introdução - DM

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INTRODUÇÃO
Por que os alunos apresentam dificuldades quando iniciam o estudo de
números negativos? Por que os professores relatam que uma das maiores
dificuldades de seus alunos relaciona-se com as operações envolvendo números
inteiros? Por que alunos do Ensino Médio erram muito quando resolvem exercícios
com números inteiros? Essas e outras questões vêm sendo discutidas durante o curso
de Licenciatura em Matemática, durante o Estágio Supervisionado e desencadearam
este Trabalho de Graduação.
Pretende-se desenvolver nesse trabalho um estudo a respeito das
diferentes dificuldades apresentadas pelos alunos do Ensino Fundamental quando
estudam números inteiros e que são discutidas em pesquisas e estudos sobre esse
tema. Analisando os aspectos históricos dos números inteiros e os aspectos
epistemológicos, estaremos tentando compreender as causas das dificuldades
enfrentadas quando se aprende e quando se ensina números inteiros.
Além disso, pretende-se também identificar as principais dificuldades
apresentadas por alunos de uma classe de 6ª série do Ensino Fundamental
evidenciadas em momentos posteriores à introdução desse conteúdo, ou seja, quando
necessitam dos conceitos de números inteiros em outros temas da Matemática.
Um dos objetivos deste estudo é entender alguns dos aspectos
relacionados ao processo ensino-aprendizagem da Matemática no Ensino
Fundamental visando à futura prática docente. Investigar diferentes métodos de
ensino, bem como diferentes recursos que podem contribuir para o aprendizado do
aluno, permite que reflexões sejam feitas a respeito das diferentes formas com que o
aluno aprende e, certamente, poderão contribuir para a essa prática.
Tentando compreender essas questões referentes aos números inteiros,
estaremos tecendo algumas considerações históricas no Capítulo 1.
No Capítulo 2 serão feitas algumas considerações epistemológicas
sobre os números inteiros.
No Capítulo 3 serão apresentadas algumas considerações sobre os
números inteiros e a sala de aula.
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No Capítulo 4 serão apresentadas a pesquisa de campo com uma
turma de 6ª série do Ensino Fundamental de uma escola da cidade São Carlos e as
conclusões dela retiradas.
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CAPÍTULO 1
ALGUNS ASPECTOS HISTÓRICOS DOS NÚMEROS INTEIROS
Desde o século VII, os hindus compreendiam subtrações do tipo 4 – 7,
que no conjunto dos Números Naturais não podem ser resolvidas. Para eles era
suficiente admitir a existência de quantidades negativas. Essas quantidades eram
denominadas de dívidas. Eles diferenciavam os números positivos dos números
negativos colocando um ponto sobre o número negativo. Entretanto eles não
aceitavam que as quantidades negativas deviam ser chamadas de números
(CENTURIÓN, 1994).
O primeiro matemático hindu que estudou os números negativos foi
Brahmagupta, também no século VII. Mas o matemático hindu mais importante do
século XII, Bhaskara, foi mais adiante que os outros estudiosos no assunto, ele disse
que um número positivo possui duas raízes quadradas, uma positiva e uma negativa,
enquanto os números negativos não possuem raízes quadradas por não serem
quadrados (IEZZI e outros, 2000). Mas ao resolver uma equação do tipo x2 – 45x =
250, ao ver os resultados x = 50 e x = -5, considerou válida apenas a raiz positiva.
Ele disse que “‘o segundo resultado não devia ser tomado por ser inadequado, pois as
pessoas não aceitam raízes negativas’ (REID, 1960)”, de acordo com MEDEIROS
(1992).
De acordo com IEZZI e outros (2000), os números negativos surgiram
na China há cerca de dois mil anos. Entretanto o autor afirma que como na época a
comunicação entre os povos era muito difícil, essa contribuição não chegou ao
Ocidente bem como tantas outras descobertas matemáticas dos chineses.
Na China, os números eram representados por barras de bambu
estendidas sobre um tabuleiro. As barras pretas representavam os números negativos
e as barras vermelhas, os números positivos. Assim, um calculista chinês deveria ter
sempre consigo um conjunto de barras de calcular.
A partir da segunda metade do século VIII, os árabes começaram a
absorver a cultura dos hindus que dominavam militarmente. Foi assim que o sistema
de numeração atual acabou sendo introduzido na Europa. O mesmo aconteceu com
os números negativos, apesar de não usarem da mesma forma que os hindus.
4
Na época do Renascimento (GUELLI, 1995), os comerciantes
passaram a utilizar números com sinais para indicar a falta ou excesso em seus
estoques. Por exemplo, se um comerciante tinha sacas de dez quilos de trigo e
vendeu sete quilos, ele escrevia o número sete com um traço na frente (hoje, o sinal
de menos) para saber que faltavam sete quilos naquela saca. Entretanto, se ele
colocasse os três quilos restantes numa saca ainda cheia, escreveria o número três
com dois traços na frente (sinal de mais) para saber que havia mais três quilos
naquela embalagem.
Segundo MEDEIROS (1992), Diofanto de Alexandria utilizou
implicitamente as regras de sinais dos números inteiros para abreviar cálculos, mas
não reconheceu a sua existência. Para iniciar o estudo da álgebra é inevitável se
deparar com o grande problema que os negativos trazem, afinal nas equações do tipo
ax + b = 0, com a e b positivos, temos uma raiz negativa. Essas raízes eram
chamadas de falsas raízes.
A dificuldade na aceitação dos números negativos estava presa ao
critério de aceitação de novas idéias em boa matemática, um critério
tradicionalmente grego que exigia uma representação geométrica de contagens e
medições assim como havia dos positivos. Era necessário um modelo concreto que
constituísse uma metáfora MEDEIROS (1992).
No século XVII, o pai da geometria analítica, Descartes, e Fermat,
deixaram de explorar ao máximo a geometria por não aceitarem os números
negativos. Foram seus sucessores que inseriram esses números na representação das
coordenadas MEDEIROS (1992).
De tão imensa a insatisfação com os números negativos, Thomas
Harriot pensou ter provado que as raízes negativas eram impossíveis em sua obra
“Artes analíticas aplicadas” de 1631. Apesar de ter vivido na mesma época que
Harriot, Stevin aceitava raízes negativas e utilizava os coeficientes negativos
livremente.
No século XVIII, os matemáticos procuravam as justificativas dos
trabalhos com os irracionais, os negativos, os complexos e a álgebra. Sendo que
nessa época, D’Alembert era um dos que lutavam contra o uso dos números
negativos na matemática. Enquanto Euler, provavelmente o maior matemático do
século XVIII, baseou-se na metáfora hindu que dizia que subtrair um número
5
negativo é o mesmo que somar um positivo, assim como cancelar uma dívida é o
mesmo que ganhar um presente MEDEIROS (1992).
Se para esses grandes pensadores era um desafio compreender os
números negativos, podemos entender como os estudantes têm dificuldade quando
necessitam operar com esses números. Esse é um dos motivos da importância de se
utilizar a história da matemática no ensino. É importante que os alunos saibam que
na história, levaram-se muitos anos para a total compreensão dos números inteiros, e
também que se trata de uma história cheia de incertezas. Entretanto, suas regras não
foram simplesmente inventadas, decorrem dos fundamentos da Matemática.
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CAPÍTULO 2
EPISTEMOLOGIA DOS NÚMEROS INTEIROS
Como foi dito no capítulo anterior, durante milênios a humanidade
viveu sem entender os números negativos. Embora, naquela época, os hindus
compreendessem subtrações do tipo 4 – 7, não aceitavam os negativos como
números.
BALDINO (1996) afirma que Glaeser (1981), em sua resenha
histórica, cita as “hesitações e perplexidades de matemáticos famosos que, embora
usassem os números inteiros sem maiores dificuldades em suas pesquisas, não
conseguiam encontrar uma explicação conveniente para a regra de sinais” (p.4). A
explicação definitiva para números inteiros foi apresentada pela primeira vez por
Haenkel, no fim do século XIX, (BALDINO, 1996).
São muitos os autores, que baseados em Glaeser, discutem o tema dos
obstáculos epistemológicos dos números negativos. Entre eles, Doroux (1982) que
insiste que a definição de obstáculos epistemológicos proposta por Brousseau exige
que o obstáculo seja um conhecimento, não uma falta dele (CID, p. 5 – 6). Doroux
considera que os primeiros obstáculos epistemológicos propostos por Glaeser, a
“falta de aptidão em manipular quantidades negativas isoladas” e a “dificuldade para
dar sentido às quantidades negativas isoladas”, não deveriam ser considerados como
tais, pois só indicam déficit de conhecimento.
Para Dourox, a “dificuldade para unificar a reta real”, constatada por
Glaeser, é uma possível concepção de obstáculo epistemológico caracterizado por
considerar os números negativos de uma natureza distinta da dos positivos. A
concepção de número como medida de uma quantidade pode ser a base desses
obstáculos, fazendo então com que os números negativos só possam ser interpretados
como uma medida “inversa”, como um objeto composto de duas partes: sinal e
medida, enquanto o positivo representa apenas uma medida. Isso pode nos levar a
interpretar os números negativos radicalmente separados dos naturais, e não como
sua prolongação (CID).
TEIXEIRA (1993) diz que do ponto de vista cognitivo, o
entendimento dos números inteiros necessita de algumas operações feitas pela
7
criança ao preencher o vazio que os números naturais não podem preencher. As
maiores complicações aparecem para a criança quando uma subtração do tipo a – b,
com b > a, levam a um resultado que até então não existe. Quando assume a
existência desse resultado, a criança está tomando conhecimento do novo conjunto
numérico: os números negativos. Esse novo conhecimento faz com que o aluno tenha
conhecimento da idéia de que os números negativos são menores que positivos. Aos
poucos ele também toma conhecimento de que há um ponto onde essas duas classes
de números se originam, nesse momento o aluno tem de mudar seu conceito de zero,
que no conjunto dos naturais indicava a ausência de quantidade, enquanto no
conjunto dos números inteiros significa um ponto de origem.
Segundo TEIXEIRA (1993), a aprendizagem operatória dos números
inteiros necessita de operações e linguagens para a assimilação, pois não possuem
modelos que se associem ao mundo físico assim como os naturais, gerando um
obstáculo na compreensão, que pode levar o aluno ao erro.
TEIXEIRA (1993) diz que para VERNAUG (1985), os erros
pertencem ao processo de aprendizagem. Para a autora, o erro não é somente o
começo da dificuldade, ele é quem indica o raciocínio da criança, que orienta as
estratégias visando o sucesso.
Para MORENO e SASTRE (1983), citado por TEIXEIRA (1993), os
erros são necessários, pois são resultados de visões diferentes do mesmo assunto,
resultando na descoberta de assimilar e resolver um problema. O erro, para esses
autores, pode ser por contaminação, quando o aluno não associa as propriedades do
problema, ou por limitação, quando o aluno não associa o elemento e o todo.
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CAPÍTULO 3
OS NÚMEROS INTEIROS NA SALA DE AULA
Os números negativos não geraram dificuldades somente no passado,
atualmente, os estudantes ainda encontram obstáculos quando operam com esses
números. Mas quais seriam essas dificuldades? Como elas se revelam para os
alunos? Existe algum método para acabar com elas? Essas são algumas das questões
a serem abordadas neste capítulo.
MEGID (2001) discute as dificuldades de seus alunos quando
operaram pela primeira vez com os elementos do conjunto dos números inteiros. A
autora conta que iniciou o assunto pedindo para que os alunos pesquisassem o que é
saldo bancário, saldo negativo, cheque especial, dentre outros itens do gênero.
Porém, seria uma pesquisa demorada, levando-a a utilizar outros métodos como
recortes de jornal indicando temperaturas, fusos-horários, tabelas de futebol e
gráficos.
MEGID (2001) ainda comenta o desempenho de seus alunos em cada
atividade. Na primeira atividade era necessário encontrar a variação de temperatura
entre duas cidades, 23° e –2°, muitos alunos acertaram o resultado, mas nenhum
representou sua resolução em linguagem matemática, 23-(-2)=25. Enquanto outros
alunos apenas subtraíram 2 de 23 obtendo 21. A autora ressalta que eles indicaram a
operação corretamente, ou seja, 23-(-2). Ainda tiveram quatro alunos que subtraíram
duas vezes o número 2, conseguindo assim o número 19. Curiosamente, um desses
quatro alunos, segundo a autora, era um dos que tinham sucesso nas avaliações.
As outras atividades propostas não geraram maiores complicações,
apenas quando tiveram de usar uma tabela sobre jogos de futebol, as meninas não
tiveram tanta facilidade quanto os meninos, que as ajudaram.
Na Proposta Curricular para o Ensino de Matemática – 1º grau (1988),
da Secretaria Estadual de Educação, encontramos sugestões para introduzir os
números inteiros nas aulas de 6ª série do Ensino Fundamental. Segundo a proposta, o
professor deveria colocar para o aluno uma situação em que ele tivesse de analisar o
significado de “sentido de percurso”, ponto de referência, marco zero, ordenação dos
números inteiros mostrando a importância dos números com sinais. Após esse início,
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a proposta sugere que sejam trabalhadas as operações, pois o aluno sabe da
existência dos números negativos, apenas não saiba como operar com eles.
Para as operações, a sugestão da proposta paulista, seria imaginar um
comerciante com potes com duzentas balas cada um, e rótulos indicando quantas
balas foram colocadas ou retiradas dos potes, assim como no passado era feito com
as sacas de grãos. Essa atividade tem como objetivo fazer com que o aluno compare
intuitivamente os números inteiros, codifique, decodifique e determine somas
algébricas, além de utilizar a representação geométrica dos números inteiros na reta.
Pois após o aluno ter o conhecimento da adição de números inteiros, o próximo passo
deve ser o de trabalhar as propriedades intuitivamente.
MEGID (2001) iniciou a exploração dessas propriedades propondo a
discussão de situações que envolviam lucro e prejuízo, e após um tempo apresentou
simbolicamente como representar essas situações. Na aula seguinte, propôs a
resolução de um exercício do livro didático em que aparecia um gráfico quadriculado
e algumas questões sobre ele. Depois que os alunos resolveram o exercício, houve
uma discussão de como foi que cada um o resolveu. Um debate que levou os alunos à
conclusão de que adicionar números negativos era o mesmo que subtrair.
A Proposta Curricular diz que este é um trabalho importante para
poder introduzir o inverso aditivo que terá grande importância quando o aluno
precisar “transformar a subtração em adição”.
sabemos que a adição e a subtração não trazem tantas dificuldades
quanto a multiplicação e a divisão de números negativos. A existência de adição e
subtração é logo observada ao utilizar a reta numérica, mas a falta de justificativas
para as regras de multiplicação e divisão faz com que o aluno não compreenda essas
duas últimas operações.
MEGID abordou a multiplicação, divisão e potenciação de números
negativos seguindo a orientação do livro didático1. A autora descreve que colocou na
lousa três multiplicações, pediu aos alunos que as observassem e escrevessem em
seus cadernos quais seriam os resultados justificando suas respostas. Eram três
multiplicações: a primeira era um número positivo por um negativo, 5 . (-8); a
segunda, um negativo por um positivo, (-9) . 12 e, a terceira, dois números negativos,
(-6) . (-8). As duas primeiras não criaram maiores problemas, pois os alunos
interpretaram que seriam somas de fatores iguais, mas a terceira fez com que os
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alunos tivessem dúvidas quanto ao resultado, alguns imaginaram que seria positivo,
mas não sabiam por quê, outros imaginaram que seria negativo, pois os dois fatores
da multiplicação eram negativos. Nesse momento a autora conta que pediu para os
alunos montarem com ela uma “tabuada” da seguinte maneira:
3 .(-4) = -12
2 .(-4) = -8
1 .(-4) = -4
0 .(-4) = 0
(-1) .(-4) = ?
Os alunos não sabiam o que responder, então ela os convidou a
observar o que acontecia com os resultados, isto é, ela convidou-os a observarem a
regularidade. Segundo a autora, eles perceberam que o resultado sempre aumentava
quatro unidades e que, na última multiplicação, esse resultado deveria ser quatro
positivo. E continuou com a “tabuada” do (-4), concluindo que o resultado seria +4.
A Proposta Curricular também oferece ao professor uma sugestão de
como demonstrar que a multiplicação de dois números negativos resulta num
positivo. Essa sugestão é dada através de um exemplo.
“Após ter sido trabalhado com os alunos o produto de dois números
inteiros positivos e o produto de dois inteiros com sinais contrários, vejamos por que
o produto de dois números inteiros negativos resulta em um positivo.
Por exemplo, por que (-2) x (-3) = 6?
Sabemos que: 3 x (-2) = (-2) + (-2) + (-2);
Todo número multiplicado por zero é igual a zero;
Podemos escrever (+3) + (-3) = 0.
(-2) x 0 = 0
Então essa sentença pode ser reescrita da seguinte maneira:
(-2) x [(+3) + (-3)] = 0
1
A autora refere-se à Coleção Matemática – Imenes & Lellis, 1997.
11
Pela propriedade distributiva da multiplicação em relação à adição que
deve ser preservada em Z, ainda podemos reescrever a sentença de outra maneira:
(-2) x (+3) + (-2) x (-3) = 0
Já sabemos que: (-2) x (-3) = -6, então reescreveremos a sentença
como:
(-6) + (-2 x (-3)) = 0
Isto é:
(-6) + ? = 0
Como vale a propriedade do inverso aditivo em Z, podemos escrever:
(-6) + (+6) = 0
Logo:
(-2) x (-3) = 6”
Segundo a proposta, ao ensinar ao aluno essas regras de multiplicação,
a divisão virá mais facilmente, tratando-a como operação inversa. E o passo seguinte
é a potenciação que apesar de ser multiplicação de fatores iguais, também traz
dificuldades aos alunos.
12
CAPÍTULO 4
IDENTIFICANDO DIFICULDADES
Após um estudo da história, da epistemologia e das possíveis
situações a serem enfrentadas em uma sala de aula, foi feita uma pesquisa com
alunos de uma turma de 6ª série de uma escola da cidade de São Carlos. Iniciando
com uma entrevista com a professora responsável pelas aulas de matemáticas dos
alunos e depois foi aplicada uma lista de exercícios relacionados com números
inteiros para analisar o conhecimento desses alunos em relação ao tema.
Segundo a professora, ela iniciou o assunto com uma conta
“impossível”, mas os próprios alunos perceberam que era possível utilizando os
números negativos.
Para ilustrar a adição e a subtração de números inteiros, a professora contou
ter relacionado as operações como dívidas e pagamentos, enquanto para a
multiplicação e para a divisão ela simplesmente explicou como funcionavam as
regras de sinais. Foi nesse momento que os alunos começaram a confundir as regras
de sinais da adição com as da multiplicação, numa conta como -2 -3 = -5 deveria ter
resultado positivo, ou seja, o resultado deveria ser +5. Nos exercícios, as maiores
dificuldades apareciam no momento de resolverem as expressões, os alunos não
sabiam qual operação deveria ser feita primeiro.
O livro adotado pela professora é o Matemática e Realidade de Gelson Iezzi e
Osvaldo Dolce, repleto de problemas práticos. Para a professora, um livro somente
com exercícios do tipo “Efetue” não é suficiente e ela adotou o livro de Iezzi e Dolce
exatamente por esse motivo, nele é possível encontrar problemas práticos com
muitas figuras, extratos bancários, jogos, tabelas com saldo de gols, ótimos para
familiarizarem os alunos com os números negativos, pois são situações que fazem
parte do cotidiano deles.
O tempo previsto para tratar de números inteiros foi de três semanas, mas
acabou por se estender por quase dois meses. Durante esse tempo, os alunos foram
avaliados com provas, chamada oral (exercícios feitos na lousa), problemas a serem
resolvidos em sala de aula, atividades individuais e em grupo. O desempenho deles,
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de acordo com a professora, foi regular, em sua opinião, poderiam ter se saído
melhor.
Após a entrevista com a professora, um dia foi escolhido para a aplicação da
lista de exercícios. Ao todo foram analisados 33 alunos de uma turma de 6a série do
Ensino Fundamental de uma escola da cidade de São Carlos.
Os erros mais freqüentes estavam na potenciação, nas regras de sinais, na
montagem de operações e conceitos.
Ao observar com atenção as listas de exercícios resolvidas foi possível
perceber que os alunos não associam a potenciação dos números inteiros com as dos
números naturais. Erros como (-1)4 = - 4, (-1)0 = -1 ou (-1)0 = 0 foram muito comuns
de se encontrar, apenas uma aluna acertou todos os itens da questão específica de
potenciação. Mas não consideraremos agora essas dificuldades, visto que a
Potenciação nos Números Inteiros ainda não havia sido vista pelos alunos até o
momento da aplicação dos exercícios.
Outro erro freqüente dentre os alunos foi na regra de sinais nas operações de
multiplicação e divisão. Os alunos fizeram confusões quanto ao sinal do resultado
das operações propostas. Alguns chegaram a misturar as regras de sinais da adição e
subtração com as da multiplicação e divisão. Foram verificados casos em que o aluno
distribuiu os sinais sem seguir um padrão.
Um dos exercícios propostos aos alunos foi o de classificação de afirmações
em verdadeiras ou falsas para verificar o conhecimento conceitual dos estudantes.
Um terço dos alunos mostrou dificuldade em classificar as orações corretamente, não
sabiam justificar suas respostas. Das quatro orações a serem analisadas, apenas uma
foi classificada corretamente por todos, a que tratava de elementos opostos. As
demais geraram confusão entre os alunos.
Alguns alunos também mostraram dificuldades em montar operações,
levando-os ao erro. Um fator que pode ter influenciado na montagem inadequada das
operações é a falta de atenção aos enunciados dos problemas. Alunos mais
cuidadosos chegaram a desenhar a reta dos números inteiros para facilitar os cálculos
de adição e subtração.
Apesar das dificuldades citadas, houve a constatação de que há alunos na 6ª
série do Ensino Fundamental que ainda não acertam operações de multiplicação e
divisão no conjunto dos números naturais.
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Até aqui como se pode notar, a maior dificuldade dos alunos está na
regra de sinais das operações, provavelmente por não conseguirem abstrair as
associações entre positivos e negativos.
A dificuldade em justificar conceitos matemáticos também foi
identificada em mais de um terço dos alunos pesquisados. Na questão sobre
conceitos de números inteiros, apenas uma das quatro afirmações propostas foi
respondida e justificada corretamente por todos os alunos, enquanto as outras três
questões
geraram
confusões
ou
dúvidas.
Muitos
estudantes responderam
corretamente, mas não souberam justificar suas escolhas.
O exercício formado por quatro orações, teve apenas a afirmação que
tratava de valor oposto respondida corretamente por todos os alunos. Dos trinta e três
alunos pesquisados, apenas quatro justificaram, ou tentaram justificar suas respostas,
desses quatro, apenas um não classificou corretamente todas as afirmações. Dos três
alunos restantes, um justificou de forma clara todas as afirmações. Claramente não
foram justificativas formais, pois tratava-se de um garoto de apenas 12 anos.
“Classifique e justifique as afirmações em verdadeiras (V) ou falsas
(F). Justifique sua resposta.
( ) O número zero é maior que todo número negativo.
( ) Os números inteiros negativos são maiores que os números inteiros
positivos.
( ) O número +7 é o oposto do número –7.
( ) O maior número inteiro negativo é o –1.”
As afirmações foram classificadas pelo aluno citado da seguinte maneira:
“(V) Porque todo número negativo é abaixo de zero.”
“(F) Porque todo número negativo é pra baixo de zero, os positivos são
acima de zero.
“(V) Porque um é o contrário do outro.”
“(V) Porque todo número negativo quanto maior, menor seu valor,
então o número –1 é o maior.”
Observando essa situação, percebe-se que os alunos em sua maioria não
possuem conhecimentos básicos de conceitos para justificar suas afirmações. Assim,
perguntamo-nos, se alunos não sabem como justificar afirmações relacionadas com
15
conteúdo dos números inteiros, como ter a certeza de que eles sabem o que está
acontecendo no momento de resolver problemas? A dificuldade dos alunos em
justificar esses passos talvez seja a mais importante a ser sanada. Ela somente mostra
que os estudantes ao se depararem com os números inteiros, se preocupam muito
mais em decorar as regras de sinais, do que entende-las, assim como todo o conteúdo
relacionado com o conjunto dos números inteiros.
16
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Aqui se encerra um estudo iniciado no primeiro semestre de 2003 com o
objetivo de identificar as principais dificuldades presentes entre alunos de 6ª série do
Ensino Fundamental ao estudarem números inteiros.
Após um breve estudo histórico, epistemológico e de algumas
situações possíveis em sala de aula, uma pesquisa feita com alunos de uma escola da
cidade de São Carlos pode exemplificar o que acontece com os alunos hoje em sala
de aula. Somente através de estudos como este que se pode ter um detalhamento
dessas dificuldades e assim corrigi-las futuramente na prática docente.
17
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