REFLEXÕES SOBRE A PROBLEMÁTICA IATROGENIA E O CÓDIGO DE ÉTICA.1 Luciana de Alcântara Nogueira2 Lujácia Felipes3 Jorseli A. H. Coimbra4 INTRODUÇÃO: A segurança do paciente bem como a preservação da qualidade do cuidado prestado são algumas das tarefas a serem cumpridas pelos profissionais que atuam na área da saúde. Neste sentido, várias instituições vêem investindo em larga escala no que se chama de “qualidade total”, termo que “implica no compromisso de toda a organização para a melhoria contínua da qualidade” (DECESARO, 2000). Para Decesaro (2000), o pensamento que norteia a qualidade total refere-se à valorização da qualidade da assistência, tendo como meta o erro zero no atendimento, preconizando as ações preventivas. Para isso, é preciso um envolvimento de todos os profissionais da equipe a fim de analisar caso a caso a melhor forma de conduzi-los. Nas últimas décadas, especificamente na área da enfermagem, o cuidado tem se tornado a essência, e tem se caracterizado pelo envolvimento, enriquecendo assim a relação interpessoal. No entanto, o cotidiano do cuidar estabelece situações que nem sempre são almejadas. As falhas muitas vezes fazem-se presentes, e ao invés de solucionarmos os problemas do paciente, em várias ocasiões somos capazes de gerá-los. O termo utilizado nestes casos passa a ser iatrogenia, “palavra que deriva do grego iatros, que significa médico e gênese, origem” (PIERIN et al, 1983). A iatrogenia é definida por Carvalho Filho et al (1998) como afecções decorrentes da intervenção da equipe de saúde, seja ela certa ou errada, justificada ou não, mas da qual 1 Este é um segmento de um trabalho realizado com intuito de avaliação da disciplina de Ética do Mestrado em Enfermagem da Universidade Estadual de Maringá. 2 Enfermeira, mestranda do programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Estadual de Maringá, coordenadora do curso de Enfermagem do Centro Educacional Católico Diocesano do Sudoeste do Paraná (UNICS) 2 3 Enfermeira, mestranda do programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Estadual de Maringá. Rua Pioneiro Antonio Barbosa do Amaral, 113 Jardim Quebec, CEP: 87.023-486 Maringá /PR. E-mail: [email protected]. Telef: (44) 9915-9762 4 Enfermeira, doutora e docente da Universidade Estadual de Maringá. resultam conseqüências prejudiciais para a saúde do paciente. Para David, Vargas e Hoirisch (1984), iatrogenia “é a doença produzida pela equipe de saúde”. Os conceitos a cerca do tema são variados, no entanto a similaridade se encontra na qualidade de atendimento prestado. As iatrogenias em geral, aumentam o sofrimento, as seqüelas, o custo do tratamento bem como a mortalidade do paciente. Tais afecções são bastante freqüentes e destacamse quando avaliadas em unidades de terapia intensiva (UTI), em tratamentos com idosos e pacientes com doença graves, em virtude da multiplicidade de cuidados realizados, ou seja, o paciente que necessita de grande número de procedimentos, a probabilidade de ocorrer um erro é maior. O profissional enfermeiro está inserido no fenômeno iatrogenia por atuar diretamente com o paciente por um período prolongado, e fazer maior número de intervenções que o profissional médico. “A iatrogenia dos cuidados da enfermagem, está relacionada à privação dos cuidados, imposição ou a prestação insatisfatória destes que viriam causar transtorno, dano ou prejuízo ao paciente (MADALOSSO, 2000)”. Assim, com a finalidade de garantir a conduta ética dos profissionais de Enfermagem nas instituições, zelar pelo exercício ético desses profissionais, combatendo o exercício ilegal da profissão, educando, discutindo e divulgando o Código de Ética dos profissionais de Enfermagem e notificando os casos de erros no processo de cuidar, o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), por meio da Resolução número 160/93 instituiu o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem na jurisdição de todos os Conselhos Regionais de Enfermagem nas Instituições de Saúde. (MOURA, 1996). Na Enfermagem, o número de publicações acerca da problemática iatrogenia, tem aumentado nos últimos anos. No entanto, tais publicações, em sua grande maioria, abordam o termo iatrogenia de acordo com um problema de assistência identificado. Um exemplo disso são os trabalhos envolvendo erros referentes à medicação, ou então a queda do paciente enquanto hospitalizado. OBJETIVOS: Neste trabalho pretendemos abordar a iatrogenia na enfermagem, a importância das notificações de erros no processo do cuidar, a necessidade do conhecimentos do Código de Ética dos profissionais de enfermagem e sua relação com esses erros. DESENVOLVIMENTO: A equipe de enfermagem, em relação às outras equipes, é a que permanece mais tempo com o paciente durante o tratamento. A escassez de profissionais na área de enfermagem atrelado ao número abundante de pacientes, tem evidenciado cada vez mais o número de “acidentes” no processo de cuidar. A falta de conhecimento e o desinteresse pelo Código de Ética que regulamenta cada profissão é fato notório. E esse descaso pode criar inúmeros problemas. É claro que as técnicas são importantíssimas para a construção do bom profissional e, embora ainda que ganhando espaço, o conhecimento de seu respectivo Código de Ética ainda está longe de ser uma obrigação curricular. Mas vale lembrar que qualquer desobediência às determinações do código de ética é passível de processo, portanto, o profissional de enfermagem deve atentar-se para conhecer o código de ética e assim evitar complicações e infrações que posteriormente poderão comprometer seu registro profissional (BARBOSA, 2004). Walkefield et al (apud Coimbra, 2004), afirmam que para a estimulação da notificação de erros é fundamental que todas as partes envolvidas na falha cometida percebam a extrema importância de que todos os erros sejam relatados, inclusive aqueles considerados sem importância. Walkefield continua ensinando sobre importância da elaboração de alguns mecanismos de facilitação e estimulação a notificação e utilização de dispositivos receptores de informação de erros de forma que os componentes da equipe multidisciplinar não se sintam culpados, envergonhados ou amedrontados quanto às punições. Alguns artigos do Código de Ética da Enfermagem são referentes à necessidade da notificação de erros e também à importância de proteger os pacientes desses erros. Acreditamos que em determinadas situações, se o enfermeiro tiver conhecimento do Código de Ética, vários erros podem ser evitados. A seguir, apresentaremos alguns desses artigos. Art. 20 – “responsabilizar-se por falta cometida em suas atividades profissionais, independentes de ter sido praticada individualmente ou em equipe”. Em algumas situações os membros da equipe se organizam e deixam de notificar as ocorrências de erros, por temer punições. Segundo Coimbra (2004), a divulgação de um suposto erro, acarreta desabono à respeitabilidade da instituição e de seu quadro de profissionais perante a comunidade. Coimbra (idem), afirma ainda que a informação de um erro é de responsabilidade dos profissionais e das instituições, entretanto, o silêncio de muitos encobre a incidência e a gravidade da problemática. Art. 7 – “recusar-se a executar atividades que não sejam de sua competência legal”. Art. 17 – “avaliar criteriosamente sua competência técnica e legal e somente aceitar encargos ou atribuições quando capazes de desempenho seguro para si e para a clientela”. Quando um profissional realiza atividades e/ou procedimentos que não são de sua competência técnica e legal, o risco de causar algum dano ao paciente ou até mesmo a outro membro da equipe é grande. Se o profissional não tem dita competência é porque ele não tem condições e conhecimentos necessários para realizar determinadas atividades. Art. 11 – “suspender suas atividades, individual ou coletivamente, quando a instituição pública ou privada para a qual trabalhe não oferecer condições mínimas para o exercício profissional, ressalvadas as situações de urgência e emergência, devendo comunicar imediatamente sua decisão ao COREN”. Quando uma instituição empregadora não proporciona condições dignas de trabalho como, entre outras: falta de material, falta de equipamentos e falta de profissionais alguns procedimentos podem não ser realizados, ou até mesmo, não realizadas corretamente e assim proporcionar erros no processo do cuidar. Art. 47 – “administra medicamentos sem certificar-se da natureza das drogas que o compõem e da existência de risco para o cliente”. Quando um profissional apenas administra uma medicação, sem certificar-se dos efeitos que essa medicação pode ocasionar ao paciente, os riscos desse profissional causar danos à esse paciente são grandes. Art. 48 – “prescrever medicamentos ou praticar atos cirúrgicos, exceto os previstos na legislação vigente e em caso de emergência”. Se o profissional enfermeiro não tem competência legal para prescrever determinadas medicações é porque ele não tem condições e conhecimentos necessário para essa prescrição, portanto, o risco de ocorrer um erro é grande. CONSIDERAÇÕES FINAIS: O código de ética dos profissionais de enfermagem pode contribuir para minimizar os erros na assistência e cuidado. No entanto, acreditamos que adotá-lo, deveria ser algo da categoria, afim de que as instituições dêem condições dignas de trabalho e que os profissionais tenham satisfação em desenvolvê-lo. O ambiente de trabalho tem influência direta com a qualidade da assistência prestada. Num ambiente sadio, em que não há competitividade, em que a estrutura física favoreça e que o quadro de funcionários seja condizente com o número de pacientes, sem dúvida proporciona maior satisfação e realização pessoal. É preciso que todos opinem e tenham oportunidade de crescer com o trabalho que oferece. Os comitês de ética das instituições, deveriam promover atividades em busca da qualidade dos atendimentos através de pesquisas, palestras, exposição de trabalhos que evidenciassem as falhas mais comuns a fim de minimizar o medo e até as ocorrências diante de cada caso. Acreditamos que o trabalho dessas comissões necessita ser repensados e aprimorados. Isto requer um trabalho árduo e duradouro, no entanto de fundamental importância para que a equipe hospitalar trabalhe unida em busca da melhor assistência. REFERÊNCIAS BARBOSA, D. Ética e Enfermagem sempre juntos. COREN-RJ, 2004. COIMBRA, J. A. H. Conhecimentos dos conceitos de erros de medicação, entre auxiliares de enfermagem, como fator de segurança do paciente na terapêutica medicamentosa. Ribeirão Preto, 2004. CARVALHO FILHO, E. T.; SOUZA, M . A. R.; ARANTES, A. C. L. Q.; VAZ, M. Y. K. C. ; HOJAIJI, N. H. S. L.; ALENCAR, Y. M. G. CUTIATI, J.E.Iatrogenia em pacientes idosos hopsitalizados. Ver. Saúde Pública, 32(1), 1998. DECESARO, M. N. Ocorrências Iatrogênicas em Unidade de Terapia Intensiva: queda de pacientes durante o tempo de internação. São Paulo: EEUSP, 2000. MOURA, M. L. P. A. COREN-SP, 1996. MADOLOSSO, A. R. M. Iatrogenia do cuidado de enfermagem: dialogando com o perigo no quotidiano profissional. Ver. Latino Americano de enfermagem, Ribeirão Preto, v.8, n.3, 2000. PIERIN, A. M. G.; IDE, C. A. C.; PADILHA, K. G.; MARKIEVICZ, W. Iatrogenia em Enfermagem. Ver. Esc. Enf. USP. São Paulo, 17(2), 1983.