livro eja hist - HISTORIANDO IDÉIAS!

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Eja Educação de Jovens e Adultos
3ª e 4ª fases do Ensino Fundamental
HISTÓRIA
Apresentação
As políticas públicas do governo de Mato Grosso do Sul têm como objetivo garantir, além
do acesso, a permanência na escola àqueles que, de alguma forma, forma excluídos do processo de
escolarização, possibilitando a essa parcela da população a conclusão da trajetória escolar.
Para desenvolver essas políticas, a Secretaria de Estado de Educação, buscando a melhoria
significativa do ensino e da aprendizagem, incentiva práticas pedagógicas comprometidas com a
emancipação e cidadania dos trabalhadores sul-mato-grossenses.
Assim, um conjunto de iniciativas didatico-pedagógicas foi pensado junto ao
professorado, culminando com a construção deste material de apoio didático para os componentes
curriculares de Língua Portuguesa, Ciências e História.
Este referencial deve ser incorporado à contextualidade histórica, valorizando a
experiência extracurricular do educando.
Dessa forma, o Governo do Estado de Mato Grosso do Sul assume o compromisso com a
qualidade social da educação dos seus jovens e adultos.
Prof. Hélio de Lima
Secretário de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul
Gosto de ser gente porque a História em que me faço com os outros
e de cuja leitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de
determinismo.
(Paulo Freire)
Aos alunos
Este livro foi carinhosamente pensado para seu aprendizado. As disciplinas escolares são
nossas ferramentas na arte do aprender a conhecer, aprender a ser, aprender a fazer e aprender a
conviver. No entanto, cada uma delas, como se fosse uma ferramenta única tem a sua
especificidade própria. E o aprendizado de História é, sem dúvida, aquele que nos remete a uma
série de análises, comparações, conclusões, permitindo-nos, a partir dele, formular nossas
opiniões, nossas ações ou intervenções diante de um contexto social complexo e desafiador como
o é a sociedade pós-moderna. Mãos a obra e bons estudos.
Aos Professores da Educação de Jovens e Adultos
Quando se propõe um caminho que deverá orientar nossa prática pedagógica é preciso
compreender que o mesmo está relacionado a uma determinada visão de mundo e, é a nossa
reflexão sobre essa relação que nos permitirá definir uma teoria que oriente nossos objetivos,
estratégias, metodologias, avaliações e outros encaminhamentos sobre o que ensinamos.
O ensino da História deve partir de problemas atuais com as interrogações colocadas pelo
presente, para uma melhor compreensão dos problemas do hoje, fundamentados no conhecimento
do passado. É esse “ir” e “vir” no tempo que caracteriza a História. Assim o estudo do passado
permite a compreensão do presente e por sua vez o presente é que projeta a perspectiva para o
futuro.
Dessa maneira, a abordagem deste material, pensado em particular aos educadores e
alunos da Educação de Jovens e Adultos, tem como ponto de partida a História da Província de
Mato Grosso no século XVI as primeiras décadas do século XX. Para isso utilizamos diferentes
estratégias de ensino como: tabelas, imagens, mapas, opiniões, textos jornalísticos, letras de
música, poemas, dentre outros.
Outrossim, reiteramos que as sugestões de trabalho poderão ser acrescidas de outros
materiais e estratégias que o(a) professor(a) selecionar para enriquecimento do ensino.
Os professores elaboradores de História
Índice
Cap. I - O Processo de Ocupação Paraguaia e o Movimento em Direção a Mato
Grosso
Cap. II - Primeiro Núcleo Populacional de Mato Grosso; a Chegada dos Jesuítas e o
seu Trabalho em MS
Cap. III - Povos Indígenas de MS na Atualidade; Consolidação do Território;
Ocupação da Banda Meridional: o Pantanal Sul-Mato-Grossense; o Avanço para o
Sul da Capitania de Mato Grosso
Cap. IV - As Tensões na Fronteira e o Conflito com o Paraguai
Cap. V - A Situação da Província no Pós-Guerra e os Problemas Relativos à Mãode-Obra Indígena
Cap. VI - A Recuperação da Província de Mato Grosso: Novos Impulsos ao
Comércio e a Produção; o Crescimento do Capital Financeiro, as Exportações de
Capitais e as Transformações na Fronteira; o Substancial Crescimento do Rebanho
Bovino e o Desenvolvimento das Charqueadas
Referências Bibliográficas
9
19
33
47
53
63
79
CAPÍTULO I
O Processo de Ocupação do Paraguai e o Movimento
de Expansão em Direção a Mato Grosso
Instituto Luís de Albuquerque (ILA) - Corumbá
O estudo da história nos possibilita realizar muitas “viagens” onde podemos constatar
os feitos dos atores em diferentes espaços e em diferentes temporalidades. E por falarmos em
viagem, relacione os atuais meios de transporte com aqueles utilizados no século XVIII, as
monções e o transporte terrestre sob o lombo de mulas.
Nossos estudos iniciam-se a partir da observação e análise da tabela abaixo:
Brasil
EUA
Alemanha
Japão
França
Ex-URSS
Paraguai
TRANSPORTE DE CARGAS NOS ANOS 1990
Rodoviário
Ferroviário
70%
18%
25%
50%
18%
53%
20%
38%
28%
55%
04%
83%
47%
04%
Hidroviário
12%
25%
29%
42%
17%
13%
49%
Fonte: CESP 1995 apud OLIVA, Jaime; Roberto Giansanti. Espaço e Modernidade: temas da
geografia mundial. São Paulo: Atual, 1999.
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1 - Analise a tabela e justifique a seguinte afirmativa: “o Brasil é um país em vias de desenvolvimento e utiliza majoritariamente o transporte mais caro (o rodoviário) para escoar sua
produção”.
2 - Promova um debate com os colegas de sala de aula sobre as condições do sistema de cargas
em Mato Grosso do Sul, destacando os seguintes pontos:
- situação antiga e atual do sistema de cargas de Mato Grosso do Sul;
- aspectos que podem ser melhorados.
Antes de conhecer um pouco mais sobre a nossa história, lembramos que seria
interessante, se possível, que você tivesse à mão alguns mapas (mundi, do Brasil, do estado ou
outros) para se localizar melhor e tentar visualizar o trajeto percorrido pelos primeiros
colonizadores que aqui estiveram. Como você pode observar, nossa longa viagem está iniciando.
Para isto vamos ler o texto.
No começo do século XVI, os espanhóis estavam empenhados na busca de um caminho
marítimo que os conduzisse às Índias, rica em especiarias. Foi essa busca que os trouxe ao estuário
do rio da Prata.
a) A princípio, o continente americano não despertou muito interesse entre os navegantes
europeus. Foi Juan Diaz de Solis quem firmou um contrato com o rei espanhol Fernando V pelo
qual se comprometia a descobrir um estreito ou braço de um rio que lhe permitisse encontrar a
confluência interoceânica. Em 1516, Solis chegou à altura de Candelária, atual Maldonado, de
onde seguiu costeando terra firme, até entrar no Rio da Prata, acreditando que se tratava de um
estreito, e ali descobriu as ilhas de São Gabriel e Martin Garcia. Na costa uruguaia, desembarcou,
acompanhado de sete outros tripulantes, com o propósito de explorar a terra, porém, foi morto
pelos índios charruas (CHAVES, 1968, p. 33).
No retorno do restante da tripulação à metrópole, uma das caravelas naufragou próximo à
ilha de Santa Catarina. Desse incidente, salvaram-se, entre outros, Aleixo Garcia, Henrique de
Montes, Melchior Ramirez e Francisco do Porto, que ali permaneceram.
Em contato com os indígenas, os náufragos europeus formaram famílias, aprenderam usos
e costumes e se tornaram conhecedores da língua. Esse convívio permitiu que eles conhecessem
histórias importantes sobre a existência de metais preciosos, principalmente a prata, situados a
longa distância do litoral atlântico. Os indígenas falavam de uma serra e de um rei, cujo reino de
Paytiti era o centro produtor desse metal (QUEVEDO, 1984, p. 177).
b) No ano de 1523, de posse dessas informações, um desses sobreviventes, o português
Aleixo Garcia, à frente de uma expedição que contava com grande número de indígenas, liderou
uma caminhada desde a ilha de Santa Catarina até os contrafortes andinos. Abaixo, você pode ler
um trecho, em que o historiador Cortesão (1950, p. 54), fala sobre esse acontecimento:
A expedição de Aleixo Garcia atingiu o Paraná, atravessando o Iguaçu acima do salto de
Santa Maria, passou daquele rio ao Paraguai; que subiu; alcançada a atual região de Corumbá
(Mato Grosso do Sul) atravessou o Alto Chaco e penetrando entre os rios Pilcomaio e Grande ou
Guapai, alcançou a região de Potosi e Sucre, onde atacou algumas povoações incaicas, que
saqueou e cujos despojos a expedição carregou na sua retirada para o Paraguai. Aí Aleixo
Garcia enviou dois de seus companheiros para a base de Santa Catarina, com a notícia do êxito
da empresa e algumas amostras da prata e do ouro apreendidos. Pouco depois era assassinado
por motivos que se ignoram pelos índios.
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A expedição de Aleixo Garcia teve importante significado na medida em que confirmou a
existência de metais na região andina, antes mesmo de Francisco Pizarro dominar os incas, o que
estimulou a peregrinação de aventureiros ao rio da Prata, aguçando a ambição dos espanhóis e
levando-os a se estabelecerem na região.
Para continuar o intento de Solis, em 1520, a Coroa espanhola organizou uma nova missão,
colocando à frente Fernando de Magalhães que atingiu a ilha de São Lázaro, nas Filipinas, mas que
também foi morto pelos indígenas locais. A expedição foi concluída por Sebastião Elcano, que se
tornou o primeiro navegante a dar a volta ao mundo (BAEZ, 1991, p. 10).
c) Em 1526, a Coroa firmou contrato com Sebastião Caboto para realizar nova expedição,
seguindo a mesma rota de Magalhães a procura de especiarias. A expedição deixou, no mesmo ano,
o porto de Sanlúcar de Barrameda, na Espanha, com quatro embarcações e duzentos homens. Em
busca de mantimentos, Caboto chegou à costa da atual ilha de Santa Catarina, onde encontrou o
restante dos náufragos da frota de Solis, que lhe contaram a lenda sobre a “Serra de Prata”. Por isso,
resolveu afastar-se do objetivo inicial de sua viagem para tentar encontrar os metais mencionados
nessas histórias. Subiu, então, pelo rio Paraná até a desembocadura do Carcarana, onde construiu o
forte de Sancti-Spiritus, primeiro estabelecimento espanhol na região (CARDOZO, 1989, p. 4142).
A hostilidade dos indígenas e a falta de mantimentos fizeram, porém, com que Caboto
retornasse à Espanha, lá sendo desterrado por não ter cumprido o contrato, já que se desviara de sua
rota inicial.
d) A divulgação, na Corte Portuguesa, dos feitos de Aleixo Garcia e de suas descobertas
provocou imediata reação da Coroa. Uma vez deliberado que, por Santa Catarina, era possível
atingir a Lendária Serra de Prata, naturalmente se aguçaram as rivalidades entre lusos e espanhóis
em torno da posse daquela área. Imediatamente, uma expedição deixou o porto de Lisboa sob o
comando de Martim Afonso de Souza. A bordo, estava Henrique de Montes, cuja presença foi
significativa, pois ele ficara por mais de dez anos no litoral catarinense e conhecia bem a língua dos
indígenas e os caminhos que levavam às riquezas do Peru. Foi por sua inspiração que se organizou,
em 1531, a entrada de Pero Lobo, que partiu da Cananéia com quarenta espingardeiros e quarenta
besteiros para buscar as riquezas peruanas. Todos, porém, foram mortos pelos nativos, na
confluência dos rios Iguaçu e Paraná (CABEZA DE VACA, 1987, p. 41-42).
Apesar do insucesso, os portugueses não perderam as esperanças de alcançar as riquezas
almejadas. Antes de voltar para Lisboa, Martim Afonso de Souza, contrariando determinações
reais, fundou, em 1532, São Vicente e Piratininga que não se situavam na Costa do Pau Brasil. Esse
local, escolhido para a fundação das vilas, favorecia o acesso ao Paraguai e às minas do Peru, o que
revela o prioritário interesse dos portugueses que era a busca dos metais preciosos.
A preocupação dos espanhóis com as expedições portuguesas na região platina acabou por
acelerar o processo de sua ocupação. A certeza da existência dos metais atraía mercadores,
banqueiros e muitos aventureiros que buscavam enriquecimento fácil e rápido. Além disso,
Francisco Pizarro, que se havia apoderado do império Inca, em 1531, retornou à Espanha, levando
grande tesouro do Peru. A parte que cabia ao rei, o quinto real, ficou exposto à visitação pública por
muitos dias, causando forte impressão nos visitantes e estimulando novas descobertas (VILAR,
apud: GADELHA, 1980, p. 70).
Em 1534, o rei da Espanha assinou uma capitulação com Pedro de Mendonza, nobre
espanhol, para a conquista e povoamento das terras e províncias do rio da Prata. Você pode saber
um pouco mais sobre esse acordo, lendo a citação que segue.
Essa capitulação tinha dois objetivos básicos: consolidar a posse espanhola sobre a
região do rio da Prata e conquistar a propalada Serra da Prata. A área da província do Paraguai
limitava-se, ao norte, com a Capitania de São Vicente, pois a linha imaginária a separar os
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territórios de Espanha dos de Portugal passava sobre Iguape, no atual Estado de São Paulo; ao
sul, com o Rio da Prata; a leste com o oceano Atlântico e, a oeste, com a Província de Tucumán.
Possuía o Paraguai, portanto, jurisdição sobre os atuais Estados brasileiros do Paraná, Santa
Catarina, Rio Grande do Sul e sul de Mato Grosso (antiga Província do Itatim, hoje zona
pertencente ao Pantanal Mato-grossense), subindo daí até a bacia do Amazonas. Igualmente,
pertenciam ao seu território o Uruguai e a Argentina, com exceção da região de Tucumán. No
atual território boliviano, limitava-se com a Província de Santa Cruz de la Sierra (GADELHA,
1980, p. 46-47).
e) A expedição partiu de Sanlúcar de Barrameda, em 24 de agosto de 1535. Em 2 de
fevereiro de 1536, aportaram à margem ocidental do rio da Prata e ali levantaram um pequeno
forte, ao qual deram o nome de Santa Maria de Buenos Aires.
Esses primeiros conquistadores não se preocuparam em trazer para a América nenhum
instrumento de cultivo da terra, porque não havia intenção de introduzir qualquer tipo de produto
agrícola. Tinham um único propósito: encontrar metais e se apropriar daquilo que o indígena
produzia.
A princípio, os índios querandis receberam amistosamente os espanhóis, destinando-lhes
víveres, pescado e carne de caça para sua alimentação. Veja o que registrou em seu diário, Schmidl
(1947, p. 38), soldado bavário que acompanhou a frota de Pedro de Mendonza:
[...] nesse local encontramos os índios Querandis; ao redor de três mil homens com suas
mulheres e filhos foram eles que nos garantiram pescado e carne para nossa alimentação.
Durante quatorze dias forneceram diariamente todo o necessário para nossa esquadra, só um dia
deixaram de fazê-lo.
Quando os indígenas deixaram de fornecer víveres, o adelantado Pedro de Mendonza
ordenou um ataque para escravizá-los e garantir a alimentação do grupo. Os querandis reagiram e,
confederados aos charruas, resistiram e se deslocaram para o interior, impedindo a escravidão. Em
função disso, os espanhóis tiveram que conviver com sucessivos ataques promovidos pelos
nativos, que se opunham ao seu projeto de fixação, sendo obrigados a conseguir alimentos através
do seu trabalho, o que causou profundo mal-estar entre eles.
Atacados constantemente, isolados em um território hostil, os expedicionários foram
quase que completamente dizimados. Leia o que conta Schmidl (1947, p. 40-41) sobre essa
tragédia:
Os dias passados na recém fundada Buenos Aires foram de fome, a escassez de
alimentos era tamanha que não bastavam nem os ratos, nem as ratazanas, víboras nem qualquer
outro animal asqueroso, também os sapatos de couro tiveram que ser comidos.
Diante dessa situação de fome, miséria e desencanto, Pedro de Mendonza enviou seu
ajudante Juan de Ayolas com a tarefa de encontrar víveres, buscar notícias sobre a terra e navegar o
Paraná, rio acima, para fundar um forte no mesmo local em que Caboto havia construído o
primeiro estabelecimento espanhol na região. Lá chegando, Ayolas ergueu uma fortificação que
recebeu o nome de Corpus Christi. Próximo desse sítio, entrou em contacto com os índios timbus.
Bem recebido pelo cacique principal, promoveu, então, uma aliança com esses naturais, que
passaram a lhe fornecer víveres.
Posteriormente, Ayolas regressou ao forte de Buenos Aires, levando mantimentos para os
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que ficaram, aliviando, assim, a situação de penúria em que se encontravam os espanhóis.
Como estavam sendo perseguidos pelos indígenas, Mendonza decidiu mudar-se com seus
expedicionários para o forte de Corpus Christi, onde a resistência por parte dos naturais era menor.
Deixou o comando do porto de Buenos Aires com o Capitão Francisco Ruiz Galan, com pequena
guarnição de soldados. Já em território dos timbus, fundou um novo forte que recebeu o nome de
Nossa Senhora da Boa Esperança. Nesse novo sítio, superadas as dificuldades iniciais, os
expedicionários iniciaram os preparativos para procurar comunicação com o Peru, tendo como
principal objetivo encontrar a Serra de Prata. Juan de Ayolas, incumbido dessa missão, saiu do
porto de Boa Esperança e subiu para a terra dos paiaguás, próxima da atual Bahia Negra.
f) A expedição subiu o rio Paraná e logo depois o seu afluente, o rio Paraguai. Nas margens
deste último, no local denominado pelos indígenas de Lambaré, os espanhóis entraram em contato
com os cários, índios agricultores e sedentários que estavam em condições de produzir os
alimentos necessários para a subsistência dos espanhóis, enquanto estes desenvolvessem sua
empresa de buscar metais preciosos e achar um caminho para o Peru. Depois de enfrentarem tantas
dificuldades, veja o que Schmidl (1947, p. 54) escreveu sobre o que ele e seus homens encontraram
nessa região:
Ali nos deu o Todopoderoso sua graça divina, os Cários tem trigo turco e uma raiz que
chamam mandiotin, batatas, mandioca-paropí e pepirá [...]. Os Cários têm peixes e carne de
veados, porcos, avestruzes, galinhas e gansos em divina abundância.
Essas palavras mostram a importância que tiveram as relações entre os espanhóis e os
índios guaranis e o papel de Assunção como ponto de apoio para a conquista da região.
Os cários pertenciam à nação Guarani, eram agricultores, plantavam, sobretudo, mandioca e milho
e completavam sua alimentação com os produtos obtidos da caça, da pesca e da coleta. Fizeram
uma aliança defensivo-ofensiva e de parentesco com os espanhóis, o que facilitou a permanência
definitiva dos europeus no território. Embora se tivessem armado e feito guerra aos invasores,
foram vencidos pelo melhor preparo militar e superioridade das armas espanholas (METRAUX,
apud GADELHA, 1980, p. 74).
Essa aliança, que a princípio pareceu útil aos dois grupos, pois protegia os indígenas
sedentários dos ataques promovidos pelas tribos nômades inimigas, não impediu, mais tarde, o
abuso e a opressão contra eles.
Depois de dominar os cários, os espanhóis se instalaram em seus territórios, à margem
esquerda do rio Paraguai. Organizaram, então, pequenas chácaras, onde viviam com índias que
lhes foram doadas pelos caciques.
Tal oferta tinha origem no pensamento dos Guaranis de que suas relações de trabalho
deviam estar baseadas no parentesco. A reciprocidade na prestação de serviços era, assim,
assegurada, porque guaranis e espanhóis prestavam-se serviços mútuos (BASTOS, 1972, p. 63).
A poligamia constituiu a base familiar da nascente sociedade paraguaia, fator de miscigenação e,
conseqüentemente, origem de vasta prole mestiça.
Para reflexão:
1 - O que você já ouviu falar sobre a civilização Inca? Pesquise onde se localizavam e que
relações existia entre ela e os primeiros conquistadores espanhóis.
2 - A poligamia era uma prática comum entre os nativos da América. Em grupo, faça uma
pesquisa sobre o comportamento dos índios sul-mato-grossenses em relação a essa prática.
Escreva um comentário e socialize através de um seminário.
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No Paraguai, a aliança cário-espanhola foi responsável pela sobrevivência e pela expansão
geográfica da colonização. Os indígenas serviram de intérpretes, guias, soldados e escravos. Além
disso, sua organização social ofereceu uma base econômica que permitiu aos espanhóis
continuarem a procurar um caminho que os levassem às riquezas lendárias.
Durante este período, agravou-se o estado de saúde de Pedro de Mendonza, o que não lhe
permitiu continuar à frente da expedição. Acabou morrendo em alto-mar, quando regressava à
Espanha, deixando Ayolas em seu lugar (CARDOZO, 1987, p. 53-54).
Ayolas tratou de dar continuidade à missão de atingir o Peru. Partiu, águas acima, pelo rio
Paraguai, onde encontrou um porto natural batizado de Nossa Senhora da Candelária. Deixou Irala
nesse local com instruções para guardá-lo por seis meses e internou-se pelo Chaco, atingindo a
região de Charcas, de onde retornou com grande quantidade de metais. Em seu regresso,
enfraquecido pelas muitas doenças que contraiu e sem munições, foi morto pelos paiaguás
(CABEZA DE VACA, 1985, p. 234).
Depois de confirmada a morte de Ayolas, Irala elegeu-se chefe, ao retornarem a Assunção,
após breve disputa pelo comando. No governo, Irala tratou de organizar a “Casa Forte” de Nossa
Senhora de Assunção, fundada por João de Salazar, e que deu origem à cidade do mesmo nome, e
de transferir para Assunção todos os que se encontravam em Buenos Aires (SCHMIDL, 1947, p.
65). Justificou sua atitude argumentando que eram muito poucos para se manterem em pontos tão
distantes e que deveriam concentrar esforços em um só local para alcançar o principal objetivo da
expedição, que era o de localizar as fontes de metais preciosos.
O Paraguai vivia como zona extremamente pobre, porque não possuía moeda e nem
produtos de exportação. As atividades se limitavam à pequena lavoura e à criação. Além disso, não
podiam adquirir escravos africanos pois não dispunham do capital necessário para isso. O
isolamento foi um traço significativo dessa sociedade; a ausência de contatos com os comerciantes
metropolitanos foi quase total, já que não havia o que levar e nem mesmo recursos para comprar. A
mão-de-obra indígena constituía a única riqueza de que o colono podia dispor, uma vez que a terra,
relativamente abundante, não tinha valor comercial e era obtida por doação real. Toda a atividade
produtiva recaia sobre o indígena. Cabia à mulher o cultivo da terra, a colheita, a produção de
objetos de cerâmica, a indústria de tecelagem e o trabalho doméstico. Os homens se ocupavam em
derrubar e queimar as matas para as plantações, construir as tabas, caçar e pescar.
Irala, como forma de premiar os primeiros colonizadores e também aliviar as dificuldades que
enfrentavam, distribuiu terras e índios de serviços entre eles. Os índios foram repartidos na
condição de encomendados, alguns foram levados para Assunção com o propósito de serem
empregados em obras públicas (GADELHA, 1980, p. 76).
O governador preparava uma nova expedição para encontrar os caminhos que levassem ao
Peru e à Serra de Prata, porque esse era seu objetivo principal. Por isso, havia mandado construir
alguns navios, porém a nova entrada foi adiada, visto que, em fevereiro de 1542, chegava a
Assunção um novo governador, Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, que suspendeu a operação
(CABEZA DE VACA, 1987, p. 23).
Cabeza de Vaca governou menos de dois anos. Aproveitou-se de sua posição para assumir
o comando da entrada preparada por Irala, com o que adquiriu prestígio aos olhos dos
assuncenhos, sempre desejosos de encontrar o caminho para o Peru. Deixou Assunção em outubro
de 1543, com dez bergantines e quatrocentos espanhóis; entrou no atual estado do Mato Grosso do
Sul, explorou o pantanal e chegou ao porto de Los Reys, de onde deu partida para descobrir aqueles
sertões e suas populações.
A entrada foi feita por terra. Assim que adentraram o continente, os espanhóis deram-se
conta de haver tomado um caminho despovoado e de mata fechada. Começaram a faltar víveres e
pareceu melhor ao governador retornar ao porto de Los Reys. Nesse local, além de falta de
mantimentos, os expedicionários foram acometidos por sezões que atingiram a quase todos,
inclusive Cabeza de Vaca, fazendo muitas vítimas fatais (CABEZA DE VACA, 1987, p. 213).
Os indígenas socorinos, xaqueses, guaxarapós e guatós aproveitaram-se da situação em
14
que se encontravam os europeus para desferir sucessivos ataques, matando muitos deles. Além
disso, as águas dos rios começaram a subir, alagando toda a terra e impossibilitando, assim,
qualquer descobrimento. Acuados por essas dificuldades, o governador e seus expedicionários
foram obrigados a retornar a Assunção.
O fracasso da expedição, a política indigenista adotada por Cabeza de Vaca, que proibia
capturar índios e escravizá-los, bem como sua oposição à instituição da família poligâmica, fez
com que passasse a ter inimigos poderosos entre os conquistadores, criando um clima de
resistência. Todos estes fatores fizeram com que fosse deposto (CHAVES, 1968, p. 159-160).
Em uma região muito pobre que não dispunha de riquezas metálicas e de produtos que
despertassem o interesse do mercado mundial, proibir o aproveitamento do indígena no processo
de produção era condenar ao trabalho o colonizador europeu, que não veio para a América com
esse intuito, mas em busca de riquezas e lucros rápidos. O cultivo da terra, como quaisquer outros
trabalhos de produção, deveria, segundo o colonizador, ser realizado pelos naturais, uma vez que
os espanhóis não dispunham de capitais para importar escravos negros.
Para reflexão:
1 - Realizar um estudo sobre as relações econômicas e de trabalho, durante o século XVI, no
Paraguai e no Brasil.
2 - Faça uma discussão sobre o aproveitamento da mão-de-obra indígena no processo de
produção do período colonial brasileiro.
Após a deposição de Cabeza de Vaca, voltou a ocupar o cargo Domingo Martinez de Irala,
que iniciou um período de guerra civil, tendo, de um lado, os alvaristas, fiéis seguidores de Cabeza
de Vaca e, de outro, os seguidores de Irala.
Em seu diário, Schmidl (1947, p. 96) registra o seguinte:
Depois que foi enviado o capitão general Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, de volta a
Espanha, estivemos em guerra, guerreávamos entre nós mesmos, o diabo nos governava nesse
período, ninguém estava seguro do outro. Quando os índios que eram nossos amigos
perceberam que estávamos divididos, planejaram se aproveitar daquela situação para matar
todos nós.
Os cários aliaram-se aos seus tradicionais inimigos, os agaces, e se lançaram contra os
invasores numa guerra que durou cerca de um ano e meio. Percebendo o perigo que representava
aquela frente de indígenas, os espanhóis se uniram novamente contra eles, derrotando-os em
diversas ocasiões. Milhares de indígenas foram exterminados, e, por volta de 1546, os
sobreviventes acabaram rendendo-se ao domínio espanhol.
A ferro e a fogo, Irala sufocou a insurreição indígena. Em 1547, já tinha o completo
controle da situação e, aproveitando-se das experiências anteriores de Ayolas e de Cabeza de Vaca,
empreendeu nova expedição. Navegou pelo Paraguai até o morro de São Fernando, local hoje
conhecido como Pão de Açúcar, em território sul-mato-grossense. Nesse sítio, deixou uma
guarnição para que se ocupasse da vigilância das embarcações e entrou por terra em direção ao
Peru, acompanhado de um grupo de espanhóis e de um grande contingente de indígenas,
especificamente guaranis. Ao atingir, em 1548, o território de Charcas, em terras peruanas,
constatou que as mesmas já estavam ocupadas por patrícios seus. Desfez-se, dessa forma, o sonho
dos colonizadores de Assunção de se apossarem daquelas riquezas (CABEZA DE VACA, 1987, p.
24).
15
Após a malograda entrada, os espanhóis não mais procuraram explorar o território
existente ao norte e nordeste do rio Taquari. Por pouco não atingiram as minas de ouro de Cuiabá.
No retorno, os expedicionários lutaram com violência e crueldade contra os indígenas
chaquenhos, escravizando-os em grande número e levando-os para Assunção. Era a compensação
possível para aliviar as frustrações daquela aventura malsucedida. Lá chegando, terminando o
encanto e a atração que exerciam as minas do Peru, trataram de abrir novas vias de comunicação e
comércio no sentido leste e sul, visando expandir a província do Paraguai.
Em princípios de 1553, Irala tratou de fundar o porto de San Juan, na costa oposta de Buenos Aires,
que serviria de escala para as embarcações que vinham da Europa. A ação dos índios charruas e
chana impediram, através de constantes ataques, o desenvolvimento desse núcleo, sendo seus
moradores obrigados a abandoná-lo (AZARA, 1987, p. 134).
Por essa mesma época, os nativos do Guaíra se deslocaram para Assunção com o propósito
de pedir proteção aos espanhóis. Veja o que aconteceu:
[...] Chegaram a Assunção alguns índios da Província do Guaira e solicitaram a proteção de Irala
contra os insultos que lhes faziam os portugueses, cativando-lhes e levando-lhes para a costa
brasileira, onde os vendiam como escravos” (AZARA, 1987, p. 134).
Diante dessa situação, o governador partiu, em fins de 1553, para a província do Guaíra, na
região do Salto, com o objetivo de combater os portugueses e conhecer a região, levando consigo
uma companhia de soldados. Cruzou o rio Paranapanema em perseguição aos traficantes dos
guaranis, atingindo o Anhembi ou Tietê, e, juntamente com os colonos portugueses, castigou os
tupis (AZARA, 1987, p. 135).
De volta, resolveu fundar nova povoação, tendo enviado, em 1554, o conquistador Garcia
Rodrigues de Vergara que, acompanhado de sessenta soldados, fundou Ontiveros, à margem
esquerda do rio Paraná, uma légua ao norte do salto de Guaíra.
A partir de 1555, a Corte de Madrid determinou que as ligações do Prata com o Peru fossem
interrompidas e proibiu também o uso de moedas no Paraguai para limitar as relações de comércio
nas áreas coloniais. Ou seja, a metrópole procurava evitar os descaminhos da prata e impedir que
as recentes descobertas de Potosi escapassem do controle das autoridades (BASTOS, 1972, p. 82).
Para reflexão:
1 - Como eram estabelecidas as relações comerciais entre as metrópoles Portugal/Espanha e
as colônias Brasil e Paraguai.
2 - Com um mapa, procure identificar as rotas comerciais entre as colônias e suas
respectivas metrópoles.
Você observou que foram tomadas medidas pela corte espanhola para proteger as zonas
produtoras de metais. Tais ações, acabaram por confinar o Paraguai, uma vez que ele não poderia
ter relações de troca com as áreas mais prósperas e também porque estava fora das rotas
comerciais. O tráfico era realizado, na Espanha, através dos portos de Cadiz e Sevilha, e, no
continente americano, por Havana, Vera Cruz, Portobelo e Cartagena. As rotas do Atlântico sul
achavam-se excluídas e toda a atividade comercial era realizada por meio do mar das Caraíbas e do
istmo do Panamá. Em conseqüência dessa situação, os assuncenhos foram obrigados a abrir novas
frentes de expansão, a fim de romper com o isolamento a que estavam submetidos.
A fundação de Ontiveros e, posteriormente, de Ciudad Real não deverão ser entendidas
como um obstáculo ao comércio entre portugueses e espanhóis; pelo contrário, visava impedir
16
abusos e discipliná-los. Os portugueses deveriam pagar pelas peças indígenas que estavam em
território da Coroa castelhana, como fizeram em anos anteriores, quando negociavam com o
próprio governador do Paraguai.
Segundo Henrique de Gandia (1936, p.16): “Juan de Salazar deixou registrado em uma
carta escrita em São Vicente que os portugueses traziam escravos do Paraguai e os que faziam o
tráfico, afirmaram que Domingo de Irala tinha conhecimento daquelas transações”.
A cidade de Ontiveros não prosperou. Dois anos após a sua fundação, Nuflo Chaves levou
o restante de sua população a três léguas ao norte de seu local original, na confluência do rio Paraná
com o rio Piquiri, dando-lhe o nome de Ciudad Real. Irala, que ordenou essa mudança, justificou:
“[...] Fundar uma cidade na Província de Guaíra, por ser escala e passagem do caminho para o
Brasil [...]” (GUZMAN, 1979, p. 123).
Em correspondência com o Marquês de Mondejar, Presidente do Conselho das Índias, o
governador mostrava-se preocupado com a presença de portugueses nas proximidades do rio
Paraná, cativando naturais e, possivelmente, pensando em estabelecer-se na região, através da
construção de algum povoado em terras da Coroa Espanhola. Dizia ele:
[...] Alguns portugueses de São Vicente tem vindo ao rio Paraná e capturado nativos da região
levando-os para serem vendidos como escravos.
Para evitar prejuízos maiores decidimos pela povoação dessas áreas para impedir ações dos
portugueses, evitando assim que a população local continue sendo escravizada pelos paulistas
(LAFUENTE MACHAIN, 1939, p. 539).
Avançando a colonização e fundando cidades nas margens do rio Paraná, Irala procurava
assegurar a posse dessas regiões e obter o controle da mão-de-obra indígena, que estava sendo
levada para São Paulo pelos portugueses, gratuitamente. Essas pequenas cidades, localizadas em
pontos estratégicos, sempre próximas dos grandes rios e de seus tributários, constituíam meio de
garantir a soberania espanhola, a posse e a colonização da área, de limitar a expansão portuguesa e
de facilitar a comunicação e, conseqüentemente, o comércio e a administração. Portanto, essas
fundações no Guaíra, na ilha de Santa Catarina e, posteriormente, em Mato Grosso, refletem o
conflito que já existia entre espanhóis e portugueses pela posse da mão-de-obra indígena.
Mais tarde, após a morte de Irala, durante o governo de Soares de Toledo, continuou a
ocupação de Guaíra. Em 1570, Ruy Diaz de Melgarejo fundou Vila Rica do Espírito Santo, a
sessenta léguas da costa oriental do rio Paraná. Juan Garay também fundou, em 1573, na margem
direita do mesmo rio, um pequeno forte que recebeu o nome de Santa Fé de Vera Cruz, localizado
exatamente na metade do caminho que liga Assunção ao estuário do Prata.
Em 1593, os espanhóis chegaram a Mato Grosso e fundaram Santiago de Xerez, primeiro
núcleo de povoação do centro-oeste brasileiro. Ainda no mesmo ano, Juan Garay fundou, pela
segunda vez, Buenos Aires, no mesmo local em que Pedro Mendonza o fizera há
aproximadamente quarenta anos.
O período que se estendeu desde a tentativa frustrada da fundação do porto de San Juan até
o estabelecimento de Santiago de Xerez e a reedificação de Buenos Aires é conhecido como o ciclo
do expansionismo assuncenho.
Desde a região do médio Paraguai até o planalto paranaense, a conquista e a colonização
espanhola se efetuou através de grupos de pessoas vindas de Assunção. Saíam liderados por algum
conquistador para fundar novas cidades, levando soldados, agricultores, animais e instrumentos
agrícolas.
Esse movimento de expansão territorial obedeceu a um sentido de unidade, uma vez que os
colonizadores que o impulsionavam traziam consigo os mesmos valores, sonhos e objetivos.
Frustradas as tentativas de atingir o Peru, cuja entrada fora proibida por ordens reais (a bem
17
da verdade, nem sempre cumpridas), Irala e a principal nobreza de Assunção passaram a
desenvolver um plano de expansão territorial que visava romper o isolamento a que estava
submetida a província. O objetivo prioritário era o de atingir duas áreas: o Guaíra, no Paraná e o
Itatim, em Mato Grosso.
Ante a impossibilidade de sustentar núcleos povoados na entrada do rio da Prata, os
paraguaios trataram de assegurar as terras guairenhas garantia fundamental para se estabelecer
comunicação entre Assunção e o litoral de Santa Catarina, região em que se deveria fundar um
porto que ligasse o Paraguai à Espanha. Procuravam, assim, conseguir, o mais rapidamente
possível, comunicação com a Europa e abrir o Paraguai ao comércio espanhol. A tentativa não
trouxe resultados positivos, já que, em princípios de 1557, o porto de San Francisco, única
possessão espanhola na costa atlântica, fora abandonado pelos seus habitantes, que se
encontravam à mercê de sua própria sorte.
O estabelecimento do Itatim era muito importante, porque essa região era a porta de
entrada ao Peru, e o sonho acalentado pelos assuncenhos era o de participar do comércio na região
mais próspera das colônias espanholas.
Outro aspecto que justifica a expansão em direção ao Itatim são as boas condições que a
região oferecia ao povoamento. A predominância da população guarani nessas áreas, além da
facilidade do trato, asseguraria a manutenção dos europeus.
Por outro lado, os próprios encomendeiros já se organizavam e exigiam o avanço da
colonização, uma vez que enfrentavam problemas quanto ao reduzido número de índios de
serviço. Essa situação não atendia aos interesses dos exploradores, e, por isso, procuravam novos
territórios onde houvesse habitantes que poderiam ser explorados.
Os conquistadores nunca deixaram de sonhar com a possibilidade de encontrar metais
preciosos. Essa busca de novos territórios foi uma das razões da expansão em direção ao planalto
do Paraná e de Mato Grosso.
Atividades:
1 - Explique o processo de povoamento e expansão do território brasileiro no período colonial,
principalmente no Estado de Mato Grosso do Sul.
2 - Segundo informações fornecidas pelos historiadores, os povos nativos apenas dificultaram
a instalação do europeu na América. Até que ponto essa afirmação pode ser considerada
verdadeira?
3 - No princípio da colonização, o indígena se constituiu como o mais valioso elemento de
cultura. Por intermédio desse nativo, o colono europeu enriqueceu sua dieta com uma série de
alimentos (mandioca, milho, inhame ou cará, mel de abelhas etc.), além de passar a usar
remédios conhecidos pelos índios. Como é possível entender a importância do indígena, no
processo de colonização, conhecendo seus hábitos e costumes?
4 - Santiago de Xerez, primeira cidade sul-mato-grossense, fundada pelos espanhóis, começou
a ser estudada nos últimos trabalhos das universidades locais, mostrando, assim, a importância
que teve no processo de colonização. Procure localizá-la em um mapa e descubra sua
importância estratégica no momento de sua fundação.
18
CAPÍTULO II
Primeiro Núcleo Populacional de Mato Grosso; A
Chegada dos Jesuítas e o Seu Trabalho em
Mato Grosso do Sul
Escadaria da XV de Novembro - Conj. Histórico do Casario do Porto (Corumbá)
Um grande obstáculo para a
colonização européia na América foi
o clima quente, que impedia o cultivo
do trigo, alimento básico do europeu.
Aqui o trigo foi substituído pela
mandioca indígena. Talvez por ser
valiosa contribuição indígena, foi, por
muito tempo chamada de pão dos
pobres. Até as hóstias, os padres
jesuítas faziam com a farinha da
mandioca.
No passado, ela foi um dos
principais produtos que garantiu a
vitória da colonização. Hoje, a
mandioca passa a ser encarada como
um produto estratégico.
Mato Grosso do Sul plantou,
em 2003, 30 mil hectares de mandioca
e já existem, no Estado, 17 unidades
industriais para seu beneficiamento.
Para entender a importância
histórica da mandioca e a sua
contribuição, hoje, para o seu Estado,
na garantia de novos empregos e
atração de investimentos, leia com
atenção a reportagem abaixo para
posterior análise:
A MANDIOCA PASSA A SER UM PRODUTO ESTRATÉGICO
Agora a mandioca passa a ser encarada em Mato Grosso do Sul como um produto
estratégico. Por isso, a Câmara Setorial da Mandioca passa a atuar de forma planejada, para
acabar com o ciclo de safras excelentes e safras péssimas, que foi resultante justamente de uma
falta de planejamento que fazia com que os produtores plantassem quando o preço estava bom,
muito embora a boa safra resultasse na derrubada do preço na safra seguinte.
Hoje Mato Grosso do Sul tem 17 unidades industriais de beneficiamento da mandioca, e
estão protocoladas junto ao Conselho de Desenvolvimento Industrial - CDI, da Secretaria de
Produção, 17 outros empreendimentos que deverão representar investimentos de R$ 116
milhões no segmento.
19
Também está garantido que mais de 40 projetos e ações serão desenvolvidas pelos
parceiros da Câmara Setorial da Mandioca visando a melhor articulação e à construção coletiva
de estratégias.
Só para se ter uma idéia do que cresceu a atividade no Estado, em 2002 foram efetuados
apenas 265 contratos de crédito rural no Estado, num montante de R$ 1 milhão e 903 mil. Em
2003, o número de contratos aumentou para 2.418, atingindo o montante de R$ 12 milhões e
365 mil em crédito. E 13 indústrias aderiram ao sistema de parcerias.
(Mauricio Hugo. In: Jornal Correio do Estado, Campo Grande, MS, 09 -02-2004)
Atividades:
1 - Faça um comentário por escrito sobre a notícia publicada no Jornal Correio do Estado.
2 - Por que a mandioca passou a ser um produto estratégico no Mato Grosso do Sul?
3 - Cite alguns produtos que podem ser produzidos a partir da mandioca.
4 - O hábito de se consumir a mandioca, aqui no Estado, é um legado de quem?
5 - É sabido que, em outros estados ou regiões do país, a mandioca recebe nomes diferentes.
Consulte o professor (ou um dicionário) para saber quais são e registre.
1 - O Avanço Espanhol e a Fundação de Santiago de Xerez, Primeiro Núcleo
Populacional de Mato Grosso
O Itatim se revestiu de grande
importância durante os séculos XVI e XVII,
pois era através do porto localizado abaixo da
embocadura do rio Mbotetei que os espanhóis
mantinham comunicação com o Peru. Foi nessa
região que se instalaram os primeiros colonos,
tentando romper com o isolamento com que
estavam submetidos e buscando alternativas
para desenvolverem suas atividades de
produção.
Segundo o padre Diego Ferrer, o
Itatim estava situado na altura dos paralelos
19,5º e 22º, tendo como limites, ao norte, o rio
Mbotetei, ao sul, o rio Apa, a leste, a Serra de
Maracaju e, a oeste, o rio Paraguai. A terra era
muito áspera e, por isso, se chamava Itatim (que
quer dizer pedras com pontas), pelos muitos
pedregais que existiam nela (CORTESÃO,
1951, p. 29-30).
Tratava-se de zona estratégica de
comunicação entre o Brasil e o Peru, entre o
vale do Paraguai e do Amazonas (CORTESÃO,
1951, p. 4).
Embora bem conhecida pelo seu
valor estratégico, a primeira cidade espanhola
de Mato Grosso, Santiago de Xerez, foi
fundada em 24 de março de 1593, por Ruy Diaz
Igreja Matriz - Aquidauana
20
de Guzman, na margem direita do baixo curso do rio Muney, hoje Ivinhema, no atual município
sul-mato-grossense de Naviraí. Portanto, muito longe de Itatim (MARTINS, 2002, p. 248).
No ano de 1600, Guzman transferiu Santiago de Xerez para um lugar mais ao norte, à
margem esquerda do Mbotetei, voltando a experimentar novas dificuldades. Acabou, entretanto,
por assentá-la, definitivamente, contrariando os interesses em Assunção, num sítio localizado a
20º23'08” latitude sul, 55º50'34” longitude oeste, às margens do rio Aquidauana, cerca de 30
léguas acima da confluência deste último com o Miranda.
Santiago de Xerez, quando transferida das barrancas do Ivinhema, foi erguida nas
proximidades do rio Aquidauana, que era chamado pelos espanhóis de Mbotetei, nome dado
também ao atual rio Miranda.
Santiago de Xerez, foi resultado de uma busca de um caminho para o Peru. As ligações
comprovadas desse território com os Andes, através de diversas expedições, foram decisivas para
seu estabelecimento. Ficava a apenas quatrocentas léguas de Potosi e, apesar das dificuldades de
acesso, a possibilidade de contato com as regiões produtoras de metais animava os colonos. Sua
fundação constituiu um ato de desobediência civil, já que os espanhóis estavam proibidos de
estabelecer comunicação e comércio entre as áreas coloniais, principalmente com regiões
argentíferas. A fundação da cidade se deve, ainda, a proximidade das minas de prata que os
espanhóis supunham existir na cordilheira do Amambaí.
Outra razão que contribuiu, decisivamente, pela vinda dos espanhóis à região foi a grande
quantidade de índios guaranis nela existente, que, em sua maioria, era sedentária e de fácil trato e já
praticava a agricultura.
A notícia da existência de diversas nações indígenas na região despertou a cobiça em
muitos que, nessa época, sofriam as conseqüências da distribuição de encomendas, levada a cabo
pelo governador do Paraguai, Domingo Martinez de Irala, que beneficiou amigos e parentes,
enviando-lhes um grande número de indígenas. Para os demais exploradores, sobraram poucos
que, com o passar do tempo, consumidos pela brutalidade do trabalho, foram morrendo. Assim,
nessa época, passou surgir a figura do encomendeiro sem índios. A região era habitada pelos
nuaras. Gadelha (1980, p. 308) esclarece que todos os povos que habitavam desde o rio Miranda
até o Apa chamavam-se Itatins; Itatins eram nuaras, niguaras, guasorapós, entre todos guaranis.
Santiago de Xerez representava um reservatório de mão-de-obra. Na parte alta da cidade
estavam concentrados os nuaras, os conumyais, e os cuataguas, que falavam a mesma língua; eram
bons agricultores e já haviam entrado em contato com muito dos religiosos que andavam pela
região catequizando. Os nuaras, segundo Guzman, foram espontaneamente ao encontro dos
colonizadores, oferecendo seus préstimos por ocasião de sua chegada. Na parte baixa da cidade, às
margens do rio Mbotetei, estavam os guanchas, divididos em três povoados que reuniam,
aproximadamente, mil índios. Também ali estavam os guatós, divididos em dois grupos com cerca
de mil índios, e os guapis, com cem. Na base da Cordilheira, entre os rios Taquari e Mbotetei,
encontrava-se a nação guetu, com grande número de indígenas, a umas quinze léguas de Xerez.
Ainda muito próxima, encontrava-se outra nação, os nujaras, que contava, na ocasião, com cerca
de mil e duzentos indígenas. Todos esses grupos falavam línguas diferentes, eram nômades e, em
algumas ocasiões, costumavam cobrar tributos dos nativos que viviam da parte alta de Xerez.
Habitavam entre rios e lagoas e cultivavam arroz silvestre e o armazenavam em silos. Colhiam,
também, grande quantidade de algodão (CORTESÃO, 1951, p. 316, v. II).
As relações entre nativos e espanhóis foram amistosas somente no início da ocupação. Os
naturais serviam aos invasores, ao mesmo tempo em que produziam todo o necessário para sua
subsistência. Com o passar do tempo, porém, o abuso por parte dos invasores acabou deteriorando
as relações entre eles. Os espanhóis passaram a praticar todo o tipo de arbitrariedade contra os
indígenas e apropriavam-se de todos os produtos produzidos por eles. Em função da
superioridade bélica, exerciam um grande domínio sobre os nativos, que eram vistos como
propriedades suas e tinham que se ocupar das tarefas que mais convinham ao dominador. Todo o
trabalho considerado desonroso era, obrigatoriamente, feito pelo indígena. De certa forma, o
21
2 - A Chegada dos Jesuítas e os Desdobramentos do Trabalho Missionário em Mato
Grosso
O segundo núcleo de ocupação espanhol também se desenvolveu na região do Itatim,
através de uma frente missionária organizada pela Companhia de Jesus no século XVII. Esse
núcleo estava situado entre os rios Apa e Taquari.
As missões organizadas pelos jesuítas constituíram instrumento de expansão territorial, do
qual lançaram mão os espanhóis para a ocupação do continente americano.
No início do século XVII, o Estado Espanhol vivia uma séria crise econômica, não estando
em condições de arcar com as despesas decorrentes do processo de colonização de uma região que
não lhe oferecia retorno financeiro. Dessa forma, viu com bons olhos a iniciativa da Igreja Católica
que, através da Companhia de Jesus, se propunha a reduzir os naturais em aldeias para lhes
oferecer educação religiosa e fazê-los súditos de Sua Majestade, retirando, assim, dos seus
ombros, o encargo da colonização. Além disso, os indígenas, liderados pelos padres, seriam
naturais protetores das fronteiras, rechaçando os possíveis ataques dos inimigos, solução mais
barata para os enfraquecidos cofres da Coroa Espanhola, que não precisaria lançar mão da
construção de presídios para a defesa de seus territórios (GADELHA, 1980, p. 31).
Os primeiros jesuítas entraram no Paraguai, em 1588, tendo começado a desenvolver seus
trabalhos em Assunção. Logo, passaram a entrar nos povoados da província do Guaíra e do Itatim.
As missões ambulantes junto aos nômades, apesar dos êxitos alcançados, nunca
conseguiam formar comunidades sólidas e duradouras.
Quando os padres deixavam as suas áreas de atuação, os nativos voltavam à sua antiga
maneira de viver, entregavam-se à influência dos feiticeiros e abandonavam os ensinamentos
cristãos. Para pôr fim a essa situação, era necessário fixá-los nas proximidades de uma igreja, onde
a educação religiosa seria sistemática (LUGON, 1976, p. 31). Os religiosos identificaram ainda
outro obstáculo à evangelização: o serviço pessoal que, segundo eles, não deixava de ser uma
forma brutal de escravidão, pois provocava a separação de famílias e impedia os naturais de
receber educação religiosa.
A situação se mostrava favorável ao trabalho missionário. O governador do Paraguai,
Hernandarias, anunciou ao rei a incapacidade do seu governo de submeter os índios apenas por
meios militares e propôs o envio de religiosos para a catequese. Convencido das vantagens
econômicas e militares que poderiam resultar da solução recomendada pelos jesuítas, o rei Felipe
II ordenou que os indígenas fossem subjugados pelos ensinamentos do Evangelho.
A princípio, foram tomadas medidas que proibiam os colonos de organizarem malocas nas
províncias em que se estruturavam as reduções e de obrigarem os indígenas aldeados a prestarem
serviço pessoal. Em 1608, os padres da Companhia de Jesus se instalaram nos territórios do Guaíra
e, em seguida, no Tapes e no Itatim, onde iniciaram o trabalho de aldeamento.
Para reflexão:
1 - Quais eram as estratégias usadas pelos jesuítas para catequizar os indígenas?
As principais reduções surgiram em 1609, ocasião em que a Companhia de Jesus havia
decidido pela fundação de três missões: a primeira, na província do Guaíra e Tibajiba; a segunda,
entre os índios paranás; a terceira, entre os índios guaicurus, em futuro território sul-matogrossense.
A terceira missão mostrava a preocupação dos religiosos em buscar, assim como os
colonos, uma via de comunicação com o Peru.
Leia atentamente o que escreveu o padre Torres (apud GADELHA, 1980, p. 196):
22
Entre os frutos e resultados que esperamos da conversão e redução desses índios, o mais
importante é que não impeçam o tráfego de Assunção ao Peru que será de só cento e vinte
léguas, atualmente percorre-se em torno de quatrocentas léguas por caminhos despovoados que
impedem o comércio e a conversão de outras nações indígenas.
A missão dos guaicurus deveria dar grandes frutos, pois, facilitando a ligação entre
Assunção e o Peru, quebraria o isolamento econômico em que se encontrava o Paraguai.
Para iniciar esse trabalho missionário foram enviados os padres Vicente Griffi e Roque
Gonzáles, que chegaram em 1612. Preste atenção às dificuldades encontradas por eles, na ocasião:
Com os Guaicurus o contato foi mais difícil, e apenas temporário. Achavam-se
culturalmente em estágio mais primitivo de civilização, desconhecendo a agricultura e o amor
que prende o camponês fixado à sua terra. Por isso revelou-se, praticamente impossível reduzilos. Não era fácil obrigá-los a lavrarem a terra, preferindo os índios emigrarem sempre que a caça
se tornasse escassa, ou as enchentes e secas obrigassem a partir (GADELHA, 1980, p. 214).
Diante da impossibilidade de reduzir (subjugar) esses indígenas, a missão foi
definitivamente abandonada e, então, os religiosos resolveram priorizar o trabalho de aldeamento
entre os guaranis. Assim sendo, organizaram as primeiras reduções entre os índios itatins em Todos
os Santos de Guarambaré e Piticu, para onde foram enviados os padres Vicente Griffi, Baltazar
Seña e Francisco de San Martin.
O período de existência dessas reduções foi muito curto. Os padres enfrentaram grandes
dificuldades, inclusive a falta de alimentos: as refeições eram feitas de farinha de raízes e de carne
de caça, quando havia, e, na maioria das vezes, tão pouca que eles preferiam deixá-la para os
doentes. Além disso, a aldeia foi acometida, no primeiro ano, por uma epidemia que matou grande
número de seus moradores (CORTESÃO, 1951, p. 12-13, v. II).
Apesar dos grandes danos causados pela doença, a ação dos padres contribuiu para elevar
seu prestígio entre eles, pois tratavam dos enfermos, levando-lhes comida, além de oporem-se à
opressão do serviço pessoal e aos costumeiros aldeamentos que os portugueses e os espanhóis
impunham aos nativos.
Logo se ativou o ódio dos colonos contra os jesuítas. As reduções foram instaladas em área
anteriormente ocupada por colonos espanhóis, que nela possuíam índios encomendados. Tal
situação propiciou o surgimento de conflitos entre dois grupos, que culminaram com a expulsão
dos religiosos. Expulsos, os padres se refugiaram nas províncias do Guaíra e se envolveram no
trabalho que ali começava, contribuindo para a organização das primeiras reduções indígenas
naquela região. Conseguiram, num curto espaço de tempo, construir, aproximadamente, treze
aldeias, onde reuniram uma grande quantidade de naturais.
Por volta de 1628, porém, essas reduções foram invadidas e completamente destruídas
pelos portugueses de São Paulo, que levaram os índios aldeados na condição de escravos.
É necessário que se abra um parêntese para explicar os motivos pelos quais os portugueses
invadiram as reduções religiosas.
É que, em 1850, a morte do cardeal D. Henrique, Rei de Portugal, sem deixar herdeiros
diretos ao trono, levou o reino a uma crise político-dinástica. O parente mais próximo Felipe II,
Rei da Espanha acabou impondo-se como legítimo herdeiro, o que provocou a incorporação do
reino lusitano pela coroa espanhola, proclamando, então, a “União Peninsular” ou “União
Ibérica”.
Firmada a União, Felipe II embargou todo o tráfego holandês nos portos portugueses e
brasileiros, eliminando sua participação no comércio. Em conseqüência, os holandeses invadiram
23
Pernambuco e, mais tarde, estenderam seu domínio de Alagoas até a Paraíba. Submeteram grande
parte do nordeste produtor de açúcar, invadiram portos de escravos de São Tomé e Angola e
bloquearam o tráfego para as áreas coloniais não dominadas, especialmente a Bahia que,
imediatamente, se ressentiu da escassez de mão-de-obra. A solução de emergência foi a
escravização indígena, realizada maciçamente a partir de então pelos bandeirantes, os quais se
aproveitaram das aberturas criadas com a quebra de fornecimento de escravos ao Brasil, para
ampliarem o mercado de venda (SODRÉ, 1984, p. 115). O índio tornou-se, assim, mercadoria
altamente valorizada. Os portugueses que, desde a metade do século XVI, já conheciam os
caminhos que levaram aos guaranis, passaram a vir fortemente armados em sua busca.
Organizaram, então, grandes bandeiras, cujo objetivo principal era fornecer mão-de-obra aos
engenhos nordestinos. A população de São Vicente foi mobilizada para essa busca, permanecendo
na vila apenas os velhos, as mulheres e as crianças. Os bandeirantes lançaram-se, principalmente,
sobre as aldeias indígenas organizadas pelos jesuítas, onde eles estavam concentrados, dóceis e
acostumados ao trabalho agrícola.
Dessa forma, fugindo dos assaltos dos portugueses, religiosos entraram na província do
Itatim. Vieram muito bem orientados para fundar uma nova redução entre os índios itatins, que
sempre mereceram especial atenção dos jesuítas.
Os padres receberam amplos poderes para reunir os naturais em povoados e os governarem
sem qualquer dependência das cidades e fortalezas vizinhas. Além disso, podiam opor-se, em
nome do Rei, a quem quisesse sujeitar os novos cristãos ao serviço pessoal dos espanhóis sob
qualquer que fosse o pretexto (MONTOYA, 1985). O propósito dos jesuítas era fazer dos
indígenas, cristãos.
Quando os padres iniciaram seu trabalho no Itatim, as aldeias das mais diversas facções
estavam dispersas pelas florestas, sendo que cada uma delas reunia em torno de 100 a 200 famílias,
que dispunham de áreas que lhes permitiam viver perfeitamente bem. Esses guaranis, que eram
agricultores e cultivavam milho, mandioca, batata-doce e feijão, completavam a sua alimentação,
principalmente, com produtos da caça, da pesca e da coleta de arroz silvestre, de mel e de palmito.
O algodão nativo era colhido e fiado pelas índias, que ainda se dedicavam à cerâmica, em cujas
peças preparavam sua alimentação diária (FERRER, apud CORTESÃO, 1951, v. 2).
Antes da conquista, os guaranis não possuíam animais domésticos, à exceção de patos, de
papagaios e de macacos. A sua permanência entre os colonizadores foi que permitiu, bem mais
tarde, adotarem o galinheiro e a criação de bovinos, de eqüinos e de caprinos.
Entre os indígenas, as terras pertenciam ao coletivo, ou seja, a todos os membros de uma
aldeia, sendo que cada família tinha um lote particular, cultivado para o seu sustento. O
crescimento demográfico e o esgotamento do solo, devido ao uso de técnicas rudimentares, como
o emprego sistemático do fogo antes do desmate e, posteriormente, com a coivara, obrigavam os
indígenas a procurarem novos campos.
Ao adentrarem em uma nova comunidade e decidirem pela redução e exclusão do modelo
de aldeamento tradicional, os padres foram colocando o indígena sob o jugo da Igreja, e o seu
sucesso dependia, antes de mais nada, do rápido desenvolvimento da agricultura tradicional
indígena.
As reduções que se formaram no Itatim se organizaram no mesmo formato que as demais
reduções de guaranis do Paraná. Os povoados eram formados por palhoças rústicas no meio da
aldeia e, cada agrupamento desse, tinha áreas cercadas para criação de aves domésticas para o
abate. Os campos estavam reservados para o cultivo de cereais e de algodão e os pastos nativos
serviam às manadas de ovelhas, cabras, mulas, além do gado vacum e cavalar (DOCUMENTOS
PARA A HISTÓRIA DA ARGENTINA, 1929, p. 725/26, t. 20).
Porém, como você pode constatar, abaixo, o maior problema enfrentado pelos religiosos
foi fazer com que os guerreiros se tornassem agricultores:
24
É verdade, porém, que o esfôrço mais árduo, nos primeiros tempos, terá sido aplicado
não na criação de uma agricultura, mas para formar agricultores, com os caçadores guerreiros
das antigas tribos nômades: Era-se mesmo coagido, nos primeiros tempos, a não deixar ao
cuidado dêles os bois de que se serviam para a lavoura, com receio de que, por preguiça, não se
dessem o trabalho de os desatrelar, quando o serviço acabava, ou os fizessem em pedaços para
comê-los (CHARLEVOIX apud LUGON, 1976, p. 124).
Assim, antes da pregação do evangelho e de fazer dos indígenas, cristãos, era necessário
transformar toda a sua tradicional base material, ensinando-lhes a lavrar a terra e as novas práticas
de cultivo e de trabalho. A fixação do indígena, por si só, criava novas necessidades e, a principal
delas, era a produção de alimentos em grande escala para suprir as necessidades dos membros da
coletividade. Além disso, cobrir a nudez dos índios implicava na produção do algodão e era isso o
que, de certa forma, mais preocupava os jesuítas, ou seja, cobrir o que poderia ofender a olhos
castos. Para eles, este seria o primeiro sinal da transformação do “bárbaro” (MONTOYA, 1985).
Era necessário, em adição a isso, desenvolver as habitações, construir igrejas e casas. A
casa comum, ou casona, deveria ser abandonada para se eliminar de vez, no olhar do jesuíta, a
incidência do pecado. Com isso, a indústria da construção sofreu um rápido desenvolvimento e
sempre esteve muito ativa pelo contínuo aumento dos índios aldeados. Também se construíram
embarcações de transportes, pequenos barcos, carros de boi, arados de madeira e galpões para
armazenar a produção.
O bovino e o eqüino tornaram-se, dentro de um aldeamento, bens de valor inestimável,
pois era com eles que se preparava o solo para o cultivo, que se fazia aração, gradagem, tratos
culturais e colheita. Não havia outras enxadas, senão as omoplatas de cavalos e de bois (AZARA
apud LUGON, 1976). Observe o que foi registrado em Documentos para la História Argentina (p.
734, 1929, t. 20): “Cada uno tiene sua yunta de buyes para la labranza” (“Cada um tem sua junta de
bois para o cultivo da terra”). Todo transporte da produção do campo para os armazéns, da madeira
para a construção de casas, de carros de bois ou embarcações, só era possível com o auxílio dos
animais de tração. Além de tudo isso, no princípio de um aldeamento era a carne desses animais
que compensava a insuficiência de qualquer gênero alimentício.
Nessa empresa, o primeiro passo era o de garantir aos novos cristãos a alimentação, sem a
qual fracassava toda tentativa de mantê-los aldeados. Qualquer provisão que faltasse era motivo
para que se ausentassem para a selva ou para os rios onde pudessem saciar sua fome.
O gado, embora muito importante, não era muito numeroso, pois o provincial
recomendava aos padres que criassem galinhas por causa da dificuldade em ter carne disponível
(Pe. ZURBANO apud CORTESÃO, 1951, p. 66, v. 2).
No Itatim, a princípio, os padres enfrentaram muitas dificuldades para obterem uma oferta
regular de alimentos. O inimigo invisível da agricultura era o clima, de modo que, em
determinados momentos, toda a produção era perdida, ora pelo excesso de chuvas, ora pela seca,
ora pelas geadas.
Quando os padres encontravam clima e solo que permitiam o cultivo de cereais, vegetais e
frutos que se desenvolviam na Europa, como trigo, batata, maçã e pêra, rapidamente dispunham de
uma boa oferta para atender aos novos cristãos, como ocorreu no Paraná, no Uruguai e no Rio
Grande do Sul. No entanto, no Itatim, eles se defrontavam com uma natureza inóspita, cujo clima
quente impedia o desenvolvimento das tradicionais culturas européias. Além disso, o total
desconhecimento das condições ambientais impediu o rápido desenvolvimento da agricultura.
Enquanto na Europa o clima é bem definido, com quatro estações e grande amplitude térmica
anual, inverno frio, com queda de neve, e verão ameno, com a precipitação de chuvas,
distribuindo-se, uniformemente, durante o ano, no Itatim as temperaturas são quentes e as áreas
dominadas por massas de ar quente equatoriais e tropicais. Apenas no curto inverno ocorre a
25
penetração de frentes frias, que se diluem rapidamente, fazendo retornar o calor. Notam-se duas
estações do ano, o verão mais quente e, geralmente, chuvoso e o inverno, menos quente e seco,
geralmente, prejudicando os vegetais (MAZZA et al., 1994).
Dada essa situação, os padres foram obrigados a introduzir mais rebanhos bovinos,
aproveitando-se dos privilégios em pastagens naturais que a terra oferecia. O jesuíta, ao lançar
mão do gado bovino e cavalar para desenvolver suas reduções entre os índios itatins, estava
lançando, sem o saber, as bases da pecuária mato-grossense e sul-mato-grossense, como fizera no
Rio Grande do Sul e no Uruguai.
Com a abertura de propriedades rurais, o indígena foi incorporado à disciplina do trabalho,
o que mais tarde favoreceu a posse desses imensos territórios pela coroa portuguesa e pelo império
brasileiro.
Somente a partir da década de 40 é que os padres foram se familiarizando com os caprichos
climatéricos do Pantanal e obtendo sucessivos êxitos com os mais variados cultivos. Em todo esse
processo, o gado bovino teve grande importância para garantir a presença dos jesuítas no sul de
Mato Grosso. Sem ele, dificilmente os padres teriam conseguido aldear os nativos e os colonos não
teriam se fixado; ele foi o motor de todos os transportes, a tração para a agricultura e a fonte de
proteína para os habitantes das aldeias nascentes. A introdução de equipamentos mais produtivos,
em substituição àqueles empregados pelos indígenas, possibilitaram o aumento das áreas
cultivadas. A intensificação da agricultura, que sempre floresceu nas reduções, permitiu a
estruturação dos rebanhos. O abate sem critério que envolvia fêmeas aptas à procriação foi
substituído pelo descarte apenas de machos ou algum outro espécime estropiado, o que permitiu o
crescimento vegetativo do rebanho.
Embora as reduções que se formaram no Itatim espelhassem o que a Companhia de Jesus
havia desenvolvido no Paraná e no Rio Grande do Sul no século XVIII aqui elas ganharam uma
feição completamente diferente. Na região missioneira do sul, havia verdadeiros núcleos urbanos
e uma economia agropastoril rigorosamente organizada, com a utilização da mão-de-obra
indígena, pelos jesuítas. No Itatim, isso nunca aconteceu: o período de existência dessas reduções
foi em torno de vinte anos, mesmo assim, com intervalos em que os padres foram obrigados, por
um motivo ou outro, a abandonar a missão, deixando-a sem qualquer trabalho missionário.
Nos momentos em que a Companhia de Jesus deu mais atenção às reduções do Itatim, ela
disponibilizou apenas cinco padres para atender uma área superior a 100.000 km2, o que, de certa
forma, impediu a catequese em massa. Além disso, os padres enfrentaram forte resistência dos
indígenas, o que não aconteceu no Guaíra, atual Paraná, onde havia uma hegemonia dos índios
guaranis e estes sempre foram mais suscetíveis ao trabalho missioneiro. Aqui, as tentativas com os
índios guaicurus, agachis, paiaguás despendeu energia do projeto sem qualquer resultado prático.
Por essas razões, os produtos religiosos do Itatim são extremamente insignificantes, sobretudo
quando comparados aos de outras regiões.
Para reflexão:
1 - Quais foram as dificuldades enfrentadas pelos jesuítas para empreender o processo de
catequização dos índios no território do Itatim?
2 - Realize uma pesquisa procurando detectar os objetivos dos jesuítas em promover a
catequese no continente americano?
3 - O que eram as bandeiras? Procure identificar as diferenças entre bandeiras e monções.
As missões do Itatim foram invadidas pelos bandeirantes paulistas em duas ocasiões, 1632
e 1648. Na primeira, os bandeirantes ameaçaram a cidade de Santiago de Xerez, mas a população
não ofereceu resistência e uniu-se aos invasores. O tenente D. Diogo de Orrego e outros cidadãos
26
guiaram-nos até as reduções do Itatim, levando cativa grande parte dos índios aldeados
(ESSELIN, 2000).
Após a invasão, muitos desses castelhanos passaram para a Capitania de São Paulo com
suas famílias e de posse de muitas peças indígenas, mas, na pressa de deixar a cidade, temendo
represálias das autoridades paraguaias e da própria Companhia de Jesus, deixaram, na campanha
chamada Vacaria, grande quantidade de bovinos que não conseguiram reunir (LEME, 1914, t. 1).
Na segunda vez, em 1648, os padres jesuítas foram obrigados a abandonar a redução, incapazes de
enfrentar os invasores em condições tão desiguais, já que não tinham armas para se defender dos
ataques. Consta do manuscrito “Informe da Companhia de Jesus” (CORTESÃO, 1951, p. 19, v. 2)
que os religiosos reuniram em torno de 700 cabeças de gado vacum deixando-as de esmola aos
indígenas aldeados e que, muitas outras, ficaram na antiga povoação, juntamente com os animais
de trabalho: bois, éguas, cavalos e mulas. Esses animais, que constituíram o casco inicial da
pecuária mato-grossense e sul-mato-grossense sobreviveram, silvestremente, em um ambiente
favorável, propício para a atividade pecuária. Essas invasões contribuíram, decisivamente, para a
propagação do gado por todo o pantanal sul-mato-grossense.
Derrotados pelo conhecido bandeirante Raposo Tavares e seus comandados, os jesuítas e
os indígenas que puderam escapar transpuseram o rio Apa e foram se estabelecer no Paraguai,
abandonando muito gado que haviam ali conseguido reunir. Nesse local o gado encontrou
condições ambientais favoráveis para se desenvolver. Além disso, epidemias e enfermidades
contribuíram para o decréscimo da população indígena no Itatim. Uma grande quantidade de
doenças que eram praticamente inofensivas para o organismo imunizado dos europeus, provocava
efeitos desastrosos nas populações nativas, biologicamente sem condições de fazer frente ao
inimigo desconhecido. Desde os primeiros contatos entre os nativos dessa região e os padres da
Companhia de Jesus, ou mesmo entre os colonos espanhóis e portugueses, há constantes registros
de epidemias que levaram à morte muitos dos primitivos habitantes.
O padre Boroa conta que, em 1634, em conseqüência da fome, surgiu uma epidemia que
exterminou 2/3 dos índios reduzidos e, posteriormente, em 1648, durante uma fuga, os índios
foram vítimas de uma nova epidemia que matou muitos deles (GADELHA, 1980, p. 246 e 270).
Outro fator importante foi que os jesuítas recomeçaram um trabalho de realdeamento da
população do Itatim, dispersa após a última invasão, conseguindo, com sucesso, reunir 800 das
1000 famílias anteriormente aldeadas e conduzi-las para as margens do rio Ipané, a 40 ou 50 km de
Assunção (GADELHA, 1980). Ou seja, o território do Itatim foi praticamente despovoado
(LABRADOR, 1910, p. 62). Os indígenas que já haviam incorporado a carne bovina à sua dieta
foram levados para muito longe, condição importante para a rápida proliferação do gado, pois as
demais nações indígenas, embora o abatessem, preferiam caças como veados, antas, caititus,
capivaras, onças, tatus. Havia também muitas aves, como patos, marrecos, araquãs, jaós, jacus e
jacutingas, além do que, os rios tinham peixes em abundância, oferecendo aos nativos, pacus,
dourados, curimbatás, piranhas. Veja como Moura (1982, p. 19) descreve toda essa riqueza
natural:
Quando o [rio Taquari] leva pouca água deixa várias praias descobertas, as quais se
enchem de caça, principalmente fatos de extraordinária grandeza, e outras mais pequenas, a que
chamam marrecos. Há também pelos matos muitas araquãs, jacus e jacutingas [...] mutuns do
tamanho dos nossos perus novos [...]. A caça de pêlo também é infinita: muito porco bravo,
muito veado e capivara.
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Assim como o rio Taquari, ricos eram o Miranda e o Aquidauana:
Um piquenique no arroio azul - Bela Vista
É prodigiosa a abundância de pescado e carne [...]. Explorando esses rios víamos a
cada instante possantes antas, veados de todas as espécies e intermináveis varas de porcos
montezes [...]. Bandos e bandos de lontras, ariranhas e capivaras [...] innumeras aves, mutuns,
jacus, jacutingas. [...] Em peixes é fartíssimo, abundam os jahús, surubys, dourados, em certos
mezes os pacús, piraputangas, piranhas, além de corumbatás, trairas, pacupévas, abotoados,
papaterras, raias, piáus e outros comuns aos rios do Brasil (TAUNAY, s/d., p. 8 e seg.).
O mesmo acontece em todo o Pantanal, que abriga em seu território “656 espécies de aves,
122 de mamíferos, 264 de peixes e 162 de répteis” (COELHO NETO, 2002, p. 53).
A variedade da fauna pantaneira permitiu que os indígenas continuassem a consumir animais,
como, por exemplo, aves, incorporadas culturalmente à sua dieta, embora a base da alimentação
deles não fosse a carne. Gostavam de frutas, mel, insetos de todo gênero, répteis, e eram muito
gulosos de uma lagarta que ataca o capim mimoso e que eram saboreadas vivas (VIVEIROS,
1958).
O gado das missões jesuíticas do Itatim, encontrando uma grande área com condições
ambientais extremamente favoráveis ao seu desenvolvimento, expandiu-se pelos campos da
planície do Pantanal, em cujo território ficou confinado. As barreiras naturais impediram que o
rebanho ganhasse outros campos. Isso só seria possível se fosse conduzido, como mais tarde
ocorreu, mas, a princípio, o gado esteve encerrado a leste pela serra de Maracaju, acompanhando o
lado ocidental do rio Paraguai, entre o Mbotetei e o fecho dos morros..
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Com os ataques portugueses e a conseqüente escravização dos indígenas, os constantes
surtos epidêmicos que levaram à morte milhares de nativos e à transferência de famílias aldeadas
para as proximidades de Assunção, a província do Itatim foi completamente despovoada de índios
guaranis. Disso se aproveitaram os bandeirantes, já que as ruínas da cidade de Santiago de Xerez e
das reduções serviam de ponto de apoio para as suas investidas. Já em meados do século XVII, eles
se instalaram às margens do Aquidauana e do Miranda, fronteira com o Paraguai. Tinham como
objetivo escravizar os indígenas sobreviventes, que eram muito poucos, promover o contrabando
com os vizinhos, manter um arraial onde se reuniam para cultivar o solo, colher e até descansar no
lugar onde foi Xerez e que, finalmente, era o centro das correrias que faziam até Santa Cruz de La
Sierra (ALMEIDA, 1941). Nas referências a data é 1951, trata-se da mesma obra?
A formação de uma base de operações na antiga Província do Itatim permitiu que, no
último quartel do século XVII, numerosas bandeiras cruzassem toda essa região, rasgando-a em
vários sentidos. Essa maciça presença portuguesa causava preocupações e temores entre os
espanhóis, justamente devido à facilidade com que eles poderiam dispor de cavalos e bovinos. Um
jesuíta espanhol, Padre Diogo Altamirano, em correspondência às instâncias do Conselho das
Índias, afirma que a ocupação daquelas áreas pelos portugueses era mais prejudicial até do que a da
colônia de Sacramento, por ficarem apartados dos olhos dos castelhanos e porque ali podiam
dispor de cavalos, mulas e outros gados (PASTELLS, 1912, v. 4).
Para reflexão:
1 - Por que doenças inofensivas ao organismo europeu provocaram tantas mortes entre os
nativos?
2 - Consultando documentos, livros, relatos de viajantes e seu próprio conhecimento, procure
caracterizar a flora e a fauna do Pantanal sul-mato-grossense.
Os bandeirantes continuavam suas ações em direção ao sul e a oeste, rumo às fronteiras
castelhanas, e isso levou-os à descoberta das minas de ouro de aluvião, abundante em Cuiabá, o
que atraiu milhares de portugueses, seus escravos africanos e índios para a região.
Com as novas descobertas, desenvolveu-se o bandeirantismo de povoamento ou de
comércio, conhecido por monções, como relata Hollanda (1945, p. 43) na seguinte passagem:
A história das monções do Cuiabá é de certa forma um prolongamento da história das
bandeiras paulistas em sua expansão para o Brasil Central. Desde 1622 numerosos grupos
armados procedentes de São Paulo, Parnaiba, Sorocaba, Itú, trilharam constantemente terras
hoje matogrossenses, preando índios ou assolando povoações de castelhanos.
As bandeiras aprisionadoras de índios foram substituídas pelas monções, que se
especializaram na atividade comercial visando ao abastecimento do recém-fundado arraial do
Cuiabá. A chegada de grandes contingentes humanos tornou a vida de todos eles muito difícil.
Como conseguir se manter em uma região tão hostil onde tudo faltava, até mesmo os instrumentos
para a mineração?
Muito rapidamente, porém, os empreendedores trataram de tirar proveito dessas novas
oportunidades para a agricultura e, sobretudo, para o criatório do bovino e do eqüino. Desde o
princípio, houve necessidade de animais de tração para transportar artigos (desde vestuário e
alimentos até ferragens e ferramentas), movimentar moinhos, fazer a lavoura e fornecer proteínas.
Observe a importância de São Paulo para o comércio da época:
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É esta vila o interposto de todos os objetos de exportação, e importação da Província; de
Goyas, e Mato Grosso; ou conduzidos por terra, ou pelos rios. As produções, que descem dos
estabelecimentos centrais, para saírem à barra, são açucar, o algodão, tecidos do mesmo,
toucinhos, aguardentes, café, courama, fumo e carnes chamadas ensacadas; estes generos são
transportados, em sumacas, a outras Províncias, [...]. Os principais efeitos de importação vêm a
ser o ferro, o aço, o sal, as fazendas sêcas e vinhos, e além destes, em mais ou menos quantidade,
todos os que a Europa produz, e costumam ser exportados para o Brasil (D' ALINCOURT, 1975,
p. 29).
Ao contrário das bandeiras do século XVII, as monções usavam basicamente a navegação
fluvial. Os bandeirantes seguiam quatro roteiros, cuja primeira parte era comum: de Araritaguabá
(Porto Feliz) desciam o rio Tietê até o Paraná (o qual desciam também). A partir daí, decidiam-se
por um dos roteiros descritos abaixo:
1 - Subiam o Ivinhema até suas cabeceiras entrando no Brilhante, onde navegavam até um
porto (mais tarde chamado Santa Rosa ou Sete Volta), aí deixavam suas canoas e caminhavam por
terra até as cabeceiras do Nioaque (ou Urumbeva), ali faziam novas embarcações e navegando
pelo Nioaque entravam no Miranda e desse passavam para o Paraguai, atingindo o São Lourenço e
encontravam o caminho fluvial das minas, cuja descoberta deu lugar à fundação de Cuiabá.
2 - Subiam o rio Verde até o seu salto, onde deixavam as canoas e daí tomavam, por terra,
um caminho, cujo percurso durava em torno de 25 dias, até o Porto do Rio Piquiri. Posteriormente,
cortavam os rios Correntes, Itiquira, e São Lourenço até chegar a Cuiabá.
3 - Subiam o Rio Pardo, entravam no Anhandui até chegar ao Aquidauana, deste ao Rio
Miranda e daí ao Paraguai, onde navegavam até o Rio Cuiabá pelo qual se chegava à cidade de
mesmo nome.
4 - Subiam até os campos de Camapuã. Num curto varadouro, atingiam o Camapuã, que os
levava ao Coxim, e desciam até o Taquari, continuando pelo roteiro comum até a região central
(SODRÉ, 1941).
Os monçoeiros preferiam a rota do rio Pardo, Anhandui e Aquidauana, provavelmente pela
grande abundância de gado que ali encontravam e que supria as dificuldades de transporte dos
mantimentos necessários ao consumo durante a jornada (HOLLANDA, 1990).
Essa rota foi abandonada a partir da criação de um estabelecimento fixo na paragem de Camapuã,
em 1725, onde se organizaram as primeiras roças. Tratava-se de uma grande fazenda onde os
viajantes podiam refazer-se da longa viagem e suprir as suas necessidades. Ali era possível obter
feijão, milho, galinhas, toucinho, tecidos, carne fresca de vaca e de porco, farinha de milho, arroz e
aguardente de cana-de-açúcar. Além disso, contava com boas acomodações para atender aqueles
que se deslocavam para a região das minas ou retornavam a São Paulo. No dizer do primeiro
capitão general da Capitania de Mato Grosso, “com mais asseio do que ali se podia imaginar”
(MARTINS DE PAIVA, et al., 1982, p. 15).
Essa fazenda foi fundada pelos irmãos Leme, Antônio, Domingos, João e Lourenço,
fugitivos da Justiça paulista, e constituiu-se no primeiro núcleo fixo português de Mato Grosso do
Sul. Localizava-se em uma faixa de terras que separa as cabeceiras dos rios Sanguessuga e
Camapuã. Os monçoeiros atravessavam esse trecho, geralmente a pé, deslocando-se através do
Varadouro Camapuã.
A partir de meados do século XVIII, o ouro começou a declinar em Cuiabá, diminuindo,
portanto, o número de migrantes que se deslocavam para as minas, o que significou o abandono
quase que completo do caminho fluvial de Porto Feliz àquela cidade. O abandono da rota
tradicional, que ligava o litoral àqueles longínquos sertões, teve conseqüências positivas no
desenvolvimento dos rebanhos na planície pantaneira e no planalto central.
A parte meridional da Província de Mato Grosso, que constituiu rota obrigatória para
30
aqueles que desejavam atingir as lendárias riquezas cuiabanas, praticamente desapareceu para o
florescimento de uma nova via. Dessa antiga rota, que passava pelos campos de Vacaria, sobretudo
na planície freqüentemente visitada por pequenos sertanejos para reunir magotes (grande
quantidade) de gado e iniciar o criatório em algum lugar ou vendê-los em qualquer região onde
fosse possível o comércio. Esses sertanejos foram, porém, aos poucos, se distanciando, pois
buscavam outras regiões onde pudessem se estabelecer. Sem a presença do homem branco, esses
animais ajuntados, permaneceram abandonados à lei da natureza por mais de vinte e cinco anos,
sem que houvesse grandes abates, sendo esse mais um fator que permitiu o seu rápido crescimento.
Atividades:
1 - No princípio as relações entre naturais e invasores eram amistosas, com o passar do tempo
tornaram-se conflituosas. Por quê?
2 - Que grupo indígena não foi reduzido pelos jesuítas?
3 - Como viviam as comunidades indígenas da região de Itatim antes da chegada dos jesuítas?
4 - Como o indígena era visto pelo jesuíta? E pelo colono?
5 - A principal riqueza de Mato Grosso do Sul é o gado bovino. O Estado detém o segundo maior
rebanho do país com aproximadamente 24 milhões de cabeças por ano, abate-se 2,8 milhões,
exporta-se cerca de 300 mil para outras unidades da federação e produz 613 mil toneladas de
carne. Sua economia baseia-se, preponderantemente, na pecuária bovina. Com base nas
informações do texto, procure entender como essa riqueza foi organizada desde o seu início,
em fins do século XVI, e produza um texto sobre isso.
6 - Atualmente, o deslocamento de Mato Grosso do Sul a São Paulo, por via aérea, se dá em
pouco mais de uma hora e, por via terrestre, em quinze. No século XVIII, essas ligações eram
realizadas através das monções, (expedições que desciam e subiam os rios das capitanias de São
Paulo e Mato Grosso) numa viagem que durava de cinco a seis meses. Com base num mapa,
procure refazer esse trajeto, vital para a sobrevivência do núcleo cuiabano.
7 - Leia o texto abaixo e faça um comentário escrito sobre o mesmo:
“Assim, antes da pregação do evangelho e de fazer dos indígenas cristãos, era necessário
transformar toda a sua tradicional base material, era lavrar a terra e, além disso, de ensinar
novas práticas de cultivo e de trabalho”. (Montoya).
8 - O Continente Americano não despertou muito interesse nos espanhóis, após a sua
descoberta. O que eles almejavam era encontrar um novo caminho para as índias em busca das
especiarias. Você sabe o que são e pra que servem as especiarias? Produza um texto a respeito.
9 - Procure compreender o processo histórico de ocupação do atual território paraguaio. Ele foi
possível graças à aliança entre alguns grupos nativos e os espanhóis, formando uma sociedade
que favoreceu a mestiçagem. Segundo informações que nos são passadas, os povos nativos
apenas dificultavam a instalação do europeu na América. Até que ponto essa afirmação pode ser
considerada verdadeira?
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CAPÍTULO III
Povos Indígenas de MS na Atualidade; Consolidação
do Território; Ocupação da Banda Meridional:
O Pantanal Sul-mato-grossense;Avanço para o Sul da
Capitania de Mato Grosso
1 - Povos indígenas de Mato Grosso do Sul na atualidade
Iniciando o estudo das Sociedades indígenas de MS, vamos ouvir a música Quyquyho e refletir:
1 Quyquyho
2 Quyquyho nasceu no centro entre
3 montanhas e o mar
4Quyquyho viu tudo lindo tudo índio por 5 aqui
6 Indiamérica deu filhos foi Tupi foi
7 Guarani
8 Quyquyho morreu feliz deixando a
9 Terra para os dois
10 Guarani foi pro sul, Tupi pro norte e
11 Formaram suas tribos cada um no seu
12 lugar.
13 Vez em quando se encontravam pelos
14 rios da América
15 E lutavam juntos contra o branco em
16 busca da servidão
17 E sofreram tantas dores no sertão.
18 Guarani foi pro sul
19 Tupi entrou no Amazonas
20 Quyquyho na lua cheia
21 Quer Tupi quer Guarani
22 Quyquyho na lua cheia
23 Quer Tupi quer Guarani...
Tela da artista plástica Gisele Ulisse
Letra e música: Geraldo Espíndola (in CASTILHO, M.A. O texto no ensino da História. Campo Grande: UFMS, 1989)
Atividades:
1 - Qual o tema da música Quyquyho?
2 - Qual a visão do autor sobre os povos indígenas?
3 - Interprete os versos 15 e 16 .
4 - Quais são as políticas públicas educacionais que o atual governo de Mato Grosso do Sul tem
procurado implementar?
5 - Faça um debate em sala de aula sobre as lutas dos povos indígenas para conservar a posse de
suas terras. Essas lutas são justas?
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Sabemos que na História das populações indígenas, como retrata a letra da música
Quyquyho, as populações precisam realizar suas conquistas. A luta contra os índios foi sempre
desigual e, muitas vezes, promotora de extermínio diante das condições superiores a que os não
índios se encontravam.
Assim como as populações Tupi e Guarani que povoaram a América e o nosso Brasil, os
indígenas, atualmente, continuam sofrendo por conquistas ainda não alcançadas. A notícia abaixo
refere-se à luta de alguns índios de Mato Grosso do Sul, os quais reivindicam a demarcação de suas
terras. Vamos ler e depois responder as questões propostas.
Em Aquidauana (190 km de Campo Grande), na aldeia Ipegue, cerca de 5 mil índios,
entre guaranis, caiuás, kadiweus, guatós e ofaié-xavantes, fizeram um protesto reivindicando a
demarcação das terras. Em Dourados (220 km de Campo Grande), aproximadamente 300
índios da etnia guarani, caiuá e terena bloquearam das 7h às 13h a MS-156, rodovia que dá
acesso ao município de Itaporã.
In: AGÊNCIA DO ESTADO. Protesto.
Disponível em < htpp: www.clajadep.hpg.ig.com.br/ba73.htm >. Acesso em 22 jul. 2002.
Atividades:
1 - Segundo o texto acima, o que os índios estão reivindicando?
2 - Pesquise outros conflitos envolvendo índios e não índios no seu estado e escreva um
comentário.
3 - Os indígenas têm sido atendidos nas suas reivindicações? Justifique sua resposta.
4 - Se você fosse de alguma comunidade indígena, qual seria a sua luta?
5 - Que fatores podem ser identificados como responsáveis pela situação precária em que vivem
a maioria dos grupos indígenas do Brasil?
Refletindo e Historiando
As sociedades indígenas do mundo contemporâneo enfrentam graves problemas com a
fome, a falta de demarcação de suas terras, a aculturação, os suicídios (Guarani/Nandeva), as
doenças, o forte choque cultural e outros. Tal situação de miséria a que estão sujeitas essas
populações, revela as péssimas condições de vida a que os índios, hoje, estão sujeitos, sendo-lhes
negado o direito à cidadania.
A população indígena no Estado do Mato Grosso do Sul é a segunda em relação aos outros
estados e não difere muito da problemática das demais nações de outros estados do Brasil.
Atualmente, esta população é de, aproximadamente, 53 mil índios. Desse total, cerca de 10 mil
vivem na condição de desaldeados.
O Estado conta também com a primeira aldeia urbana do Brasil, Marçal Tupay de Souza,
situado num local denominado de Desbarrancado, no bairro Tiradentes. Na aldeia, procurou-se
preservar características das moradias de etnias indígenas, construindo-se ocas de tijolos e
cobertas de telhas romanas, cuja arquitetura lembra a oca original.
Na aldeia, moram, atualmente, mais de cem famílias de índios que vivem na área urbana e
que exercem as profissões dos não índios, ou seja, do Mercado Municipal, os produtos trazidos da
aldeia como milho, feijão, caju, guavira, guariroba e outros. Hoje, a comunidade conta com um
museu que resgata a cultura indígena através do seu artesanato nesse local, os produtos são
expostos e comercializados para turistas e visitantes. Dentro da aldeia urbana há, também, uma
escola para as crianças indígenas.
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Atividades:
1 - Relacione as nações indígenas de Mato Grosso do Sul, indicando a população de cada uma e o
total da área demarcada.
2 - Faça um levantamento da menor população indígena e da menor área demarcada.
3 - Faça um levantamento da maior população indígena e da maior área demarcada.
4 - Na sua opinião, porque ocorre tanta demora na demarcação das terras indígenas?
5 - Com ajuda de seu professor de matemática, elabore um gráfico e uma tabela de dados das
populações indígenas e das áreas demarcadas no Estado.
Nações Indígenas de Mato Grosso do Sul
NAÇÃO TERENA
Municípios: Dois Irmãos do Buriti, Sidrolândia, Nioaque, Aquidauana, Miranda, Porto
Murtinho, Anastácio, Dourados e Campo
Grande.
População: Cerca de 19 mil índios.
Áreas demarcadas: 19,1 mil hectares.
NAÇÃO OFAIÉ XAVANTE
Município: Brasilândia.
População: Cerca de 40 índios.
Áreas demarcadas: 484 hectares.
NAÇÃO KADIWÉU
Município: Porto Murtinho.
População: Cerca de 2 mil índios.
Áreas demarcadas: 542,5 mil hectares,
porém não ocupam mais que 100 mil
hectares.
NAÇÃO GUARANI/CAIUÁ
Municípios: Amambaí, Antonio João,
Laguna, Carapã, Ponta Porá, Bela Vista,
Maracajú, Japorã, Tacuru, Paranhos,
Eldorado, Coronel Sapucaia, Dourados,
Caarapó, Juti e Douradina.
População: Cerca de 25 mil índios.
Áreas demarcadas: 16,9 mil hectares.
NAÇÃO GUATÓ
Município: Corumbá.
População: Aproximadamente 400 índios.
Áreas demarcadas: 10,9 mil hectares.
NAÇÃO GUARANI/NANDEVA
Municípios: Paranhos, Dourados e Antonio
João.
População: Cerca de 1,8 mil índios.
Áreas demarcadas: 2,1 mil hectares.
Fonte: Mendes, Gilda Cristina F. Conhecendo Mato Grosso do Sul - conhecimentos históricos e geográficos. São Paulo. Ed.
Ática, 1997.
Aprendendo com a cultura Terena
Apesar dos diversos e complexos problemas enfrentados, atualmente, pelas nações indígenas, há,
por parte das etnias, empenho em preservar a sua cultura. O exemplo abaixo nos dá uma idéia dessa
luta como resistência à aculturação. Vamos ler:
A Dança do Bate Pau
Denominado pelos não índios como a Dança do Bate Pau, é a dança milenar da nação
Terena. Esta dança teve sua origem durante o ritual de um pajé, quando em sonho, visitou uma
floresta onde assistiu o Kohixoti Kipaé, que levou para aldeia, onde ensinou e adotou. É uma das
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mais lindas danças indígenas que poucos têm oportunidade de apreciar. Conhecendo outras
danças de outras etnias do Brasil, comparando, podemos observar que a dança da ema, possui
um cerimonial de sete partes e uma linha harmoniosa nas suas pinturas, indumentária, música e
ritmo. Além do que, traz em sua coreografia o regime político do povo Terena, que é
caracterizado pelas cores azul e vermelho, Xúmono e Súkirikióno. Durante estes anos de
experiência com o grupo TÊ, todas as vezes que colocamos a indumentária, existe um processo
espiritual que vai tomando conta dos componentes à medida que os mesmo vão se
transformando com as cores dos colares, cocares e saia. Toda essa preparação leva em torno de
uma hora e trinta minutos.
Fonte: http://www.almasdessaterra.hpg.ig.com.br/terena.htm
Atividades:
1 - Organize um painel com algumas contribuições dos indígenas de Mato Grosso do Sul na
alimentação, na língua, no artesanato, na música, na dança, ilustrando a atividade.
2 - Na sua opinião, os indígenas devem preservar sua cultura? Escreva um pequeno texto para
debate sobre o assunto.
Ampliando os Conhecimentos: Aventuras do Descobrimento do Brasil
A partir desse momento, iniciaremos uma aventura sobre o descobrimento do Brasil. Feche
os olhos e vamos imaginar a chegada de Cabral no solo brasileiro, em Porto Seguro, no ano de
1500. Desta forma os historiadores têm se manifestado em apresentar uma análise do que foi o
choque entre duas culturas bem diferentes: índios e portugueses. A esse respeito, MORISSAWA
(2001) argumenta que: “Cá em terra, um punhado de índios e índias nus, observando, pelo menos
curiosos, aquela gente estranha, envoltas em muitas peças de roupa, barba na cara, pele branca [...].
De repente, estavam cara a cara”.
O texto a seguir nos levará a uma longa viagem ocorrida nos séculos XV e XVI resultado da
expansão comercial e marítima realizadas por algumas nações européias. Leia-o para saber do que
se trata e depois responda as questões abaixo:
Invasores x invadidos
Os indígenas? Eles não tinham a menor idéia do que era tudo aquilo que vinha do mar.
Os Portugueses? Alguns dizem que sabiam muito bem onde se encontravam. Outros defendem
que não... que aquilo era o descobrimento do Brasil. Mas pense bem. Você está dentro de sua
casa e, de repente, chegam uns desconhecidos...
Vamos puxar na memória aquelas primeiras comunidades que estivemos visitando.
Nossos indígenas também eram caçadores-coletores, nômades, que viviam da pesca, da caça ou
da coleta de frutos silvestres e raízes, ou semi-nômades, que já praticavam a agricultura de
forma rudimentar. Viviam em aldeias que tinham, mais ou menos, entre 500 e 3 mil habitantes.
Segundo o antropólogo Darcy Ribeiro, os indígenas eram 5 milhões e atualmente são apenas
320 mil no território hoje chamado Brasil. Enquanto Portugal tinha na época somente um
milhão.
Para eles, a terra era de todos, não existia a propriedade privada da terra. O trabalho era
naturalmente dividido entre a comunidade, assim como tudo o que era produzido, caçado,
pescado e coletado. Não geravam excedentes de produção, não tinham comércio. A natureza
tão rica que os cercava constituía fonte de vida, e não de lucro. Muitos ainda vivem assim.
Como poderiam, portanto, imaginar que aqueles barbudos cheios de roupas estavam ali
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para serem seus usurpadores? Que eles vinham a serviço de um estado mercantilista? Que iriam
obrigá-los a trabalhar, a esconder o corpo, a adorar um deus que não fazia parte de seu
imaginário?
Fonte: Morissawa, Mitsue. A História da luta pela terra e o MST. São Paulo: Expressão Popular, 2001,
p. 56.
Atividades:
1 - Quais eram os objetivos dos portugueses quando planejaram a viagem para o Brasil?
2 - Quais foram as atitudes, os comportamentos e as reações dos povos indígenas com a chegada
dos portugueses? Organize um debate do tema.
2 - A Consolidação do Território e o avanço para o Sul da Capitania de Mato
Grosso
Boiada da Fazenda Esperança - Ponta Porã
As pesquisas científicas para datar há quanto tempo e de onde teriam vindo os primeiros
habitantes da América ainda caminham. Nesse sentido, as descobertas da pesquisadora Niède
Guidon como restos de fogueira, pedaços de machado e facas de pedras são indícios de que, talvez,
a presença humana no Brasil remonte à 48 mil anos.
Assim, quando os europeus, principalmente portugueses e espanhóis, aqui aportaram, a
América já tinha donos há muito tempo, embora estes não soubessem o que fosse isso: ser donos.
E em Mato Grosso do Sul, quando teriam aportado os colonizadores? Nossa aventura
através de leituras dos textos a seguir certamente nos darão esta resposta.
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Foi somente no governo do quarto Capitão-General, Luis de Albuquerque de Mello
Pereira e Cáceres, que as atenções portuguesas se voltaram para o sul da Capitania. A iniciativa da
ocupação do sul da Capitania de Mato Grosso coube ao Governador de São Paulo, D. Luis de
Antônio de Souza Botelho Mourão que, em 1767, fundou o presídio de Nossa Senhora dos
Prazeres, à margem esquerda do Iguatemi. Sua edificação, planejada na Corte Portuguesa, visava,
sobretudo, povoar os campos de Vacaria, a fim de desenvolver-se ali a agricultura, a criação bovina
e a exploração dos recursos naturais e, também, servir de obstáculo à invasão espanhola pela
fronteira do Iguatemi. Esse projeto exigia elevados investimentos, recursos de que os portugueses
não dispunham nem no reino, muito menos em São Paulo, o que resultou em completo fracasso.
Além disso, foi edificado em uma região onde as constantes epidemias produziram grande
mortandade entre os pioneiros. Isolado dos demais centros coloniais, foi invadido sem oferecer
qualquer resistência.
Em janeiro de 1773, chegou a notícia de São Paulo de que os espanhóis haviam fundado o
forte de Vila Real da Conceição, acima da boca do Rio Ipané, à margem esquerda do Paraguai, por
onde visavam manter comunicação entre Assunção e as aldeias dos chiquitos, o que, para os
portugueses, representava perigo de expansão dos inimigos em direção ao norte. Por outro lado, a
presença de paiaguás e de guaicurus, no mesmo rio, abaixo do Jauru, ainda dificultava a expansão
portuguesa em direção ao sul da capitania (MELLO, 1959, p. 47-48).
Considerando esses fatores, Luis de Albuquerque, procurando assegurar a exclusividade
da navegação no médio Paraguai e conter as incursões dos naturais, resolveu fundar um presídio
em Fecho dos Morros, à margem direita desse rio, área que, pelo tratado de Madrid, pertencia à
Coroa Espanhola.
A posse de ambas as margens do rio Paraguai, dava aos portugueses o controle da parte
superior da bacia desse rio, impedindo o avanço espanhol. Tratava-se de local estratégico: um
estreito que permitiria, sem custo, manter o controle da navegação; sítio facilmente fortificável,
tornando as embarcações inimigas alvo fácil dos canhões. Além disso, ficava no caminho que
ligava Assunção às reduções dos chiquitos, o que impedia o projeto de comunicação entre eles.
Porém, o forte construído para deter o avanço espanhol e garantir o uso privado da
navegação do rio, na verdade não cumpriu bem o seu papel, pois, em boa parte do ano, com as
cheias do pantanal, toda a área ficava alagada, permitindo que as embarcações inimigas o
contornassem, deixando de ser alvo fácil dos canhões portugueses.
Outro aspecto negativo da escolha do sítio foi destacado por Francisco Rodrigues do Prado
(1856, p. 45), como você pode ler abaixo:
O lugar não é próprio para o desenvolvimento da agricultura, como também para a
pecuária, por ser alagado durante até sete meses do ano, e ainda houveram períodos que os
campos ficaram cobertos de água por dois anos (1791-1792): assim pouco pode o presídio
servir para impedir a passagem dos espanhóis, e nada para evitar a fuga dos portugueses ou dos
seus escravos.
Além da localização do forte, abaixo da embocadura do rio Mbotetei, permitir que tropas
inimigas vindas do sul, navegando por esse rio, pudessem surpreender as forças ali estacionadas,
convém acrescentar que se tratava de uma construção bastante rústica, de madeira e de terra,
coberta de palha e extremamente frágil.
Os portugueses, temendo represálias por parte dos espanhóis, por se instalarem em área
que, segundo o tratado de Madrid, pertencia a eles, trataram de fundar um povoado às margens do
Rio Paraguai, próximo da foz do Rio Mbotetei, para cobrir a parte posterior de Coimbra e prover o
forte de alimentos, uma vez que o sítio era inadequado para a criação e para a lavoura. Com essa
incumbência, o governador enviou, em 1776, o sertanista João Leme de Prado com instruções de
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proceder à exploração desses rios e identificar locais que pudessem abrigar novas fundações.
Nessa busca, os lusitanos não descartaram a possibilidade de ocupar as ruínas de Santiago
de Xerez, porém, após examinarem aquele território, optaram pela ocupação de uma área à
margem direita do rio Paraguai, a atual Albuquerque, localizada a uma légua do seu leito, abaixo da
foz do Mbotetei, à altura do paralelo 19º25', latitude sul.
Após a fundação do pequeno povoado, Leme do Prado continuou a explorar a região,
colhendo novas informações que foram enviadas para o Capitão-General Luis de Albuquerque, em
Vila Bela. De posse dessas informações, ele decidiu pela fundação de outro núcleo “sobre os altos
barrancos a altura do paralelo 19º, imediatamente a jusante do canal dos Tamengos”(MELLO,
1959, p. 121).
A fronteira sul de Mato Grosso vivia no mais completo abandono, situação que se estendeu
por longo período. Os soldados, além de enfrentarem atrasos em seus salários, tinham alimentação
deficiente nas trincheiras, assim como era constante a falta de munição. Todas as vezes, porém, que
se divulgavam notícias sobre a possibilidade de uma invasão por parte dos espanhóis, procuravase dar melhores condições às tropas: o pagamento era colocado em dia e recursos eram destinados
à compra de munição e armamento para garantir a defesa. Quando, porém, a situação se
normalizava e desapareciam as ameaças, tudo voltava ao estado anterior.
Portanto, a parte meridional da Capitania de Mato Grosso permaneceu isolada por todo o
século XVIII. Foi somente no século XIX, que o processo de colonização deslanchou.
Para reflexão:
1 - Através de leituras procure entender os objetivos econômicos da Coroa Portuguesa na
exploração da Capitania de Mato Grosso.
2 - Por que podemos afirmar que houve disputa entre o Império Português e o Espanhol pela
posse do Território de Mato Grosso do Sul?
3 - A Ocupação da Banda Meridional: O Pantanal Sul-Mato-Grossense
Dono de fauna e flora riquíssimas, o sul de Mato Grosso reduzia-se a dar abrigo a caçadores
de peles de animais e penas de aves e a explorar apenas produtos que brotavam espontaneamente
de seus solos.
Certamente, o início de sua ocupação teria demorado ainda mais não fosse a importante
contribuição da Rusga, na quase metade do século XIX. No caso de Mato Grosso, a rebelião
reconhecida como Rusga irrompeu na noite do dia 30 de maio de 1834 e durou alguns meses. Ela
marcou o triunfo do movimento nativo local e a completa desarticulação das forças tradicionais,
representadas pelos comerciantes portugueses, com importantes desdobramentos para o futuro da
Província.
No período que se seguiu à Independência, a situação nacional refletiu em Mato Grosso:
ocorriam intensos debates em torno de qual forma assumiria o novo Estado nacional, entre os
caramurus que pregavam o retorno ao absolutismo e a restauração das duas Coroas e os liberais
que defendiam a manutenção do livre comércio e da escravidão.
À medida que a crise ia se agravando, acirravam-se as discussões e, conseqüentemente, o
ódio contra os portugueses, os quais, na sua maioria comerciantes, eram responsabilizados por
todos os males que afligiam o povo. Nas mais diversas províncias do Império explodiam
manifestações armadas.
A disseminação da violência dirigida contra os portugueses pareceu incontrolável e uma
onda de saques, perseguições e mortes se estenderam por dias seguidos, alcançando diversas
regiões da Província (NEVES, 1988).
A revolta nativista foi vitoriosa e, restabelecida a normalidade, a facção dos comerciantes
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portugueses foi subjugada completamente. A elite emergente substituiu-os à frente dos negócios
públicos e do comando militar da Província.
Famílias inteiras, procurando áreas novas onde pudessem desenvolver atividade criatória ou se
livrar dos inconvenientes da Justiça, chegaram ao Pantanal, sul da província de Mato Grosso, para
iniciar o processo da sua colonização.
Essa empresa de migração foi feita pela iniciativa particular de alguns colonos sem que
houvesse o envolvimento do Estado. Os pioneiros foram atraídos pela facilidade em se obter terra
abundante e devoluta, cuja pastagem natural, em grande quantidade, abrigava milhares de cabeças
de bovinos e eqüinos selvagens e domesticados na posse dos grupos indígenas.
Geralmente, as comitivas que deixaram o norte de Mato Grosso eram muito numerosas, com
famílias inteiras, parentes, amigos, compadres, agregados e alguns escravos, ou seja, os que
vinham tomar posses das terras não eram pessoas miseráveis, mas reuniam condições que lhes
permitiam a fundação de fazendas.
Muitas vezes, esses grupos de colonos, fugindo do centro do inóspito Pantanal,
embarcavam em pequenos navios em Cuiabá e vinham pelo Paraguai abaixo até Corumbá, onde se
dispersavam com suas comitivas para o local que preferissem. Nesse primeiro momento de
ocupação, era possível escolher as terras que se queria para tomar posse, geralmente nas
proximidades dos fortes, onde se poderia encontrar auxílio em caso de necessidade e proteção
contra os naturais.
Para reflexão:
1 - O que se entende por Revolta Nativista?
2 - Faça um estudo sobre o processo migratório do norte para sudoeste de Mato Grosso no início
do século XIX.
Vindo de Cuiabá os colonizadores que chegaram à região, antes da metade do século XIX,
reproduziram os mesmos processos políticos a que estavam afeiçoados no norte e trataram logo de
tomar posse de grandes áreas, herança da consciência do Brasil colonial, onde quem dispunha de
terra era considerado rico, poderoso, respeitado e gozava do prestígio social.
Havia a clara possibilidade de os pioneiros se apossarem de grandes áreas, achando ter
direito a elas. Além disso, o fator que determinou o tipo de propriedade fundiária foi a criação
extensiva do gado bovino, que por si só exigia grandes áreas e impelia os colonos a se apossarem
delas.
No Pantanal, como unidade territorial, generalizou-se a sesmaria de uma légua de frente
por três de fundo, o que eqüivaleria a 13.068 hectares.
A justificativa para incorporar grandes áreas no Pantanal era a de que, durante as cheias,
como parte das terras ficava alagada, necessitava-se de outro terreno correspondente, que não
fosse atingido pelas enchentes, para onde o gado pudesse refugiar-se. Além do que, a pecuária
extensiva praticada no Pantanal tem características próprias, é realizada em extensas áreas,
exigência do pequeno suporte dos campos, que comporta, em cada 3,3 ha, apenas uma cabeça de
gado.
Os bovinos eram criados à solta até as primeiras décadas do século XX, pois não havia
cerca para deter o seu avanço e, à medida que, instintivamente, procuravam melhores pastagens,
fugindo das áreas macegosas, iam descobrindo novas pastagens, cujas terras os homens que
acompanhavam os seus deslocamentos iam incorporando ao seu patrimônio e requerendo junto às
autoridades estaduais.
Com isso, foram surgindo megalatifúndios no pantanal mato-grossense:
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Exemplos:
Fazenda Palmeiras, com 106.025 hectares - legalizada em 03/12/1894
Fazenda Rio Negro, com 118.905 hectares - legalizada em 03/09/1893
Fazenda Firme, com 176.853 hectares - legalizada em 27/08/1899
Fazenda Taboco, com 344.923 hectares - legalizada em 24/04/1899
Fazenda Rio Branco, com 384.292 hectares - legalizada em 22/06/1901
(CORRÊA FILHO, 1955, p. 23).
A própria situação do lugar levou a esse processo de concentração de terras, uma vez que
não era possível a prática da pecuária em outros moldes que não fosse a extensiva. Aproveitando o
capital natural (a terra e o gado selvagem), a lucratividade do empreendimento seria garantida com
custos baixíssimos. Os investimentos necessários a uma prática intensiva, ou seja, construção de
cercas, plantio de pastagens artificiais e outros, eram, naquele momento, impraticáveis.
Ao tomar posse de uma área, a primeira tarefa do novo proprietário era a de reunir o gado
alçado espalhado por todo o Pantanal Sul, por meio da chamada bagualeação. As comitivas
organizadas para tal empreendimento permaneciam por mais de 15 dias na região, distantes do
núcleo da fazenda (BARROS, 1998).
Os homens saíam, sobre o lombo de cavalos, para recolher os animais descendentes dos
rebanhos introduzidos, séculos antes, por jesuítas e colonos espanhóis, como também aqueles que
os índios guaicurus, devido aos seus rápidos deslocamentos, abandonaram Pantanal afora.
Geralmente, os vaqueiros saíam em noite de luar para melhor visualizar os animais que
tinham o hábito de pastar apenas à noite, os quais eram laçados e amarrados em árvores, onde
passavam horas nessa condição para que fossem quebradas as suas resistências e, mais tarde, o
peão voltava ao local para conduzi-los. Não era raro encontrar alguns animais mortos. Morriam de
pura raiva e, recolhidos, eram levados para as proximidades das sedes da fazenda. (PROENÇA,
1958, p. 72-73). Eram as vaquejadas: “vai-se escondido, pelos matos, e sai-se em cima do gado, de
repente.. Pior, porém, era caçar a rês feroz, em ermas regiões, perante a lua. A pega do gado bagual,
de noite, é trabalho terrível” (ROSA, 2001, p. 117).
Para manter esse gado nas proximidades do núcleo da fazenda, sob os olhos dos criadores,
usava-se o seguinte estratagema: cortava-se a ponta do casco, para que a dor da pisada o impedisse
de fazer longas caminhadas. Com relação às fêmeas, aproveitava-se seu instinto materno:
prendiam-se as crias para que as mães não se alongassem (PROENÇA, 1958).
Foi assim que os bovinos foram sendo reunidos em torno dos ranchos dos pioneiros e, desta
forma, começavam a se estruturar os primeiros rebanhos e, com eles, as fazendas.
À medida que esse rebanho encontrado pelos campos ia sendo recolhido, recebia
imediatamente a marcação a ferro, o que determinava que, daquela data em diante, ele estava na
posse de um fazendeiro, passando à condição de mercadoria e, conseqüentemente, não poderia ser
abatido por outrem.
No final do século XIX, quando muito gado selvagem ainda estava espalhado pelo
Pantanal, essa lógica do homem “branco” já havia sido absorvida pelos índios guaicurus, entre os
quais já reinava a compreensão de que o gado orelhano não dividido (não marcado) era gado de
ninguém, era de todos, era gado bravio, era como bicho (RIVASSEAU, 1941).
A pecuária tornou-se a principal atividade do Pantanal. O regime das cheias e a distância
das regiões mais ricas impediram o desenvolvimento de outras atividades. A posse do gado, que
podia ser conduzido para outras regiões, significou que a sobrevivência dependia quase que
exclusivamente desse recurso.
Ao lado da atividade criatória, o pioneiro teve que desenvolver a agricultura para garantir a
sua subsistência e a de sua família, no mesmo modelo do norte de Mato Grosso. Enquanto lá a
atividade agrícola se desenvolveu para atender à atividade mineira, no sul deu suporte para o
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desenvolvimento da pecuária.
Cada latifúndio tinha o seu cultivo próprio de gêneros alimentícios para o sustento
daqueles que viviam e trabalhavam no núcleo rural. Praticamente produzia todo o necessário, não
havendo a necessidade de recorrer para além dos limites da propriedade, a não ser para a aquisição
de ferro, louça, vinhos e outros produtos, cuja produção interna não era possível. A maioria dos
produtos elaborados nas fazendas era fabricada por processos manuais ou com instrumentos
rudimentares de baixíssimo rendimento.
A alimentação básica era mandioca, carne, leite, muita farinha de milho e de mandioca,
abóbora, batata-doce, moranga, feijão, açúcar. No entanto, o maior consumo era de carne
(CORRÊA FILHO, 1955). Ela era servida em, pelo menos, três refeições: ao raiar do dia, no
desjejum o chamado “quebra-torto” , no almoço e no jantar (BARROS, entrevista, 2001).
Também contribuía na alimentação do mato-grossense, tanto do norte como do sul, o peixe dos
rios e baías. Era comum, igualmente, o cultivo de árvores frutíferas, como a laranja, o limão, a
manga, a jabuticaba, o mamão. Dessas frutas faziam-se doces e, de algumas delas, licores que eram
servidos o ano todo.
Instalou-se, no Pantanal sul-mato-grossense, a grande propriedade rural voltada
basicamente para o criatório bovino e adotou-se o indígena como mão-de-obra principal numa
relação de semi-escravidão.
O vaqueiro se originou do índio, do guató, do guaná, dos chamacocos e dos guaicurus, os
primitivos donos da terra, também do negro escravo que veio para as minas de ouro e, depois, para
as plantações de cana no norte de Mato Grosso. Esse vaqueiro acompanhou o desbravador por
vários caminhos e, já no sul, recebeu a influência do sangue paraguaio, absorvendo-lhe os
costumes e traços fisionômicos, formando um tipo diferente do vaqueiro do norte (PROENÇA,
1997).
Na verdade, a origem do vaqueiro sul-mato-grossense pautou-se pela violência e pela
expropriação. O recrutamento da mão-de-obra para a pecuária teve por base o elemento indígena,
que sofreu conseqüências dramáticas, porque, apesar de se opor quando expropriado de suas
terras, de seu gado, de seus bens e de sua gente, teve que se sujeitar a um regime de semiescravidão.
Nas primeiras décadas do século XIX, os indígenas, sobretudo os terenas e os guanás,
tradicionais agricultores, eram livres e economicamente autônomos. Em contato com os religiosos
que promoviam a catequese e com os soldados dos fortes instalados na fronteira, transformaram
toda a sua tradicional base material por incorporarem novas práticas de cultivo e de trabalho, além
de instrumentos mais produtivos, ao ponto de se tornarem os responsáveis pela produção de
hortifrutigranjeiros de alguns núcleos populacionais do pantanal sul de Mato Grosso, como
Miranda e Corumbá.
Com o processo de colonização do pantanal sul, os pioneiros foram expropriando os
indígenas de suas terras e de todo o seu gado e submetendo-os violentamente. Aqueles que não
foram mortos refugiaram-se pelo interior em busca de segurança, os que ficaram, foram
submetidos e transformados em força de trabalho. Nesse processo de expropriação, foram
surgindo imensos latifúndios que concentravam milhares de cabeças de gado. Por volta de 1860, já
havia algumas substanciais propriedades e, à frente delas, os primeiros colonizadores que se
tornaram importantes figuras na economia e na política de Mato Grosso.
A presença do paraguaio em Mato Grosso aparece somente no final do século XIX e
começo do século XX.
Em meados do século XIX, o isolamento, a solidão e a falta de renda constituíram uma
marca significativa da nascente sociedade sul-mato-grossense, o que obrigou alguns poucos a
produzirem praticamente tudo dentro da propriedade, inclusive tecidos. As unidades mais bem
aparelhadas produziam a vestimenta de seus empregados e também a dos nativos nas aldeias.
Nesse período, já haviam se estabelecido as primeiras fazendas regulares, sobretudo na
fronteira, onde estavam concentrados os fortes e as aldeias indígenas dirigidas por padres. No
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começo, o principal negócio desses pioneiros foi a produção do couro que se exportava em grande
quantidade, tanto do gado vacum como dos animais silvestres. A carne era desprezada devido ao
pequeno mercado interno, tanto que, muitas vezes, abatia-se a rês apenas para retirar-lhe o couro.
Dispondo de uma imensidão de campos e de uma vegetação que permitia boa forragem, o
gado se multiplicou muito rapidamente: em meados do século XIX havia previsões de que
“somente o distrito de Miranda possuía 150.000 mil cabeças de gado, segundo o testemunho de
vista de José Barbosa Bronzique” (TAUNAY, 1923, p. 114).
O volume de gado existente no sul da Província era substancial e despertou a atenção de
tropeiros mineiros, já acostumados a conduzirem boiadas de Cuiabá para engorda em Minas
Gerais, desde 1836, quando Manoel Bernardo inaugurou o intercâmbio conduzindo para Uberaba
um magote de legítimo gado pantaneiro (CORRÊA FILHO, 1969).
Desde 1848, formou-se uma corrente contínua de boiadas no norte de Mato Grosso,
compradas por gente de Minas Gerais, que cuidava da engorda na sua Província antes de levá-las à
capital brasileira (LEVERGER apud MAMIGONIAN, 1986).
O processo de concentração urbana foi um fenômeno registrado no Brasil no início do
século XIX e deveu-se ao desenvolvimento comercial estimulado, tanto pela abertura dos portos
como pelo aparecimento de atividades econômicas urbanas, e, mais tarde, também pela expansão
das áreas de cultivo do café nas Províncias do Rio de Janeiro e de São Paulo. Esta última, por ser
incompatível com o criatório bovino, conduziu a uma ampliação do mercado da carne nessas
regiões e permitiu que o gado do sul de Mato Grosso, como já acontecia com o do norte, fosse
comercializado com produtores do Triângulo Mineiro, tradicionais invernistas, e, posteriormente,
levados para abate na capital administrativa.
A colonização do Pantanal sul de Mato Grosso se fazia com uma corrente que vinha do
norte, formada, sobretudo, por cuiabanos e poconeanos livramentanos, que conheciam as relações
que se estabeleciam entre os comerciantes mineiros e os produtores mato-grossenses. Não
demorou muito para que os mineiros chegassem à região de Miranda e Aquidauana com o
propósito de comprar bois. Logo, teve início a exportação do gado em pé, como você pode
constatar lendo o trecho a seguir:
Em 1850 os boiadeiros do triângulo mineiro, conhecedores já do sertão sulmatogrossense para onde passavam atravessando o Paranaíba, abaixo da barra do Rio
Grande, iniciaram as suas viagens periódicas a estas paragens, fazendo negócios de gado
com criadores estabelecidos nas margens do Miranda, Ivinhema, Apá e planos da Vacaria
(ALMEIDA, 1933, p. 2).
A cidade de Uberaba, no Triângulo Mineiro, havia se transformado em importante centro
comercial. Devido a sua privilegiada posição geográfica, aderiu ao grande comércio entre o
Centro-Oeste e o litoral do Sudoeste, tornando-se importante entreposto de comércio do gado
bovino.
Logo foi estabelecido importante canal de mercantilização entre os invernistas mineiros e
os criadores de Mato Grosso. O gado sulino era conduzido para o Triângulo Mineiro e, após a
engorda, era vendido a abatedouros paulistas e cariocas.
Os animais eram vendidos uma vez por ano, os compradores apareciam geralmente no
período da seca, de maio a julho, e os fazendeiros começavam a reunir o gado com, pelo menos,
trinta dias de antecedência. O isolamento e a distância do sul de Mato Grosso dos centros mais
dinâmicos do País tornaram o pantaneiro um produtor dependente dos tropeiros, que eram poucos
e sabiam tirar proveito dessas fragilidades. “Daí que, no ato do negócio havia sempre certa
insegurança por parte do pantaneiro, temor de perder a oportunidade e ficar sem vender”
(BARROS, 1998, p. 107).
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Uma outra alternativa comercial para os colonos do sul de Mato Grosso era a cidade
portuária de Corumbá, que recebia, com freqüência, mercadorias vindas de Cuiabá. No entanto,
apesar da pequena distância entre o porto e os pólos da nova colonização e da facilidade em se fazer
o percurso via marítima, em função da rica rede hidrográfica que levava ao rio Paraguai, havia um
fator limitante, ou seja, ali só era possível a venda de peles de animais e plumagem de aves, pois as
fazendas localizadas nas proximidades de Corumbá abasteciam os pólos colonizadores de carne
seca e carne verde.
Os mascates vinham com suas embarcações até o ponto comercial de convergência, que
era Corumbá, traziam aquelas mercadorias impossíveis de serem produzidas no interior das
fazendas e em seu retorno levavam, sobretudo, couro e penas de aves, produtos da região, para
serem vendidos. Por último, o contrabando que se realizava com o país vizinho, o Paraguai, seguiu
forte até as primeiras décadas do século XX. As boiadas conduzidas pelos tropeiros entravam
livremente em território paraguaio, onde eram vendidas com relativa facilidade. Isso porque as
únicas alternativas que os pioneiros do sul de Mato Grosso tinham para vender seus produtos eram
através de comerciantes que vinham de Cuiabá, pelos tropeiros de Minas Gerais, ou então, o
contrabando com a República vizinha.
Para vencer as dificuldades de ligação da Província com todo o Império, era
imprescindível a busca de uma via mais rápida que superasse os problemas das grandes distâncias,
uma vez que os antigos caminhos tornaram-se obsoletos. Desde o ano de 1828, Luis d'Allincourt
chamava a atenção das autoridades brasileiras para a necessidade da abertura da navegação pelo
rio Paraguai, a fim de possibilitar a comunicação do litoral Atlântico com Mato Grosso,
integrando, assim, a Província à economia e à soberania do País. Ou seja: através da navegação
fluvial, assegurar-se-ia, estrategicamente, o domínio de toda a fronteira oeste do Império,
procurando acelerar seu processo de definitiva ocupação, permitir o seu desenvolvimento
econômico e libertá-la das limitações impostas pelo caminho terrestre. Resolver esse problema, no
entanto, não dependia apenas do desejo das autoridades nacionais, mas também de situações
extremamente complexas que envolviam as relações diplomáticas do Brasil com a República do
Paraguai.
Embarcações com as quais se fazia n transporte de pessoas e mercadorias de um lado a outro (MT/SP), no Rio Paraná
44
Atividades:
1 - Leia atentamente o texto e responda a questão proposta.
“No final do século XVIII a coroa portuguesa, decidiu pela fundação do Forte Coimbra e das
cidades de Albuquerque e Corumbá, no território em que hoje é o estado de Mato Grosso do Sul.
Até então, as atenções dos portugueses estavam voltadas apenas para Cuiabá e regiões
auríferas”.
a) O que mudou nas relações entre portugueses e espanhóis para que a fronteira sul viesse a
ser ocupada?
2 - Forte de Coimbra, importante marco na consolidação do território sul-mato-grossense, foi
construído em lugar errado devido a um engano cometido por Mathias Ribeiro da Costa,
encarregado de fundá-lo. Procure identificar o sítio onde foi fundado o forte e o local
recomendado. Em grupo, produza um texto, justificando se o erro causou prejuízo ao Brasil e à
consolidação da colonização.
3 - Mesmo após a construção do Forte de Coimbra, Albuquerque e Corumbá, a fronteira sul de
Mato Grosso vivia no mais completo abandono, situação que se estendeu por longo período.
Quais foram as razões que levaram o colonialismo português a dar tão pouca importância a essa
região.
4 - Recém-chegados, os pioneiros se apropriaram de grandes extensões de terras, pois não se
contentavam com pequenas propriedades, não buscaram a condição de modestos agricultores e
aspiravam a condição de grandes senhores e latifundiários. Em duplas, discutam o peso da
grande propriedade rural na formação histórica do Brasil e do Estado de Mato Grosso do Sul e
registrem em forma de texto.
5 - O que significa bagualeação?
6 - Para os indígenas, o gado bovino descendente de rebanhos introduzidos séculos antes pelos
jesuítas e colonos espanhóis era uma caça como qualquer outro animal, já para o colono, era
uma mercadoria. Eis aí a chave para entender os primeiros conflitos entre o nativo e o colono.
Comente em forma de texto.
7 - Considerando as condições ambientais e as longas distâncias dos mercados consumidores, a
pecuária bovina vai, ao longo dos séculos, se constituir na principal atividade econômica do
pantanal sul-matogrossense. Cite as possíveis causas desse sucesso.
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CAPÍTULO IV
As Tensões na Fronteira e o Conflito com o Paraguai
Forte Coimbra - Pantanal
A letra da música Trem do Pantanal de Geraldo Roca e Paulo Simões pode nos dar alguns
subsídios para o entendimento de algumas razões que levaram à guerra do Paraguai.
Primeiro vamos ouvir e cantar esta bela canção.
Trem do Pantanal (Ed. Peer Music)
Geraldo Roca e Paulo Simões
Enquanto esse velho trem atravessa o pantanal
As estrelas do cruzeiro fazem um sinal
De que esse é o melhor caminho pra quem é como eu
Mais um fugitivo da guerra
Enquanto esse velho trem atravessa o pantanal
O povo lá em casa espera que eu mande um postal
Dizendo que estou muito bem e vivo
Rumo a Santa Cruz de La Sierra
Enquanto esse velho trem atravessa o pantanal
Só meu coração está batendo desigual
Ele agora sabe que o medo viaja também
Sobre todos os trilhos da terra.
Voz e viola: Almir Sater/ violino: Zé Gomes/ violão de 12:
Carlão de Souza/ baixo: Nadinho/ teclados: Luis Lopes.
47
Atividades:
1 - Produza um texto tecendo um comentário sobre o tema da música.
2 - Faça uma pesquisa sobre a Guerra do Paraguai e organize um debate.
Como podemos perceber, a letra da música nos fala de guerra, uma guerra real, cuja
história vamos conhecer agora estudando este texto.
As primeiras décadas após a independência da América Espanhola foram marcadas por
violentos debates políticos e econômicos. Emergiram desse processo grupos internos
contraditórios: de um lado, aqueles que defendiam um atrelamento ao Império Britânico e
desejavam organizar as novas repúblicas independentes como fornecedoras de matéria-prima à
indústria inglesa e consumidoras dos seus manufaturados; de outro, aqueles que advogavam para
seus países um desenvolvimento autônomo com medidas que protegessem a produção artesanal
platina frente a um impacto da manufatura inglesa, lançando mão dos mais variados recursos para
atenderem seus propósitos. Verifique você que, no caso do Paraguai, após a sua independência, o
então Presidente
Havia assegurado um sensível distanciamento frente ao imperialismo inglês. [...] além de
monopolizar a navegação dos rios interiores, o que lhe permitiu controlar rigorosamente todo o
comércio de importação e de exportação, o governo paraguaio tomou iniciativas que
viabilizaram o desenvolvimento acentuado das forças produtivas. Uma delas foi a estatização
das terras, donde o surgimento conseqüente das estâncias de la patria, que expandiram
vigorosamente a pecuária. Também o arrendamento das terras agriculturáveis, a baixo preço,
rapidamente assegurou a auto suficiência do país em arroz, milho, algodão, legumes. [...]. O
Estado Paraguaio também incrementou o desenvolvimento da indústria manufatureira,
especialmente nos ramos têxtil, de papel, de tintas, de pólvora, etc. A exportação de erva mate,
de algodão, de tabaco, de couros curtidos, de cigarros e mel de abelha propiciou ao país
superávits sucessivos nos exercícios orçamentários, o que deu margem à implantação de
estaleiros em Assunção e da siderurgia de Ibicuy, através dos quais o Paraguai chegou a
construir seus próprios navios e fundir peças militares (ALVES, 1985, p. 7).
O Paraguai contrariava, assim, todo um novo pensamento gestado em Londres, que
pregava o livre comércio, a utilização das vias navegáveis para o comércio, a eliminação das
barreiras alfandegárias, enfim, tudo aquilo que impedia a livre circulação da mercadoria.
A única via de comunicação do Paraguai com o exterior era através do rio Paraguai,
estando assim obrigado a utilizar essa via quem desejasse entrar ou sair do País. Para evitar
contatos indesejáveis e controlar todo o comércio importador e exportador, o Governo paraguaio
“mandou colocar postos de guarda de 300 em 300 metros de distância para assim alcançar seus
objetivos” (VERSEN, 1976, p.51). A política isolacionista e contrária aos interesses internacionais
praticadas por Francia teve continuidade no governo de Carlos Antônio Lopes.
O Brasil e a Inglaterra reclamavam do exclusivismo característico do sistema colonial. No
caso do Brasil, o fechamento dos rios afetava os seus interesses, pois ameaçava a integridade do
seu território, uma vez que o rio Paraguai era a via de comunicação mais rápida com a Corte e com
o resto do mundo, como também permitia o transporte de mercadorias mais pesadas e volumosas
com o conseqüente barateamento do frete, e a possibilidade de estimular a economia local, então
completamente estagnada, era uma alternativa para minorar a situação de empobrecimento por
que passava a Província após o ciclo do ouro. Enquanto permanecia fechada a banda meridional,
só era possível a vinculação com as demais Províncias do Império basicamente através do
comércio de caravanas, com todas as dificuldades conhecidas: transpor relevos acidentados,
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enfrentar a presença hostil de algum remanescente indígena, levar alimentos para atender aos
animais que compunham a tropa. Eram vias inseguras, verdadeiras trilhas de salteadores. Além
disso, o Império corria o sério risco de ver a Província de Mato Grosso girar economicamente em
torno dos círculos comerciais paraguaios, com tendência a se desligar da precária unidade
monárquica e se juntar à nova República.
Do outro lado, a Inglaterra, afetada seriamente em seus interesses comerciais, exigia a
abertura dos rios que compunham a Bacia do Prata. Os comerciantes de Liverpool e de Manchester
pediam a interferência do Governo britânico no sentido de tomar medidas que limitassem as
restrições postas ao comércio no Prata e assegurassem acesso ao rio Paraguai e às regiões do
interior.
Esses reclamos eram respaldados pelos centros industriais de York Shire, Manchester,
Leeds, Halifaxe e Bradford e subscritos por 1.500 banqueiros, comerciantes e industriais das
cidades citadas. A opinião generalizada, na Inglaterra, era de que o comércio livre com Buenos
Aires e Montevidéu não teria tanta importância se as comunicações com o interior sul-americano
não fossem estabelecidas.
O Brasil, através de seu governo, manifestava constante preocupação com a integridade de
seus territórios a oeste e mantinha conversações com o governo paraguaio, sempre com o respaldo
da Inglaterra, que defendia seus objetivos comerciais.
O estabelecimento de um cenário de crise na região platina fez com que o Governo
paraguaio revisse a sua posição e adotasse medidas que pudessem resguardar sua independência
nacional, fortemente ameaçada. O que mais importava, naquele instante, era uma aliança com o
Império, tanto é que, em 1856, foi assinado um acordo de comércio entre o Brasil e a República do
Paraguai que liberou a navegação do rio de mesmo nome até o porto de Corumbá, ligando, então,
Mato Grosso ao Rio de Janeiro e a todas as demais províncias do Império, cuja navegação fosse
possível.
A assinatura desse Tratado promoveu mudanças substanciais na região meridional de Mato
Grosso que, através do franqueamento da navegação, ligou-se ao comércio mundial via o estuário
do rio da Prata. A principal beneficiária desse Tratado foi a cidade de Corumbá, que teve
possibilitada a abertura do seu porto a navios nacionais e estrangeiros.
Já no ano de 1858, foi criada a Companhia Nacional de Navegação a Vapor, que manteve, a partir
de então, uma viagem mensal entre Corumbá e Montevidéu (MOUTINHO, 1869).
A abertura da navegação pelos rios Paraguai e Paraná deu a Corumbá a condição de
principal entreposto comercial da Província e porta de acesso às mercadorias européias da
América do Sul e da Europa. A princípio, não havia muito o que levar da região: apenas couro do
gado vacum e de animais silvestres, sebo, charque e penas de aves.
A vida econômica da Província passou a se desenvolver. Ao longo das regiões ribeirinhas
havia um crescente movimento de mercadorias e pessoas, quebrando, assim, uma rotina de
profundo paradeiro e abandono. O mesmo decreto que habilitou o porto de Corumbá ao comércio
criou uma mesa de rendas. Em 1861, instalou-se a alfândega e, em 1862, o povoado foi elevado à
categoria de vila (FONSECA, 1986, v. 1).
O Pantanal sul de Mato Grosso, depois de permanecer isolado pela conjuntura colonial
portuguesa por mais de 150 anos, foi favorecido por fatores que provocaram a dinâmica do seu
crescimento. Da abertura do porto ao início da guerra com o Paraguai, passaram-se somente oito
anos, período marcado pelo progressivo crescimento da região.
Embora o tratado de comércio e navegação estivesse em pleno vigor com o porto de Corumbá
recebendo não só navios brasileiros, mas de todas as demais bandeiras, a guerra entre o Império
brasileiro e a República paraguaia parecia ser uma questão de tempo.
Desde meados do século XIX, o governo imperial que, até então, pouca atenção havia dado
ao sul da Província de Mato Grosso, passou a tomar iniciativas visando assegurar o domínio das
regiões em disputa com o Paraguai. Para isso instalou novas colônias militares, ao longo da
fronteira, enquanto promovia conversações com o governo paraguaio para a abertura da
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navegação do Rio Paraguai. Além disso, encorajava os colonos para estabelecerem permanente
controle sobre a área, desenvolvendo atividades que pudessem, mais tarde, justificar a presença
brasileira.
Tanto o governo brasileiro como o paraguaio tomavam iniciativas para assegurar a
propriedade das terras que consideravam suas. O Brasil, para defender as terras sulinas da
província de Mato Grosso, construiu fortes, incentivava a abertura de fazendas, o criatório e o
cultivo, ações que nada mais eram do que a manifestação da política lindeira dos gabinetes do Rio
de Janeiro e a aplicação de um único princípio, o uti possidetis. O Paraguai, por sua vez, com medo
da expansão brasileira no que era considerado território paraguaio, juntamente com os ataques dos
guaicurus desde fins do século XVIII, estabeleceu pequenos fortes ao longo do rio Apa, além de
estimular os colonos a se fixarem e manterem permanente controle sobre a região. Já em princípios
da década de sessenta do século XIX, a fortaleza de Humaitá foi concluída e, em adição a isso, o
governo comprou da Inglaterra centenas de canhões e grande quantidade de munições. Tinha,
também, uma esquadra que contava com dezessete pequenos vapores (VERSEN, 1976).
Aumentou grandemente os seus efetivos militares, evidenciando, assim, a intenção de declarar
guerra ao Brasil.
Em princípio de 1862, o Presidente
Solano Lopes enviou a Mato Grosso o
oficial do seu Exército, Isidoro
Resquim, disfarçado de comprador de
gado e terras, para fazer um
levantamento do rebanho eqüino e
bovino das propriedades que
concentravam maior número de
cabeças, dos armamentos que
dispunham as unidades fronteiriças,
enfim, fazer o mapeamento da região
(GUIMARÃES, 1999).
Outro espião foi o tenente Andrés
Hererro. Em 1863, ele visitou Mato
Grosso com o pretexto de que
desejava estreitar relações comerciais
entre o Brasil e o Paraguai e, assim,
anotou tudo que pudesse ser de
interesse militar. Passou por Coimbra,
por Albuquerque e pelo
estabelecimento naval de Dourados, à
margem direita do rio Paraguai. Subiu
o rio São Lourenço e o Cuiabá e só
não foi até a capital porque era estação
da seca e as águas baixas não
permitiam o tráfego de navios de alto
calado. Como os paraguaios
pretendiam invadir Mato Grosso
também através do rio, aproveitaramse do trabalho de seus espiões para
estudarem previamente as
singularidades mesológica e
patomográfica das áreas-chave da
região que iriam ocupar (SILVA,
Praça dos Monumentos Históricos - Nioaque
1999).
50
A guerra era iminente e foi deflagrada.
Após a invasão de tropas brasileiras na República do Uruguai, o Presidente Solano Lopes
ordenou a intensificação dos preparativos militares para fazer guerra ao Brasil. Ele considerava a
ocupação do território oriental perigosa para o equilíbrio dos Estados do Prata e que o Uruguai,
pela sua posição geográfica extremamente estratégica, tinha que manter-se livre, independente e
distante da influência do Brasil e da Argentina.
As hostilidades entre a República do Paraguai e o Império do Brasil começaram em
novembro de 1864, quando o Presidente Solano Lopes deu ordens para capturar o vapor brasileiro
Marquês de Olinda, com a conseqüente prisão do Presidente nomeado para Mato Grosso, o
coronel Carneiro de Campos, que nele seguia
como passageiro (CUNHA MATOS apud
VERSEN, 1976).
A Guerra da Tríplice Aliança interrompeu
um promissor processo de desenvolvimento
econômico na região do Pantanal sul de Mato
Grosso. Durante quase cinco anos, desapareceu
a livre navegação no rio Paraguai, sobretudo no
trecho brasileiro, já que as cidades ribeirinhas
permaneceram sob o domínio do invasor. À
exceção de Santana do Paranaíba, na fronteira de
Minas Gerais e Goiás, os poucos núcleos
urbanos organizados no sudoeste de Mato
Grosso foram completamente arrasados pelos
exércitos invasores.
Batalha Riachuelo
Atividades:
1 - No século XVI, com a fundação da cidade de Santiago de Xerez e da redução do Itatim, o
Pantanal sul-mato-grossense ganhou destacada importância, tornando-se palco de conflitos
entre portugueses e espanhóis. A luta estendeu-se até o século XIX quando iniciou a guerra entre
a Tríplice Aliança e o Paraguai. Com base no texto, relacione as raízes dessa guerra
considerando as contradições que se iniciaram no período colonial.
2 - Pandiá Calógeras afirma que o Presidente Paraguaio Solano Lopes, cometeu erros que
levaram seu país à derrota na guerra como, por exemplo, a invasão de Mato Grosso, que nenhum
objetivo militar existia, pois a conquista do território constituía mero alvo geográfico, “golpe de
espada na água”. Você concorda com essas afirmações? Procure descobrir as verdadeiras razões
da invasão de nosso território. Escreva-as em seu caderno.
51
CAPÍTULO V
A Situação da Província no Pós-guerra e os
Problemas Relativos à Mão-de-obra Indígena
Criação da raça Nelore - Fazenda Bela Vista - Nova Alvorada do Sul
Durante muitos anos, acreditou-se que a pecuária praticada no Planalto não causara
qualquer dano ao meio ambiente, sobretudo na planície.
Estudos recentes, ao contrário, mostraram que a exploração pecuária provocou o desastre
do Rio Taquari.
Na edição do dia 8 de dezembro de 2003, no Correio do Estado, técnicos da Embrapa
afirmaram que:
o que provocou o assoreamento do Rio Taquari, na região norte de Mato Grosso do Sul, não foi
a atividade agrícola dos sojicultores gaúchos. Muito mais que a atividade agrícola, a
implantação de pastagens cultivadas em solos arenosos foi fator importante para o aumento do
aporte de água e de sedimentos que acabaram chegando a planície pantaneira pelo Rio Taquari,
provocando grave processo de assoreamento daquele curso d'água.
A pecuária constitui-se uma das mais importantes atividades econômicas do Estado. Como
associar desenvolvimento econômico e preservação ambiental?
Leia a notícia abaixo:
Pecuária provocou o desastre do Rio Taquari
Ao contrário do que até agora se alardeou, o mais grave fator que provocou o
assoreamento do Rio Taquari, na região norte de Mato Grosso do Sul, não foi a atividade agrícola
dos sojicultores gaúchos que introduziram a soja na região de São Gabriel do Oeste no final da
década de 70, após o desastre do café. Muito mais que a atividade agrícola, a implantação das
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pastagens cultivadas em solos arenosos foi fator importante para o aumento do aporte de água e
sedimentos que acabaram chegando a planície pantaneira pelo Rio Taquari, provocando o grave
processo de assoreamento daquele curso d'água. Os técnicos chegaram a essa conclusão a partir
do experimento que vem sendo desenvolvido sobre a denominação “Perdas de Água e Solo do
sistema de recuperação e manejo de pastagens na bacia do Alto Taquari”, fruto de uma parceria
envolvendo a Embrapa Pantanal, a Embrapa Gado de Corte, a Embrapa Florestas e a
Agropecuária Miguel Sergio Ltda.
Esses estudos mostraram que a pecuária foi grande responsável pelo processo de
assoreamento pelo fato de as pastagens terem sido implantadas em solo de areia muito fina em
28.450 quilômetros quadrados da bacia.
Com os incentivos dados por programas como o Polocentro e Polonoroeste, a partir de
meados da década de 70, intensificou-se o desmatamento na área da Bacia do Alto Taquari. Em
1977, apenas 3,4% da área da bacia eram ocupados para atividades agropecuárias. No entanto a
Embrapa Informática Agropecuária, mostra que, no ano de 2000, 62,1% da área da Bacia do
Alto Taquari passaram a ser ocupadas pela agropecuária bovina, caracterizando aí o grave
processo de desmatamento que acabou provocando o desastre do Rio Taquari.
Fonte: Correio do Estado, Campo Grande, MS, 08 de dezembro de 2003.
Atividades:
1 - Leia atentamente o texto “Pecuária provocou desastre no Rio Taquari”e responda as questões
propostas abaixo.
2 - Qual é o tema central da notícia?
3 - Qual o fator apontado na matéria como responsável pelo assoreamento do Rio Taquari?
4 - Produza um texto emitindo sua opinião e promova um debate a respeito.
1 - A Situação da Província no Pós-Guerra e os Problemas Relativos à Mão-de-Obra Indígena
Terminada a guerra, muitos eram os problemas. Um deles foi o isolamento a que
foram submetidos os habitantes do sul de Mato Grosso.
Os habitantes dessa região, sobretudo aqueles residentes na zona de fronteira,
foram, direta ou indiretamente, afetados pela guerra, uma vez que, com o fechamento do rio
Paraguai, a região ficou completamente isolada das demais regiões brasileiras, ocorrendo, com
isso, o aumento dos preços dos alimentos e de outros artigos, o que agravou a situação material da
população pela falta de suprimentos.
Apesar do empenho das autoridades, ainda em 1872 o quadro era desolador a ponto
de o governo imperial ter sido obrigado a enviar alimento para Corumbá para aliviar a fome que
grassava naquela cidade. A desarticulação da produção agrícola, sobretudo no sul de Mato Grosso,
resultante do conflito entre o
Brasil e o Paraguai era
conseqüência, também, da
destruição das aldeias
indígenas de Miranda e do
Bom Conselho, em
Albuquerque. Essas duas
unidades desempenharam
importante papel na
produção de gêneros
alimentícios para consumo e
troca, tais como o milho, a
Trabalhadores típicos dos ervais; agachado, está o majordomo, que em dialeto ervateiro
mandioca, a cana, o feijão,
significava o homem encarregado de empreitar a mão-de-obra guarani.
54
bem como alguns produtos artesanais como chapéus, redes para dormir, balaios, cerâmicas e
tecidos, que eram absorvidos pela pequena população urbana dos vilarejos próximos.
A invasão paraguaia, a prisão do padre responsável pelas aldeias, Frei Mariano de Bagnaia,
e a fuga em massa dos indígenas contribuíram para desmantelar completamente a produção,
levando a população a conviver, nesse período, com a ameaça da fome que se seguiu aos primeiros
anos após o fim das hostilidades.
Com o fim dos combates e com o tratado de paz, os índios tentaram retornar para as suas
antigas aldeias, o que, entretanto, não foi possível, uma vez que elas foram sendo invadidas por
fazendeiros e militares desmobilizados do exército brasileiro, que passaram à condição de
criadores de gado e preferiam se apossar de terras onde já houvesse algumas benfeitorias, tais
como áreas desmatadas que facilitassem o começo das atividades naqueles distantes rincões.
O processo de expropriação das terras e escravização do indígena, que se iniciara no século
XVI, intensificou-se no século XIX, sobretudo após a guerra com o Paraguai, devido à expansão
pastoril empreendida pelos pioneiros que se afazendaram em diversos pontos da Província,
sobretudo no Pantanal Sul. Com isso, a população indígena foi se dispersando pelas fazendas da
região, na condição de vaqueiros e agricultores.
Quando da construção da rede telegráfica, no trecho Aquidauana-Miranda, o Major de
Engenharia Cândido Mariano da Silva Rondon, em contato com os nativos, fez um relatório dos
trabalhos realizados de 1900 a 1906 pela Comissão de Linhas Telegráficas do Estado de Mato
Grosso a fim de apresentar às autoridades do Ministério da Guerra. Parte dele você pode ler a
seguir:
A linha naquele trecho passou pelos campos de quatro Fazendas que possuem cerca de
6.000 cabeças de gado. Em tôrno destas, outras se grupam com um número triplo de criação,
sendo a mais importante a do Cutape, de propriedade do Coronel Estevão Alves Correa, com
cerca de 10.000 rezes. [...]/ Os camaradas dessas fazendas são, na sua maior parte, índios
Terêna, os mais dóceis que conheço da raça ameríndia. [...]/ Estão já transformados e há mais de
século que sua gente não conhece mais o arco e a flecha. Andam vestidos e apenas as mulheres
nas aldeias gostam de andar mais a vontade. [...]/ Cultivam a mandioca de que fazem farinha, a
banana, a batata, a cana de açúcar e o algodão com que fabricam rêdes e tecidos diversos. [...]/
Por estes motivos são muito procurados pelos fazendeiros, que também os preferem em razão
de se contentarem com pouca remuneração, o bastante para se vestirem, comerem e
satisfazerem seus vícios. [...]/ São comumente explorados pelos fazendeiros (RONDON, 19001906. p. 83).
Os indígenas, sobretudo os terenas, transformaram-se no principal elemento de mão-deobra nas fazendas que se organizaram no sul de Mato Grosso, na condição de vaqueiros e em outras
atividades que se desenvolveram por toda a região. Trabalhavam na lavoura, na colheita e preparo
da erva-mate, da ipeca, da borracha e, também, nos transportes, como barqueiros ou remeiros, ou
seja, em todos aqueles postos que a nova civilização exigia.
Mas não apenas os terenas foram utilizados. Na ausência de oferta de mão-de-obra no sul,
outros grupos também se constituíram elemento de trabalho, requerido em todas as áreas do
pantanal.
Aqueles que restaram do povo guaicuru tornaram-se exímios vaqueiros e passaram a
prestar serviços em áreas que se estendiam do Nabileque a Corumbá. Obviamente esse grupo se
enfraqueceu muito a partir de 1850, principalmente após a guerra, quando sua cavalhada foi
atingida pela peste das cadeiras que dizimou quase todo seu rebanho. No entanto, ainda nos dias de
hoje, são extremamente disputados pelos fazendeiros do Pantanal, em especial na região do
Nabileque.
55
Na época das cheias, a condução dos rebanhos para as áreas mais altas, não alagáveis, é um
trabalho difícil que exige do vaqueiro habilidade, conhecimento e perícia. Nesse período, os
nativos são disputados em verdadeiros leilões. No momento em que as águas estão subindo, o
rebanho bovino e eqüino tem que ser retirado rapidamente, por isso não é qualquer peão que se
adapta às condições ambientais do Pantanal e que pode realizar esse trabalho.
Os guaicurus estão adaptados às condições da região. Historicamente, eles incorporaram a
questão da sazonalidade das enchentes anuais, pois acompanhavam o movimento das águas,
levando e trazendo seus rebanhos, aproveitando-se da renovação das pastagens para oferecer-lhes
uma melhor alimentação (MARTINS, entrevista 22-9-2000).
O mesmo sucedeu com os kinikináus, layanas, guatós e guanás, uma vez que perderam
muitas de suas terras para os invasores e se integraram ao trabalho nas fazendas de gado ou, então,
em outras atividades por toda a extensa faixa de fronteira.
Os nativos, mesmo disseminados pelas novas áreas que se abriam no pantanal sul-matogrossense, continuaram a desempenhar papel essencial na produção de alimentos e como
trabalhadores nas fazendas.
Embora os indígenas tenham, em sua maioria, lutado ao lado das tropas brasileiras, durante
a Guerra do Paraguai, a segunda onda humana de ocupação da região sul de Mato Grosso
iria proporcionar aos grupos Guanás e, especialmente aos Terêna, uma nova situação de
conseqüências dramáticas, para eles, porquanto determinou o engajamento dessas populações a
uma economia de caráter escravista. A esse período referem-se os Terêna modernos como ao
tempo do cativeira (OLIVEIRA, 1976, p. 57).
Mas, de forma muito clara, entre o terena e o colonizador branco havia uma acomodação,
uma troca comercial: o nativo precisava das ferramentas que o colono possuía, sem as quais não
conseguia produzir, por outro lado, o branco precisava do alimento que o nativo produzia.
Obviamente, isso não impediu que fosse praticada toda sorte de arbitrariedades contra o indígena,
inclusive a escravidão.
Segundo alguns historiadores, todo o trabalho recaiu sobre os ombros dos imigrantes
paraguaios que entraram na Província após o fim da Guerra da Tríplice Aliança. Na verdade, foram
necessários alguns anos para que a população paraguaia se reestruturasse, consumida que foi no
esforço da guerra. Veja o que Paul Lewis (apud MORAES, 2000, p. 13) afirma a esse respeito: “ao
iniciar a guerra, o Paraguai contava com uma população de 550 mil habitantes e, no final da
mesma, mais da metade havia morrido. Afirma ainda que dos sobreviventes apenas 14.000 eram
homens”. De acordo com Efraim Cardozo (apud MORAES, 2000, p. 13), “dos cerca de um milhão
e trezentos mil, habitantes paraguaios, apenas cerca de trezentos mil sobreviveram à guerra, sendo
na sua maioria mulheres e crianças”. Imagine, ainda, o número de inválidos que, pela natureza dos
combates, certamente era um número significativo.
Apesar da diferença dos números apresentados, de uma coisa você pode ter certeza, a
nação paraguaia sofreu um duro golpe, porque a população masculina sobrevivente era, na maior
parte, formada por crianças e idosos, mesmo assim indispensáveis ao esforço nacional de
recuperação econômica do país no pós-guerra. As mulheres, grande maioria da população, tiveram
que ocupar postos na produção e no comércio, tarefas até então reservadas aos homens, como o de
empunhar o arado para tirar da terra o sustento dos seus filhos ou exercer atividades comerciais e
industriais.
Após o fim da Guerra da Tríplice Aliança, a população paraguaia que emigrou para o Brasil
era insignificante. Segundo o censo de 1872, havia em Mato Grosso 1.669 estrangeiros,
computados em toda a Província. Destes, 764 habitavam a região sul, dos quais 226 eram
56
paraguaios, sendo 122 homens, 101 solteiros, 18 casados e 3 viúvos, e 104 mulheres, 93 solteiras, 5
casadas e 6 viúvas (MATTOS, 1990).
No sul do Pantanal mato-grossense, a mão-de-obra continuou a ser principalmente
indígena. Somente mais tarde, com as sucessivas crises econômicas e golpes de Estado, no país
vizinho, os vencidos começaram a cruzar a fronteira em busca de trabalho. Muitos deles, exímios
vaqueiros, não encontraram dificuldades em obter abrigo nas fazendas de gado que se
desenvolviam na região.
O período pós-guerra foi de consolidação, em que triunfou a grande propriedade rural
dedicada ao criatório bovino. Através de expedientes violentos e ilegais, o índio foi sendo
expropriado de suas terras e de seus bens e incorporado ao trabalho escravo ou, então, recebia uma
insignificante remuneração, processo que se iniciou na década de 30 do século XIX e se
intensificou após a Guerra do Paraguai.
A ausência crônica de capitais entre os latifundiários pantaneiros para investimentos em
mão-de-obra escrava fez com que o indígena fosse largamente empregado tanto no trabalho
doméstico como no da lavoura e da pecuária.
Outro impulso à utilização da mão-de-obra do indígena veio com a valorização do negro no
mercado de trabalho, devido aos impedimentos que a Inglaterra colocou ao tráfego, e também com
a expansão da lavoura de café no Brasil.
Atividades:
1 - “Após a guerra, o processo de reconstrução do pantanal sul-mato-grossense esteve
majoritariamente em mãos dos indígenas. Todos os encargos exigidos para a recuperação da
Planície contou com a mão-de-obra desse povo, como a pecuária, a agricultura, os transportes,
etc. Poucas são as pessoas que têm consciência disso, pois os índios são, preconceituosamente,
vistos como maus trabalhadores e preguiçosos. Produza um texto destacando a participação do
indígena na sociedade.
2 - Alguns importantes historiadores brasileiros sustentam que, após a guerra, muitos
paraguaios cruzaram a fronteira em busca de trabalho, obtendo-o sem dificuldades nas
fazendas sul-mato-grossenses. Com base nos recenseamentos pós-guerra, com o texto e seus
conhecimentos é possível escrever um comentário sobre essa afirmação.
3 - Após a guerra da Tríplice Aliança o governo imperial obteve a abertura do Rio Paraguai à
livre navegação internacional, o que garantiu a comunicação marítimo-fluvial da Província
com o Rio de Janeiro. Relacione as vantagens econômicas, sociais, políticas e culturais que
esse ato proporcionou.
4 - Estabeleça uma relação entre a invasão paraguaia ao solo sul-mato-grossense, a instalação
da alfândega e a construção da estrada de ferro Aquidauana - Miranda.
5 - A década de 70 do século XIX foi muito importante tanto para o Brasil como, também, para
o que é hoje o Estado de Mato Grosso do Sul. Procure identificar o que de mais importante
aconteceu nesse período e como a realidade econômica foi completamente transformada.
6 - Não esqueça de duas expressões chaves que são muito importantes para entender o final do
século XIX: imperialismo e capital financeiro internacional. Faça uma pesquisa sobre isso.
Ampliando os Conhecimentos: A Luta pela Terra no Mato Grosso do Sul
Desde os primórdios da humanidade a terra sempre esteve presente na vida dos atores
humanos como bem necessário a sua sobrevivência. Nesta unidade você vai estudar uma das lutas
pelas terras no Brasil. Vamos discutir o papel da grande propriedade rural na formação histórica do
Brasil e do Mato Grosso do Sul.
57
Leia a reportagem abaixo:
Acampados Fecham Acesso à Fazenda em Protesto à Justiça
Os sem-terra do acampamento 17 de abril, em Nova Andradina, estão bloqueando as
entradas de acesso à Fazenda Teijin, em protesto à morosidade da Justiça em definir se a fazenda
será destinada para a reforma agrária. O protesto começou na manhã de ontem e já teve como
resultado o agendamento de reunião entre uma comissão da Federação da Agricultura (Fetagri)
e representantes do Ministério Público Federal (MPF).
“Os sem-terra vão ficar nas entradas por tempo indeterminado, até que se tenha uma
determinação”, disse o presidente do Sindicato Rural de Nova Andradina, Adilson Remelli. O
acampamento é formado por 1,4 mil famílias ligadas à Fetagri e ao Movimento Sem-Terra
(MST).
Desde ontem, quatro grupos de oitenta pessoas estão nas quatro porteiras de acesso à
Fazenda Teijin. Os sem-terra estão controlando a entrada e saída de funcionários, deixando
passar o ônibus de estudantes e somente os casos de doença.
A Fazenda Teijin, com 27 mil hectares é alvo de pretensa reforma agrária há três anos,
porém uma ação impetrada pelo MPF recomendou que o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA) não procedesse a desapropriação, pois o investimento para tornar a
área agricultável seria muito alto. O INCRA recorreu da decisão e a análise do processo está
tramitando na Justiça Federal de Dourados, ainda sem definição. Adilson Remelli disse que os
sem-terra “se cansaram de esperar” e resolveram fazer o protesto para agilizar a decisão judicial.
Hoje às 13 horas, a Fetagri e o MPF reúnem-se para discutir a ação. Remelli disse que, se
a ação do Ministério for retirada, o processo pode ser considerado nulo e o INCRA pode iniciar o
processo para reforma agrária. A Fazenda Teijin pertence ao grupo Teijin Desenvolvimento
Agrário, sob responsabilidade de um grupo coreano.
Fonte da matéria: Jornal Correio do Estado, 10 de fevereiro de 2004.
Atividades:
1 - Cite algumas reivindicações feitas pelos sem-terra?
2 - Aponte a opinião do governo sobre a pretensa reforma agrária na Fazenda Teijin?
3 - Qual a alegação do Ministério Público Federal?
4 - A que solução podem chegar FETAGRI, MPF, MST e INCRA?
5 - Dê sua opinião sobre a reforma agrária.
6 - Pesquise o significado das siglas: MPF, MST, INCRA, FETAGRI.
A Reforma Agrária na Voz do Poeta Popular
Na análise do poema a seguir vamos perceber qual é o sentido da reforma agrária na voz do
caboclo. Leia o poema:
Reforma Agrária é assim - Antonio Gonçalves da Silva (Patativa do Assaré)
Cabôco Mané Lorenço.
meu colega e meu amigo que pensa aquilo
que eu penso
e diz aquilo que eu digo,
nós samo da mesma laia
dos coitado que trabaia
ou na diara ou na meia
Era só que fartava.
Deus fez a terra pra gente
prantá fejão, mio e fava.
arroz e toda semente, e estes latifundiaro
egoista e uzuraro
sem que nem pra que se apossa.
E nós neste cativêro
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nós pertence a mesma crasse
destas crianças que nasce
Iinriba da terra aléia.
sendo agregaro e rendero
da mesma terra que é nossa.
Ninguém vê ninguém repara
nosso grande padicê
por isto a Reforma Agrara
nós mesmo vamo fazê,
nós todos juntos, os sem-terra,
por vale sertão e serra
promovendo uma campanha
abalando toda gente,
ficando assim iguamente
Furmiga quando se açanha.
Amigo, o que você pensa,
onde a gente vai chegá
com esta sentença
sem terra para trabaiá?
Quem presta atenção descobre
que o sacrifício do pobre
é de arrupia cabelo.
derne o campo até a praça
quanto mais dia se passa
mais omenta o dismantêlo.
E você, Mané Lorenço,
que tem voz forte e grossa
e pensa aquilo que eu penso
vai gritando: a terra é nossa!
Leste, Oeste, Sul e Norte,
uvindo este grito forte
com corage se prepara
e assim com esta união
sem precisá de lição
nós faz a Reforma Agrara.
(Transcrito de Silva, 1994)
Tá tudo correndo istreito
quando um geme o outro chora.
é priciso havê um jeito
pra vê se a coisa miora.
nós matuto brasileiro
vivemo no cativêro.
as terra desta nação
pra todo lado se espande
dominada pelos grande
e os pobre na sujeição.
Atividades:
1 - Que formas de trabalho são citadas no poema?
2 - Interprete os seguintes versos: “nós matuto brasileiro/ vivemo no cativêro/ as terra desta
nação/ pra todo lado se espande/ dominada pelos grande/ e os pobre na sujeição”?
3 - Qual o significado de reforma agrária, na visão do poeta?
4 - Os versos abaixo apresentam duas possibilidades de uso da terra. Indique qual você considera
mais justa e explique por quê.
- Uso da terra 1: “era só o que fartava,/ Deus fez a terra pra gente/ prantá feijão, mio e fava/ arroz
e toda semente”
- Uso da terra 2: “e estes latifundiaro/ egoísta e uzuaro/ sem que nem pra se apossa,/ [...]/ da
mesma terra que é nossa”.
Você sabe o que é latifúndio?
A palavra latifúndio já era utilizada na Roma Antiga para designar “uma grande área de
terra sob posse de um único proprietário”.
Tomando em âmbito mundial, a aplicação do adjetivo “grande” varia de acordo com a
realidade de cada país ou de uma região de um mesmo país. Tomemos como exemplos
extremos o Japão e o Brasil. No Japão, que é um país pequeno e superpovoado, uma
propriedade que tenha mais de cem hectares pode ser classificada como latifúndio. Já no
Brasil, um país muito grande e relativamente pouco povoado, o latifúndio pode ser uma
propriedade com mais de 5 mil hectares, se estiver localizada na Amazônia, ou, no outro
extremo, de 500 hectares, se estiver situado no Rio Grande do Sul. Tudo depende das
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características de cada região.
No caso brasileiro, o nome foi classificado em lei pelo Estatuto da Terra, de 30 de
Novembro de 1964, para designar as grandes propriedades improdutivas.
Fonte: Morissawa, Mitsue. A História da luta pela terra e o MST. São Paulo: Expressão
Popular, 2001, p. 13.
Atividade:
1 - Volte ao capítulo 3 e encontre exemplos de megalatifúndios e produza um texto sobre o
assunto. (Lembre-se, caso tenha dúvidas, consulte o professor).
2 - Para enriquecer o conhecimento socializem os textos produzidos promovendo um debate
em classe.
Cenário da Fazenda Estrela, formada em sua maioria por pastagens onde nascem e se criam bezerros da raça Nelore Antônio João
Diferentes opiniões sobre a questão da terra no Brasil
No painel abaixo, estão as opiniões de representantes de diferentes segmentos da sociedade
brasileira a respeito da questão da terra. Leia atentamente:
Representante dos pecuaristas
Na tribuna do parque de exposições (63ª Expozebu), em Uberaba, Minas, FHC ouviu o
discurso de Olavo Borges Mendes, presidente da ABCZ (Associação Brasileira de Criadores
de Zebu), que chamou a reforma agrária do governo de “falida” e o MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra) de “movimento sem lei”.
“Não acreditamos nesse arremedo de reforma agrária que está sendo colocado em
prática afoitamente, por pressão ou mesmo chantagem conduzida pelo MST”, disse Mendes.
O ruralista afirmou que o MST desafia autoridades e manipula a imprensa. Ele disse
que o direito de propriedade é sagrado. Segundo ele, há risco de os conflitos no campo se
agravarem. “o que está acontecendo é inaceitável para nós, proprietários rurais. Tem trazido
insegurança e intranqüilidade”, afirmou. (Folha de São Paulo, 03/05/1997).
Representante da Igreja Católica
O cardeal arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, afirmou que a Igreja
Católica apóia as invasões promovidas pelos sem-terra. Disse também que é preciso fazer a
reforma agrária “urgente” no Brasil. “É legítima a ocupação de uma terra que não está sendo
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trabalhada”, disse o cardeal.
D. Paulo criticou o ritmo da reforma agrária no país, mas defendeu o presidente
Fernando Henrique Cardoso. “FHC precisa do apoio do povo, senão os partidos que o apóiam
vão dificultar”.
As declarações foram dadas ontem na reunião anual dos bispos da Arquidiocese de São
Paulo, no Centro Santa Fé. O local também foi ponto de parada da caminhada de 1.000 km dos
sem-terra, que saíram anteontem de São Paulo rumo a Brasília onde chegarão no dia 17 de
Abril. A marcha é um protesto contra a política agrária do governo e pede a punição dos
responsáveis pela morte de 19 sem-terra, em Eldorado dos Carajás, no Pará.
O cardeal afirmou que a Igreja “está ao lado dos sem-terra”, disse que a reforma agrária
está atrasada 500 anos. “O Brasil não pode esperar mais” (Folha de São Paulo, 19/02/1997).
Presidente da República
O Presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu ontem a união entre o governo e o MST
para acelerar a reforma agrária. Em entrevista a Rede Globo, FHC considerou “inútil” a
discussão sobre os números da reforma agrária constantemente questionados pelos sem-terra.
“Agora, eu acho inútil brigar: assentou-se tanto ou quanto, o MST diz que é tanto, o ministério
diz que é não sei quanto mais. Não é esse o problema. Se nós dermos as mãos, vamos assentar
mais gente. E é isso que nós temos que fazer”, afirmou FHC [...].
Para FHC, a marcha dos sem-terra é um exercício normal da cidadania. “Acho que um país
democrático como o nosso, precisa se acostumar a que haja esse tipo de manifestação dentro da
democracia, uma demonstração construtiva”. (Folha de São Paulo, 18/04/1997).
Atividades:
1 - Com base no painel da página anterior, faça um quadro (modelo sugerido abaixo)
indicando a que instituição pertencem as pessoas que fazem as declarações, bem como a que
acontecimentos as situações se referem.
Quem emite opinião
Instituição
Tema
Opinião
2 - Verifique a opinião manifestada nos textos sobre:
-a reforma agrária;
-o movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra;
-as invasões de terras.
3 - Discuta com os colegas e responda:
-um trabalhador rural, participante do MST, concordaria com as afirmações acima? Com
qual(is)? Por quê?
-de qual(is) ele discordaria? Por quê?
4 - Pesquise sobre os movimentos messiânicos ocorridos no Brasil durante a Chamada
República Velha (Canudos e Contestado).
5 - Escreva o significado dos termos: campesinato; latifúndio; escravidão; capitalismo. A partir
das definições encontradas, produza um texto com os termos que pesquisou.
6 - Pesquise para saber se está acontecendo algum conflito por terras no Estado de Mato Grosso
do Sul e organize um painel com os resultados obtidos.
7 - Escreva sobre o Quilombo de Palmares destacando possíveis remanescentes na sua região.
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CAPÍTULO VI
A Recuperação da Província de Mato Grosso: Novos
Impulsos ao Comércio e à Produção; O Crescimento do
Capital Financeiro, as Exportações de Capitais e as
Transformações na Fronteira; O Substancial
Crescimento do Rebanho Bovino e o
Desenvolvimento das Charqueadas
Fonte: Atlas Histórico Básico - Editora Ática
Atividades:
1 - Com um lápis colorido percorra o caminho dos monçoeiros;
2 - Pinte a Província de Mato Grosso ;
3 - Localize no mapa a redução do Itatim e crie uma legenda para os itens 1,2 e 3.
Sugestão: Se em sua escola tiver sala de informática essas atividades poderão ser
desenvolvidas nela.
1- A Recuperação da Província de Mato Grosso; Novos Impulsos ao Comércio e à Produção
Fachada do prédio onde funcionava o escritório da Charqueada Matto Grosso - Porto Murtinho
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Após a guerra, as atenções do Governo imperial voltaram-se para Mato Grosso, e medidas
foram sendo tomadas para estimular a economia local. A primeira delas, e a mais importante, foi a
obtenção da livre navegação do rio Paraguai, garantindo a comunicação marítimo-fluvial da
Província com o Rio de Janeiro.
Ainda no ano de 1869, assim que as forças paraguaias deixaram o território matogrossense, o governo imperial, como medida de apoio ao desenvolvimento comercial da região,
baixou o Decreto nº 4.388, de 15 de agosto, isentando de tributos todos os gêneros de importação e
exportação comercializados em Corumbá por um período de dois anos e liberando o porto
corumbaense para a entrada de todas as embarcações de qualquer origem. Essa concessão
estendeu-se por dez anos, até 1879 (PÓVOAS, 1995, p. 314, v. 1).
Essa foi uma decisão muito importante, uma vez que inúmeras embarcações voltaram a
transitar pelo rio Paraguai e seus afluentes. Empresas nacionais e estrangeiras estabeleceram-se e
passaram a prestar serviços de navegação entre Corumbá e as cidades do Prata, com o
estabelecimento de linhas de cargas e de passageiros. Para o porto da vila chegaram mercadorias
dos mais longínquos países. Corumbá “passou a ser uma cidade-empório constituída na sua maior
parte de comerciantes, de nacionalidades diversas. Era a porta de entrada para a Província de Mato
Grosso” (ROCHA, 1977, p. 78-108).
Essa pequena cidade portuária tornou-se o centro distribuidor da Província e de todas as
cidades e zonas ribeirinhas. Era ali que se processava o transbordo das embarcações de menor
calado, destinadas a Cuiabá, Cáceres, Miranda, Coxim e escalas (SOUZA, s/d.).
A cidade passou a desempenhar o papel de capital do rio Paraguai. Era o entreposto entre os
portos platinos e europeus e de toda a Província, tornando-se a principal porta de embarque da
exportação dos bens produzidos no pantanal e da entrada da cultura platina, com todas as suas
decorrências.
Investimentos do governo imperial também contribuíram, no começo da década de 70 do
século XIX, para impulsionar a economia local. A construção de um estaleiro da Marinha em
Ladário ofereceu muitas oportunidades de emprego e se constituiu em tentativa de reanimar a
economia da região: “Ladário converteu-se numa florescentíssima povoação, com cerca de três
mil almas, várias ruas e boa casaria” (FONSECA, 1986, p. 317, v. 1). No Arsenal, instalaram-se a
Escola de Aprendizes Marinheiros e as oficinas de habilitação técnica de serviços náuticos e
fabricação de acessórios de transportes fluviais.
Com o objetivo de resguardar Corumbá e Ladário de qualquer ataque, o governo imperial
preparou um projeto defensivo com a construção de cinco fortes às margens do rio Paraguai que
iam desde o canal dos Tamengos até a cidade de Ladário. Dessa forma, dinamizou ainda mais o
setor de construção.
No ano de 1870, o comando do Exército em operações no Paraguai deslocou o 21º BC para
Corumbá. Como de costume, um grupo de mercadores encarregados de fornecer suprimentos à
tropa acompanhou-na e se estabeleceu na vila, contribuindo para o incremento do comércio e, mais
tarde, atraindo um maior número de comerciantes (FONSECA, 1986, v. 1).
Em 1872, a Alfândega foi reinstalada em Corumbá com o objetivo de vistoriar e controlar
as mercadorias que entravam e saíam pelo porto da Província, além de cobrar direitos dos produtos
que não tinham isenção fiscal. Devido à ausência de edificações públicas para o armazenamento
das mercadorias em trânsito, as instalações alfandegárias funcionavam, também, como depósitos
dos artigos com destino a outras cidades.
Ainda no ano de 1872, instalou-se, na cidade de Corumbá, o 2º Batalhão de Artilharia a Pé,
que reunia 605 homens.
A invasão paraguaia em solo mato-grossense produziu profundas modificações
econômicas, transformando, completamente, a face da Província. O término da guerra deu grande
impulso à fixação de novos fazendeiros na área central e meridional do Pantanal.
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2 - O Crescimento da Capital Financeiro, as Exportações de Capitais e as Transformações na
Fronteira
Primeira participação de Mato Grosso em uma Feira Internacional de Amostras. Rio de Janiero, sob patrocínio da Cia. Matte Laranjeira
O fim da guerra com o Paraguai coincide com o surto ferroviário no Brasil. As hostilidades
na fronteira de Mato Grosso deixaram claro para as autoridades brasileiras que o Império precisava
buscar recursos para estabelecer comunicações mais rápidas e eficientes com a imensa área do
Centro-Oeste. Essa providência seria importante para, em caso de guerra:
1- proporcionar deslocamentos dos equipamentos militares e de soldados mais rapidamente;
2 - promover a colonização e o desenvolvimento da região, drenando para os portos do Atlântico as
matérias-primas e os alimentos ali produzidos;
3 - possibilitar o desenvolvimento de novas atividades econômicas;
4 - assegurar ligações mais estreitas com os países vizinhos e o transporte de passageiros.
Um fato importante a destacar é que o fim da guerra com o Paraguai coincide com a Guerra
Franco-Prussiana, na Europa, cuja grande novidade fora a utilização, com extremo sucesso, da
rede ferroviária pelo exército de Bismark, “mobilizando e concentrando milhões de homens na
fronteira, como nunca antes ocorrera” (MEIRA MATTOS, 2003, p. A3). Certamente, esses
acontecimentos influenciaram o governo brasileiro e o estimularam a construir, mais tarde, a Rede
Ferroviária Noroeste do Brasil.
No começo da década de 1870, muitos projetos que ligavam, por via férrea, São Paulo a
Mato Grosso já eram constantemente debatidos nos círculos governamentais ou fora deles. Para
confirmar essa preocupação geral, observe a citação que segue.
Essa formidável obra de penetração pelo território de Mato Grosso coube na parte final,
à Noroeste do Brasil, com que se realizou lentamente uma velha aspiração alimentada por
debates sucessivos. [...] Já em 1876, notável comissão de engenheiros, presidida pelo Visconde
de Rio Branco, se debateu às voltas com dezesseis dêles, “tão discordes, lembra Euclides da
65
Cunha, que, malgrado a valia de juízes daquele porte, o controvertido tema não teve decisivo
desfecho e chegou ao nosso tempo (1905), disparatando em trinta pareceres”. Foi do Clube de
Engenharia, do Rio de Janeiro, que partiu o último e mais vigoroso impulso para sua realização
quando, em outubro de 1904, “deliberou indicar ao govêrno 'como problema nacional
inadiável' o traçado de um caminho de ferro que, partindo de São Paulo dos Agudos (ou de
Bauru), transpondo o Paraná e o Urubupunga, se dirigisse a um ponto do rio Paraguai adequado
a encaminhar para o Brasil o comércio do sudeste boliviano e norte paraguaio, permitindo ao
mesmo tempo rápidas comunicações do litoral com Mato Grosso, independentes do percurso
em território estrangeiro”. Fundada a Companhia Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, de
capitais mistos, brasileiro e franco-belga, com concessão de garantia de juros pelo govêrno
federal, em 1904, e incorporada por Teixeira Soares e Pereira da Cunha, iniciou-se em 1905 a
construção da estrada, cujo trecho de Bauru a Itapura essa emprêsa inaugurou em 1910
(AZEVEDO, s/d., p. 69-70).
A ferrovia de Bauru a Porto Esperança, no Paraguai, que foi iniciada em 1905, só ficou
pronta e em condições de tráfego, em 1914.
O mesmo processo aconteceu com a navegação. Você pode comprovar isso pelos dados
apresentados por Calógeras (1945, p. 244):
de 1839 a 1874, o número de viagens aumentou de 50% sob a bandeira brasileira, e de 101% sob
o pavilhão de outras nações, a tonelagem cresceu 130% no primeiro caso, e de 414% no
segundo. Em 1859, quase todos os barcos eram veleiros; ainda em 1873, somente 29% eram
movidos a vapor.
Os navios à vela estiveram em maior número do que os movidos a vapor até a década de 70
do século XIX. Foi somente a partir daí e, sobretudo, de 1880, que a frota foi dando lugar aos mais
modernos.
Junto com o desenvolvimento das linhas férreas e da navegação a vapor instalaram-se as
primeiras linhas telegráficas e os cabos submarinos. Os portos foram organizados e reaparelhados,
uma vez que eram “até então meros ancoradouros” (SODRÉ, 1978, p. 88).
No que diz respeito à indústria, foram implantadas sessenta e duas empresas, vinte
companhias de navegação a
vapor, oito de mineração,
três de transporte urbano,
duas de gás e oito estradas de
ferro, na década de 1860
(PRADO JUNIOR, 1959).
Foi um período em
que o país viu crescer as suas
cidades, tirou proveito do
capital financeiro internacional para a exploração dos
serviços públicos, transporte, fonte de energia e portos.
Vieram os bondes, os trens
urbanos e as companhias de
iluminação. Tais concessões
foram feitas em virtude da
ausência de capitais
Velha locomtiva em frente a Fazenda Serrinho - Três Lagoas
66
nacionais interessados, sen-do esses campos de explora-ção entregues ao capital estrangeiro.
Esse vento modernizador que tanto beneficiou o Império brasileiro não deixou de bafejar
no Pantanal mato-grossense: enquanto aguardavam, ansiosamente, pelo trem, as autoridades
procuraram desenvolver a navegação.
A reabertura do Rio Paraguai permitiu o contato direto da Província com as Repúblicas sulamericanas platinas, como, também, o intercâmbio com o Rio de Janeiro e o acesso ao Atlântico.
Essas companhias de cargas e passageiros colocavam a Província em contato com o mundo. A
intensidade e a regularidade dessa navegação possibilitaram um surto de desenvolvimento para
Mato Grosso. Embora a Província tivesse uma pequena população e, por isso, não fosse uma
grande consumidora de produtos platinos e europeus, a expansão do mercado se deu na
perspectiva daquilo que a região podia oferecer de matérias-primas e alimentos.
A abertura de linhas regulares de navegação permitiu grande afluxo de comerciantes
estrangeiros para a região, negociantes de gado, couro e expedições científicas. Mercadorias dos
mais distantes países chegavam ao Porto de Corumbá, no coração do Pantanal Sul, e dele saíam
matérias-primas da terra, como peles, ipeca, charque, subprodutos do boi, penas e, mais tarde,
borracha e erva-mate. Era aí que acontecia o transbordo das mercadorias para as embarcações
menores destinadas às cidades ribeirinhas da Província, como Cáceres, Cuiabá, Miranda e Coxim.
Os grandes vapores da linha nacional não iam além de Corumbá, que recebia as riquezas das frotas
do mundo inteiro e, depois, funcionava como centro distribuidor da Província. Foi, por isso, que,
além das linhas de navegação regulares, surgiram empresas armadoras organizadas por
comerciantes e empresários dos portos regionais que conduziam passageiros e mercadorias por
todo o alto e médio Paraguai, levando produtos às pequenas cidades ou a determinados portos para
atender fazendeiros recém-estabelecidos e, de lá, trazerem produtos produzidos na região.
Em meados da década de 70 do século XIX, começou-se a perceber a presença do capital
financeiro europeu em Mato Grosso.
Em 1895, constituiu-se, na Antuérpia, a Compagnie des Produits Cibils, que adquiriu e
passou a explorar a Charqueada de Descalvado. Os negócios relativos à borracha, que começaram
a ganhar força, atraíram, também, capitais belgas, surgindo a Compagnie des Caoutchoucs du
Matto Grosso e a Albuna S. A. (STOLS apud ALVES, 1984, p. 49).
No começo do século XX, diversas empresas estrangeiras estabeleceram-se no Pantanal sul-matogrossense para explorarem o criatório bovino.
3 - O Substancial Crescimento do Rebanho Bovino e o Desenvolvimento das Charqueadas
Durante o período da Guerra do Paraguai, poucas famílias
permaneceram em suas propriedades. Tão logo foi anunciada a
invasão, as fugas se sucederam em massa: as cidades foram
abandonadas e entregues ao inimigo. No campo, o processo foi o
mesmo: aqueles com mais posses se dirigiram para Cuiabá ou
Santana do Paranaíba, os de poucos recursos se abrigaram na serra
que circunda o Pantanal e, dos que permaneceram, muitos se
engajaram nos exércitos formados para deter o invasor, ficando as
fazendas abandonadas e o gado sem manejo.
Os rebanhos bovinos que estavam apascentados nessa
grande área foram, em boa parte, apanhados, serviam para
abastecer não só os exércitos invasores mas também a população
civil mato-grossense e assuncenha. Porém, a peste das cadeiras
que, na ocasião, atacou os eqüinos, permitiu que o gado bovino
fosse se alongando e se juntando às grandes manadas selvagens
que há muito haviam se espalhado por todo o Pantanal, garantindo,
assim, a sobrevivência de considerável número de animais, de
Touro Nelore - Rio Brilhante
67
forma a tornar raro que alguma fazenda tivesse um único animal de sela para manejar o rebanho.
Por causa da falta de eqüinos e da redução do comércio e do consumo, uma vez que a
população abandonou praticamente todas as áreas do Pantanal mato-grossense, palco da guerra, o
gado bovino cresceu numericamente. Quando terminaram as hostilidades, ao retornar às suas
terras, os fazendeiros foram obrigados a recorrer ao mesmo procedimento que os seus
antepassados utilizaram para juntar o gado bovino, a “bagualeação”. No entanto, tinham maiores
dificuldades devido à falta de cavalos. Aos poucos, os animais iam sendo juntados e as
propriedades rurais, reorganizadas. Os bois mansos, geralmente animais de carga, tornaram-se,
por força das circunstâncias, animais de montaria, era com eles que se fazia o manejo.
O desenvolvimento da atividade comercial em Corumbá, através das casas de importação e
exportação, geralmente entrepostos de Buenos Aires e de Montevidéu, despertou o interesse de
investidores estrangeiros em expandir a indústria da carne em Mato Grosso.
Em 1885, estimava-se que havia em torno de 800 mil cabeças de gado bovino em toda a Província
(RAMOS FERREIRA, 1887). A falta de cavalgaduras impedia um levantamento minucioso dos
estoques, isso significa, então, que os números poderiam ser bem maiores.
A grande quantidade de excedentes bovinos pouco aproveitados e a excelente posição de
Mato Grosso para atender o mercado consumidor do Rio de Janeiro e do nordeste brasileiro
estimularam a instalação das charqueadas no fim do século XIX e no começo do XX. A existência
do mercado consumidor de charque e a livre navegação internacional dos rios da Bacia Platina
facilitaram o aproveitamento do gado bovino pela possibilidade de transportes mais rápidos e
baratos e pelo interesse dos investidores platinos (MAMIGONIAN, 1986).
Esse período coincidiu com a crise da indústria do charque na Argentina e no Uruguai,
devido ao rápido desenvolvimento nesses países, com vistas à exportação de lã e à criação de
ovinos, que passaram a ocupar as pastagens
antes destinadas à pecuária bovina,
abastecedoras das charqueadas platinas que,
além disso, entraram em crise por causa da
queda das exportações de carne salgada ao
Brasil, à Cuba e aos Estados Unidos
(PUIGGROS & DEFFONTAINE apud
MAMIGONIAN, 1986, p. 48).
Por essas razões, houve um deslocamento de capitais platinos ligados à exportação
de charque para a Província de Mato Grosso.
Contribuiu, ainda, para a instalação das
charqueadas, a facilidade para o escoamento da
produção pelo rio Paraguai, principal via de
comunicação de Mato Grosso com o restante do
Brasil e que passava, através do Rio da Prata
pelos vizinhos Uruguai e Argentina. Fator não
menos importante foi o baixo preço do gado
bovino. Em 1908, ainda era possível comprar
uma vaca por 15$000 e um novilho por 30$000.
No entanto, em 1910, quando as charqueadas
estavam em pleno funcionamento, os valores
saltaram respectivamente para 26$000 e 45$000
(AYALA & SIMON, 1914). Ainda assim, o
preço era muito baixo pois, no mesmo período,
em São Paulo e no Rio de Janeiro pagavam-se
100$000 por um novilho. Esse conjunto de
fatores, aliado ao baixo custo da mão-de-obra, Padaria Cuê (Padaria velha) - Porto Murtinho
68
garantiu alta rentabilidade aos negócios.
Aproveitando-se de todas essas condições, os capitalistas platinas passaram a investir no
Pantanal. Em 1907, foi fundada a Charqueada Miranda, em Pedra Branca, próximo da Vila de
Miranda, de propriedade da firma montevideana Deambrósio, Legrand & Cia. Em 1909, começou
a funcionar a Charqueada do Barranco Branco, no município de Porto Murtinho, pertencente à
Empresa Extrativa e Pastoril do Brasil S.A., com sede em Montividéu. Ainda em 1909, foi
instalada, também em Porto Murtinho, o Saladeiro Tereré, de propriedade de Moali & Grosso
Ledesma, igualmente de Montividéu. Esses três estabelecimentos tinham capacidade para abater
de 50 a 60 mil reses por safra (AYALA & SIMON, 1914).
Até o princípio da década de 20 do século XX, a grande maioria das indústrias de charque
que se instalaram em Mato Grosso o fizeram no Pantanal Sul, às margens do rio Paraguai ou de
seus afluentes. A escolha desses locais se explica pelos estoques de bovinos que existiam na região,
uma vez que as charqueadas têm a necessidade de se instalar em locais onde há uma oferta regular
de matéria-prima. Por outro lado, o rio Paraguai se constituía no principal escoadouro para essa
produção.
O período que se estendeu de 1870 a 1910 foi marcado pela lenta integração do Pantanal
Sul de Mato Grosso ao mercado nacional, quando foram sendo construídas as bases para o
desenvolvimento da pecuária de corte. Esse foi um período que coincidiu com a substituição da
criação do bovino pela ovelha, na Argentina e no Uruguai, com o conseqüente deslocamento de
capitais desses países para a exploração dos imensos rebanhos que estavam sendo pouco utilizados
na planície pantaneira. Pouco mais tarde, quando grandes frigoríficos ingleses se instalaram
naqueles dois países para a exportação da carne congelada ou em conserva para o mercado
europeu, ambos deixaram de fabricar o charque que, em parte, era exportado para o Brasil, cujo
mercado foi, então, suprido exclusivamente pela indústria nacional (FLORES DA CUNHA,
1928). Isso permitiu novo aporte de investimentos no Pantanal Sul de Mato Grosso, o que acelerou
o processo de transformação de toda a região. Os produtores passaram a vender mais e melhor e,
conseqüentemente, começaram a ser feitas benfeitorias nas fazendas, com cercas separando as
propriedades e permitindo melhor seleção dos animais, o que abriu caminho para a estruturação de
um dos mais importantes plantéis de gado bovino do mundo.
Atividades:
1 - Observe a foto ao lado e
produza um texto sobre as
origens desse profissional
no Mato Grosso do
Sul.
69
Agora leia o texto a seguir:
Tratamento dispensado ao gado é bom
A marcha do gado remonta ao início da atividade pecuária de corte no estado. As
pessoas que trabalham nessa atividade foram criadas na lida com o gado e, mesmo com a
evolução dos transportes, o custo fala mais alto para o criador de gado na hora de levar o seu
rebanho.
Mesmo percorrendo longos percursos, o gado não emagrece significativamente na
maioria das vezes. Em muitos casos, chega a ganhar peso porque ao longo das estradas onde
as pastagens são viçosas ele consegue comer. Também nas pousadas (e muitas delas são
piquetes), há alimentação suficiente para repor o que foi gasto durante a caminhada, além de
água. O Correio Rural ouviu uma comitiva que saiu em meados de janeiro de Bonito para
Antonio João, numa marcha estimada de 20 dias. Eram 1.300 cabeças de touro de sobreano
que caminharam mais de 100 quilômetros até seu destino. Um grupo de sete peões, residentes
a maioria em Bela Vista, daria conta do trabalho. À frente a carroça, puxada por burro, com o
cozinheiro e todos os mantimentos; roupas; redes; utensílios e outros equipamentos básicos,
garantindo a logística da viagem. Arroz-carreteiro, guisado de mandioca, macarrão, arroz e
feijão são o cardápio básico desse pessoal, que fazia a sua parada diária em locais
predeterminados, perto de rios ou córregos ou nas cidades, nos clube de laço e parque de
exposições, porque o gado precisava de um local seguro para o pernoite. (CF)
Fonte: Jornal Correio do Estado: Campo Grande/MS, 09/02/2004.
Atividades:
1 - Escreva uma notícia para algum jornal ou revista salientando a questão bovina no Mato
Grosso do Sul.
2 - “Apesar da guerra, o rebanho bovino foi, em grande parte, preservado. Isso contribuiu para
a instalação da indústria do charque no Estado. Por isso, hoje, nos tornamos um dos principais
produtores de carne do Brasil”. Levando em consideração o texto acima, estabeleça uma
relação entre o papel da pecuária no começo do século XIX e nos dias de hoje e faça um painel
com gravuras, destacando frases do capítulo.
70
Glossário
Adelantado: Antiga nomenclatura dada às várias funções exercidas por civis ou militares nas
colônias da América Espanhola, como governador de uma província, Capitão-general, em tempo
de guerra.
Aluvião: depósito de cascalho, areia e argila que as enxurradas formam junto às margens ou foz
dos rios.
Aração: lavrar, sulcar a terra.
Bagual: diz-se de ou potro recém- domado; diz-se de ou animal domesticado que voltou ao estado
selvagem.sent.fig. intratável, espantadiço.
Bavário: Habitante da Bavária (região alemã).
Bergantine: antiga embarcação à vela e remo, esguia e veloz, com um ou dois mastros de galé e
oito a dez bancos para remadores, usada no oriente pelos portugueses; bergantim real bergantim
luxuosamente equipado, com toldo à popa, destinado ao serviço exclusivo do monarca.
Capitulação: rendição militar,render transigir.
Confluente: lugar onde se juntam um ou mais rios.
Encomienda: instituição segundo a qual , o proprietário de terras devia cristianizar os índios,
conquistando em troca o “direito” de receber deles um pagamento em trabalho.
Estaleiros: lugar onde se constrói ou consertam navio.
Estuário: tipo de foz em que o curso de água se abre mais ou menos largamente.
Gradagem: revolver e aplanar a terra lavrada.
Inóspita: em que não se pode viver.
Ipeca: erva rasteira, lenhosa, de flores brancas e raízes longas, de onde se extrai um alcalóide de
propriedades medicinais.
Macegosa: terreno coberto de erva daninha.
Mesológica: estudo das relações entre os seres vivos e o meio.
Omoplatas: cada um dos ossos chatos delgados e triangulares, que forma, cada um, a parte
posterior de cada ombro.
Política lindeira: Política de favores estabelecida entre os governantes das regiões de fronteira.
Rechaçar: fazer retroceder, opondo resistência, repelir.
Sazonal: relativo a ou que ocorre na sazão ou estação. Cada uma das estações do ano. Tempo
próprio para a colheita dos frutos. Oportunidade.
Sezões: Febre intermitente ou periódica; malária.
Trincheiras: escavação no terreno para que a terra escavada proteja os combatentes.
Varadouro: passagem.
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Adendos
Fonte: Atlas Histórico Básico - Editora Ática
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Fonte: Atlas Histórico Básico - Editora Ática
74
Fonte: Atlas Histórico Básico - Editora Ática
75
Fonte: Atlas Histórico Básico - Editora Ática
76
Fonte: Gilda Cristina Falleiros Mendes - Conhecendo Mato Grosso do Sul
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