ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM REUMATOLOGIA PERFIL DOS PACIENTES REUMATOLÓGICOS INTERNADOS EM UM HOSPITAL DE REFERÊNCIA EM DOENÇAS REUMÁTICAS DA CIDADE DE FORTALEZA-CE MARIA CLARA SECUNDINO PEREIRA FORTALEZA 2016 ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM REUMATOLOGIA PERFIL DOS PACIENTES REUMATOLÓGICOS INTERNADOS EM UM HOSPITAL DE REFERÊNCIA EM DOENÇAS REUMÁTICAS DA CIDADE DE FORTALEZA-CE MARIA CLARA SECUNDINO PEREIRA Monografia a ser apresentada ao Programa de Residência Médica em Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza e da Escola de Saúde Pública para obtenção de especialização em Reumatologia Orientadora: Rejane Maria Rodrigues de Abreu Vieira FORTALEZA 2016 ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM REUMATOLOGIA PERFIL DOS PACIENTES REUMATOLÓGICOS INTERNADOS EM UM HOSPITAL DE REFERÊNCIA EM DOENÇAS REUMÁTICAS DA CIDADE DE FORTALEZA-CE BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Dra. Rejane Mª Rodrigues de Abreu Vieira Orientadora e Médica Reumatologista do HGF ________________________________________ Dr. Walber Pinto Vieira Coordenador da Residência Médica em Reumatologia do HGF _________________________________________ Dra. Mailze Campos Bezerra Médica Reumatologista do HGF Aprovada em: ______________ de 2016 Sumário Lista de siglas e abreviaturas .................................................................................... v Resumo ..................................................................................................................... vi Abstract ..................................................................................................................... vii 1 - INTRODUÇÃO .................................................................................................... 01 1.1 - Objetivos .......................................................................................................... 02 1.1.2 – Objetivo Geral ............................................................................................... 02 1.1.3 – Objetivos específicos .................................................................................... 02 2 – MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................. 03 2.1 – Tipo de Estudo ................................................................................................. 03 2.2 – Amostra ........................................................................................................... 03 2.3 – Critérios ........................................................................................................... 03 2.3.1 – Critérios de Inclusão ..................................................................................... 03 2.3.2 – Critérios de Exclusão .................................................................................... 04 2.4 – Riscos ….......................................................................................................... 04 2.5 – Benefícios........... …......................................................................................... 04 2.6 – Instrumento de Coleta de Dados …................................................................. 04 2.7 – Análise de Dados ............................................................................................ 04 2.8 – Desfechos ........................................................................................................ 04 2.8.1 – Desfecho Primário. ....................................................................................... 04 2.8.2 – Desfecho Secundário ................................................................................... 05 2.9 – Aspectos Éticos …............................................................................................ 05 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................................................... 06 4 – CONCLUSÃO ......................................................................................................14 5 - REFERÊNCIAS ....................................................................................................16 Anexo 1.......................................................................................................................17 iv Lista de Siglas e Abreviaturas AR Artrite Reumatóide CFM Ciclofosfamida DM Diabetes mellitus DP Desvio-padrão DRC Doença renal crônica DCV Doença cardiovascular ES Esclerose Sistêmica HAS Hipertensão Arterial Sistêmica HGF Hospital Geral de Fortaleza ITU Infecção do trato urinário IVAS Infecção de vias aéreas superiores LES Lúpus Eritematoso Sistêmico RTX Rituximabe SAAF Síndrome do anticorpo antifosfolípide SS Síndrome de Sjogren TGI Trato gastrointestinal TVP Trombose venosa profunda UPA Unidade de Pronto Atendimento UTI Unidade de Terapia Intensiva v Resumo Houve avanços no diagnóstico e no tratamento das doenças reumáticas autoimunes nos últimos anos, permitindo maior sobrevida aos pacientes cronicamente enfermos. Apesar das melhorias do diagnóstico precoce e das opções terapêuticas, outros aspectos indiretamente relacionados à atividade da doença causam taxa significativa de complicações e levam à necessidade de hospitalização. Este estudo tem como objetivo conhecer o perfil clínico e epidemiológico dos pacientes que necessitam de hospitalização no Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza (HGF). Trata-se de um estudo transversal, retrospectivo e descritivo, que tem como base os dados de relatórios de alta dos 108 pacientes internados na Enfermaria de Reumatologia durante o período de março de 2014 a março de 2015. A maioria dos pacientes era do sexo feminino, portadora de Lúpus Eritematoso Sistêmico e estava na idade fértil. Grande parte apresentava comorbidades, sendo a Hipertensão Arterial Sistêmica a mais prevalente. Metade dos pacientes tinha internamentos prévios, e a maioria advinha do ambulatório de Reumatologia do HGF. Atividade da doença reumatológica e infecção foram as principais causas de internação. O tempo médio de permanência hospitalar foi de 17 dias, com alto índice de infecções nosocomiais, cujos focos principais eram respiratório, cutâneo e urinário. Houve uso expressivo de imunossupressores e antibióticos. Dada a escassez de estudos epidemiológicos, foi difícil correlacioná-los aos dados do presente estudo, o que salienta a necessidade de mais pesquisas epidemiológicas nacionais. A coleta de dados dos prontuários foi laboriosa, o que ressalta a importância do seu preenchimento adequado. O atraso de uma abordagem que poderia ser resolvida ambulatorialmente acaba levando ao agravamento do paciente e à necessidade de internação hospitalar. Houve boa resolutividade dos internamentos. Os pacientes tiveram acesso a procedimentos de alta complexidade, profissionais especializados e medicamentos específicos, apesar das dificuldades próprias do Sistema Único de Saúde. Palavras-chave: Epidemiologia, doenças reumáticas, hospitalização vi Abstract There have been advances in diagnosis and treatment of autoimmune rheumatic diseases in recent years, allowing greater survival to chronically ill patients. Despite improvements of early diagnosis and treatment options, other aspects indirectly related to disease activity cause significant rate of complications and deaths, and lead to the need for hospitalization. This study aims to evaluate the clinical and epidemiological profile of patients who require hospitalization at the Rheumatology Service from Hospital Geral de Fortaleza (HGF). It is a cross-sectional, retrospective,and descriptive study, which is based on hospital discharge reports data from 108 patients admitted to the Rheumatology Ward during the period from March 2014 to March 2015. Most patients were female, carrier of Systemic Lupus Erythematosus and fertile age. The majority presented comorbidities, being systemic hypertension the most prevalent. Half of the patients had previous admissions, and the majority comes from HGF Rheumatology clinic. Rheumatologic disease activity and infection were the main causes of admissions. The mean time of hospital stay was 17 days, with high rate of nosocomial infections, whose main focuses were respiratory, skin and urinary. There was significant use of immunosuppressants and antibiotics. Due to paucity of epidemiological studies, it was difficult to correlate them to the data from this study, which accentuates the need for more national epidemiological research. The collection of data from medical records was laborious, which emphasizes the importance of their proper completion. The delay of an approach that could be resolved in an ambulatory level eventually leads to the patient aggravation and the need for hospitalization. There was good resoluteness of admissions. Patients had access to highly complex procedures, specialized professionals and specific drugs, despite the difficulties inherent in SUS. Keywords: Epidemiology, rheumatic diseases, hospitalization vii 1 1- Introdução As doenças reumáticas compreendem um grupo heterogêneo de patologias que têm como aspecto comum o acometimento preferencial das articulações e do sistema musculoesquelético. A maior parte destas patologias envolve a inflamação crônica multissistêmica, caracterizando um componente autoimune de suma importância, que frequentemente requer cuidados intensivos e é potencialmente incapacitante (BROTEN, 2014; GOLDBLATT, 2013). As doenças reumáticas autoimunes compreendem vários subtipos, que incluem Artrite Reumatoide (AR), Lupus Eritematoso Sistêmico (LES), Síndrome de Sjogren (SS), Esclerose Sistêmica (ES), miopatias inflamatórias idiopáticas e vasculites sistêmicas. O mecanismo de patogênese, o curso clínico, o tratamento e o prognóstico variam conforme a particularidade de cada enfermidade e de cada paciente. Diferentes mecanismos imunorregulatórios estão envolvidos e não são plenamente compreendidos. Apesar das peculiaridades, todas as patologias mencionadas estão associadas a imunossupressão e incorrem em substancial morbimortalidade, com grande impacto socioeconômico (GOLDBLATT, 2013; TAKAKUBO, 2012). Houve avanços no diagnóstico e no tratamento das doenças reumáticas autoimunes nos últimos anos, permitindo maior sobrevida aos pacientes cronicamente enfermos. Nota-se um interesse crescente no estudo de critérios para diagnóstico precoce e classificação, na busca de medicações com menos eventos adversos e menores custos, na monitorização dos índices de prevalência das doenças reumáticas. Estimativas acuradas das taxas de doença são necessárias para determinar o significado clínico destes distúrbios e seu efeito sobre a saúde pública. Entretanto, os estudos epidemiológicos vigentes ainda são escassos. Isto se verifica, sobretudo, no Nordeste do Brasil, onde as fontes de pesquisa ainda são bastante limitadas (BERNATSKY, 2011; SANTIAGO, 2014; TAKAKUBO, 2012). Apesar das melhorias que subsidiam o diagnóstico precoce e as opções terapêuticas, com impacto positivo na sobrevida e no prognóstico dos portadores de doenças reumáticas, outros aspectos indiretamente relacionados à atividade da doença ainda causam taxa significativa de complicações e óbitos e levam à necessidade de hospitalização. Sabe-se que pacientes com doenças reumáticas 2 apresentam uma maior prevalência de doenças infecciosas quando comparados com a população em geral, seja devido à imunossupressão da doença de base ou à terapia imunossupressora. Nesse contexto, a prevenção e a detecção precoce de doenças infecciosas é de extrema importância em pacientes com imunidade prejudicada, face à grande morbidade e mortalidade nesses pacientes. Tal controle implica a necessidade de fácil acesso ao especialista, de acompanhamento ambulatorial periódico e de celeridade na internação hospitalar, quando esta se faz indicada (APPENZELLER, 2004; LUZ, 2007). 1.1- Objetivos 1.1.2 – Objetivo geral Conhecer o perfil clínico e epidemiológico dos pacientes que necessitam de hospitalização no Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza. 1.1.3 – Objetivos específicos Correlacionar os dados obtidos na literatura científica com os encontrados na Enfermaria de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza. Identificar as principais dificuldades para diagnóstico e tratamento efetivos face à conjuntura social e estrutura hospitalar em que o paciente está inserido. Avaliar o grau de resolutividade da internação hospitalar. 3 2- Materiais e Métodos 2.1 – Tipo de Estudo Trata-se de um estudo epidemiológico transversal, retrospectivo, descritivo, que tem como base os dados de relatórios de alta dos pacientes internados na Enfermaria de Reumatologia durante o período de março de 2014 a março de 2015. Os dados foram coletados em um instrumento elaborado pelos autores, específico para o estudo, contendo as seguintes questões: Sexo, idade, doença reumatológica prévia à internação, idade ao diagnóstico reumatológico prévio, tempo de diagnóstico da doença reumatológica, existência de internamentos prévios, diagnóstico inicial da internação, origem do paciente, presença de comorbidades, tempo de internação hospitalar, tratamento administrado durante a internação atual, realização de procedimentos invasivos intra-hospitalares, diagnóstico final da internação, tempo de permanência hospitalar, destino do paciente após alta hospitalar. 2.2 – Amostra A amostra compreende um total de 108 pacientes internados na Enfermaria do Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza no período de março de 2014 a março de 2015. 2.3 – Critérios 2.3.1 – Critérios de Inclusão Foram incluídos no estudo pacientes internados na Enfermaria do Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza que já são sabidamente portadores de doença reumatológica autoimune ou que apresentaram como hipótese diagnóstica inicial alguma doença reumatológica autoimune. Foram avaliadas todas as internações admitidas no período de março de 2014 a março de 2015. 4 2.3.2 – Critérios de Exclusão Foram excluídos do estudo pacientes internados na Enfermaria do Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza que não são previamente portadores de doenças reumáticas autoimunes nem as apresentaram como hipótese diagnóstica inicial. Os pacientes transferidos da Enfermaria de Reumatologia para outros setores do Hospital, bem como os pacientes acompanhados pelo Serviço de Reumatologia que não estiveram em nenhum momento da internação alojados na nossa Enfermaria, também foram excluídos, pela ausência de relatório de alta do próprio Serviço de Reumatologia. 2.4 - Riscos O presente estudo deu-se através da revisão de dados provenientes de relatórios de alta, sem acesso direto ao paciente. Há o risco de quebra de sigilo por identificação dos pacientes e dos dados contidos nos relatórios de alta, porém se mantém o compromisso em preservá-lo. 2.5 - Benefícios Conhecer o perfil dos pacientes internados no Serviço de Reumatologia. Avaliar as ferramentas diagnósticas, o manejo terapêutico e a resolutividade da internação. 2.6 – Instrumento de coleta de dados Vide anexo 1. 2.7 – Análise de dados Os dados obtidos nos relatórios de alta foram inseridos em uma planilha do programa Microsoft Excel e analisados. Os resultados foram apresentados em tabelas de frequência, de acordo com o tipo de variável analisada (contínuas ou categóricas). Para as variáveis contínuas foram calculadas média e desvio-padrão. 2.8 - Desfechos 2.8.1 – Desfecho primário Descrever o perfil dos pacientes internados na Enfermaria de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza. 5 2.8.2 – Desfecho secundário Correlacionar os resultados obtidos com os já descritos na literatura científica. Detectar as limitações inerentes ao próprio paciente ou ao Serviço em que está inserido. 2.9 – Aspectos éticos Houve uso de fonte secundária de dados. Foram coletados dados demográficos (sexo, idade, idade ao diagnóstico reumatológico prévio), diagnósticos inicial e final, tempo de doença reumatológica, tratamento durante internação, procedimentos intrahospitalares, internamentos prévios, origem e destino do paciente, comorbidades, tempo de internação. Este trabalho dispensa o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, pois não houve contato com os pacientes envolvidos na pesquisa. Antes de sua realização, foi avaliado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Instituição. 6 3 – Resultados e Discussão No período de março de 2014 a março de 2015, o Serviço de Reumatologia do Hospital Geral de Fortaleza foi responsável por 163 internações hospitalares. Destas, 118 (72%) correspondem a pacientes que permaneceram em acompanhamento na própria enfermaria de Reumatologia, enquanto 45 (28%) referem-se a pacientes que obtiveram outros destinos, tais como: transferência para enfermarias de outras especialidades médicas, encaminhamento a Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) ou óbito. Estes pacientes não dispuseram de relatório de alta preenchido pelo Serviço de Reumatologia. Do total de 118 internações às quais seguiu-se alta hospitalar na nossa enfermaria, dez (8,5%) diziam respeito aos mesmos pacientes, que necessitaram de múltiplas internações nesse período. Assim, um total de 108 pacientes foi avaliado no intervalo em estudo. Dos 108 pacientes estudados, pouco mais de 84% eram do sexo feminino, numa proporção aproximada de cinco mulheres internadas para cada homem internado. Já a média de idade ao diagnóstico foi de aproximadamente 32 anos, e a média de idade à internação foi em torno de 39 anos. A quantidade, em números absolutos e em percentual, pode ser agrupada em cinco faixas etárias principais, conforme visualizado na tabela 1. Tais dados estão de acordo com a literatura, segundo a qual a maioria das doenças reumáticas autoimunes tem maior prevalência no sexo feminino e no período de idade fértil, por uma associação ao efeito estrogênico (CARVALHO, 2014). 7 Tabela 1. Distribuição por gênero, idade e tempo de doença M:H 5:1 Sexo feminino/ Sexo masculino 91 (84,26%)/17 (15,74%) Idade média à internação (anos) 39,29 ± 14,88 Faixa etária (anos) 18-29 32(29,63%) 30-44 39(36,11%) 45-59 24(22,22%) 60-74 8(7,41%) ≥75 5(4,63%) Idade média ao diagnóstico prévio (anos) 32,53 ± 15,72 Tempo de doença (anos) 7,31 ± 6,84 O LES foi a doença reumatológica predominante entre as patologias da internação, compreendendo um total de 50% dos casos. A maioria era do sexo feminino, numa proporção de 13 mulheres para um homem. A média de idade ao diagnóstico foi de 27 anos, com DP de ± 9,89 anos. Tais informações se assemelham à literatura científica, que demonstra para o LES uma predominância do sexo feminino na proporção de 11 mulheres para um homem e um acometimento que se inicia entre 16 e 55 anos de idade. Outras patologias reumatológicas, encontradas em ordem decrescente de frequência nas internações avaliadas, foram: AR, vasculite e síndrome de sobreposição, conforme visualizado na tabela 2 (CARVALHO, 2014; SANTIAGO, 2014). Tabela 2. Distribuição dos pacientes previamente portadores de doença reumatológica segundo o tipo de doença Com doença prévia 94(87,04%) LES 54(50%) AR 10(9,26%) Vasculite 7(6,48%) Sobreposição 5(4,63%) Sjogren primária 3(2,78%) SAAF primária 3(2,78%) Espondiloartrite 2(1,85%) Polimiosite 2(1,85%) Outros 8(7,41%) Sem doença prévia 14(12,96%) Total 108(100%) Noventa e quatro pacientes tinham um diagnóstico reumatológico prévio, com tempo médio de doença de 7,31 anos (Tabela 1). Tal dado corrobora com os estudos 8 atuais, nos quais se nota um aumento da sobrevida entre os portadores de doenças reumáticas autoimunes, justificado pela padronização e precisão dos métodos clínicolaboratoriais, com diagnóstico precoce e maior suporte terapêutico. Estudos mostram que há 62 anos apenas 52% dos portadores de LES chegavam ao quarto ano; Atualmente, 95% atingem o quinto ano. Nos primeiros cinco anos de LES, a mortalidade se deve tipicamente à gravidade da doença ou a infecções relacionadas ao tratamento imunossupressor. No nosso estudo, 42 de 70 pacientes portadores de LES encontravam-se até o quinto ano de doença à internação, e a maioria apresentava atividade de doença e/ou infecção. Não foi possível avaliar taxas de óbito, uma vez que pacientes transferidos para outros setores do Hospital foram excluídos da avaliação (APPENZELLER, 2004; SANTIAGO, 2014). Apenas 14 pacientes não apresentavam doença reumatológica prévia e estavam em processo de investigação (Tabela 2). Destes, sete tinham tempo de doença inferior a 12 meses e obtiveram elucidação diagnóstica ao fim do período, enquanto apenas um com tempo de doença inferior a 12 meses não a obteve dentro desse intervalo. Sete pacientes com tempo de doença superior a 12 meses obtiveram elucidação diagnóstica durante a internação hospitalar. Tal resultado condiz com a literatura médico-científica, na qual se estima que até 50% dos portadores de doenças reumáticas autoimunes possam não ser prontamente diagnosticados com uma afecção específica nos primeiros 12 meses de seguimento (GOLDBLATT, 2013). Setenta pacientes (65%) apresentavam alguma comorbidade sabidamente conhecida antes da internação hospitalar. A patologia mais registrada foi a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), que acometia 59%. Dez pacientes eram portadores de Diabetes Mellitus (DM), nove tinham história pregressa de trombose venosa profunda (TVP), sete eram acompanhados por transtornos psiquiátricos, seis apresentavam doenças oftalmológicas, cinco tinham hipotireoidismo, quatro tinham acidentes vasculares cerebrais (AVCs) prévios, três tinham doença renal crônica (DRC). Psoríase cutânea, hepatite C e asma foram encontradas em um paciente, respectivamente. Sobre a HAS, comorbidade comum entre os pacientes internados, é sabido que constitui fator de risco para doenças cardiovasculares (DCVs). Estudos mostram que a prevalência de DCVs em pacientes com doenças reumáticas autoimunes é maior do que na população geral, como resultado de um efeito composto dos fatores de 9 risco cardiovascular tradicionais com a inflamação crônica, o componente genético e os efeitos adversos do tratamento. Estima-se que, em mulheres com LES e idade entre 35 e 44 anos, o risco relativo de infarto agudo do miocárdio é 52 vezes maior quando comparado a mulheres sem a doença. Observa-se ainda uma maior incidência de DCVs com a melhora da sobrevida de pacientes com LES, pois em geral a aterosclerose se manifesta numa faixa etária mais avançada e com maior tempo de doença. Tais resultados permitem vislumbrar futuras complicações cardiovasculares, bem como reinternamentos, entre as pacientes lúpicas que compõem a maior parte das internações na Enfermaria de Reumatologia do nosso Serviço (APPENZELLER, 2004; CASTANEDA, 2015; GOLDBLATT, 2013). Para 48% dos pacientes, essa internação correspondia à primeira registrada em prontuário, enquanto 52% já haviam se internado anteriormente. No período estudado, oito pacientes tiveram múltiplas internações na enfermaria de Reumatologia, seis dos quais tiveram duas internações, enquanto os outros dois pacientes necessitaram de três internações. Cabe indagar se parte dessas internações seria evitável, mediante a garantia de exames laboratoriais para detectar atividade da doença, de livre acesso ao ambulatório de Reumatologia aos primeiros sinais de descompensação clínica, de um atendimento primário capaz de diagnosticar precocemente uma doença reumatológica e de detectar e resolver infecções em pacientes imunossuprimidos. Quanto à origem dos pacientes, verificou-se que a maioria (72%) advinha do ambulatório de Reumatologia do HGF (Tabela 3), onde foram atendidos 13.022 pacientes no mesmo período. Esse dado permite inferir um entrosamento adequado entre profissional médico e paciente, com boa acessibilidade aos recursos hospitalares em caso de piora clínica ou necessidade de investigação complementar. Por outro lado, abre questionamento no que diz respeito à boa resolutividade do atendimento ambulatorial. A grande demanda de atendimentos ambulatoriais poderia levar ao atraso dos retornos e, por consequência, da detecção e resolução precoce de complicações. O tratamento específico das doenças reumáticas, em geral bastante oneroso, é outro ponto que talvez demonstre a indisponibilidade dos recursos terapêuticos a nível ambulatorial. 10 Tabela 3. Origem dos pacientes Ambulatório de Reumatologia do HGF Outros setores do HGF Outros serviços de Saúde do Estado Origem desconhecida Total 85(72,03%) 18(15,25%) 14(11,86%) 1(0,85%) 118(100%) Sobre o motivo das 118 internações à admissão hospitalar, foram computados dois diagnósticos iniciais principais (Tabela 4): Atividade da doença reumatológica e infecção. Foram 69 casos supostamente relacionados a atividade da doença, sendo 45 de LES. Destes, 67% correspondiam a nefrite lúpica, que é importante preditor de prognóstico e mortalidade. Foram 26 casos de infecção, dos quais 13 estavam associados à hipótese de atividade da doença reumatológica. Houve predomínio de focos cutâneos (GOLDBLATT, 2013). Tabela 4. Diagnóstico inicial à admissão hospitalar Doença reumatológica em atividade 69(58,47%) LES 45 (Nefrite lúpica) (30) Vasculite Miopatia inflamatória Sobreposição AR Outros Infecção Pele Trato respiratório Trato urinário Outros focos Outros 6 6 5 4 3 26(22,03%) 11 8 2 7 23(19,49%) Ao longo das 118 internações, somaram-se 44 casos de infecções com focos definidos, alguns com múltiplos focos. Os casos predominantes advinham de foco respiratório, cutâneo e urinário (Tabela 5). Comparando-se início e fim de cada internação, observa-se um aumento expressivo do registro de casos infecciosos, sobretudo da quantidade de casos respiratórios, que se igualou à de casos cutâneos, bem como da quantidade de casos urinários, que aumentou seis vezes. Esses dados servem de alerta para um índice importante de infecções intra-hospitalares, comuns a 11 pacientes suscetíveis do ponto de vista imunológico, e também para a necessidade de se traçar estratégias de prevenção de doenças infecciosas, como é o caso da vacinação (LUZ, 2007). Tabela 5. Casos de infecção no início e no fim das internações hospitalares e uso de antibióticos Infecção Início Fim Antibióticos Pele 11 14 18 (Úlceras) (6) (7) Trato 8 14 14 respiratório Trato urinário 2 12 12 Outros focos 7 9 10 Múltiplos focos 0 7 0 Total 26(22,03%) 44(37,29%) 56(47,46%) Sabe-se que a imunossupressão predispõe ao risco de infecções. Vários estudos confirmaram o aumento do risco de infecções entre pacientes tratados com agentes imunobiológicos, com presença infecções bacterianas graves e oportunistas que necessitam de terapia antimicrobiana e/ou hospitalização. Na amostra avaliada, o uso de antibióticos contemplou 50 (42%) diagnósticos infecciosos. Alguns pacientes apresentaram mais de um foco presumido e, portanto, mais de um diagnóstico infeccioso. Dessa forma, 56 focos infecciosos foram submetidos a antibioticoterapia (Tabela 5). (APPENZELLER, 2004; KOURBETI, 2014). Outros estudos apontam a infecção como sendo a principal causa de internação e de óbito em pacientes com LES. Entre os casos de LES, verificou-se a presença de infecção em 30 (25%). Nestes, o tempo médio de internação correspondeu a 19 dias, com DP de ± 11 dias. Nenhum dos casos mencionados evoluiu para óbito, o que não impossibilita que outros casos de LES excluídos do estudo tenham apresentado tal desfecho, tais como os que envolveram transferências às UTIs. Ainda que não evoluíssem para óbito, alguns pacientes com LES sofreram suspensão ou adiamento do tratamento específico da doença devido às intercorrências infecciosas, bem como um prolongamento do tempo de permanência hospitalar, o que certamente repercutiu no seu prognóstico geral. (APPENZELLER, 2004; KOURBETI, 2014; SANTIAGO, 2014). 12 Em relação ao tempo de permanência hospitalar geral, a média foi de 17 dias, com DP de ± 9 dias. O tempo mínimo foi de dois dias, ocasião em que a internação consistia na realização de nova infusão Rituximabe em paciente previamente diagnosticada com nefrite lúpica em atividade. O tempo máximo de permanência foi de 56 dias, referente a paciente com reativação de nefrite lúpica e ITU por germe multirresistente, submetida a antibioticoterapia intravenosa, pulsoterapia com CFM e biópsia renal. As intercorrências infecciosas, assim como a realização de exames de alta complexidade e procedimentos invasivos, podem ser elencadas como alguns dos principais fatores responsáveis pelo prolongamento das internações. Uma quantidade expressiva de procedimentos invasivos foi realizada durante a internação, entre os 118 casos estudados (Tabela 6). Destacaram-se 15 biópsias renais, sendo 13 por nefrite lúpica e duas por vasculite, além de seis casos de hemodiálise, todos em pacientes com nefrite lúpica. Tabela 6. Procedimentos realizados nas internações Biópsia 28 Renal 15 Pele 3 Glândula salivar 2 Músculo 2 Osso 2 Outros locais 4 Punção aspirativa por agulha fina 7 Hemodiálise 6 Debridamento 4 cirúrgico/amputação Drenagem tórax e/ou pericárdio 3 Cateterismo direito 2 Outros 6 Total 56 Sobre a instituição de tratamento específico da Reumatologia durante a internação, notou-se uso expressivo de corticoide, sendo 32 casos de uso prednisona oral na dose de 0,5mg/dia a 1mg/kg/dia e 24 casos de pulsoterapia com metilprednisolona, na dose de 1g/dia durante 3 dias. Houve 25 casos de uso de CFM e imunossupressores orais, respectivamente. Verificaram-se, ainda, nove casos de uso de RTX e seis casos de uso de Imunoglobulina. Das 118 internações avaliadas, 30 (25%) necessitaram do uso concomitante de imunossupressão e antibioticoterapia. 13 Isso ressalta a importância do binômio atividade de doença versus infecção sobre o prognóstico dos pacientes. Se, de um lado, o amplo uso de imunossupressores tem reduzido a incidência de óbitos decorrentes de atividade de doença, por outro tem aumentado o número de óbitos associados a infecções. Portanto, o controle de ambos, através da detecção precoce e do tratamento cauteloso, é determinante para a boa resolutividade dos internamentos hospitalares (APPENZELLER, 2004). Quanto ao destino dos pacientes após as 118 altas hospitalares, houve 103 encaminhamentos ao ambulatório de reumatologia, 60 encaminhamentos a outros ambulatórios, 22 encaminhamentos ao Centro de Infusão para administração de CFM mensal ou imunobiológicos, uma evasão hospitalar. A maioria dos outros ambulatórios contemplava as seguintes especialidades, em ordem decrescente de frequência: Endocrinologia, Neurologia, Nefrologia, Odontologia, Pneumologia, Cirurgia Vascular, Cardiologia, Oftalmologia. A franca necessidade de acompanhamento de múltiplas especialidades reforça o contexto de multidisciplinaridade em que os portadores de doenças reumáticas autoimunes estão inseridos, não raro sujeitos a várias comorbidades e complicações. Sua acessibilidade a um serviço de atendimento primário, secundário e terciário de qualidade, com abordagem diagnótisco-terapêutica eficaz, é de inquestionável relevância, a fim de contemplar as mais variadas necessidades e contribuir para a redução da morbimortalidade. 14 4 – Conclusão O perfil clínico-epidemiológico dos pacientes internados na Enfermaria de Reumatologia do HGF é predominantemente do sexo feminino e portador de LES, com comprometimento renal, e idade na faixa reprodutiva. Apresenta como principal comorbidade a HAS. Necessita de internação hospitalar por atividade da doença reumática auto-imune e/ou por infecção, sendo que metade sofre múltiplas internações desde o diagnóstico da doença de base. É procedente, na maioria das vezes, do próprio ambulatório de Reumatologia do HGF. Tem um tempo médio de permanência hospitalar de 17 dias, com alto índice de infecções nosocomiais, cujos focos principais são respiratório, cutâneo e urinário. Faz uso expressivo de imunossupressores orais e injetáveis. Dada a escassez de estudos epidemiológicos, sobretudo de fontes brasileiras, houve dificuldade em correlacioná-los aos dados obtidos no presente estudo. Isso salienta a necessidade de mais pesquisas epidemiológicas nacionais no que diz respeito às doenças reumáticas auto-imunes. Traçando-se o perfil dos doentes, com suas mais variadas particularidades, o profissional de saúde e a Instituição de Ensino e Saúde tornam-se mais aptos para a determinar metas de controle das doenças. Quanto aos prontuários dos pacientes avaliados, pode-se dizer que a coleta dos dados foi demasiado laboriosa. Cabe ressaltar a importância do seu preenchimento adequado, considerando-se o valor dos mesmos como fonte inesgotável de saber para Ensino e Pesquisa, bem como medida da eficiência do trabalho profissional, do Serviço e da Instituição de Saúde. Identificaram-se algumas dificuldades para diagnóstico e tratamento efetivos dos pacientes. No tocante ao acesso do paciente à assistência médica especializada do HGF, a grande demanda acaba por atrasar o retorno ambulatorial. A limitação de acessibilidade em períodos alheios ao dia da consulta, que de certo modo é necessária para a organização da Instituição, impede a avaliação de possíveis intercorrências. Somem-se, ainda, a constatação diária da lotação da Emergência e a ineficiência da atenção primária e secundária em saúde. Tudo isso faz com que os pacientes sofram demora no diagnóstico e no tratamento de descompensações clínicas pertinentes à imunossupressão, quer pela doença de base, quer pelo 15 tratamento. Assim, o atraso de uma abordagem que poderia ser resolvida ambulatorialmente acaba levando ao agravamento do paciente e à necessidade de internação hospitalar. Em relação aos internamentos em si, pode-se concluir que houve boa resolutividade. Os pacientes tiveram acesso a procedimentos de alta complexidade e múltiplos profissionais especializados. A oferta de medicamentos foi contemplada de uma forma geral. Apesar da não tão infrequente falta de imunossupressores ou antibióticos específicos, foi possível recorrer a outras alternativas terapêuticas. Houve, porém, dificuldade na realização de alguns exames laboratoriais e de imagem, por falta de insumos. Essas são dificuldades próprias das instituições que tem como âncora de atendimento o Sistema Único de Saúde, sempre sobrecarregado. 16 5 – Referências 1. APPENZELLER, S.; COSTALLAT, L.T.L. Análise de Sobrevida Global e Fatores de Risco para Óbito em 509 Pacientes com Lúpus Eritematoso Sistêmico. Rev Bras Reumatol, v. 44, n. 3, p. 198-205, mai./jun. 2004. 2. BERNATSKY, S.; LINEHAN, T.; HANLY, J.G. The Accuracy of Administrative Data Diagnoses of Systemic Autoimmune Rheumatic Diseases. Journal of Rheumatology, v.38, n.8, p.1612-1616, ago. 2011. 3. BROTEN, L. et al. Systemic Autoimmune Rheumatic Disease Prevalence in Canada: Updated Analyses Across 7 Provinces. The Journal of Rheumatology, v.41, n.4, p.673-679, abr. 2014. 4. CASTANEDA, S. et al. Cardiovascular morbidity and associated risk factors in Spanish patients with chronic inflammatory rheumatic diseases attending rheumatology clinics: Baseline data of the CARMA Project. Seminars in Arthritis and Rheumatism, v.44, n.6, p.618–626, jun. 2015. 5. CARVALHO, M.A.P. et al. Reumatologia: Diagnóstico e Tratamento. 4 ed. São Paulo: AC Farmacêutica, 2014. 6. GOLDBLATT, F.; O'NEILL, S.G. Clinical aspects of autoimmune rheumatic diseases. Lancet, v.382, n.9894, p.797-808, ago. 2013. 7. KOURBETI, I. S.; ZIAKAS, P.D.; MYLONAKIS, E. Biologic Therapies in Rheumatoid Arthritis and the Risk of Opportunistic Infections: A Meta-analysis. Clinical Infectious Diseases, v.58, n.12, p.1649–1657, jun. 2014. 8. LUZ, K.R.; SOUZA, D.C.C.; CICONELLI, R.M. Vacinação em Pacientes Imunossuprimidos e com Doenças Reumatológicas Auto-Imunes. Rev Bras Reumatol, v. 47, n.2, p.106-113, mar/abr. 2007. 9. TAKAKUBO, Y.; KONTTINEN, Y.T. Immune-regulatory mechanisms in systemic autoimmune and rheumatic diseases. Clinical and Developmental Immunology, v.2012, 14p, ago. 2011. 10. SANTIAGO, M.P.B. et al. Atividade, Gravidade e Prognóstico de pacientes com Lúpus Eritematoso Sistêmico – antes, durante e após prima internação. J Health Biol Sci, v.2, n.2, p.65-73, mai. 2014. 17 Anexo 1 1. Sexo: M ( ) F ( ) 2. Idade: _____ anos 3. Doença reumatológica prévia: Não ( ) Sim ( ) Se sim, qual?_______________ 4. Idade ao diagnóstico reumatológico prévio: ____ anos 5. Tempo de diagnóstico da doença reumatológica: _____ anos 6. Internamentos prévios? Sim ( ) Não ( ) 7. Diagnóstico inicial da internação atual: ________________________________ 8. Origem do paciente: Ambulatório Reumatologia do HGF( do HGF( ) Outros serviços de Saúde do Estado( ) ) Outros setores Origem desconhecida( ) 9. Comorbidades:__________________________________________________ 10. Tempo de internação hospitalar: _____________________________________ 11. Tratamento na internação atual:_____________________________________ 12. Procedimentos invasivos: __________________________________________ 13. Diagnóstico final da internação atual:_________________________________ 14. Tempo de permanência hospitalar: ___________________________________ 15. Destino do paciente após alta hospitalar: Ambulatório Reumatologia( ) Centro de Infusão( ) Outros ambulatórios( ) Se outros ambulatórios, quais? _____________________________________________