A vida sexual dos grilos ingleses

Propaganda
A Malária e o aquecimento global
O aquecimento global é um fato. Faz mais de cem anos que nossa insistência em jogar na atmosfera o gás
carbônico resultante da queima de combustíveis fósseis tem contribuído para aumentar a temperatura do planeta.
O pior é que nada indica que nas próximas décadas o comportamento do Homo (não tão) sapiens vai mudar
substancialmente. Resta descobrir as conseqüências de nossa irresponsabilidade. Infelizmente o físico Niels Bohr
tem razão quando disse que “é difícil fazer previsões, especialmente sobre o futuro”. Uma das previsões feita
pelos climatologistas sugere que o aquecimento global aumenta a incidência das doenças tropicais, especialmente
a malária. A boa notícia é que um estudo cuidadoso da evolução da malárias nos últimos 100 anos demonstra que
esta é mais uma das diversas predições precipitadas divulgadas amplamente pela imprensa.
Superficialmente o raciocínio parece perfeito. Todos sabem que temperaturas altas facilitam a multiplicação dos
mosquitos transmissores da malária. Alem disso, nas noites quentes, o apetite dos insetos aumenta e com ela o
número de pessoas picadas. Como a transmissão do parasita ocorre quando o inseto pica uma pessoa infectada e
em seguida pica uma pessoa saudável, mais picadas produzem mais doentes. Resultado: o aquecimento global
provocaria um aumento na freqüência de pessoas com malária. Óbvio, mas errado.
Faz anos que epidemiologistas que estudam e combatem a malária vem criticando este modelo simplista.
Mostraram que outras mudanças resultantes do aquecimento global, como o encolhimento das florestas e a
diminuição da umidade do ar nas áreas afetadas pela malária tornaram a vida dos insetos muito mais difícil.
Demonstraram que as medidas de combate à doença, como o uso de medicamentos e medidas preventivas, como
extermínio dos insetos e o uso de redes nas camas tem um efeito maior e em direção contrária ao aquecimento
global. Em outras palavras diziam que a epidemiologia da malária é complexa e que o argumento dos
climatologistas era, para dizer o mínimo, simplório.
Neste novo estudo os cientistas compararam a incidência da malária em 1900 com a incidência em 2007. Como
nestes últimos 107 anos o aquecimento global foi semelhante ao que se acredita que vai a ocorrer nos próximos
anos, a idéia era saber como a malaria se comportou durante o aquecimento global que já ocorreu. É nestas horas
que o valor do acumulo sistemático de dados epidemiológicos fica evidente. Foram compilados dados coletados
em todo o planeta, desde o Brasil, passando por toda a África, Oriente Médio, Ásia e Oceania, sem esquecer a
costa leste dos EUA que era infestada por Malária em 1900. As regiões foram classificadas de acordo com a
porcentagem das pessoas de uma área que possuíam o parasita no sangue. Nas regiões hipoendêmicas (menos de
10% das pessoas com parasitas), mesoendêmicas (entre 10 e 50%) hyperdendêmicas (entre 50 e 75%) e
holoendêmicas (mais de 75%) a doença esta presente de forma constante. O resto do planeta foi classificado como
áreas sem a doença ou simplesmente epidêmicas (onde a doença surge e desaparece ao longo do tempo). Quando
comparamos os dados de 1900 e 2007 o resultado é impressionante. A área endêmica que era de 58% do planeta
caiu para 30%. Dois terços das áreas endêmicas caíram de classificação um ou dois pontos (de holoendêmicas, por
exemplo, para mesoendêmicas). O Brasil que era meso e hiperendêmico se tornou todo hipoendêmico, um dos
locais do planeta onde o controle da doença foi mais eficiente. A doença desapareceu do costa leste dos EUA.
Alem disso os autores analisaram todos os fatores que levaram a esta redução durante os 100 anos em que
temperatura do planeta subiu e mostraram que diversos fatores são dez a cem vezes mais importantes que o
aumento de temperatura.
A conclusão é que o aquecimento global é irrelevante para o aumento ou diminuição das populações afetadas pela
malária. Medidas preventivas, saneamento e medicação tem um impacto ordens de magnitude maiores.
Estes resultados não significam que o aquecimento global não existe ou não é importante, mas demonstram que
transferir fundos, hoje usados para combater a malária, para reduzir o aquecimento global seria burro e desastroso.
Mais informações: Climate change and the global malaria recession. Nature vol. 465 pag 342 2010
Fernando Reinach ([email protected])
Download