2598 Introdução - Vilson J. Leffa

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ESQUIZOFASIA: ASPECTOS PSICOLÍNGUISTICOS DE UMA LINGUAGEM
SUPOSTAMENTE AGRAMATICAL.
Moab Duarte Acioli - Universidade Católica de Pernambuco
Introdução
Um dos mais instigantes temas de estudo da linguagem humana é aquele que aborda a
linguagem do sujeito que se apresenta esquizofrênico, um quadro psicopatológico emblemático
do que se denomina loucura. Está sendo enfocada uma condição limite, plena de enigmas,
estimulando autores a fazerem comentários sobre os comentários do filósofo francês GillesDeleuze (1925-1995) em torno de “um modelo agramatical para a língua”:
(...) arrastada ao seu limite agramatical pelas novas potências gramaticais,
descobre, revela, confronta, do outro lado do seu limite, as ‘figuras de uma
vida desconhecida’, ‘música e silêncio’, ‘visões e audições não linguageiras’,
seu fora, um fora não exterior (...) a linguagem é procurada lá onde parece
faltar, longe do equilíbrio, perto do esquizofrênico e dos grandes livros
escritos numa espécie de língua estrangeira, língua em desequilíbrio (...) é aí,
beirando seus limites, que a natureza da linguagem se mostra (ALMEIDA,
2003, p.27).
Dialeticamente pode ser dito que “lá” onde “parece” não existir linguagem, é o lugar
onde a linguagem se mostra, e para isso o caminho se inicia com o conhecimento do que seja
esquizofrenia. È uma categoria que surge da “medicalização” da loucura. Num aspecto
semiológico, é importante diferenciar sintoma, como experiência da doença, de signo, como
diagnóstico e prognóstico científico, destacando a intervenção de uma consciência que elabora
essa objetivação (FOUCAULT,1998). Nessa consciência “diagnosticadora”, há um lugar
fundamental para uma “ordem discursiva”, classificando os signos em critérios de normalidade
e de patologia (FOUCAULT,1996).
O processo histórico de medicalização da loucura se iniciou com o movimento do
alienismo, fundamentado no conceito de tratamento moral de Philippe Pinel (1745-1826), ao
término do século XVIII, sob a atmosfera da Revolução Francesa. O reformador sofreu
influências do Iluminismo, principalmente de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), para quem
existia a defesa do homem “bom” no estado natural, vindo a sociedade a corrompê-lo
(MARTINS FILHO, 2000).
Uma das precondições do tratamento moral era isolar o paciente da sociedade,
entendida como estratégia de proteção do louco. Nesse contexto, o termo hospital era pejorativo,
pois ficava subtendida a “hospedagem” do limbo social, enquanto asilo implicava o sentido de
“proteção”. A loucura converteu-se numa entidade clínica, necessária ser descrita, para se
buscar a respectiva cura (DESVIAT, 1999).
Entre os séculos XIX e XX europeu, o fortalecimento do positivismo implicou a
superação do pensamento metafísico pela ordem física e matemática, tendo influência na
constituição do campo da psiquiatria. Nele surgiu um modelo nosológico, mais organicista,
representado, em se tratando da loucura, pela definição de “dementia praecox”, elaborada por
Emil Kraepelin (1856-1926), apontando um processo endógeno e do metabolismo cerebral de
“demenciação”.
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Outro, mais psicodinamista, esteve envolto com a elaboração do próprio conceito de
esquizofrenia, por Eugen Bleuler (1857-1939), conceituada como uma entidade mórbida,
igualmente endógena, ou então, como reação psicopatológica. Nesse caso, os principais sinais
eram a fragmentação das associações de idéias, podendo ocorrer, igualmente, autismo e
ambivalência afetiva.(EY; BERNARD; BRISSET, 1978; STONE, 1999).
Apesar da inter-relação fundamental entre pensamento e linguagem
(VYGOTSKY,2005), os estudos psicopatológicos, principalmente por conta da influência da
fenomenologia, consideravam a linguagem secundária ao pensamento, o que no caso da
esquizofrenia, as alterações da linguagem eram percebidas apenas como uma consequência da
fragmentação do pensamento (GABBARD, 2006). Entretanto, é inegável ocorrer na
esquizofrenia uma completa desorganização da linguagem, cuja sintaxe se torna inteiramente
incoerente e ilógica (EBERT; LOOSEN; NURCOMBE, 2000).
Portanto, nesse artigo caracterizado como revisão bibliográfica, apresentando
fragmentos de um caso clínico, é apontada a necessidade de uma compreensão dos novos
significados da linguagem no caso da esquizofrenia, discutindo ser ou não ser um distúrbio,
existir ou não existir determinada “gramaticalidade”, no qual são trilhados percursos teóricos, e
por que não dizer clínicos, a se buscar uma fusão de horizontes entre a perspectiva do terapeuta
e/ou pesquisador e o respectivo paciente (GADAMER, 1998).
1) O Conceito de Esquizofasia
Esquizofasia é um sinal clínico descrito por Emil Kraepelin (1856-1926), oriundo do
grego “esquizo” (no português cisão) e “fasia” (no português linguagem). Nessa clínica pode ser
dito que a linguagem se apresenta como uma mistura confusa de palavras, pronunciadas pelo
menos com grande rapidez, de modo a tornar o discurso absolutamente incompreensível.
Somente os aspectos prosódicos permitem uma tradução efetiva e afetiva (CAIXETA et
al.,1999; CHELNAUX, 2005).
Além da esquizofasia, também denominada de “salada de palavras”, existe no caso da
esquizofrenia outros sinais, a saber: a) neologismos: criação de novas palavras; b) estilizações,
rebuscamentos e maneirismos: perda da adequação e flexibilidade do comportamento verbal
diante do contexto sociocultural; c) criptolalia: construção de linguagem completamente
incompreensível (DALGALARRONDO, 2008).
Num sentido neurolinguístico, é importante referir serem encontradas semelhanças entre
a esquizofasia e as parafasias dos sujeitos portadores de afasia sensorial. Este tipo de afasia se
caracteriza pela perda da capacidade de compreensão das palavras, sem apresentar um insight
do problema, e estando associada a lesões no hemisfério esquerdo. Por sua vez, as parafasias
podem ser definidas como literais, ou seja, substituir uma palavra por outra: mulher por chapéu,
por exemplo; ou então, verbais, com permuta de um som por outro som, entre eles, substituir
chapéu por papel (POROT, 1977).
Importante relembrar que as afasias sensoriais foram descobertas pelo neurologista
francês Karl Wernicke (1848-1905), ao pesquisar uma área neuroanatômica, na junção
temporoparietal esquerda, considerando que estava associada com a compreensão da palavra.
Entretanto, autores como Barros (2000, p.18) comentando os respectivos comprometimentos da
expressão — em se tratando, especificamente, das chamadas afasias motoras— e também da
compreensão nos casos de afasia sensorial, relembra que os pioneiros nesses estudos
explicaram a linguagem em termos anatônicos cerebrais e o lingüístico ficou
reduzido a um centro motor conectado a um centro sensorial, unido através
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de fibras de associação. Estabeleceu-se assim, uma relação direta entre uma
lesão e a presença de sintomas, portanto, uma relação de causalidade direta.
Esta é a crítica de Sigmund Freud (1856-1939), em 1891, no texto “Sobre a concepção
das afasias”, descrendo no modelo localizacionista e vindo a elaborar o conceito de aparelho de
linguagem, no qual a palavra, num sentido psicológico e sendo a unidade fundamental da
linguagem, apresenta quatro elementos principais, a saber: 1º A imagem acústica; 2º A imagem
visual da letra; 3º A imagem cinestésica da fala ou glossocinéstica; 4º A imagem cinéstica da
escrita (FREUD, 1977).
Nesse aspecto, tanto a fala quanto a escrita para serem inteligíveis devem apresentar
uma coerência semântica e uma coesão sintática que parecem atingidas nos casos de
esquizofrenia. O que ocorre com o aparelho de linguagem? Que leitura psicolingüística pode ser
elaborada?
2) A Esquizofasia e a Contribuição da Psicolinguística
Jacques Lacan (1901-1981), no ano de 1953, ao escrever o histórico Discurso de Roma,
afirmou:
Que se retome pois a obra de Freud na Traumdeutung para se recordar aí que
o sonho tem a estrutura de uma frase, ou melhor, a nos atermos à sua letra, de
um enigma, isto é, de uma escrita da qual o sonho da criança representaria a
ideografia primordial, e que no adulto reproduz o emprego fonético e
simbólico ao mesmo tempo dos elementos significantes, que se reencontra
nos hieróglifos do antigo Egito assim como nos caracteres cujo uso a China
conserva (LACAN,1996, p.132)
Está sendo abordado que o acesso ao simbólico é condição necessária para a
constituição do inconsciente, tendo este uma presença forte de representações imagéticas que se
articulam com as representações ídeoverbais do plano pré-consciente/consciente.
Com isso é observada uma reviravolta nos preceitos estruturalistas de Ferdinand de
Saussure (1857-1913), este a vincular significante como imagem acústico-verbal e significado
como a construção social desse sentido (SAUSSURE, 2006). Ao contrário, para a psicanálise
lacaniana existe uma autonomia do significante em relação ao significado, o que no caso da
esquizofrenia, este significante transborda através de uma série de sintomas, entre eles a
esquizofasia. A polissemia do significante imagético é percebida através da tentativa de uma
interpretação consciente por outros sujeitos dos sentidos do discurso esquizofásico (LACAN,
1985; CABAS, 1982).
Ao abordar a fala na esquizofrenia, Sigmund Freud (1856-1939) escreveu o seguinte:
Na esquizofrenia as palavras estão sujeitas a um processo igual ao que
interpreta as imagens oníricas dos pensamentos oníricos latentes — que
chamamos de processo psíquico primário. Passam por uma condensação, e
por meio do deslocamento transferem igualmente suas catexias de umas para
as outras. O processo pode ir tão longe, que uma única palavra, se for
especialmente adequada devido a suas numerosas conexões, assume a
representação de todo um encadeamento de pensamento (FREUD, 1974,
227).
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Parte-se de uma concepção do narcisismo na esquizofrenia, no qual a energia psíquica
encontra-se centrada no sujeito e onde a palavra na condição de representação das coisas, tornase uma coisa em si mesmo. Está em jogo todo um movimento de condensação das palavras —
uma fotografia vale mais do que mil palavras — e um deslocamento de sentidos, entre essas
palavras, perdendo as referências das coisas às quais elas deveriam representar.
Num olhar lingüístico, a esquizofasia se encontra num gradiente entre a glossolalia,
onde se destacam as alterações semânticas, entre elas o neologismo; e a salada de palavras, onde
existem as alterações sintáticas. Em outro enfoque teórico, pode ser dito haver certo um
paralelismo entre a perspectiva psicanalítica na relação significante-imagem e significado-idéia,
com os preceitos de Charles Peirce (1839-1914), para quem a linguagem se fundamenta numa
semântica verbo-visual fundamentada na relação entre o ícone / figura, o índice / referente e o
símbolo / convenção social (PEIRCE; FREGE, 1974).
Autores como Dor (2003) pontuando a ótica de Lacan, enfatizam que o acesso ao
simbólico é condição necessária para a constituição do inconsciente, sendo este e o consciente
efeito de um mesmo ato, e um sendo epifenômeno do outro. Nisso, a aquisição da linguagem
propicia uma clivagem do sujeito. Porém, a linguagem é instrumento do consciente e não do
inconsciente, já que este é constituído, principalmente, de REPRESENTAÇÕES
IMAGÉTICAS, enquanto as REPRESENTAÇÕES ÍDEO-VERBAIS fazem parte do plano do
pré-consciente / consciente. Entretanto, não se poderia pensar numa determinada gramática da
imagem?
Relembrando as relações entre a esquizofasia (alteração semântica e sintática na
esquizofrenia) e a jargonofasia (alterações semânticas e sintáticas presentes nas afasias), é
oportuno abordar outro aspecto no âmbito lingüístico. Sobre isso Jakobson e Halle (1956)
elaboraram uma classificação dos transtornos de linguagem nas afasias em dois grupos:
1º Grupo: Afasias da similaridade: Existe uma perda mais ou menos grave na
capacidade de selecionar, e portanto, substituir unidades lingüísticas semelhantes, entre elas,
fornecer um sinônimo para a palavra chapéu, por exemplo. Está implicada a função semântica.
2º Grupo: Afasias de contiguidade: Existe um comprometimento da estrutura de relação
entre os signos lingüísticos, comprometendo a organização sintática. Os pacientes muitas vezes
são chamados de agramaticais, porque se utilizam de um amontoado de palavras. São perdidas
as funções sintáticas e há um comprometimento das relações metonímicas.
Jakobson e Halle (op.cit.) igualmente afirmam que diante das respectivas dificuldades
com os tropos, os pacientes se apóiam nas estruturas completamente ou parcialmente
preservadas, do seguinte modo, a saber: nos casos de afasia de similaridade, os pacientes
privados da capacidade de estabelecer relações metafóricas, apoiarão seu discurso nas relações
lógicas e contextuais; ao passo que os pacientes com afasia de contiguidade, com dificuldades
em estabelecer relações metonímicas, apresentarão recursos metafóricos, mesmo que
empobrecidos.
Resumindo, pode ser dito que nessa compreensão lingüística, a esquizofasia encontra-se
num gradiente em um pólo, onde existe um desvio semântico, a glossolalia e em outro pólo, um
desvio sintático, a salada de palavras.
Ao nível do encontro dialógico com o terapeuta, a abordagem do sujeito portador de
esquizofasia tem que se apoiar em um determinado contrato de singularidade da comunicação,
formado pela universalidade do padrão lingüístico e a particularidade da linguagem do
esquizofrênico sem a referência externa.
No próximo item serão comentados alguns fragmentos de um discurso esquizofásico.
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3) Fragmentos de um Discurso Esquizofásico:
Ricardo aos 17 anos de idade apresentou o primeiro surto esquizofrênico, entre vários,
até os atuais 22 anos. Encontrava-se cursando o segundo ano do Ensino Médio, tendo parado de
estudar por conta das vozes que lhe perturbavam a concentração.
Ao falar da sua experiência de adoecer, resume-a na seguinte frase:
(1) “Oitchau é igual a carniê mais sinfi mais hormônio comlê mais tininho de fama”.
No ambulatório do SUS, onde é medicalizado, o psiquiatra lhe perguntou o significado
daquela frase e ele cartesianamente a decompôs nos seus elementos constituintes. Ricardo
respondeu:
(2) “Oitchau é oi quando fala e tchau quando termina. São probleminhas de falinhas
para falar”
A condensação de duas das interjeições, uma de chegada e outra de partida no Brasil,
cria um efeito de neologismo, implicando uma simultaneidade entre dois momentos do ato de
fala, do começo e do seu fim. Uma possível compreensão do sentido da ambigüidade é a
presença das “falinhas”, ou seja, das alucinações auditivas que provavelmente ocorrem quando
ele começa a falar, vindo o mesmo a ficar imediatamente em mutismo.
(3) “Carniê é inflamação da garganta mais vozes dentro da boca”.
Outra condensação surge entre palavras que denota uma composição entre o morfema
“carne” e o fonema vogal, anterior e semifechado “ê”, que denota uma certa semelhança com
vocábulos de etimologia grega como “gastrite”, que pode ser decomposto em “gastro” (no
português estômago) e “ite” (inflamação). No caso não se trata de uma afecção física, mas
psíquica com a experiência cenestésica da presença de vozes, que não são as suas, dentro da sua
boca, expressando a alteridade do sujeito.
(4) “Sinfi é festa de aniversário de três gêmeos, dizendo que tem um filho”.
A concepção da palavra como uma coisa no fenômeno da esquizofasia, assim como o
transbordamento do significante em relação ao significado pode permitir compreender as várias
condensações com suas possibilidades de polissemia. O termo “sinfi” parece indicar um
neologismo que remete a uma idéia de “sem filhos”, haja vista, o próprio paciente, em outra
entrevista, destacar essa condição como sendo “ao contrário”, ou seja, a ausência de paternidade
mostrar-se uma situação reversa nas situações do cotidiano. O paradoxo lógico é encontrado na
explicação do termo “sinfi” como sendo “festa de aniversário de três gêmeos”, talvez o próprio
sujeito fragmentado nas suas alteridades, e “dizendo que tem um filho”, fato que ainda não
ocorreu, pois o paciente nunca teve um relacionamento amoroso ou sexual.
(5) Hormônio comlê é nascido nos Estados Unidos.
Trata-se de outra condensação na qual pode ser pensada a idéia de “hormônio com leite”
o que implica o sentido masculino de sêmen e feminino de aleitamento materno. Uma nova
fragmentação de sentidos, associada à explicação de nascido nos Estados Unidos, o que implica
uma outra identidade do sujeito, de nacionalidade brasileira, o que pode estar relacionado a um
desejo de metamorfose.
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(6) Tininho da fama é pensar ser famoso.
O substantivo masculino tino apresenta o significado de vaso para conter plantas e que
num arcaísmo com sentido figurado pode representar a vocação ou a competência para o
exercício de alguma tarefa ou algum predicado. No caso o diminutivo está relacionado à
vocação para a fama, como expressão aberta do desejo do paciente. Entretanto, em outro
momento ele define o significado da palavra “anônimo” como sendo “chegou alguém no
ambulatório”. Isso parece remeter a outra idéia, a da massificação da assistência médica no
Sistema Único de Saúde, quando o sujeito torna-se uma palavra-doença ou um númeroprontuário. Anônimo significa aquele que não tem ou não deseja mostrar o seu nome.
Considerações Finais
A contribuição da interface psicologia, psicopatologia e lingüística mostra-se relevante
como possibilidade de multiplicação dos ângulos que enfoquem fenômenos complexos como a
linguagem na esquizofrenia.
Mais uma vez fica registrada uma dicotomia entre modelos de explicação mecânica,
linerar e objetivista, como aqueles exclusivamente biomédicos, e aqueles outros hermenêuticos,
compreensivos e intersubjetivos, a permitir, mesmo de modo tímido, o entendimento do por quê
de certos fenômenos.
Essa compreensão psicolingüística da esquizofasia apresenta uma importância teórica
ao sublinhar a natureza dos processos lingüísticos em si mesmos, mostrando a sua face
imagética e verbal, ou então, a importância da cadeia de significantes em relação à construção
social dos significados;
Além disso, diante da esquizofrenia, quadro psiquiátrico que atinge cerca de 1% da
população mundial, a ideologia que faz acreditar num processo crônico e incapacitante, muitas
vezes não elabora uma autocrítica e mostra que os chamados cuidadores não estão atentos à
natureza dessa linguagem particular, perdendo a possibilidade do estabelecimento de um esforço
dialógico.
Inegável a existência de um hermetismo e para isso a hermenêutica permite a abertura
das Caixas de Pandora. Não se deve esquecer que Hermes dos gregos e Mercúrio dos romanos,
era o intérprete da vontade dos deuses, e no caso, os deuses podem ser pensados como as forças
misteriosas presentes na condição de esquizofrenia.
Existe uma patologia porque existe sofrimento psíquico, entretanto se é uma linguagem
gramatical ou não, fica a pergunta a ser respondida em outro momento, sobre a existência ou
inexistência de uma gramática da imagem. De modo preliminar, pode ser trazido o pensamento
de Lao-Tsé (VI AC), quando escreveu no primeiro versículo do Tao: O livro do caminho
perfeito, as seguintes palavras:
O Insondável (Tao) que se pode sondar não é o verdadeiro Insondável. O
Inconcebível que se pode conceber não indica o Inconcebível. No
Inconcebível está a origem do Universo. O que é Nominável constitui a mãe
de todos os seres. O Ser indigita a Fonte Incognoscível. O Existir nos leva
pelos canais cognoscíveis. Ser e Existir são a Realidade Total. A diferença
entre Ser e Existir são a Realidade total. A diferença entre Ser e Existir é
apenas de nomes. Misterioso é o fundo da sua unidade. Eis em que consiste a
sabedoria suprema (LAO-TSÉ, 2004, p.27).
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