CULTIVO DE BROMÉLIAS Atelene Normann Kämpf Nota: O presente artigo foi publicado originalmente (há 14 anos!) em: Castro, C.E.F. et al. (Coord.). Manual de Floricultura, Maringá: SBFPO. 1992. 280p. A obra, organizada pela Sociedade Brasileira de Floricultura e Plantas Ornamentais, foi lançada no Simpósio Brasileiro de Floricultura e Plantas Ornamentais, realizado em Maringá/PR, no período de 13 a 16 de outubro de 1992. Entretanto, a reduzida tiragem dessa edição resultou que tenha se esgotado em pouco tempo. O artigo abaixo representa o item 7.5 Bromélias (pág. 201 – 211) do capítulo 7 - Plantas ornamentais cultivadas, com pequenas adaptações no texto original, disponibilizada on line em Dezembro de 2006. Introdução O abacaxi, a banana-do-mato e a barba de pau são representantes da família botânica Bromeliaceae, que compreende cerca de 45 gêneros, mais de 2000 espécies e inúmeras variedades cultivadas, nativas em sua quase totalidade nas Américas, desde o sul dos Estados Unidos até a Argentina. Com base em suas características botânicas, a família é dividida em três subfamílias: Pitcarnioideae – plantas terrestres de folhas espinescentes, frutos secos (cápsulas) e sementes geralmente aladas, como em Dyckia e Hechtia (Fig. 1). Estas plantas vivem junto a cactus e agaves, em pleno sol. Bromelioideae - terrestres ou epífitas, com folhas serrilhadas, denteadas ou com espinhos nas margens; os frutos podem ser secos (cápsulas) ou carnosos (bagas). Pertencem a este grupo Ananas, Bromelia, Aechmea (Fig. 2), Nidularium e Cryptanthus, entre outros, cultivados para jardim e para vasos. Algumas formam, com as folhas, um depósito para captação de água, como uma cisterna. As epífitas vivem em matas pluviais ou em ambientes com alta umidade relativa do ar. Tillandsioideae – na maioria são epífitas, com folhas de margens lisas, sem espinhos ou dentes; os frutos são secos e as sementes apresentam uma coroa de pêlos longos (“pappus”), que as auxiliam na dispersão pelo vento. Em cultivo comercial encontram-se algumas espécies de Tillandsia, bem como variedades de Vriesea (Fig. 3) e Guzmania, estas em destaque entre as dez plantas mais comercializadas na Europa na década de 1980, conforme a Bolsa de Flores de Aalsmeer, na Holanda. Na natureza, as bromélias ocorrem em ambientes variados, desde locais áridos, desérticos, até em elevadas altitudes, com densa neblina, bem como em escarpas rochosas, nos campos ou no interior de matas. Para poder sobreviver sob condições tão diversificadas, as plantas desta família desenvolveram sistemas especiais para captar e armazenar água e nutrientes, ora formando cisternas, ora utilizando-se de pêlos ou escamas sugadoras – estruturas características, presentes na superfície das folhas em muitos gêneros. As diferentes estratégias usadas pelas plantas para resolver a sua nutrição representam importantes características hortícolas. O produtor de bromélias pode identificar quatro grupos, conforme: (a) plantas terrestres, de folhas sem escamas - a nutrição das plantas dá-se basicamente pelas raízes. (b) plantas terrestres, de folhas com escamas primitivas – estas plantas apresentam um sistema alternativo de captação de água, ainda que primitivo, permitindo sua sobrevivência em locais com deficiência hídrica no solo: as escamas podem absorver a umidade do ar, suprindo a necessidade da planta. (c) plantas epífitas, formadoras de cisternas e folhas com escamas desenvolvidas - e (d) plantas epífitas que não formam cisternas e apresentam folhas densamente cobertas por escamas desenvolvidas, conferindo à folha tons acinzentados - Nos grupos (c) e (d) predominam plantas de interior de matas, capazes de viver sobre árvores ou outros suportes, que as levem para mais próximo à luz. Na natureza, tais plantas apresentam sistema radicular com a função predominante de órgão de fixação. As folhas são as principais encarregadas do processo nutritivo, através de pêlos sugadores, com ou sem a presença de cisternas para armazenar água. Nos dois últimos grupos encontra-se a maioria das bromeliáceas cultivadas na Europa, como plantas ornamentais para interiores, preferidas pela durabilidade e intenso colorido das flores e brácteas da inflorescência. A observação do comportamento das bromeliáceas na natureza auxilia o viveirista na determinação de práticas culturais para a produção dessas plantas. Indicações para cultivo ● Formação de mudas A propagação pode ser tanto por sementes, como de forma vegetativa. Formam sementes as plantas criadas ao ar livre, com flores polinizadas por colibris, borboletas ou até morcegos. Em ambientes fechados pode-se praticar a polinização artificial, de preferência usando-se diferentes indivíduos, pois a auto-incompatibilidade ocorre com freqüência. Apesar de haver exceções, as sementes maduras devem ser colhidas e usadas logo a seguir, porque perdem rapidamente a capacidade de germinar. Entre as condições para a germinação, a temperatura é um dos mais importantes fatores: sementes germinam na faixa entre 15 e 30 oC, mais rapidamente em torno de 25 oC, diminuindo o processo em temperaturas acima e abaixo desta faixa. Como a temperatura, a luz é fundamental na germinação, pois sementes de bromeliáceas são geralmente fotoblásticas – ou seja, germinam em presença da luz, mesmo que em pouca quantidade. A semeadura pode ser feita de forma densa, pois as plântulas crescem muito devagar. Recipientes e substratos esterilizados ajudam a diminuir o risco de perdas por fungos. Como substratos usam-se misturas leves de turfa, musgo (Sphagnum) ou material similar, peneirados, para evitar grãos muito grosseiros. A sementeira deve ser coberta por vidro ou plástico, de forma a evitar a rápida evaporação da umidade, porém de tal forma a não impedir a aeração. Plântulas recém germinadas podem ser adubadas com solução nutritiva, preparada com 0,3 a 0,5g de uma formulação completa e hidrossolúvel, em cada litro de água, pulverizada sobre as folhas. A propagação vegetativa dá-se através da retirada de “filhotes” ou afilhos, que são novos ramos formados entre as folhas da planta antiga, em geral por ocasião de seu florescimento. Os afilhos são colocados a enraizar em substratos leves, porosos e bem drenados, não recebendo adubação antes da formação das raízes. A propagação vegetativa é o método mais rápido de se obter uma nova planta, que estará apta para o florescimento muito antes das mudas obtidas via semente, mas este método é limitado ao número de afilhos formados pela planta matriz. Para aumentar a taxa de multiplicação, pode-se optar pelo emprego de processos biotecnológicos (micropropagação), através da cultura de tecidos. A micropropagação, entretanto, pode levar à formação de plantas com aparência (hábito e arquitetura) diferente da planta matriz. O pesquisador alemão Dr. Karl Zimmer tem longa experiência no assunto e descreve os métodos de cultivo in vitro com detalhes (Zimmer, 1986). ● Fatores de crescimento Como principais fatores que afetam o crescimento vegetal são apontados a luz, a temperatura, a água, o substrato e os nutrientes. Bromélias não fogem a esta regra geral, apesar dos diferentes hábitos de crescimento na natureza. Luz - a necessidade de luz varia conforme o estádio de desenvolvimento das plantas. Na fase inicial, plântulas e plantas jovens desenvolvem-se melhor à sombra densa. Sob iluminação artificial, a germinação pode ocorrer em intensidades a partir de 200 lux (14 horas/dia), enquanto que plantas mais desenvolvidas necessitam níveis de, no mínimo, 1500 a 2000 lux (na altura das plantas). Temperatura - a temperatura ambiente tem se demonstrado não ser um fator limitante para a produção de bromeliáceas. Em locais com temperaturas abaixo de 10 oC, esperase crescimento mais lento ou mesmo a estagnação do processo. Água - o fornecimento de água para as plantas deve levar em conta o tipo de estratégia que a mesma usa para tanto, na natureza. As plantas terrestres serão irrigadas pelas raízes, enquanto as epífitas devem receber a água pelas folhas: ou enchendo-se a cisterna, ou pulverizando-se as folhas, como uma fina neblina. Substrato - plantas epífitas exigem substratos de baixa densidade, alta permeabilidade e alta aeração. A presença de elevada fração de matéria orgânica (fibrosa) no meio de cultivo pode atender tais características. Misturas com solo mineral podem ser usadas para o cultivo de plantas terrestres em recipientes. É possível cultivar bromélias em solução nutritiva, usando como substrato apenas argila expandida rígida (“cinasita”). Neste sistema, chamado de hidrocultura, o sucesso do cultivo depende muito da qualidade e da granulometria da argila expandida. A escolha da granulometria baseia-se nas dimensões das raízes a serem formadas pela planta. Para bromeliáceas de porte médio, como Guzmania minor, Vriesea splendens, V. incurvata, entre outras, são adequados grãos de 0,8 a 1,5 cm de diâmetro. Adubação - na prática, podem ser usados dois tipos de adubação: foliar e radicular. A adubação foliar será usada preferencialmente nos estádios iniciais da vida da plantas, como logo após a germinação, na forma de pulverizações. Em plantas formadoras de cisternas (Aechmea, Guzmania e outras), quando adultas, irriga-se a solução nutritiva por sobre as folhas, de forma a preencher generosamente o copo de sua cisterna, permitindo que a solução escorra e molhe o substrato, alcançando as raízes. A solução nutritiva será elaborada utilizando-se um adubo de formulação completa (macro e micronutrientes), totalmente solúvel em água, na concentração de 0,5 g da formulação para cada litro de água. Esta tarefa será realizada nas primeiras horas da manhã, sem a incidência direta do sol. É importante testar previamente as plantas, para conhecer o seu nível de sensibilidade à adubação foliar. Algumas bromeliáceas, como Nidularium innocentii, não toleram a presença de solução salina nas folhas, o que provoca queimaduras nas lâminas. A adubação radicular é própria para plantas terrestres adultas. Entretanto, a prática confirma que plantas epífitas também são beneficiadas com esta forma de adubação, desenvolvendo raízes de modo similar às espécies terrestres. Para esta adubação também são usados adubos completos e solúveis em água, em concentrações desde 1,0 g/litro de água (para plantas menores ou mais sensíveis, como Guzmania e algumas espécies de Vriesea) até 2,5 g/litro de água (para plantas grande ou mais rústicas, como Aechmea fasciata). A periodicidade das adubações varia conforme o objetivo do cultivo: para a produção comercial de mudas, a freqüência pode ser de uma a duas vezes por semana, conforme a época do ano (no inverno, com baixas temperaturas, diminui-se a freqüência). Para a manutenção de plantas usadas na decoração de interiores podem ser seguidas as mesmas recomendações, reduzindo a freqüência para até quatro vezes ao ano. ● Indução ao florescimento Em plantas que já atingiram o porte adulto, pode-se acelerar a formação da inflorescência. Para tanto se emprega etileno ou alguma substância que libere esse produto, como gás acetileno ou o produto comercial Ethrel. O gás acetileno é fornecido diretamente da garrafa para a cisterna da planta (previamente preenchida com água), durante o período de 6 a 8 segundos. A aplicação de Ethrel é feita em solução, na concentração de 0,1 a 0,2% para espécies robustas, e em torno de 0,05% para espécies sensíveis. A solução é aplicada com pulverizador manual sobre as folhas. Doenças e pragas Felizmente, as bromeliáceas são plantas pouco suscetíveis a doenças e pragas, que aparecem, em geral, como uma indicação de práticas culturais impróprias, como, por exemplo, excesso de irrigação, concentração inadequada da solução nutritiva ou falta de sombreamento. Entre os principais problemas destaca-se a ocorrência de Fusarium. O sintoma da presença deste fungo parte da base da plana, já que o agente habita o substrato. As folhas se tornam marrons, secam, e a planta apodrece de dentro para fora. O combate à doença instalada é difícil e muitas vezes é melhor exterminar as plantas doentes para evitar maiores perdas. Cochonilhas também podem causar danos e prejudicar o visual das folhas. Seu aparecimento parece ser favorecido por altas temperaturas e ar seco. Provavelmente pela presença das escamas sugadoras na superfície das folhas, algumas bromeliáceas são muito sensíveis ao contato direto com biocidas. É recomendável fazer testes preliminares antes de uma aplicação massiva. ● Literatura citada Zimmer, K. Bromelien: Botanik und Anzucht ausgewählter Arten. Berlin: Parey, 1986. 168p.