30 DE JULHO A 5 DE AGOSTO DE 2011 SANTUÁRIO DE APARECIDA PÁG. 8 MISSÃO Igreja e Aids: conheça a assistência eclesial aos soropositivos Pastoral de DST/Aids promove ações de valorização da vida Leonardo Meira [email protected] Cerca de 600 mil brasileiros convivem com um vírus de nome pequeno, mas efeitos potencialmente devastadores. O HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana (Human Imunodeficiency Virus, na sigla em inglês) – foi identificado em seres humanos pela primeira vez em junho de 1981, em Los Angeles (EUA). De lá para cá, mais de 65 milhões de pessoas já foram infectadas pelo vírus que causa a AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Acquired immune deficiency syndrome, na sigla em inglês). Hoje, a doença contabiliza cerca de 33 milhões de casos no mundo. Nesses 30 anos, são inúmeras as organizações e movimentos sociais que lutam para proporcionar mais dignidade aos que se descobrem portadores do vírus. Na linha de frente dessa lista, a Igreja Católica é responsável por mais de um quarto de toda a assistência sanitária prestada no mundo. Segundo dados do Pontifício Conselho para a Pastoral da Saúde, há mais de 117 mil centros católicos que atendem a portadores do vírus no mundo. No Brasil, uma das iniciativas concretas é a Pastoral DST/Aids. “É um serviço da Igreja que desenvolve um trabalho complementar às políticas públicas de saúde e aos trabalhos das demais organizações empenhadas no enfrentamento da Aids. O objetivo de todos é controlar a epidemia. Talvez essa seja uma das razões do sucesso, embora relativo, da resposta brasileira: envolver muitos sujeitos, especialmente as pessoas que vivem com HIV, além de aliar assistência e prevenção”, explica Pe. José Trasferetti o secretário-executivo da Pastoral, frei José Bernardi. As ações são desenvolvidas nos campos de prevenção, acompanhamento de pessoas que vivem e convivem com HIV e formação e espiritualidade dos agentes de pastoral. Todo o trabalho é desenvolvido em dinâmica de parceria (com outras pastorais, ONGS, serviços e profissionais de saúde) e incidência política, ou seja, participando dos espaços que organizam, elaboram e decidem as políticas de enfrentamento da epidemia. A Aids não é uma doença que afeta somente o corpo, mas tem implicâncias de ordem social, cultural, e afeta temas considerados tabus na sociedade: uso de drogas, orientação sexual, relações extraconjugais, início das relações sexuais, violência contra mulheres, entre outros. “Desde o início, a Aids foi estigmatizada e ainda se percebe grande preconceito em relação a quem se descobre com o vírus do HIV, implicando em morte social, muitas vezes. A Pastoral procura trabalhar com seus agentes e nas comunidades todos esses temas, pois sem abordá-los fica difícil entender a Aids como um limite de saúde, sem culpas, julgamentos ou moralismos”, esclarece frei Bernardi. A Pastoral não busca substituir ou fazer as vezes dos serviços de saúde ou daquilo que é próprio do gestor público. No entanto, há acordos firmados entre a Igreja e o Ministério da Saúde (MS) na busca por combater a doença. Há parcerias e convênios, tanto para formação de agentes nas diversas áreas, quanto para ações onde seja imprescindível a participação da Igreja. Uma das parcerias é com o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do MS, que busca incentivar o diagnóstico precoce do HIV: as Pastorais de DST/Aids, da Criança e da Saúde mobilizam as comunidades para realizar o teste mesmo quando não se tem sinais ou sintomas da doença. A caminhada da Pastoral iniciou como uma Comissão da Pastoral da Saúde e permaneceu dois anos como tal. Após, a percepção foi de que havia muitos temas específicos que deveriam ser enfrentados do ponto de vista pastoral e eclesial, e decidiu-se pela criação de uma estrutura específica. “O surgimento da Pastoral permitiu que a Igreja oferecesse sua contribuição numa perspectiva mais proativa e não tanto reativa. Além disso, encontramos nosso espaço e alcançamos o reconhecimento dos profissionais da saúde e dos gestores dos serviços públicos de saúde. É consenso nesses setores que a Igreja, atravéss das diversas pastorais, desempenha um papel imprescindível vel no campo de enfrentamento da Aids”, conclui o secretário-executivo da Pastoral. Visão eclesial Os religiosos que trabalham com o segmento garantem que apenas o diálogo logo educativo fraterno é capaz de construir pessoas que possam discernir acerca do correto uso da sexualidade e da vida afetiva. “É preciso discutir e aprofundar os nossos comportamentos em sociedade, sobretudo a questão do uso de drogas intravenosas e o exercício cio da sexualidade. Para os pais e filhos é necessário rio construir uma moralidade do diálogo franco e honesto. Não podemos mais educar nossos filhos inspirados com base em uma moral do tipo pode ou não o pode. A educação não o pode ocorrer na base da opressão ou da imposição, o, e sim estar marcada pelo afeto. A moral católica também m necessita ser revista, pois deve ser mais positiva e aberta àss necessidades do nosso tempo”, defende o doutor em Teologia Moral e presidente da Sociedade Brasileira de Teologia Moral (SBTM), padre José Antonio Trasferetti, autor do livro Teologia, Sexualidade e Aids,, publicado pela Editora Santuário. A visão o sobre a sexualidade afeta diretamente o modo de se relacionar com a problemática tica da Aids, pois é por meio de uma sexualidade vivida de forma desorganizada que se contrai o vírus HIV. “O cuidado com a sexualidade é fundamental. A discussãoo livre em torno de uma sexualidade libertadora deve permear os diálogos. logos. As pessoas precisam estar muito cientes das fragilidades do seu corpo. Comportamentos de castidade e de fidelidade sãoo os mais recomendáveis. Entretanto, se a pessoa nãoo consegue por muitas razões es construir uma vida em torno de uma prática sexual responsável, vel, que busque, então, o, o sexo seguro por amor a si e aos outros. O cristianismo nãoo pode mais praticar uma moral negativista, contaminada pela noção de pecado que torna as pessoas oprimidas e fracas. A sexualidade deve ser encarada no contexto de uma formaçãoo integral e deve acompanhar a evoluçãoo da pessoa enquanto protagonista da história”, complementa padre Trasferetti. A Aids também apresenta-se como campo de missão no que diz respeito ao cuidado oferecido aos homossexuais soropositivos, por exemplo. “Há grupos específicos de corajosos cristãos os que se aproximam das pessoas homoafetivas que, muitas vezes, também são cristãos e, por sua orientação o sexual, acabaram abandonando ou sendo abandonados pela igreja. A própria pria Pastoral da DST/Aids tem sido uma porta de retorno à Igreja de muitas pessoas que já se julgavam ‘indignas’ de estar diante de Deus. Sabemos que, diante de Jesus, todos sãoo dignos de misericórdia e perdão. Particularmente nesse campo, evangelizar é humanizar. Quando um serviço da Igreja é capaz de tornar as pessoas mais humanas, mais solidárias, consegue fazer isso pela força do evangelho e, consequentemente, evangeliza, mesmo não fazendo adeptos”, afirma frei Bernardi. Símbolo mundial da luta contra a Aids SANTUÁRIO DE APARECIDA PÁG. 9 em números 592.914 é o número de casos identificados no período de 1980 até junho de 2010, segundo a última edição do Boletim Epidemiológico – AIDS e DST, do Ministério da Saúde 55% dos infectados não sabem que possuem a doença 630 mil é a estimativa de infectados pelo HIV, segundo o Estudo Sentinela Parturientes, realizado em 2006 R$ 700 milhões é a média de investimento anual em terapia antirretroviral (ARV). Em 2009, 200 mil pessoas estiveram em tratamento, o equivalente a R$ 3.500,00/ pessoa/ano 25 mil pessoas vivendo com HIV/Aids iniciam o tratamento ARV a cada ano 3.398 casos de Aids em jovens de 13 a 24 anos de idade foram identificados, no banco relacionado, no ano de 2009. A razão de sexos é de 1,2 casos entre homens para cada 1 caso entre mulheres 1,5:1 é a razão de sexos no número de casos desde 2002 (15 homens para cada 10 mulheres). Apesar de existirem mais casos de Aids no sexo masculino (385.818) do que no feminino (207.080), nota-se uma diminuição dessa diferença 30 DE JULHO A 5 DE AGOSTO DE 2011 40-49 anos é a faixa etária na qual se observa a maior proporção dos casos de Aids 30% das pessoas notificadas com Aids no país possuem entre 8 e 11 anos de estudos. 25,1% do total possuem entre 4 e 7 anos e 8,8% entre 1 e 3 anos. Observa-se uma tendência de aumento da escolaridade entre os portadores, mais especificamente a partir do ano de 1999 0,41% é a prevalência de infecção pelo HIV em gestantes. Estima-se que 12.456 recém-nascidos sejam expostos ao HIV anualmente, segundo dados do Estudo Sentinela Parturiente (2004) Fonte: Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do MS 5 estados estão à frente com nnúmeros mais elevados, desde o ano 2000, alternando-se entre as quatro primeiras posições: Rio Grande do Sul, Roraima, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo 2 capitais lideram a relação em primeiro e segundo lugar, respectivamente, desde o ano 2000: Porto Alegre e Florianópolis. Em 2009, as taxas para essas duas capitais foram, respectivamente, de 172,1 e 89,7 casos de Aids por 100.000 habitantes 5 municípios do país figuram nas cinco primeiras posições por sua mais elevada taxa de detecção de Aids, de 2000 a 2009, e pertencem à Região Sul, mais especificamente aos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em 2009, por ordem decrescente de classificação das taxas de detecção, estão Porto Alegre/RS (172,1 por 100.000 habitantes), Rio do Sul/SC (96,7), Florianópolis/SC (89,7), São Leopoldo/RS (82,7) e Cruz Alta/RS (82,3) Posição da Igreja O Observador Permanente da Santa Sé junto à Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York, Arcebispo Francis Assisi Chullikatt, interveio durante a Conferência de Alto Nível sobre HIV/Aids. O encontro aconteceu entre os dias 8 e 10 de junho, por ocasião dos 30 anos de descoberta do vírus. “Responsáveis por mais de um quarto da assistência sanitária oferecida aos infectados pelo HIV/Aids, as instituições sanitárias católicas conhecem bem a importância do acesso aos tratamentos, cuidados, e também do apoio aos milhões de infectados”, afirmou. Dom Chullikatt destacou que os Estados devem reconhecer que a família, baseada no matrimônio entre um homem e uma mulher e unidade fundamental e natural da sociedade, é indispensável na luta contra o HIV/Aids. Ele também reiterou que a Santa Sé não aprova o uso de profiláticos como parte dos programas de prevenção à doença ou os programas/cursos de educação sexual. Os programas de prevenção ou de educação à sexualidade humana deveriam concentrar-se não na busca por convencer que comportamentos de risco e perigosos façam parte de um estilo de vida aceitável, mas sim evitar os riscos e evidenciar o que seja eticamente sadio. “O único método seguro e completamente confiável para prevenir a transmissão sexual do HIV é constituído pela abstinência antes do matrimônio e pelo respeito e fidelidade recíprocos no matrimônio, que é e deve ser sempre o fundamento de todo o debate sobre prevenção e apoio. É necessária uma modalidade baseada sobre valores, que ofereça a solicitude e o apoio moral para quantos estão infectados e promova um modo de viver em conformidade com as normas da ordem moral natural, uma modalidade que respeite plenamente a dignidade intrínseca da pessoa humana.” Arcebispo Francis Assisi Chullikatt Acesse mais conteúdo sobre o tema no blog do JS: jornalsantuario.wordpress.com