OBSERVAÇÃO DO PLANETA MARTE Ednilson Oliveira AS OPOSIÇÕES Marte é sem dúvida um planeta muito interessante do ponto de vista observacional, e o astrônomo amador munido de um modesto instrumento verá em Marte motivo de bastante estudo e satisfação. Marte está a uma distância média de 228 milhões de quilômetros do Sol, ou a 1,52 UA (1 UA é a Unidade Astronômica e equivale a 149.600.000 Km). Seu diâmetro tem 6.786 km, sendo menor que a Terra. Sua órbita é relativamente excêntrica (0,093), o que resulta na distância Sol-Marte variar em até 40 milhões de quilômetros. O mais importante disto é, a larga excêntricidade Terra-Marte, que faz com que a oposição se distancie entre 56 milhões de quilômetros a 101 milhões de quilômetros. Nessa situação o planeta fica mais visível, no entanto na maior parte do tempo Marte ao telescópio decepciona, pois no afélio Marte chega a ter uma distância à Terra de até 401 milhões de quilômetros. As oposições mais favoráveis (ditas oposições periélicas) ocorrem no final do mês de Agosto e a cada 15 ou 17 anos, e nesta ocasião o planeta passa a brilhar mais do que a estrela Sírius ou até mesmo o planeta Júpiter e é superado somente pelo planeta Vênus. A última oposição periélica ocorreu em 1988. Quando Marte está em sua conjunção superior (ponto mais afastado), aparece cerca de 7 vezes menor e 49 vezes mais fraco do que nas oposições periélicas, seu disco planetário varia entre 3 a 25 segundos de arco. No entanto a cada 780 dias aproximadamente, ou a cada dois anos terrestres, ocorrem as aproximações, as oposições normais, ver figura das oposições. Estas aproximações coincidem com a oposição do planeta. Se denomina oposição quando o planeta nasce no horizonte leste justamente no momento em que o Sol se põe no Oeste (se diz que o planeta está oposto ao Sol). Para os astronômos amadores este é o momento em que o planeta Marte se apresenta em condições máximas para se observar, pois no telescópio seu tamanho será grande e brilhante comparado a outros meses do ano. Este ano a oposição será às 15:00 h do dia 24 de Abril onde o planeta terá um diâmetro aparente de 16,2 segundos de arco e magnitude de -1,6. A próxima oposição periélica será em 2.003 onde Marte terá um diâmetro de 25 segundos de arco. ONDE ESTÁ MARTE? Marte no começo do ano estava na constelação da Virgem, já em Fevereiro encontrava-se na constelação da Balança (Libra), porém no início da segunda quinzena de Abril, o planeta, regressará novamente à constelação da Virgem. No dia 24 de Abril estará, como vimos, em oposição, época em que se manterá visível durante toda a noite. A sua elongação leste começará então a diminuir gradualmente, passando apenas a ser visível como estrela da tarde. Entretanto, ir-se-á deslocando sucessivamente para as constelações da Balança, em fins de Julho, do Escorpião, em princípios de Setembro, e de Ofiuco, em meados de Setembro (passando a 3 graus a norte de Antares em 17 de Setembro). Continuando o seu percurso entrará nas constelações do Sagitário, no princípio da segunda quinzena de Outubro, e do Capricórnio, em fins de Novembro. A tonalidade avemelhada de Marte auxiliará a sua identificação. AS OBSERVAÇÕES Contrariamente ao que se pode pensar, as observações realizadas por amadores é de extremo valor. Os grande observatórios profissionais não podem dedicar todo o seu tempo a investigação de um único objeto e repartem o seu tempo entre muitos projetos astrofísicos que esperam meses para obter resultados , por exemplo de uma remota galáxia. Mesmo o telescópio espacial Hubble, apesar das belíssimas imagens, não tem todo tempo do mundo para investigar Marte. Este planeta é muito dinâmico, e teremos que estar a todo momento tirando as mais variadas informações, e esta observação planetária que o amador realiza através de seu telescópio desfrutando de todos detalhes possíveis da superfície do planeta é de extrema valia, mesmo para um modesto instrumento. COMO OBSERVAR Para observar Marte é imprescindível pelo menos um refrator de 100mm ou um refletor de 120mm, sugerimos mesmo um refletor de 200mm para uma observação mais satisfatória. Porém com um refrator de 75mm nas oposições já é possível visualizar um pequeno ponto branco (calota polar de Marte) e uma de suas maiores formações, a Syrtis Major. Para observar Marte devemos primeiro observar os maiores detalhes e anotar a data e o início da observação e a hora em Tempo Univeral (TU) e depois os detalhes mais débeis. Segundo a prática habitual alguns observadores marcam os detalhes segundo o grau de obscuridade, sendo 0 = branco (calota polar) e 10 = negro (fundo do céu), a região da planície, laranja-róseo, em geral recebe valor 2 a 3. Finalmente anota-se a data e a hora do fim da observação. Marte tem um período de rotação de 24 h e 40 min e durante a observação os detalhes poderão se mover. No dia seguinte, 24 horas depois, se você observar no mesmo horário, Marte terá girado de 9 graus, e a cada dia novos detalhes aparecerão, demorará cerca de 40 dias para se observar a mesma região no mesmo horário. Agora o amador terá que ter muita dedicação e paciência para estudar todos os detalhes deste planeta. O QUE OBSERVAR Marte é um planeta que tem sido visitado por sondas nas últimas décadas e observado por telescópios a mais de um século e para tanto se tem bem documentado os principais acidentes de sua superfície. No princípio deste século o planeta ficou muito popular devido aos canais que Giovani Schiaparelli observou em 1877. Nestas sucessivas campanhas de observações, ele notou que certas estruturas mudavam de forma, e por isso imaginou tratar-se de canais. Devido a imaginação e persuasão de Percival Lowell, fez com que vários astrônomos das décadas seguintes acreditassem existir em Marte uma rede complexa de canais hidrográficos e vida inteligente. Tivemos que esperar até a década de 70 com as sondas Vikings aterrisando no planeta para terminar momentaneamente a controvérsia se há vida ou não em Marte. Na realidade, Marte tem estruturas superficiais com grandes rasgos (estrias), parecidas com os grandes Canions dos EUA, porém estas estrias gigantescas não são acessíveis aos telescópios terrestres. Alguns projetos interessantes aos amadores podem ser produtivos a médio e longo prazo. Como exemplo destacamos as estruturas determinadas como Syrtis Major (descoberta por Huygens em 1659), Meridiani Sinus e Solis Lacus estas estruturas podem ser observados por modestos instrumentos. Para realizar uma completa cartografia de Marte há que realizar a observação em uma mesma hora, recordemos que Marte, de uma noite para outra, para uma mesma hora de observação gira 9 graus, 9 x 40 dias = 360 graus. Se dispusermos de uma câmara de Vídeo , máquina fotográfica ou CCD , podemos montar uma animação da rotação deste planeta. Notemos também que se o observador empregar filtros adequados, poderá ver em Marte os deslocamentos das tempestades de areia, das nuvens de sua atmosfera, o derretimento da calota polar e muito mais... Só mesmo um grande telescópio verá seus dois únicos e minúsculos satélites: Phobos com 22 km e Deimos com 13 km, descobertos por Asaph Hall em 1877. Os nossos telescópios não veêm o impressionante Olimpus Mons (Monte Olimpo a maior elevação do sistema solar com 24 km de altura) o Valles Marineris, um canion de 4.000 km de extensão e 600 km de largura. Contudo o Homem tem em mente colonizar Marte, este é o sonho de décadas e que atualmente vem sendo concretizado com os mais recentes projetos e sondas ao planeta Marte, nosso irmão “habitável” mais próximo. OBSERVAÇÕES MAIS AVANÇADAS DE MARTE I) OBSERVANDO MARTE PASSO A PASSO As observações devem ser feitas na seguinte sequência: 1) Arejar o telescópio 2) Observar o planeta acima de 30 ou mesmo 45 graus do horizonte 3) Usar o aumento mais adequado, não usar aumentos muito excessivos (observar a turbulência atmosférica) 4) O desenho deve ser feito com lápis número 2 mole, não há necessidade de ser um desenho artístico, mas representar o que o observador realmente está vendo no disco planetário de Marte 5) Registrar no gabarito padrão todas as informações pertinentes à observação 6) Começar desenhando a calota polar 7) Depois as manchas escuras 8) Depois as manchas claras 9) o desenho não deve ultrapassar mais do que 20 minutos 10) Depois de feito o desenho, o observador deve fazer o cálculo para achar o Meridiano Central e com isso identificar no mapa os nomes das regiões visíveis durante a observação 11) Estimar as cotas fotométricas* 12) Observação da nuvens em luz integral e com filtros** 13) Desenhar o mais fiel possível no gabarito padrão o tamanho da Calota Polar 14) Observar com os seguintes filtros da série da Wratten da Kodak com outro similar:1. Luz branca, 2. Azul, 3. Vermelho, 4. Verde, 5. Amarelo, 6. Violeta, 7. Magenta, 8. Laranja, 10. Luz branca 15) A hora média, entre a hora de início T1 e o fim T2 do desenho é o valor da hora que deve ser considerado para o cálculo do Meridiano Central 16) A observação ideal é aquela que se faz pelo menos com três horas de duração para estimar bem o que vai ser registrado. *Cotas Fotométricas Método das cotas fotométricas ou de intensidades fotométricas foi estabelecida por G. de Vaucouleurs em 1939, este método consiste no seguinte: submete-se as regiões claras, regiões escuras e calotas polares a uma fotometria pessoal, seguindo uma escala que vai de 0 a 10. O valor 0 corresponde à calota polar (região mais brilhante do planeta) e o valor 10 corresponde ao fundo negro do céu nas vizinhanças do planeta. Nesta escala as regiões claras têm uma cota fotométrica em torno de 2,0. Estas cotas são representadas pela letra T, assim: Calota polar T = 0,0 Regiões claras T = 2,0 Fundo negro do céu T = 10,0 Os outros valores de intensidades são interpolados entre esses valores básicos, o observador experiente verá que as regiões de Hellas, Tharsis, Amazonis terá uma valor entre 1,5 a 2,5 e regiões como Syrtis Major, Solis Lacus, Tyrrhenum Mare terá um valor entre 6 e 7. Faça uma tabela das regiões observadas com estes valores obtidos e compare com as observações diárias e com outros observadores. ** Filtros na observação de Marte O emprego de filtros é bastante útil na observação de fenômenos atmosféricos e de detalhes na superfície do planeta Marte. O observador deve colocar o filtro entre o olho e a ocular do telescópio. O aumento deve ser da ordem do número da abertura do instrumento em milímetros, ou seja um refletor de 150mm, terá que ter um aumento de 150x. existem dois tipos de filtros: vidro e gelatina; os de vidro são de difícil aquisição e preços elevados, e os de gelatina, embora, também não muito fáceis de encontrar são os de preço mais acessível. Filtros da série Wratten da Kodak, usados para a observação de Marte: Amarelo - W 8, 12, 15. Torna mais brilhante as regiões desérticas, melhora o “seeing” astronômico Laranja - W 21, 23 A Aumenta o contraste entre regiões claras e escuras, penetra o haze e a maioria das nuvens, detecta nuvens de poeira amarela Vermelho - W 25 Proporciona máximo contranste às características da superfície, realça os detalhes finos da superfície, as bordas das nuvens de poeira amarela, e as bordas das capas polares Verde - W 56, 57, 58 Escurece as características vermelhas e azuis, realça os detalhes de gelo (frost), o fog de superfície e projeções da capa polar. Azul Verde - W 64 Detecta “ice-fogs” e hazes polares Azul - W 80 A, 38, 38 A Mostra as nuvens da atmosfera, nuvens brancas descontínuas, e o haze do limbo, e escurece os detalhes avermelhados Violeta - W 47 Mostra nuvens de alta altitude, hazes do limbo, faixas de nuvens equatoriais, capa de nuvens polares, nuvens de cinza vulcânica, e detecta o fenômeno “violet-clearing”. Magenta - W 30, 32 Realça os detalhes vermelhos e azuis e escurece os verdes. Relaciona detalhes da superfície com a posição das nuvens atmosféricas. Melhora os detalhes da região polar. II) COMO CALCULAR O MERIDIANO CENTRAL DE MARTE Girando sobre si próprio em 24h 37min e 22s, Marte oferece ao observador terrestre, praticamente a mesma região que, contudo, vai gradativamente sofrendo atraso. É esse atraso que permite precisamente estudar, durante a oposição, todos os detalhes do globo marciano. Para facilitar a identificação de suas observações, de seus desenhos, de suas imagens, o observador aerográfico precisa de uma tabela que permitirá a determinação fácil e rápida da longitude do meridiano central (M.C.) no momento da observação. Exemplo: Observação de Marte no dia 24 de Abril de 1999 às 20:20h TL. 1) Transformar TL em TU 1) Procurar no anuário ou na tabela aqui fornecida o valor do MC às 00:00h em TU Com o auxílio da Tabela Auxiliar procurar os valores. 2) Em 24 de Abril de 1999 às 00:00h TU o MC é 140.62, perceba agora que 20:20 TL corresponde às 23:20 TU. Então pela tabela auxiliar temos para 23:00h = 336.27 e para 20min = 4.87, somando-se este dois valores teremos 341.14 Somar agora o valor do MC à 00:00h TU com o valor achado da tabela auxiliar. 140.62 + 184.54 = 325.16 Ou seja o valor do M.C. às 23:20 TU é 325.16 OBS: Se por um acaso der na soma um valor maior do que 360, deveremos então subtraí-lo por 360, se desse por exemplo 525.68 então valor seria 165.68. O M.C. não pode ultrapassar 360. TABELA AUXILAR HORAS HORAS 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 ROTAÇÃO 14,62 29 ,24 43 ,80 58 ,48 73 ,10 87 ,72 102 ,34 116 ,96 131 ,58 148 ,21 160 , 83 175 ,45 HORAS 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 ROTAÇÃO 190 ,07 204 ,60 219 ,31 233 ,93 248 ,55 263 ,17 277 ,79 292 ,41 307 ,03 321 ,65 336 ,27 350 ,89 MINUTOS 9 10 15 20 ROTAÇÃO 2 ,19 2 ,44 3 ,66 4 ,87 MINUTOS MINUTOS 1 2 3 4 ROTAÇÃO 0 ,24 0 ,49 0 ,73 0 ,97 5 6 7 8 1 1 1 1 ,22 ,46 ,71 ,95 30 40 50 7 ,31 9 ,75 12 ,18