Negócios rumo à China São projectos portugueses cujo sucesso passou pela entrada no mercado chinês. Conheça as histórias de quem aproveitou as oportunidaedes da segunda maior economia do mundo para crescer. ¦ ¦¦ ANA PIMENTEL Cortiça, farmácia "software" ou multimédia e industriaL Não importa de onde vêm, mas sim para onde vão. Na Mmd, 80% das vendas internacionais já chegam do mercado chinês. A língua, a distância e a cultura podem dificultar a viagem, mas não sado, abriu uma empresa de direito chinês, em Macau. Durante este período, tem desenvolvido vários traba- impedem o sucesso das negociações. Dizem os especialistas que o segredo dois acordos específicos: comumparque de ciência e tecnologia em Pe- estánacalma,napersistênciaenapaciència E no respeito pela cultura de quim,ecomumaempresacriadapela Universidade de Tsinghua, "muito forte na área da transferênciade tec- negócio. Em 2020, a PriceWaterhouseCoopers (JWQprevêqueaChina tenha ultrapassado os Estados Unidos da América (EUA) na liderança das maiores economias do mundo. Em 2050,éavezda índia "Qualqueremque queira ser um lídermundial-temdeterumagranpresa industrial - depresençanos mercados emergentes", disse Ed Breen, presidente da Tysco International, no 14° CEO Survey, um inquérito realizado a mais de 1200 gestores em todo o mundo pela PWC. As maiores expectativas estão depositadas na China, eleita p0r39% dos inquiridos como um dos três países mais importantes para o cresci- mento das empresas. ASociedade Portuguesa de Inovação (SPI) está naquele país desde 1999. Começou o processo de internacionalização dois anos depois de ter surgido ejá conta com 65 colabo- radores, de 10 nacionalidades diferentes. Seis são chineses. No ano pas- lhos para a Comissão Europeia, com o governo americano e com empresas que queiram internacionalizar- se através daexportação.importação ou procura de parcerias. Celebrou nologia". "Conseguimos exportar todo o tipo de apoio, desde a fase inicial até ao estabelecimento de joint- ventures e outras parcerias", explica SaraMedina,administradoraecoordenadora das actividades e serviços da consultora na China, desde 2004. Nos últimos anos, confessa que temhavidoumagrandeprocuiu"As empresas estavam muito receosas em ir para a China, mas agora o processo de decisão é mais rápido", diz. Quem quiser apostar na segunda maior economia do mundo tem de a ver como um investimento. Para os chineses, aconfiançaé essencial. Por isso,háque ter cuidado naaproximação. "A primeira vez que fui a uma reuniãoàChina, quis falarlogo de negócios. Eles disseram que, primeiro, tínhamos que nos dar a conhecer", conta Os empresários devem fazer visitas ao país regularmente, paraque estabeleçam um grau de confiança com vêm o mundo de umaforma mais globaL Ir àChinaháuns anos pareciamais longínquo do que agora", adianta O facto de os governos parecerem mais próximos também tem gerado um clima de confiança nas empresas. "E preciso tratar a China de uma forma muito profissional", diz SaraMedina Com confiança, respeito pela cultura e persistência "E preciso tempo os parceiros. "Hoje, as pessoas paraambas as partes se conhecerem. EpaciênciaAChinatemdeservista como um investimento", conclui ParaEduardoßeira,professordo programa The Magellan MBA, da - University of Porto Business School (EGP-UPBS), as diferenças culturais são muito mais profundas do que as existentes no protocolo social. "Veja-se o exemplo do sentido de lealdade na cultura chinesa de negócios. É completamente diferente do EGP ocidental. Aquilo que é visto por um ocidental como uma 'golpada', é para ochinêsumajogadainteligente'que mercê todo o mérito", explica Primeiro, prudência Ana Teresa Lehman, coordenadora do programa Managing InternationallydaEGP-UPBS,recomendaprudência As iniciativas de internacionalização devem ser precedidas de muita avaliação e estudo, sobretudo com a conjuntura económica actual "Como referiu Rahm Emanuel, não se deve desperdiçar uma boa crise. São momentos privilegiados parare- reduzir burocracias e ter pensar estratégias, reposicionar actividadeserecursos,racionalizar,con- processos, solidare,emalguns casos, aproveitar agressivamente oportunidades que surjam de adquirir empresasecompetências abom preço." instituições. Os exportadores devemestaratentosàsgarantiaseaos seguros de crédito. "Ainda há um longo caminho até que possamos assumir que prestamos serviços de apoio ainvestidores deexcelênciae que somos um país ágil, coordenado e pouco burocrático." Segundo Ana Teresa Lehman, a pode ser vista internacionalização comoummenudeescolhasentreváriosmodosdeentradanos mercados internacionais. "Há que ter muita atenção às questões culturais e fozer uma correcta avaliação do mercado e dos riscos." É importante ter um Emtodosossectores,háactividades e empresas com potencial de in- 'Tenho a firme ternacionalização. convicção de que Portugal não pode abdicar da sua vocação industrial, particularmente centrada nos 'clusters' da região do Norte", revela A atenção centra-se em áreas como a automação, máquinas industriais, saúde, agro-alimentar, florestas, recursos do mar, indústrias criativas e outros sectores com tradição, mas comelevadacomponente tecnológica ou de 'design'. "Salientaria ainda o sectordaenergia,emquePortugalse destaca positivamente", acrescenta contriSem esqueceroturismo.cujo buto para as exportações também é "mensurável". Por isso, é preciso simplificar uma melhor articulação entre as parceiro quedomineasespecificidades do mercado, de confiança e planos de contingência para cenários "Na maioria dos casos, as empresas portuguesas só serão competitivas na China com produtos diferenciados e com estratégias de nidistintos. cho.Oconsumidorchinêscompoder de compra é sofisticado, exigente e gastamuito. Essaeliteeconómicarepresentamuitos milhões de pessoas", frisa Além da China, Ana Teresa Lehmanaconselhaasempresasaestarem de "olhos postos" na América Latina (Brasil, Colômbia e México) e noutros países asiáticos, como a índia e Indonésia "Enquanto outros mercados forem mais acessíveis, mais rentáveis e de menor risco para o investimento, penso que deverão servistes como prioritários em relação à China", diz Eduardo Beira Continua a haver muito paraexplorar no mercado europeue "prudência" é apalavrade ordem. "É verdade que a China é um mercado fabuloso e em grande crescimento ehaverápor lá, certamente, muitas oportunidades, mas, mais uma vez, não é o mar de facilidades social e enque muitaíomunicação tidades politicas insistem em idealizar, muito em especial para empresas não asiáticas." Selo europeu A Blucpharma prepara a entrada no mercado chinês. Seis meses depois da primeira visita, Sérgio Simões não poderia estar mais expectante. Há já algum tempo que a Bluepharma estava desperta para o mercado chinês. Sérgio Simões, vice-presidente indústria, a cadeia de conhecimento valor na China e os requisitos pedidos pelas autoridades. "0 mercado do negócio e para o desenvolvimento do produto, sabia que iria encontrar farmacêutico um mercado diferente do chinês que, regra geral, funcionam com barreiras à entrada." Depois, os distribuidores do europeu: as especificidades com mais volume e menos retalhado. Há cerca de seis meses, iniciou missão é extremamente regulamentado uma com duas visitas ao país. A e quisemos conhecer e locais ajudaram a entender o mercado de distribuição: os argumentos de venda, que tipo de medicamento pode ter sucesso, onde é que existe o factor de diferenciação, entre outros. "Ajudaram-nos a perceber qual é o ponto de partida para sermos competitivos na China", explica. terceira está prevista para o próximo trimestre. "Identificámos muito bem o Não se ficaram que esperávamos, ver e encontrámos precisavam de compreender o circuito de aprovação dos medicamentos. Mesmo que já o que queríamos um bom interlocutor que nos ajudasse a planear a missão." Na bagagem, levavam três objectivos: conhecer mercado farmacêutico identificar o na China, locais que ser distribuidores e as os "players" pudessem empresas chinesas que pudessem ser eventuais parceiros para o desenvolvimento de medicamentos. Conheceram à entrada, o mercado, os principais as barreiras actores da poderem por aqui. Para exportar para a China, estejam aprovados na Europa ou nos EUA, devem fazer ensaios clínicos no país liderado por Hu Jintao. Por isso, de aliados. "É preciso identificar nas empresas chinesas precisam eventuais parceiros para o desenvolvimento de medicamentos." Porquê a China? Porque é um mercado emergente. Nos países mais desenvolvidos, o mercado está é mais importante taxas crescem de uma forma muito manter uma relação cuidada com os parceiros que ter um contrato. Por isso, é "A nossa empresa exporta muito, já estava habituada a internacionalizar-se. Ir à China fazia preciso tempo e paciência. O maior obstáculo às negociações continua a ser a língua. "Mesmo nas grandes todo o sentido", cidades, completamente de crescimento maduro e com taxas moderadas. Ali, as superior. comenta. Na segunda maior economia no mundo, ainda é muito difícil comunicar." do Sérgio Simões acredita que estão em condições de exportar para o mercado chinês dentro de três ou quatro anos. "Estou com fortes convicções de que vamos retirar retorno deste investimento e que a China pode ser um mercado muito importante para a Bluepharma." Made in China Dois anos depois de ter pisado o solo chinês com o seu próprio pé, a Mmd já conseguiu implementar 200 sistemas na indústria do calçado. João Bernardo, fundadores 50 anos, foi um dos da Mind. Em quatro país com maior número anos, a empresa que desenvolve de projecto soluções e produção assistidas por computador adquiriu uma posição de liderança na industria nacional do calçado. Rapidamente perceberam que tinham de começar uma estratégia de internacionalização. Em 2005, fizeram um acordo de distribuição com uma empresa multinacional inglesa. "Os primeiros resultados em 2006 e a parceria operacional e num surgiram apostarem na China foi um passo natural. Afinal, este tinha sido o No início de 2009, começaram a operar de forma independente. "Foi claramente difícil manter os contactos anteriores, tínhamos do nosso lado a mas qualidade dos produtos. Tivemos de fazer um esforço directo muito grande, que obrigou a deslocar-nos a China de dois em dois meses." Abordaram manteve-se de vendas durante a parceria anterior. "Era o grande mercado de exportação." directamente todos os Enquanto uma portuguesa de elevada dimensão pode adquirir quatro ou seis sistemas da Mmd, uma fábrica chinesa pode adquirir cinquenta ou cem diferentes. Obstáculos? A distância, investimento o necessário para manter o contacto directo com o mercado e a língua "Há uma grande dificuldade no de regras, os estabelecimento processos de cooperação e de negociação são extremamente lentos, o mercado é muito extenso, mas também muito disperso." clientes Neste momento, a Mmd está mercado do extremo Oriente. Três conseguiram uma taxa de sucesso de quase 100%. Celebraram dois presente em países como os EUA, Vietname ou Japão. A China foi a primeira experiência de anos depois iniciaram acordos de vendas até meados crescendo de 2008", conta. Entraram nos EUA, na Europa de Leste e no um processo de internacionalização próprio. "Quando decidimos avançar com os nossos próprios primeira manter sob nosso controlo grandes clientes americano extremo difícil foi os chinesa sem ter interlocutores do mercado e os seus parceiros Oriente", diz. Daí até de distribuição com empresas locais e no final de 2009 lançaram um gabinete de representação no país. "É muito manter um processo de colaboração com uma empresa a recursos, fase do processo que tinha adquirido durante a parceria anterior e no própria e já internacionalização corresponde a cerca de 80% das vendas internacionais da empresa. "Nos EUA vendemos para os grandes departamentos criativos, enquanto que na China vendemos mais próximos para as fábricas." Neste momento, já têm mais de 200 sistemas mercado", instalados. da língua e do comenta João Bernardo. Um século dedicado à cortiça Noventa anos depois de ter produzido a primeira rolha, a Moisés Lima estreou-se eifi solo chinês. Uma década de crescimento levou-a a apostar noutras áreas de negócio. Moisés Lima, 53 anos, levou a cortiça para a China há dez anos. Os motivos foram vários: às "altas taxas" de crescimento da economia juntou-se a especificidade do mercado e as amizades que foi criando por lá. Mas não só. Foi, "sobretudo, por uma questão de garantia de continuidade" que se aventurou para aquela que é hoje, a segunda maior economia do mundo. "O sector das cortiças, em geral, sempre teve uma grande percentagem das vendas para exportação, devido à grande quota de mercado que Portugal tem a nível mundial, pelo que esta sempre foi muito usual e a nossa empresa não foge à regra", explica o director geral da empresa que detém o seu nome. Fundada em 1910, a Moisés Lima Cortiças tem passado de geração em geração. Produz rolhas naturais, ideias para vinhos de qualidade que precisam de envelhecer na garrafa, rolhas I+l para vinhos de consumo até dois ou três anos, rolhas aglomeradas para consumo muito rápido, rolhas colmatadas e rolhas que toca ao sector das cortiças. Por isso, os negócios de Moisés Lima para vinhos de rotação rápida e rolhas capsuladas para vinhos fortificados ou espirituosos. limitados, Aquacol Além destas, a empresa produz cortiça em pilha, em fardo ou em paletes. Para Moisés Lima, vender na China é mais "demorado e complexo" do que vender no ocidente, mas nem por isso deixa de retirar mais-valias. "Como já conhecemos este mercado em terreno oriental têm sido mas estáveis. Como principais obstáculos à entrada no mercado chinês, o empreendedor destaca a compreensão e adaptação à cultura, sobretudo, sua forma de negociar, "mais complexa e demorada estávamos habituados Ocidente". E acrescenta: à do que no "Na Ásia, as relações pessoais desempenham um papel importante nos negócios com alguma profundidade, temos tido um crescimento sustentado, já e, sem entender com algum peso na facturação e começámos a aproveitar outras Para o futuro, Moisés Lima pretende continuar a actuar no mercado chinês nas duas áreas em que já actua: alimentar e cortiças. de negócio, oportunidades acrescenta. fora das cortiças", Recentemente, a empresa começou na área alimentar, a actuar sobretudo em vinhos, conservas. Q azeites e director explica que, apesar de terstcfo etéita a segunda maior economjadOí mundo, a.China. ainda é um pequeno consumidor no isto, tudo é mais difícil." "Com crescimento sólido, parcerias locais, a nível de províncias e não de país, que a China é demasiado grande e diferenciado para ser visto como um todo e privilegiando, sempre que possível, a venda de produtos portugueses." EDUARDO BEIRA, PROFESSOR NO PROGRAMA "THE MAGELLAN MBA" Que cuidados devem ter? Para entrar na China é preciso "ter a casa muito bem arrumada" 0 que devem fazer as empresas que queiram entrar no mercado chinês com sucesso? Paraentrarnomercadochinêscomperspectivas de sucesso, é necessário atender a requisitos muito específicos: ter vastos recursos, inclusive humanos, uma grande capacidade de absorver riscos financeiros de longoprazo,umaelevadacapacidadedegestão (incluindo adisponibilidade de quadros capazes), possuir um perfil empresarial extremamente maduro e com uma situação de base muito sólida no mercado doméstico. No fundo, é necessário 'ter a casa muito bem arrumada'. A verdade é que os investi- mentos directos na China exigem, regra geral, um perfil que está fora do alcance das PME portuguesas. Implicam um risco que, praticamente, só as grandes multinacionais podem suportar. São vários os aspectos que podem dificultar a entrada no mercado chinês. Além das diferenças culturais, a concorrência feroz é um dos aspectos a ter em conta AChinatem, neste momento, ao nível do mercado interno, o maior nível de concorrência capitalista alguma vez registado nas economias internacionais. Ignorar estarealidade pode ser um suicídio para um pequeno ou médio investidor. Pode parecer que a China é um paraíso para empresários ocidentais, porque a mão obra é 'barata', trabalha muito, tem mercadorias mais baratas ou ainda porque o ocidente e o mercado local escoam quase tudo, mas nada é mais falso. Além daconcorrência ser fortíssima, é regida por regras bastante diferentes. Que áreas de actividade têm maior probabilidade de sobreviver na economia chinesa? O mercado dos produtos de consumo será naturalmente um mercado interno, cresque vai continuaraconhecerumforte cimento, assim como os serviços financeiros. O nicho dos artigos de luxo será dos mais atraentes paraprodutores europeus. Outro mercado é o das matérias-primas, em que a China é pouco abundante. Vej a-se o que se tem passado com a Austrália e alguns estaPodem as nossas facilidades nas relações com África (e Brasil) permitir uma aproximação triangularapossíveis negócios com aChina? Nalguns casos não será dos africanos. impossível...