Comedia Evfrosina de Jorge Ferreira de Vasconcelos Lisboa, 9 de abril de 2011 versão juvenil de Silvina Pereira apresentação da “Comédia Eufrosina” pelos alunos do 4º/8º anos é o culminar de um trabalho desenvolvido ao longo deste 2º período lectivo que visou pôr os alunos em contacto com os textos clássicos do renascimento português, neste caso do autor Jorge Ferreira de Vasconcelos, através de um projecto pluridisciplinar que envolveu também as disciplinas de História e Português . Este “exercício escolar”abrange várias áreas artísticas como a representação e as danças da época para além do canto e da interpretação musical de instrumentos da época. Silvina Pereira foi a responsável pela encenação, Luís Mouro pela cenografia, Vicente Trindade o ensaiador das danças históricas e a interpretação musical está a cargo dos alunos da Escola de Música. A Pedro Carneiro (Director da EDCN) Tras a nevoa vem o sol O Espectáculo Os jovens portugueses conhecem os seus clássicos? m contexto escolar, e de modo especial numa escola de formação artística, faz todo o sentido conhecer e trabalhar o repertório teatral clássico português e perceber o seu interesse no século XXI. A experiência artística e pedagógica com uma obra tão magnífica como a Comedia Eufrosina, constitui um convívio salutar com um desconhecido repertório, habitualmente não ensinado na escola. Aproximar esta jóia do teatro renascentista português, à sensibilidade e à energia dos nossos jovens, dando-lhes a possibilidade de conhecer e desfrutar de um património capaz de “mexer connosco”, ao fim de centenas de anos, é o desafio deste projecto. E emocionante ouvir e ver com propriedade e confiança, as palavras bem articuladas de Jorge Ferreira deVasconcelos nestes vibrantes corpos, donzelas e mancebos de ontem e de hoje, numa contínua celebração da fonte da vida. Esse, foi o prémio da ousadia, e já sabemos que “a ousadia há-de ser o princípio da obra”. Agradeço ao Director da Escola, Professor Pedro Carneiro pela maneira com que acarinhou desde logo este projecto. Assim como à Directora da Escola de Música pela colaboração e aos professores de História e Língua Portuguesa que se prontificaram a entrecruzar esta experiência artística com os conteúdos curriculares dessas disciplinas, de modo a que todo o trabalho sobre o Renascimento Português fosse enquadrado num âmbito de interdisciplinaridade, num projecto que abrangeu várias áreas artísticas: a representação, a dança, o canto e a interpretação de instrumentos musicais da época. Silvina Pereira Para a encenação deste exercício escolar, realizei uma versão juvenil da obra. Embora em versão reduzida, este trabalho permitiu que os alunos trabalhassem com o texto original da Eufrosina. As dificuldades são conhecidas: a apreensão dos conteúdos, a linguagem antiga, a exigência da leitura em voz alta, um verdadeiro Cabo dasTormentas dos tempos modernos. A vergonha de falar em público, a memorização e a concentração exigida pelo texto, proporcionaram alguns episódios hilariantes, que são afinal algumas das etapas da prática artística e da aproximação ao texto dramático e à sua representação. Entrar na mundividência de um texto clássico exige um tempo que o sistema escolar não tem. Também a experiência da representação de uma obra desta natureza, coloca problemas acrescidos pois, aqui se privilegia o lugar à palavra, enquanto causa e consequência de acção, num tempo em que esta se encontra “deperecida e desqualificada”. Mas o teatro, através do jogo das personagens e da dramatização da acção no espaço cénico, possibilita um campo de experiência estética por onde passa a descoberta, o divertimento e a criatividade que permite ultrapassar os obstáculos de partida. Não esquecerei o despertar daquela bela e serena Eufrosina, senhora de belíssima voz, assim como o impacto estranho e pertubador de ver ressurgir em cena a gentil Silvia de Sousa, descobrindo a desilusão do primeiro amor. Não deixarei de recordar o enamorado Zelotypo, na sua luta pelo Amor que tudo vence. Foi Silvina Pereira é actriz, encenadora e directora artística do Teatro Maizum. É licenciada em antropologia Cultural pela FCSH da Universidade Nova de Lisboa e doutorada em Estudos deTeatro pela FL da Universidade de Lisboa. Integra como investigadora o Centro de Estudos Clássicos da mesma Faculdade, onde desenvolve um Pós-Doutoramento sobre Encenar o teatro clássico, hoje. Ficha artística Versão cénica e encenação Cenário Figurinos Direcção Musical Danças Voz Fotografia Silvina Pereira Luis Mouro António de Oliveira Pinto André Barroso Vicente Trindade Júlio Martín Pedro Soares Personagens por ordem de entrada em cena João d'Espera Deus Maria Cariophilo Zelotypo Filtra Andrade Zelotypo Andrade Vitória Estudante Duarte Silvia de Sousa Andresa Eufrosina Andrade Silvia de Sousa Eufrosina Cariophilo Galindo Pelonia Dom Carlos Doctor Carrasco Cotrim Filotimo Cupido Inês Correia Maria do Mar Miguel Fernandes Índia Nunes Maria Beatriz Miguel Duarte Teresa Dias Fabiana Sousa Pedro Garcia João Costa Íris Pereira Iolanda Almeida Diana Duarte Beatriz Pato Alice Pernão Índia Mello Maria Francisca Marques Teresa Duarte Patrícia Rodrigues Ana Francisca Costa Pedro Garcia Teresa Duarte Maria Francisca Alves Diana Coimbra Interpretação Musical Viola da Gamba Flauta de bisel, percussão e canto Alaúde renascentista Alaúde renascentista Ana Sousa Vanessa Catarino Pedro Vaz Prof. André Barroso O Autor Jorge Ferreira de Vasconcelos Comediógrafo português – (Lisboa? Coimbra? c 1515- 1525 – 1585) orge Ferreira deVasconcelos, cortesão e artista do Renascimento português, contribuíu de uma forma valiosíssima para o teatro em Portugal. Estrelas de primeira grandeza, as suas comédias são fontes de luz que o tempo e o esquecimento quase extinguiram da nossa memória. J Nasceu na segunda ou terceira década do século XVI. Seu pai, António Dias [Pereira] Ferreira, era natural de Coimbra. Foi criado do duque de Aveiro, D. João de Lencastre, e são-lhe atribuídos os títulos de doutor jurista e de Cavaleiro da Ordem de Cristo. Não se encontrou, porém, por enquanto, documentação comprovativa destas informações. Sabe-se no entanto que exerceu os seguintes ofícios e cargos: moço de câmara do Infante D. Duarte, moço de câmara de D. João III, escrivão do tesouro da casa real,Tesoureiro do Tesouro Real e Tesoureiro do Armazém da Guiné e Índia. Confirma-se ainda que sua filha, Briolanja Mendes de Vasconcelos, casou com D. António de Noronha, futuro editor das edições seiscentistas das comédias Ulysippo e Aulegrafia. Em 1550 Vasconcelos encontra-se em Lisboa a escrever sobre o Torneio de Xabregas. Perdeu um filho jovem em 1578, na batalha de Alcácer Quibir. Foi casado com D. Ana de Souto, senhora nobre. Morreu em 1585. Este artista do Renascimento português, cujos dotes de escritor e comediógrafo se comprovam com a leitura das suas obras, concorreu significativamente para o enriquecimento do teatro português, tendo suscitado o entusiasmo dos seus contemporâneos, atestado pelas muitas leituras e edições de que a sua obra foi objecto. Da obra que lhe é atribuída, somente as três comédias, Eufrosina, Ulysippo, Aulegrafia e o Memorial das Proezas da SegundaTávola Redonda, são hoje conhecidas. As restantes obras encontram-se hoje desaparecidas. SP A Obra Sobre a Comedia Eufrosina A acção da Comedia Eufrosina desenrola-se em meados do século XVI, ao tempo de D. João III e da Rainha D. Catarina de Áustria. A história dos amores de Zelotypo e Eufrosina, donzela, muito bela, nobre e rica, contrariados pela cegueira do pai velho, rico e prepotente, teria dado em Camões uma elegia, em António Ferreira uma tragédia, em Camilo um melodrama romântico. O nosso autor escolhe a via da Comédia Nova, a comédia maçorral à maneira de Plauto. No final, o amor e a juventude triunfam contra as razões da política e do dinheiro de Dom Carlos, numa utopia optimista reflectida no espelho encantado das águas do Mondego. Jorge Ferreira deVasconcelos, em oposição àTragédia Castro, de António Ferreira, impõe a este clássico a visão libertária da primavera de um Eros cristão, erasmiano e humanista, que em breve seria banida pela noite da Contra-Reforma do Senhor Dom João III. Direito ao amor, liberdade das mulheres, revolução feminista?… Ferreira deVasconcelos verá a sua comédia imposta no Index, e os seus amigos presos ou perseguidos pela Inquisição, expulsos dos círculos do poder: Francisco de Holanda, Damião de Góis… Que eu conheça, esta portuguesíssima Eufrosina, que textualmente quer dizer alegria socegada, é sol de pouca dura e última visão feliz e optimista que nos resta, antes do naufrágio da segunda metade do nosso século XVI. Monumento da língua, núpcias do Amor Sagrado e do Amor Profano, é uma enorme alegria ressuscitar esta comédia censurada. SP A Escola studar Jorge Ferreira de Vasconcelos, na disciplina de Língua Portuguesa, com os alunos da EDCN, foi, para mim, uma experiência notável, posta em marcha e suportada por um trabalho coordenado e transversal, envolvendo várias disciplinas e domínios do saber. Neste sentido, foi também uma feliz redescoberta do autor e da sua obra, nomeadamente de Eufrosina, uma comédia clássica caleidoscópica absolutamente brilhante, sobretudo ao nível da planificação autoral do esquema de intriga e da caracterização segura das múltiplas personagens que a povoam. Confesso, igualmente, que me espantou a forma descomplexada como os alunos captaram e respiraram o espírito do autor, da obra e da época, tão competentemente retratada nesta comédia. Por outro lado, o evidente experimentalismo linguístico de Jorge Ferreira de Vasconcelos, que poderia ter sido factor de rejeição, acabou, pelo contrário, por ser um tónico revigorante para os nossos alunos e, consequentemente, para as aulas de Língua Portuguesa. Este trabalho inovador e abrangente, de tipologia infelizmente rara no nosso sistema de ensino, proposto por Silvina Pereira, acaba por ser, sem dúvida, um novo olhar sobre aquela que é, nas próprias palavras da encenadora, «a última visão feliz e optimista que nos resta, antes do naufrágio do séc. XVI». E Pedro Mateus (Professor de Língua Portuguesa) A Escola s Descobrimentos Portugueses são um período da História Nacional que integram a História Mundial. Influenciaram de forma determinante, a visão humanista e multicultural do Renascimento. Esta visão foi recentemente veiculada na exposição Encompassing the Globe - Portugal e o Mundo nos séculos XVI e XVII e está presente de forma muito clara no programa do 8.º ano de História. Os portugueses usaram a experiência para alterar o saber adquirido. e quebraram barreiras: científicas, sociais e culturais, entre outras. Porém, nem todos os humanistas portugueses ficaram conhecidos pela resistência à mudança fomentada pela Inquisição, num período posterior. Entre eles, destaco Jorge Ferreira de Vasconcelos, salientando aqui o valioso contributo da encenadora Silvina Pereira, não só por ter adaptado o texto Eufrósina, como pelo trabalho que desenvolveu de reconhecimento da obra deste grande humanista português. Este livro contém em si as características humanistas de outras obras feitas por essa Europa fora, que os alunos encontraram nos trabalhos de pesquisa que realizaram. A divisão actual do Saber por disciplinas, pela complexidade do Todo, dado o excesso de informação, afasta-se um pouco da visão humanista do homem do Renascimento, cujo expoente máximo é Leonardo da Vinci. Por isso, considero que a realização deste projecto é marcante para toda a comunidade escolar envolvida.Trabalhar o texto pelo ângulo da análise linguística, em Língua Portuguesa, a dramatização, em Expressão Dramática, e a contextualização do mesmo, em História, contribuiu para “ligar” os saberes, que no fundo são vertentes do mesmo Saber. Gostaria de salientar que, entre os professores envolvidos e a encenadora, houve várias reuniões com o objectivo de , também, “ligar” as estratégias a desenvolver com os alunos. Aproveito ainda para agradecer o acesso a textos inéditos facultados pela encenadora. Como Directora de Turma de um dos grupos envolvidos, saliento igualmente a disponibilidade e o apreço com que este projecto foi aceite entre os Encarregados de Educação, que “sacrificaram” muito do tempo dedicado à família em prol do mesmo. Pelo exposto, considero que todo o processo deste projecto vale por si, independentemente do produto final. Isabel Garcia O (Professora de História) ficha técnica Produção Colaboração Escola de Música do Conservatório Nacional Programa Assistência de Cena Direcção Técnica Operação de luz Serralharia do dodecaedro Costura do telão Profº de Português Profª de História Paulo Carvalho Paula Rei e Francisco Vinhas António Amaral Francisco Vinhas Mestre Júlio Mouro Vicente Lina Santos Pedro Mateus Isabel Garcia Foy representada a presente comedia em a muyto nobre & sempre Real cidade de Lisboa pelo colégio de Dança e da Musica do Conservatorio Nacional. Com previlegio Real que nenhuma pessoa outras possa editar né vender, nem trazer doutra parte, sobas penas conteu das no previlegio. E acabouse aos nove dias do mes de Abril. q De MMXI Vos valete et plaudite. Agradecimentos Companhia Nacional de Bailado, Academia de Dança Antiga de Lisboa, Teatro Maizum, Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Lisboa, Isabel Fernandes, Augusto Portela, Lina Santos, Alice Sousa para vós, adeus, e aplaudi.