, apontam que os anseios dos clientes de hoje são movimentados por razões de ordem emocional e não somente racional (ARNOULD, PRICE, 1993; THOMPSON, LOCANDER, POLLIO, 1989; HIRSCHMAN, HOLBROOK, 1982; SCHMITT, 1999; PULLMAN, GROSS, 2003; SWARBROOKE; HORNER, 2002). Em 1999, a expressão “economia da experiência” surgiu no título do livro de B. Joseph Pine II e James H. Gilmore. Ideia análoga foi explorada em outro livro de 1999 intitulado The Dream Society, de Rolf Jensen, do Instituto Copenhagen para Estudos Futuros na Dinamarca (UNCTAD, 2010). A Sociedade do Sonho, ou ainda, a chamada Economia da Experiência, por Pine II e Gilmore (1999), é uma tendência econômica mundial que proclama necessidades emergentes e valores de mercado, sendo seguida por aqueles que desejam inovar nos processos de concepção e comercialização de produtos, sobretudo em atividades ligadas ao turismo (MINISTÉRIO DO TURISMO, s.d). Tal fenômeno faz com que o fator emocional, os valores e os sentimentos, contraiam maior relevância que o fator racional. Jensen (2002) corrobora a ideia, ao afirmar que na Sociedade do Sonho, um produto não possui exclusivamente a mera função pela qual foi concebido, mas vai além. O consumo de determinado produto está atrelado ao valor emocional que o próprio possui, não exclusivamente ao produto físico em si, além da chance de suprir uma necessidade legítima (JENSEN, 2002), o que também pode ser aplicado ao setor de prestação de serviços. 1 A lógica passou a ser, então, a do Serviço-Dominante (SD), que "oferece uma ideia que enfatiza o marketing de serviços e não de produtos ou serviços, a ser alcançado por meio de diálogo, co-criação de valor com uma rede de parceiros e foco na experiência" (TYNAN; McKENCHNIE, 2009, p. 502). Nessa nova tendência registra-se uma mudança de foco, passando-se da inteligência racional para a inteligência emocional, fazendo com que os grandes valores econômicos sejam as experiências e os sonhos (MINISTÉRIO DO TURISMO, s.d). Segundo Holbrook e Hirschman (1982, p. 132) "esta perspectiva experiencial é fenomenológica em espírito e se refere ao consumo como um estado de consciência primariamente subjetivo com uma variedade de significados simbólicos, respostas hedônicas, e critérios estéticos". O conceito expande a ideia de que, no futuro próximo, os indivíduos estariam dispostos a dispender altas porcentagens dos seus rendimentos, com o intuito de usufruir de experiências extraordinárias. Seus anseios por experiências emocionais estariam vinculados ao consumo de produtos e serviços criativos que necessitariam ser extremamente específicos e individualizados, em comparação a um simples negócio de commodity (UNCTAD, 2010). Estas experiências, enriquecedoras, remeter-se-iam por sua vez a um estilo de vida customizado, ao status e a utilizações de determinadas marcas. Schimitt (1999) diz que consumidores querem produtos que toquem seus sentidos, impressionem e estimulem suas mentes; algo que possa ser incorporado aos seus estilos de vida, ou seja, que ofereçam uma experiência. Esse enfoque reconhece e capitaliza o fato de que, quando os indivíduos vão a um restaurante, elas não vão apenas pela comida, mas pela experiência multifacetada de participar de um evento em um ambiente encantador, com bom vinho, companhia, conversa, música etc (UNCTAD, 2010). Assim, quando se fala em turismo, por exemplo, observa-se que o indivíduo não vai à praia tão-somente para tomar sol ou um banho de mar, mas também para ficar bem diante da sociedade, para relaxar, para encontrar os amigos (TONINI, 2009). Pine e Gilmore (1999) batizaram de Economia da Experiência, essa forma de comercialização na qual o consumidor não adquire simplesmente um produto ou serviço, mas sim, paga “para passar algum tempo participando de uma série de eventos memoráveis” (PINE; GILMORE, 1999, p. 2). A ideia é reafirmada por Marcuse (1968) e Jensen (2002), quando expõem que não se compra algo com o objetivo de que o mesmo desempenhe simplesmente sua função, mas sim, que possibilite satisfazer outros desejos. Para os autores, o valor econômico dessa relação não está apenas na conquista ou fidelização do cliente, mas na valorização de um mesmo produto ou serviço por conta de sua condição especial para aquele determinado cliente, assim como em sua capacidade de se eternizar em sua memória. Os consumidores, como anteriormente citado, buscam algo criativo, algo que seja capaz de ser tornar memorável e é exatamente isso que a Economia da Experiência vem oferecer, tornar a imaginação real, encenada como em uma peça teatral, trazida para bem perto do consumidor, fazendo-o vivenciar, passar por cada momento inusitado que uma experiência pode proporcionar (PINE; GILMORE, 1999). A questão, então, não é se, mas quando e de que maneira se inserir na emergente Economia da Experiência. A experiência ocorre quando uma empresa intencionalmente usa os serviços como um palco e os produtos como suportes para seduzir os consumidores de forma que se crie um acontecimento memorável. Commodities são fungíveis, produtos são tangíveis, serviços são intangíveis e experiências são memoráveis! (PINE; GILMORE, 1998). Baseado nestas tendências, muitas organizações privadas e públicas iniciaram uma transição, procurando apropriar produtos e serviços de modo a inseri-los em uma corrente cujo alvo é incrementar a comercialização (BENI, 2004). Todo este processo não deixa de fazer parte do modelo capitalista de produção, acumulação e consumo. O modelo que toma conta dos seres sociais, traduzido em uma nova síntese econômica: o consumo de emoções. 2 2.2 Experiências de Consumo A ampliação da competitividade do mercado, inserida em uma economia globalizada, vem demandando às empresas novas estratégias para atrair mais consumidores, uma vez que a mera apresentação funcional do produto não é mais suficiente para conquistar ou fidelizar os clientes. A busca pelo “novo” por parte dos consumidores é um estímulo para as empresas buscarem alternativas para envolver àqueles. O que se percebe é que os clientes não buscam uma compra simples, o que se verifica é a busca por experiências. Sobre a perspectiva experiencial, pode-se citar o estudo de Hirschman e Holbrook (1982) como o explorador nesse tipo de consumo. Tais autores discutem a hegemonia da visão tradicional de marketing que poderia não abarcar o entendimento mais intenso do consumo na visão do próprio consumidor. No ponto de vista trazido por Hirschman e Holbrook (1982) o processo de consumo é composto também por fantasias, sentimentos e diversão. Além disto, esse novo olhar clarifica que o consumidor moderno traz consigo uma maior complexidade e heterogeneidade ao adquirir produtos e serviços. (ADDIS; HOLBROOK, 2001; GENTILE; SPILLER; NOCI, 2007; YUAN; WU, 2008). A experiência de serviços é tratada de diversas maneiras na literatura de marketing, e essas abordagens ajudam a compreender melhor as interações do cliente com a empresa, o produto, o serviço, dentre outros fatores. Verhoef et al. (2009) abordam o caráter holístico de uma experiência, onde fatores diferentes, tanto os geridos pela empresa (por exemplo, produto, ambiente de loja), quanto aqueles que não se podem controlar (características do consumidor e fatores situacionais de compra), compõem a conjuntura na qual a experiência se consolida. A literatura que trata sobre o tema experiência é bastante vasta e traz um extenso universo de exemplos, que vão desde experiências utilitárias às hedônicas (Babin et al. 1994), das experiências comuns às extraordinárias (Kim, 2001). O termo experiência é utilizado tanto como tática de promoção de vendas, como pode fazer parte do âmago da oferta. A experiência do cliente emana de um conjunto de interações entre um consumidor e um produto ou serviço, uma marca. Tendo como premissa a ideia de que a experiência é singular, particular e holística por natureza, isso implica que ocorre em alguns níveis, quais sejam: cognitivo, afetivo, emocional, social e físico e provoca determinadas respostas (Verhoef et al., 2009). Contudo, para Shaw e Ivens (2002), o comportamento em cada uma dessas fases está sujeito às expectativas antecedentes dos consumidores, construídas através de experiências prévias, do boca a boca, anúncios publicitários, imagem da marca e experiências com outras marcas similares. As experiências de consumo não focalizam exclusivamente aspectos funcionais dos produtos, e sim todos os eventos, atividades e até os “detalhes” capazes de agregar valor em todas as fases do consumo, por exemplo, o planejamento do ambiente, a interação com outros indivíduos, a “construção” de sentimentos e significados e mesmo, aspectos emocionais (BRUNER, 1986). A oferta de experiências de consumo está ligada ao hedonismo que, por sua vez, se relaciona aos aspectos simbólicos, emotivos e multissensoriais os quais segundo Hirschman e Holbrook (1982, p. 92) são "múltiplas modalidades sensoriais incluindo sabores, sons, cheiros, impressões táteis e imagens visuais". O marketing sensorial ainda se relaciona às experiências vividas pelos consumidores e a suas dimensões sensoriais, emocionais, cognitivas, comportamentais e racionais, não apenas funcionais (JANUZZI; PACAGNAN, 2009). Tenta analisar a situação de consumo de maneira holística, buscando a adequação dos produtos e serviços às expectativas dos clientes, deixando-o à vontade para se guiar mais por seus impulsos e suas emoções (KOHEL, 2004). 3 Para delimitar elementos, dimensões e variáveis da experiência, alguns modelos vêm sendo sugeridos, dentre os quais, cita-se o servicescape, trazido por Bitner (1992), embora não tenha sido fecundado dentro de uma abordagem experiencial. Nesta pesquisa Bitner (1992) demonstra que as reações podem ser agrupadas em: cognitivas, emocionais e físicas. A pesquisa de Pullman e Gross (2003), por sua vez, enfatiza a criação de experiências levando em conta os contextos. Para os autores, experiências podem ser conceituadas dentro de contextos físicos, relacionais e um período de tempo. Lofman (1991) propôs, em uma pesquisa de caráter exploratório, os elementos mais importantes relacionados ao consumo experiencial incluem o contexto no qual a experiência ocorre, vários fatores ligados ao consumo em si e como aspectos sensoriais podem fazer parte da estimulação dos consumidores. No tocante ao Brasil, Azevedo Barbosa (2006) propôs um esquema para o entendimento do processo de oferta e consumo de experiências extraordinárias nos serviços. Vale salientar que o processo de consumo é influenciado pelas dimensões das experiências extraordinárias (expectativa, motivação, interação, satisfação,envolvimento e encantamento). Segundo defendem Pinto e Lara (2009), é relevante salientar que é provável que aja um diálogo entre o campo da experiência e das questões sociais, culturais e simbólicas abarcando o consumo que não tem sido apreciado em muitas pesquisas, uma vez que nas experiências de consumo é comum a manifestação de questões eminentemente simbólicas e permeadas por várias sensações como sonho, imaginação, alegria, prazer, status, dentre outras coisas. Uma das principais formas de ofertar experiências aos consumidores é a elaboração de ambientes ou cenários de serviços que atinjam seus sentidos e desperte emoções. Esta é uma prática comum quando se fala em ambientes de varejo, negligenciando os meios ambientes naturais urbanizados e humanizados para fins de consumo. 2.3 Ambientação de um Espaço Natural para a Oferta de Experiências Como forma de diferenciação e promoção de experiências positivas, o ambiente de consumo pode ser trabalhado (BATESON; HOFFMAN, 2003). Semelhante ao design de produtos, o ambiente físico, denominado por Bitner (1992) de servicescape, passou a ser investigado por pesquisadores de marketing e utilizado por profissionais para elaboração dos espaços de varejo. Kotler (1973, p. 50) chama de atmospherics "o esforço de projetar um ambiente de compra para produzir, no comprador, efeitos emocionais específicos que aumentem a probabilidade de compra". Quando se fala em atmosfera fora do seu sentido literal, faz-se alusão a seu caráter, ou seja, a forma com que esta comunica um sentimento aos seus participantes (BOHME, 2013). Transferida para a área do marketing, a metáfora da atmosfera ganha uma abordagem mais operacional, associando-se à criação de um ambiente de varejo pelo uso de cores, iluminação, sons e mobiliário com o objetivo de estimular respostas sensoriais e emocionais dos consumidores afetando seu comportamento (KOTLER, 1973; JANUZZI; PACAGNAN, 2009; KOVACS et al, 2005). A atmosfera do ponto de venda ou servicescape, então, refere-se a todos os elementos da loja que podem ser controlados pelo ofertante do serviço e que são passíveis de influenciar as reações afetivas, cognitivas e comportamentais dos indivíduos, sendo descritas em termos sensoriais por meio dos cinco sentidos (RIEUNIER, 2004). Devido à constante interação dos consumidores com os traços físicos da organização prestadora de serviços e do que estes podem comunicar é que os pesquisadores e profissionais devem estar atentos a que fatores influenciam o comportamento do consumidor. O design de um ambiente de serviço (servicescape ou atmosfera) é, portanto, feito em consonância com o design da experiência. Para Carbone e Haeckel (1994) o design da 4 experiência tem mais a ver com um contexto de pistas ou elementos de design e do ambiente do que com a performance do serviço. Em um ambiente de serviços, o contexto é o lugar onde o "indivíduo consome o serviço e tudo com que este interage dentro daquele cenário" (PULLMAN; GROSSMAN, 2003, p. 218). Segundo Berry, Carbone e Haeckel, Qualquer coisa que pode ser percebida ou sentida – ou reconhecida pela sua ausência – é uma pista de experiência. Assim, o produto ou serviço à venda desprende uma gama de pistas, o cenário físico oferece mais pistas, e os funcionários [...] ainda mais pistas. Cada pista carrega uma mensagem, sugerindo algo ao consumidor. A combinação de todas as pistas faz a experiência total do consumidor. (2002, p. 01) Aubert-Gamet e Cova (1999, p. 38) apresentam considerações sobre a maneira de investigar esta interação existente entre o consumidor e o servicescape: • o ambiente não é mais considerado apenas como um estímulo definido, mas também parcialmente como um construto pessoal; • o ambiente não é apenas espacial, mas também social (um construto socioespacial) • o consumidor é parte ativa do ambiente. Considerando as dimensões do marketing sensorial aplicadas à atmosfera de varejo, faz-se necessário ampliar seu alcance para os ambientes construídos fora destes locais, ou seja, em meios ambientes naturais, para compreender as interações existentes entre seus elementos e o comportamento do consumidor. Um fenômeno recorrente na dinâmica econômica, cultural, história e espacial das cidades é a ambientação dos espaços urbanos. Para Thibaud (2010), falar de ambientação dos espaços urbanos significa compreender como as transformações da cidade de hoje se encarnam e se propagam na vida cotidiana. Conceitos como servicescape e atmosfera de loja são constantemente aplicados a ambientes de varejo construídos dentro de estabelecimentos comerciais, de restaurantes, hotéis ou até ambientes de varejo online (GEARGEOURA, PARENTE, 2009; AGUIAR, FARIAS, 2012; GALHANONE et al., 2011; FARIAS, 2005). Como forma de complementar essa concepção de ambiente construído agrega-se a ideia da apropriação dos elementos de um meio ambiente natural para a transformação em um espaço de prestação serviços (ambientação), ou seja, um espaço de consumo em ambiente natural. Para isto, parte-se da premissa que meio ambiente e ambiência são conceitos distintos e que devem ser incorporados ao estudo da atmosfera de loja, visto que a urbanização se dedica cada vez mais à sensibilização dos espaços, transformando um mundo de formas construídas em um mundo de "ar e de atmosferas sensíveis". A ambiência (ambientação de um espaço urbano) vai além do controle dos aspectos físicos de um meio ambiente, visa dotá-lo de valor afetivo, "organizar as sensações, para fazer sentir Stimmung [a atmosfera do ambiente]" (THIBAUD, 2011, p. 31). O que Thibaud chama de ambiência (ambientação dos espaços urbanos), para Malard (1993, p. 4) é "o conjunto de qualidades que fazem de um lugar um domínio sagrado", sendo revelada no processo de apropriação em um processo de humanização do espaço e dotando-o da natureza humana segundo suas necessidades e desejos. 5 Na seção a segui serão apresentados os procedimentos metodológicos utilizados para investigar como a ambientação de um espaço natural numa praia contribui para a oferta de experiências a seus consumidores. 3 Procedimentos Metodológicos O método utilizado para o desenvolvimento do artigo foi a observação participante, através da qual o pesquisador participa da comunidade ou cultura sendo investigada, mas mantém uma posição analítica ou observacional para que seja capaz de descrever e interpretar padrões, relações, entendimentos e significados atribuídos pelos sujeitos do estudo (TACCHI et al, 2003). A observação é uma técnica direta que envolve o contato com informantes; é nãodirigida já que o observador não intervém na situação observada e tem a observação da realidade como sendo o objetivo final; e constitui uma análise qualitativa, pois envolve anotações para descrever e compreender uma situação (JACCOUD; MAYER, 2008, p. 254). Denzin (1989) define a observação participante como uma estratégia de pesquisa que combina, ao mesmo tempo, análise de documento, entrevista com participantes, participação e observação direta e introspecção do pesquisador. A pesquisa em questão não envolveu a análise documental ou entrevistas, mas focou na observação e interpretação dos fatos observados. O local selecionado para a realização da observação foi uma barraca de praia, na praia de Boa Viagem no Recife, Pernambuco. O ambiente foi selecionado por se diferenciar dos demais estabelecimentos que prestam serviços semelhantes na mesma localidade através da oferta de serviços, produtos e ambiente mais elaborados e voltados a oferecer uma experiência a seus consumidores, sendo assim de importância para o estudo da economia da experiência. A observação foi realizada durante o período de funcionamento da barraca que abre nos fins de semana de sexta-feira a domingo das 9 às 16 horas, principalmente nas sextas e sábado que possuem maior movimento. Em alguns dias em virtude de clima ruim o estabelecimento não funcionou ou fechou mais cedo, o que impossibilitou a observação no período. A análise foi feita com base em um recorte do público frequentador do local e focou em pessoas de 20 a 30 anos que constituem a maioria dos frequentadores no intervalo da observação. Com o auxílio de um diário de campo, as informações coletadas durante a observação foram transcritas horas após a coleta, em detalhes para que não se perdessem ou se confundissem. A partir destas informações partiu-se para a descrição. 4 Análise dos Dados A praia de Boa Viagem, maior praia urbana da cidade do Recife, é marcada pela presença de barracas que prestam serviços de bar e culinária ao longo de sua costa. Os produtos e serviços ofertados são muito semelhantes e, para se diferenciar, utilizam estratégias das mais diversas, desde promoções e tratamento diferenciado ao cliente até a produtos de alto valor econômico. A barraca estudada se destaca por dois fatores principais: sua ambientação e seus produtos, alguns considerados de luxo. A ambiência vai além dos aspectos físicos do local e 6 inclui a presença das pessoas que o frequentam, ou seja, é um construto socioespacial (AUBERT-GAMET E COVA, 1999). Em relação ao ambiente físico, a barraca é marcada por seus guarda-sóis padronizados, de cor vermelha. Suas cadeiras e mesas possuem a mesma cor e, assim como as sombrinhas, levam o nome e logotipo de uma cerveja patrocinadora do local. As mesas são dispostas de modo a maximizar o uso do espaço, já que este é limitado pela prefeitura. Vão desde o início da faixa de areia próxima a calçada até a beira mar e todas possuem coolers (também da cerveja patrocinadora) ao lado para facilitar e aumentar o consumo de bebidas e produtos gelados. Uma mangueira é utilizada em dias muito quentes para climatizar o local, já que por causa da proximidade das mesas e da presença massiva das barracas circula pouco vento em seu interior. Assim que chega à barraca o cliente é convidado ao início da experiência, não pisando diretamente na areia, mas com a opção de caminhar por peças de madeira em formato de pés que simulam um tapete vermelho. O cardápio é formado por pratos e bebidas de alto valor econômico e são apresentados de forma bem elaborada. A barraca é a única na localidade a oferecer espumante e champanhe como opção. Apesar de possuir uma ambientação física diferente das demais, o que chama atenção é o aspecto social da ambiência. Sua formação sempre visou públicos de altas classes sociais e, mesmo com facilidades de pagamento como cartões de crédito, estes são os únicos públicos presentes. Percebe-se a presença de uma maioria de jovens e adultos, tanto homem como mulheres, da faixa de 20 a 30 anos. Os clientes vão em grupos ou até mesmo sozinhos e consomem, principalmente, bebidas entre elas cerveja e água de coco. Embora possua um cardápio variado de frutos do mar e outros tipos de comida, os clientes preferem consumir alimentos de ambulantes que circulam o local. Vestidos de forma semelhante, com marcas e grifes, os consumidores se identificam não só com o ambiente, mas também uns com os outros, o que mostra que a experiência ali vivida está de acordo com seus estilos de vida. Como dito anteriormente, os consumidores atualmente não buscam produtos e serviços funcionais, procuram ambientes com os quais possam se identificar e identificar pessoas semelhantes, atividades que proporcionem prazer, diversão, enfim, buscam experiências hedônicas. Ir a praia se transformou num exercício de socialização e o banho de mar ficou em segundo lugar. Nesta barraca especificamente, a experiência é focada neste aspecto social: as pessoas vão para aparecer diante daquela sociedade e consumir aquilo que lhes garante status. A relação com o ambiente se dá mais com sua fama e seu nome do que com o que seus componentes físicos, como mobiliário. 5 Considerações Finais A busca por experiências de consumo é um fenômeno recorrente diante da Economia da Experiência em que vivemos. Através da elaboração de ambientes de serviços as empresas se diferenciam umas das outras para fidelizar e conquistar novos clientes e tentar encantá-los. Expandir os estudos sobre o tema é importante para compreender a dinâmica que rege o comportamento dos consumidores e o que os instiga a buscar determinadas experiências. Os espaços públicos também são espaços de consumo e devem ser tratados como tal, com direito a planejamento de seus cenários para conquistar os consumidores. 7 Este artigo, como parte de um projeto de dissertação, não traz os resultados finais da observação que ainda está em andamento, no entanto traz algumas considerações interessantes para discussão que serão complementadas com observações futuras. 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