COMENTÁRIO DA PROVA DE COMPREENSÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS Professores Vagner de Alencar Carreira, Yeso Osawa Ribeiro, Wellington Borges Costa Virtudes e problemas neste exame são basicamente os mesmos que detectamos já há algum tempo: interessante trazer a reflexão metalinguística na abertura e no encerramento da prova; salutar tocar o debate político para além das questões meramente eleitorais e partidárias comumente degradadas em bate-bocas de redes sociais, além de se manter ciência como pauta constante no modelo do exame. Ao mérito da diversidade de gêneros, que tão bem a UFPR propõe aos alunos como forma de avaliação, agrega-se o que, ao nosso entendimento, é um deslize contumaz do processo: a ausência de questão envolvendo Literatura. Duas das cinco propostas abordam o tema da palavra e da leitura. O processo seletivo, no todo, exige o conhecimento de dez obras literárias, de variados gêneros, ao longo do tempo de preparação. Pode parecer repetitivo, cansativo, mas sempre perguntamos o porquê dessa ausência, já que nas vezes em que de alguma forma o conhecimento literário ilustrou questão de compreensão e produção de texto, isso se revelou importante instrumento para o trabalho dos professores das duas áreas. Feita a ressalva, mais uma boa prova nestes moldes. 1 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 1 A artificialidade da escrita em oposição à naturalidade da fala. É nessa comparação que Steven Pinker fundamenta seu texto “Uma janela para o mundo”, capítulo de sua obra “Guia da escrita: como conceber um texto com clareza, precisão e elegância”. Segundo Pinker, como o ato de escrever não é espontâneo nem instintivo, ele não apenas exige mais prática do que a fala como requer mais esforço na transmissão do que se quer comunicar. Isso porque o diálogo possui recursos de interação inexistentes na relação texto–receptor: a expressão facial, o olhar, as atitudes e a predisposição do que ouve em compreender o que recebe já aquele que precisa se fazer entender pela palavra escrita, conclui Pinker, tem que ser eficiente em simular sua relação com o leitor. 2 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 2 Diferenças entre a fala e a escrita. Eis o tema abordado pelo psicólogo cognitivista Steven Pinker no texto “Uma janela para o mundo”, trecho extraído da obra “Guia de escrita: como conceber um texto com clareza, precisão e elegância”, publicada pela editora Contexto. Segundo Pinker, enquanto a fala é instintiva, natural, a escrita requer aprendizagem e prática, o que a torna um desafio para toda vida. Para o psicólogo, ambas as formas de comunicação envolvem diferentes tipos de interação com o outro. O ato da fala propicia o diálogo, que possibilita apreender algo a mais do interlocutor, como expressão facial, olhar e gestos. Nesse caso, há uma troca de informações. O mesmo não ocorre quando se escreve. O autor explica que ao se produzir um texto, imagina-se quem o lerá, cria-se um leitor invisível, simplesmente se faz de conta que ele existe. Nesse último caso, não há interação, o que não permite um “feedback”. 3 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS 4 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 1 “Onde está a esquerda? No fundo à direita”. Este é um dos slogans do movimento político dos jovens da Espanha em suas ocupações de praças públicas em 2011, Defino-me como um liberal. E esta definição tanto cabe na direita como na esquerda do espectro, pois a classificação não é tão simples assim. Quando se fala de economia, sou liberal, ou seja, de direita, pois defendo a livre iniciativa a livre concorrência, a tal “mão invisível do mercado” de que falava Adam Smith e oponho-me a uma economia estatal, de Estado forte e interventor. Agora, quando o debate é comportamento social sou liberal, ou seja, de esquerda, pois me oponho àquele reacionário que não percebe os efeitos dos ventos da modernidade. Oponho-me ao conservador que em nome de rígidos padrões morais quer impor controle à sociedade. Identifico-me com bandeiras libertárias, como casamento gay, legalização de drogas ou descriminalização do aborto. Se sendo um liberal, sou tanto de direita quanto de esquerda, defino-me como um extremista de centro. EXEMPLO 2 Sou de esquerda. Mas um verdadeiro revolucionário, Defendo a igualdade, como por exemplo o agora falecido Fidel Castro.Entendo que na Economia o Estado deve ser forte e robusto. Cabe ao Estado regular a Economia para que o lucro a todo custo não promova mais tragédias como a da Samarco em 2015, o que jamais ocorreu quando a Vale do Rio Doce era estatal. Creio ser insuficiente se apregoar apenas a revolução na Economia. Fidel era de esquerda? Apenas em parte. Para mim, não bastam avanços sociais obtidos como os conquistados pela revolução cubana. Ok. Saúde e educação são fundamentais, mas são básicos demais. Um país sem desdentados ou analfabetos é um ponto de partida, um princípio, não uma finalidade. Fidel e Guevara perseguiram homossexuais há mais de meio século. Ainda agora, candidatas à presidência do Brasil identificadas com bandeiras de esquerda, como Heloísa Helena e Marina Silva, assumiram postura conservadora em questões importantes como aborto e drogas. Sou revolucionário em permanente transformação.Esquerda sempre. Sintetizo minha posição ideológica na figura do parlamentar Jean Wyllis. 5 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 3 O fim da Guerra Fria - que opôs no mundo os pensamentos de direita e de esquerda durante o século XX - não deixa dúvidas: a direita venceu. O capitalismo é, pois, inquestionável neste século XXI, vez que as bases concretas do socialismo ruíram com o muro de Berlim. E a encarnação do último suspiro de sonho acalentado por esse fracasso ideológico, o ditador cubano Fidel Castro, está indo para a sepultura, desencarnando no momento em que escrevo este texto. Foi-se, com o martelo, o tempo de ter vergonha de ser de direita. Conter o capitalismo em nome de bandeiras muitas vezes razoáveis, como justiça social, significou retrocesso e obstáculo ao progresso. Capitalismo é progresso. Econômico, científico, tecnológico. É empreendimento, trabalho e emprego. E gera conforto e qualidade de vida. Garantida a manutenção do progresso com a supremacia da direita no campo econômico, precisamos estar vigilantes pela manutenção da outra palavra do lema que rege nossa bandeira: a ordem. A esquerda se move por sonhos utópicos que ameaçam destruir um patrimônio tão laboriosamente construído pela humanidade e que oferece suporte ao progresso: a estrutura da família, da propriedade e da fé. A tradição, enfim. Com muito orgulho, considero de direita e conservador da ordem e do progresso. 6 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 1 A tragédia de não poder ser o que se poderia. Tudo por conta de um Governo corrupto que, ao comentar a desigualdade de acesso a recursos mata mentes brilhantes. Essa foi em síntese a sábia crítica de Neil Tyson apresentada em tira do El País. Nada mais acertado, pois a quem falta comida, difícil preocupar-se com átomos, a quem falta escola, difícil dedicar-se à cura da Aids. Não à toa, as “maiores mentes” não “nascem” no continente africano ou em solos subdesenvolvidos, mas na Europa, EUA: Newton, Marie Curie, Galileu Galilei, Bill Gattes. Aliás, se Einstein fosse um pequeno sírio que conseguisse sonhar em ser cientista e não em chegar vivo à Alemanha, possivelmente repensaria sua ideia de que “é na dificuldade que se encontra oportunidade”. 7 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 2 Neil Degrasse Tyson, um dos divulgadores científicos mais reconhecidos do mundo, tem suas ideias sobre a relação entre equilíbrio social e ciência abordadas em uma sequência de quadrinhos publicados no jornal El País. Para o cientista, a desigualdade social, que narra de governos ruins e da corrupção, impede o desenvolvimento científico e tecnológico. Perder, para a fome e a miséria, talentos como o de Einstein, pai da Teoria da Relatividade e Nobel de Física em 21, reprime o avanço da própria civilização. 8 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 1 O professor e filósofo norte-americano Jason Brennan é famoso por sua tese de que só os bem-instruídos deveriam participar do processo democrático. Parece que Brennan, ao propor o que se chama de epistocracia, esquece ou omite o fato de que Portugal, por exemplo, foi governado por um acadêmico numa das mais longas ditaduras do século XX. Inspirado no modelo fascista, Salazar mergulhou seu país no atraso, na censura e no isolamento por 41 anos. Então, só mesmo uma mente inferior e inflamada de paixões totalitárias pensaria numa “evolução” da democracia em que o poder político estaria na mão de poucos. A autoridade emanada do conjunto dos cidadãos, ainda que fosse a pior forma de governo, superaria com folga qualquer fórmula retrógrada vinda daqueles que se veem como superiores. 9 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO 2 Deixe-se de lado o discurso sobre a “onda conservadora varrendo o mundo”. Fato inconteste e real que é, fiquemos nas causas. Se há algo de podre na democracia em sua configuração atual, como sugere Jason Brennan, é porque o sistema não é imune ao silêncio perigoso e sorrateiro (envergonhado?) emanado das urnas em eleições ou consultas populares, paralisando um mundo estupefato ao constatar, a cada nova surpresa, que não, a História jamais acabará. Antes que se acuse a epistocracia defendida por Brennan de elitista, basta lembrar que foi a aquiescência dos analfabetos políticos quem ajudou a forjar ditaduras, totalitarismo, autoritarismo. E eles, comumente, depois se omitem diante das consequências de suas escolhas. Se o cidadão médio não consegue perceber o risco que corre em seus direitos e suas conquistas quando avaliza o que a democracia - bem ou mal - lhe descortina, é o caso de se considerar uma opção que permita à História não se repetir como farsa. O que está aí já sabemos o que nos traz. Todo poder aos que pensam! 10 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS 11 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS EXEMPLO Um país se faz com homens e livros. A célebre frase de Monteiro Lobato, dita numa época em que ser alfabetizado era para poucos, nos dá um alento ao analisar o gráfico “Evolução da leitura no Brasil entre 2011 e 2015”. A pesquisa faz parte da 4ª edição nacional “Retratos da Leitura no Brasil”, realizada pelo IBOPE e, apesar de ainda se ler pouco no Brasil, houve um crescimento em relação à média anterior (50%). Dentre as cinco regiões, a que mais evoluiu foi a Sudeste, com 5 pp acima da média brasileira atual. A Região Sul, por sua vez, embora tenha evoluído 7 pp (era 43% em 2011), ainda permaneceu abaixo da média nacional. Já o Nordeste, em 2011, estava acima da média 1 ponto percentual e manteve a mesma porcentagem. Tal dado não distancia essa região dos índices positivos. Maior inserção nas universidades, o Vale-Cultura, a ascensão das Classes Sociais, campanhas midiáticas e parcerias de empresas com setores educacionais; além de maior acesso ao livro graças a edições de baixo custo e informatizadas. Todos esses fatores justificam a evolução do número de leitores na média nacional. 12 COMPREENSÃO E PROD. DE TEXTOS