Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas

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Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas
(Eds.) Mª João Marçalo & Mª Célia Lima-Hernandes, Elisa Esteves, Mª do Céu Fonseca, Olga Gonçalves, Ana
LuísaVilela, Ana Alexandra Silva © Copyright 2010 by Universidade de Évora
ISBN: 978-972-99292-4-3
SLG 48 – Porquê estudar no século XXI o Português arcaico, antigo ou mediaval?
FORMAS VERBAIS E INDETERMINAÇÃO: EVIDÊNCIAS NA GRAMÁTICA
DA LINGUAGEM PORTUGUESA DE FERNÃO DE OLIVEIRA E EM TEXTOS
DO PORTUGUÊS BRASILEIRO DO SÉCULO XXI
Maria da Conceição HÉLIO SILVA1
RESUMO
A busca por passados mais remotos da história da língua portuguesa, mais
especificamente, o português arcaico (a pré-história do português) refletido em
documentação escrita, possibilita compreender estágios atuais da língua e as mudanças
ocorridas ao longo do tempo. De acordo com esses estudos, as características
linguísticas do período arcaico do português estão presentes em documentos que vão
dos séculos XIII e XIV até à segunda metade do século XVI, o que possibilita a
compreensão da língua portuguesa atual. Portanto, variantes do tempo passado podem
ser detectadas em textos escritos do português antigo, o que favorece aos estudos
históricos do português, na perspectiva de detectar formas ainda em uso, no presente.
(MATTOS E SILVA 1989, 1991, 2006, 2008). Essa percepção tem um significado
importante para os estudos históricos da língua portuguesa do Brasil (PB) e foi
compreendendo a língua como um fenômeno histórico, cujos estágios anteriores
explicam muitos fatos linguísticos atuais do português, que buscamos verificar formas
verbais que co-ocorrem com a indeterminação do agente nos 50 capítulos da Gramática
da Linguagem Portuguesa de Fernão de Oliveira (1536) e em edições de Revistas
Brasileiras de grande circulação nacional para verificar, nesses dois períodos históricos,
a presença de formas verbais que co-ocorrem com a indeterminação do agente.
PALAVRAS-CHAVE: formas verbais; indeterminação; português arcaico; português
brasileiro; Linguística Histórica.
INTRODUÇÃO
A resposta à pergunta “Por que estudar hoje o português arcaico?” nos parece já
devidamente respondida no Brasil por Mattos e Silva (2006), que realizou estudos sobre
a fonologia, a morfologia e a sintaxe do português arcaico. Em várias outras obras de
sua autoria, Mattos e Silva trata também dessa fase do português, especificamente,
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como nas Estruturas trecentistas: elementos para uma gramática do português arcaico,
de 1989, onde aborda a estruturação do sintagma nominal e verbal.
Esse retorno aos estudos históricos possibilita a construção de gramáticas de
línguas naturais de fatos pretéritos das línguas e informa sobre variações e mudanças
linguísticas em curso no português atual, assim como o estudo de fatos linguísticos do
presente pode possibilitar a interpretação de fatos linguísticos do passado.
A ide\ia inicial para a realização deste breve estudo se deu, principalmente, a
partir da leitura do artigo A língua brasileira está mais próxima do português antigo, de
Mattos e Silva (1991), quando diz que
O ensino normativo evidencia-se como uma necessidade social, numa
sociedade estratificada; entretanto, aquele ensino em que se busque
compreender o fenômeno estrutural que é qualquer língua, ao mesmo
tempo em que se busque compreender o fenômeno histórico que
também é uma língua, é uma necessidade cultural e racional e torna-se
uma das formas de fazer crescer intelectualmente, do mesmo modo
que a matemática, a filosofia, a história, a música... (p.2)
e da leitura da obra dessa mesma autora O Português arcaico: fonologia, morfologia
sintaxe (2006), onde encontramos exemplos como os que se seguem:
a) Avia preto de duzentos monges (o SUJ nulo com verbos
existenciais)
b) Veo aaquel templo e derribou o altar en que se fazian os sacrifiços
(verbo na terceira pessoa do plural, expressando um sujeito genérico);
c) De cincoenta anos adeante vai já homen folgando e assessegando e
quedando das tentações (o pronominal homen, próprio do período ao
arcaico (relacione-se ao on francês), que, com muita frequência,
expressa a não-determinação do SUJ);
d) Aquesta manceba con sa sogra foi convidada pera ir aa consagraçon
da eigreja
e) Disse que os juizos de Deus non se podian compreender Todalas
cousas... que se farán come aquelas que se nunca farán pera se
poderian fazer(a estrutura da passiva analítica, sem agente explícito,
que resulta numa forma de indeterminação do sujeito, o
mesmo
ocorrendo com a passiva sintética; com se apassivador e verbo na
terceira pessoa). (p.160)
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As formas verbais com sentido indeterminador do agente, acompanhadas de se,
presentes em b, e a estrutura passiva sem agente expresso presente em c, na citação
anterior sobre o português arcaico, nos levaram a verificar a presença dessas
construções, nos 50 capítulos da Gramática da Linguagem Portuguesa de Fernão de
Oliveira, de 1536, documento histórico da fase final do período arcaico e primeira
gramática da língua portuguesa, e em textos do português brasileiro contemporâneo.
Essa comunicação, portanto, apresenta os resultados desse breve estudo.
Para melhor contextualizar esse tema, resumimos algumas ideias sobre
indeterminação, agente e passiva.
A INDETERMINAÇÃO
A respeito da indeterminação, Ribeiro (1914[1884]) relaciona a indeterminação
nas línguas românicas ao processo ocorrido com o latim, em que a forma que exprimia
voz reflexiva passou a exprimir voz passiva, expressando a indeterminação do agente.
O importante historiador Said Ali (2001 [1921]), um dos grandes sintaticistas da
história do português, defende a tese de que não existe se passivo, mas sim, se
indeterminador, em sentenças do tipo “aluga-se quartos”. Para Said Ali a ação é
psicologicamente atribuída a um ente humano, desconhecido ou que não se deseja
nomear, com o se exercendo a função psicológica de agente indeterminado.
Também Said Ali já considerava a primeira pessoa do plural sem referência
explícita a nenhum sujeito como uma forma de se indeterminar, ampliando as
possibilidades de formas verbais que co-ocorrem com a indeterminação.
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Em Câmara Júnior (1985, p.221) encontramos também referência à
indeterminação, dessa vez, ratificando o que dizem as gramáticas normativas (GNs) do
século XX:
Note-se, porém, que pode haver um sujeito INDETERMINADO, ou
melhor, indiferenciado, isto é, referindo-se à massa humana
indiferenciada. Exprime-se em português pela terceira pessoa do
plural do verbo (ex.: Contam que certa raposa...).
Câmara Júnior (idem; ibidem) também se refere a um sujeito indeterminado
homen no português arcaico, assim como Teyssier (2007). Argumenta este autor que
homen, com o sentido do on francês, teve o seu desaparecimento no século XVI.
No português europeu (PE), Mira Mateus et al (2003) constatam que a
indeterminação ocorre, no PE, nas seguintes condições:
a) Com clítico nominativo se, acompanhado da terceira pessoa do singular de um
verbo: Diz-se que o leite vai faltar.
b) Com verbo na terceira pessoa do plural, com sujeito nulo: Dizem que o leite
vai faltar.
c) Com verbo na segunda pessoa do singular em frases com interpretação
genérica: Ajudas sempre os amigos e apesar disso eles criticam-te.
d) Nas construções passivas: Aceitam-se encomendas.
O AGENTE
Sobre agente, esse conceito de agente nas GNs coincide com o de sujeito, além
disso, geralmente as GNs se referem ao termo agente apenas como o agente da passiva,
que é considerado presente em duas possibilidades- na passiva “sintética” e na passiva
analítica.
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Na perspectiva da linguística, Dik (1980, apud PONTES: 1986) reconhece o
agente como uma relação funcional semântica, que está sempre presente numa
predicação de ação. A noção de agente ligada à de sujeito indeterminado, assim como
o uso do verbo na terceira pessoa do plural sem agente expresso e o uso do se como
índice de indeterminação do sujeito como formas de indeterminação, também é
encontrada em Ribeiro (1914[1884]).
O conceito de agente presente em Mira Mateus (2003) expressa que: “agente é o
papel temático do argumento que designa a entidade controladora, tipicamente humana,
de uma dada situação” (“Os presentes votaram a proposta, A Maria guiou o jipe”)
(p.188).
Compreendemos que nestes exemplos, o agente coincide com o sujeito sintático,
mas sabemos que nem sempre é assim.
Martins (2003), a respeito do uso do se, numa perspectiva diacrônica, refere-se à
mudança e à variação desse uso no período medieval, séculos XV e XVI, quando
aparece sem concordância entre o verbo e seu argumento interno, associado à posição
de sujeito, em frases como: “As outras cousas da grandeza desta terra e do seu governo
e costumes se guarda pera os livros de geografia.” (p.21).
A PASSIVA
A respeito da passiva, encontramos em Ribeiro (1944[1884]), na sua Gramática
Portuguesa, o seguinte:
Fica, pois, demonstrado que as fórmas românicas construídas com se,
bem como com as formas passivas, servem para exprimir a acção sem
trazer a lume o agente. (p.334).
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Ribeiro já havia consolidado no século XIX na sua gramática o uso do se e da
passiva como formas de indeterminação “sem trazer a lume o agente”.
No português brasileiro (PB), os estudos de Naro (1976) concluem que a passiva
analítica e a passiva com se indeterminador não são sinônimas e ocorrem apenas com
verbos que requerem um sujeito humano. Concordando com Naro, Ikeda (1980, p.113)
cita ”Aluga-se este apartamento. Este apartamento é alugado”, que têm sentidos
diferentes.
Scherre (1999) considera que a construção de passiva sintética adotada pelas
Gramáticas Tradicionais é, na verdade, uma estrutura ativa de sujeito indeterminado:
Hoje, a estrutura classificada como passiva sintética — joga-se búzios
ou jogam-se búzios; doa-se filhotes ou doam-se filhotes; cobre-se
botões ou cobrem-se botões; analisa-se dados ou analisam-se dados
— não é passiva sintética; é, sim, uma estrutura ativa de sujeito
indeterminado semelhante a outras estruturas irmãs do tipo: No Brasil,
precisa-se urgentemente de reforma agrária e vive-se bem nesta terra.
A concordância nas estruturas denominadas passivas sintéticas é
variável e ocorre por atração ou por falsa concordância com o objeto
direto, em função, especialmente, do conhecimento da norma
codificada, ou seja, da gramática normativa da língua portuguesa.
(p.13-14)
Hélio Silva (2009) estudando formas verbais que co-ocorrem com a
indeterminação do agente, em textos escritos dos séculos XIX e XX, concorda que não
existem passivas sintéticas no PB e considera como passivas, além das construções
formadas de verbo ser mais particípio, as construções formadas apenas do particípio do
verbo. Vale dizer que as contradições da regra da suposta equivalência entre passiva
sintética e passiva analítica já eram apontadas por Said Ali (2001[1921]), ao que ele
chama de “subterfúgios” e advoga a inexistência de passiva sintética no português do
Brasil. E que se ela ainda existe é por mera pressão do ensino gramatical.
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Oliveira (2004) referindo-se à passiva no período arcaico, entende que,
considerando a história da língua, no português arcaico, por exemplo, é possível que as
passivas de se pudessem ter sido legítimas, ao lado das passivas de ser nesse período.
Ainda Oliveira (2005), tratando da voz passiva no período arcaico, afirma que, no
corpus analisado, a ausência de agente da passiva nesse período é um significativo
mecanismo de indeterminação do sujeito
Ainda sobre o se, Nunes (1990) tratou do se indeterminador e apassivador, numa
visão sincrônica e diacrônica, para analisar a mudança de Alugam-se casas para Alugase casas, a partir de cartas, diários e documentos, como representantes do vernáculo de
cada época. Juntamente com Naro, Nunes constatou que o se dito passivo/apassivador
passou por um processo de reanálise sintática no português antigo.
Há, ainda, com relação a esse pronome, as mudanças recentes: o apagamento do
se indeterminador em construções finitas e a inserção desse clítico em construções
infinitivas, uma criação do PB, o que, segundo Hélio Silva (2009) seria uma
contribuição dos afrodescendentes brasileiros.
A falta de concordância entre verbo e argumento interno, que como vimos
também foi constatado por Martins (2003) no período medieval, séculos XV e XVI,
provocando mudança e variação, no PB só aumentou desde o século XVIII até o XIX,
ampliando-se no século XX na fala.
Vejamos, então, algumas evidências de formas verbais que co-ocorrem com a
indeterminação do agente na Gramática da Linguagem Portuguesa (1536) e em Revistas
Brasileiras de grande circulação nacional (XXI).
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FORMAS VERBAIS E INDETERMINAÇÃO DO AGENTE
Gramática da Linguagem Portuguesa, de Fernão de Oliveira (1536) (GLP)
Foram encontradas na GLP evidências de formas verbais co-ocorrendo com a
indeterminação do agente, ou seja, com o sentido semântico de indeterminação, com e
sem o acompanhamento do se indeterminador. O fato linguístico ao qual nos referimos
diz respeito a formas verbais do tipo:
a) estrutura passiva sem agente expresso
Esta tal cousa nunca ainda foi vista (...) Se agora de novo for achada, trará
também voz nova consigo.(p.130)
b) terceira pessoa do singular com se
E deste rei Luso se chamou a terra em que vivemos Lusitania.(p.85)
Acabou-se d’empremir esta premeira anotação da Língua Portuguesa, por
mandado do mui manifico senhor dom Fernando d’Almada, em Lixboa,[...]
(p.155)
c) terceira pessoa do singular sem se
Ditongo dizem também ser dição grega e quer dizer ou significa e diz
dobrado som (p.105);
d) infinitivo sem se
[...] assi é trabalhoso e pouco certo querer saber os nascimentos particulares
das dições.(p.121)
A quantidade das síllabas da nossa língua é mui fácil de conhecer, (p.110))
e) terceira pessoa do plural sem agente expresso sem se
E pode ser que a pessoa que achou a cousa não lhe pôs logo o nome; ou
porventura não j´este nome mas outro, e despois lhe poseram este.
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f) terceira do plural com se
As letras mudas são estas (...) Chamam-se mudas porque em si não têm voz
algua [...] (p.121)
Como seria de esperar, não foram encontradas formas verbais do tipo
infinitivo com se no PE, já que não é um uso comum nessa variedade do português.
Também não ocorreram casos de formas verbais do tipo gerúndio com e sem se
indeterminador na GLP (1536), pelo menos nos capítulos consultados.
Evidências em textos do português brasileiro do século XXI (Revista Brasileiras de
Circulação Nacional-RBCN)
Nas revistas brasileiras consultadas do século XXI foram encontradas as
seguintes formas verbais co-ocorrendo com a indeterminação do agente do tipo:
a) estrutura passiva sem agente expresso
Um composto extraído da uva e um remédio usado em transplantes são
as mais recentes esperanças da ciência contra o envelhecimento.
A doença é conhecida como “Síndrome da Pele enrugada”.
A esta altura, o mestre já era considerado um dos maiores diretores de
cinema do mundo [...].
b) terceira pessoa do singular com se
Desde 1911, quando surgiu o primeiro vestibular no Brasil não se via uma
transformação tão radical.
Estima-se que no Brasil existam cerca de 900.000 portadores da doença.
c) infinitivo sem se
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Com tanta informação disponível na internet, não faz sentido querer medir
quanto conhecimento o jovem armazenou na escola [...].
É uma armadilha antiga.Não há por que cair nela de novo.
d) terceira pessoa do plural sem agente expresso sem se
AÇÚCAR. Acharam o culpado. Ele é o vilão da “globesidade”, a epidemia
mundial de obesidade mórbida, o maior desafio da saúde no século XXI.
Não foram encontradas no PB ocorrências de forma verbal do tipo terceira do
singular sem se, provavelmente por se tratar de textos escritos, uma vez que os estudos
linguísticos apontam que essa forma é restrita ao português oral brasileiro, nem
ocorrências do gerúndio com e sem se e da terceira do plural com se forma mais
facilmente encontrada em textos escritos do PE.
Considerando esses exemplos e respondendo de forma afirmativa à pergunta
que fez Mattos e Silva (2006) e fazendo minhas as suas palavras, faz sentido um
brasileiro de agora, olhar para trás e ver que a língua que usa hoje, ainda tem muito a
ver com o português arcaico, mesmo depois de se entrecruzar com tantas outras línguas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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