VULNERABILIDADE MACROECONÔMICA NO MERCOSUL: A

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VULNERABILIDADE MACROECONÔMICA NO MERCOSUL: A UTILIZAÇÃO
DE UM ÍNDICE PARA BRASIL E ARGENTINA
Rogério Piva da Silva1
Camilla de Oliveira2
Área Temática: América Latina: Estratégias Nacionais e Integração Regional
Resumo: Dois fenômenos protagonizam o cenário econômico mundial: a globalização econômica e a
regionalização ou integração econômica. O estudo analisa as economias dos principais países do
MERCOSUL, Brasil e Argentina, e sua situação financeira. Os procedimentos metodológicos adotados
baseiam-se no raciocínio dedutivo, na pesquisa aplicada, descritiva, documental e quantitativa, aplicando
um índice capaz de medir a vulnerabilidade financeira e econômica (IVFE), que engloba receitas e
obrigações de pagamentos reais e virtuais. Nota-se um crescimento da fragilidade externa dos países nos
anos de 1994 e 1995, devido à Crise Mexicana; E em 1997 e 1998, por causa do maior volume de capitais
de curto prazo, das despesas de serviços não financeiros, da Crise Asiática e da Moratória da Rússia. O
Brasil apresenta aumento do IVFE, no primeiro trimestre de 2007, resultado da crise dos EUA, aumento
da taxa de juros e recrudescimento da inflação. Em 2011, o IVFE do Brasil é menor que o da Argentina,
devido ao fortalecimento da economia brasileira e problemas enfrentados pela Argentina: recessão, alta
inflação e uma desvalorização monetária. O índice mostra-se eficiente para projetar futuras crises de
confiança internacional e a fragilidade financeira. Para apresentação do trabalho é necessária a utilização
de projetor de imagem.
Palavras Chave: MERCOSUL. Vulnerabilidade Macroeconômica. Brasil. Argentina
Abstract: Nowadays two phenomena characterize the world's economic scenario: the economic
globalization and the economic integration. This paper analyses the economy of the major countries of
MERCOSUL, Brazil and Argentina, and their financial situation. The methodological procedures adopted
are based on a deductive reasoning and an applied, descriptive, documentary and quantitative research,
applying an index able to measure the financial and economic vulnerability (IVFE) that englobes
revenues and liabilities of real and virtual payments. A growth of the external fragility of the countries
can be noted in the years 1994 and 1995, because of the Mexican peso crisis; And in the years 1997 and
1998, because of a big amount of short-term capital, expenses with non-financial services, the Asian
financial crisis and the Russian financial crisis. Brazil presents an increase of the IVFE on the 2007 first's
quarter as a result of the U.S. subprime mortgage crisis, an increase of the lending rate and inflation. In
2011, Brazil's IVFE is lower than the Argentine, what can be explained because of the strengthen of the
Brazilian economy and economics problems faced by Argentina like recession, high inflation levels and a
currency devaluation. The index appears to be efficient to project future international confidence crises
and the financial fragility.
Keywords: MERCOSUL. Macroeconomic Vulnerability. Brazil. Argentina
1. Introdução
Dois processos protagonizam o cenário mundial nas últimas décadas, a
globalização econômica e a integração econômica. Ambos são fenômenos
1
Professor Associado do Instituto de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis da Universidade
Federal do Rio Grande – Doutor em Economia – UAM – Rua Lino Neves, 730 – Rio Grande- RS, CEP:
96202-600. Tel. (53)9118-2713 – [email protected]
2
Acadêmica do Curso de Ciências Econômicas – Universidade Federal do Rio Grande – Av. Presidente
Vargas, 285, Bl. L1 101 – Rio Grande – RS, CEP: 96202-100. Tel. (53)2125-7628 –
[email protected]
complementares. A globalização cria a necessidade de economias mais dinâmicas e
competitivas, propulsionando assim o regionalismo.
Um dos processos que mais se desenvolveu na última década na América Latina,
consequência desta forte tendência de integração das economias 3, foi o Mercado
Comum do Sul – MERCOSUL, constituído por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai
no dia 26 de março de 1991, em Assunção no Paraguai. Os países que formaram este
Bloco Econômico acordaram ampliar as dimensões dos seus mercados nacionais com
base na premissa de que a integração constitui condição fundamental para acelerar o
processo de desenvolvimento econômico e social de seus povos. Estabeleceram que a
constituição do mercado comum deve pautar-se pelo aproveitamento mais eficaz dos
recursos disponíveis, pela preservação do meio ambiente, pela melhora das
interconexões físicas e pela coordenação de políticas macroeconômicas de
complementação dos diferentes setores da economia, fundamentados no equilíbrio,
gradualidade e na flexibilidade para uma maior inserção no cenário internacional.
O comércio intra-regional, então, multiplicou-se e fortaleceu as relações
comerciais entre os países membros. Entretanto, as diferenças entre os países do bloco,
como as divergências no aspecto estrutural e no grau de desenvolvimento e as
assimetrias em algumas variáveis macroeconômicas, dificultam o avanço do bloco, no
que diz respeito a estágios mais avançados de integração.
Por outro lado, o rápido crescimento verificado no comércio internacional nos
últimos anos foi facilitado pela redução nos custos de transporte e comunicações, assim
como pela liberação de fluxos comerciais e financeiros. Esse rápido crescimento gerou
uma maior integração produtiva no mercado global, o que possibilita a busca por
economias de escala, mas também acabam por transmitir mais rapidamente efeitos
positivos e negativos de crescimento, depressão ou instabilidade financeira a todas as
economias regionais.
As várias crises que afetaram a economia mundial nas últimas décadas
revelaram a fragilidade do funcionamento do mercado financeiro, bem como,
evidenciaram os equívocos na política econômica das nações capitalistas. Da mesma
forma, a interdependência da economia mundial ficou manifesta a partir da rápida
transmissão dos efeitos dessas crises a quase todo o planeta.
3
Conforme Silva, R.Piva (2000) Integração é um processo de aglutinação ou união de dois ou mais
Estados que, buscando alcançar objetivos comuns definidos em um marco institucional comunitário,
desenvolvem uma maior cooperação e interdependência.
Assim, a nova etapa da economia mundial associado às sucessivas crises
econômico-financeiras tem se manifestado em efeitos devastadores, não só para as
economias periféricas ou em desenvolvimento, como é o caso dos países que compõe o
MERCOSUL, mas também, para os países desenvolvidos e blocos consolidados, como
é o caso da União Europeia.
Portanto, o objetivo deste estudo é identificar o grau de vulnerabilidade externa
dos países do Mercosul, principalmente Brasil e Argentina, a partir da utilização de um
índice de vulnerabilidade financeira e econômica (IVFE). O IVFE é obtido através de
uma análise das receitas e obrigações, reais e virtuais, do balanço de pagamentos dos
países analisados. Os dados são trimestrais, a partir de uma amostra que compreende
todos os trimestres de 1994 até 2011, e foram obtidos junto ao Boletim Mensal do
Banco Central do Brasil, ao Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e na base
de dados do Fundo Monetário Internacional.
2. Mercosul
2.1 Antecedentes e histórico
Os estudos preliminares, buscando a integração econômica nos países da
América Latina, iniciaram-se entre a década de 40 e 504 na Comissão Econômica para
América Latina (CEPAL). Baseado na ótica de desenvolvimento da época e no modelo
de substituição das importações, a formação de um mercado comum latino americano
teria por função ampliar os mercados nacionais, obter economias de escala,
aproveitando as especificidades de cada país para assim promover o desenvolvimento
da região.
A primeira iniciativa de integração econômica na América Latina foi feita pela
Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua, com a celebração do
tratado de Manágua que estabeleceu o Mercado Comum Centro Americano (MCCA)
decretando livre comércio na região. No mesmo período, criada pelo Tratado de
Montevidéu, em 18 de fevereiro de 1960, foi fundada a Associação Latino Americana
de Livre Comércio (ALALC), inicialmente tendo Brasil, Argentina, Chile, México,
4
Anteriormente, em 1990 e 1935, foram feitas negociações entre Argentina, Brasil e Chile para formar o
“Pacto ABC” de livre comércio, que não frutificou em nenhuma das tentativas. Em 1958 e 1959, foi
proposto pelo Brasil a “Operação Panamericana” (OPA), na qual os Estados Unidos destinariam, a
exemplo do Plano Marshall para Europa, ajudas econômicas aos países latino americanos. Os Estados
Unidos rechaçaram a proposta (SILVA, 2000).
Paraguai, Peru e Uruguai como participantes. Posteriormente, Equador e Colômbia
(1961), Venezuela (1966) e Bolívia (1967) ingressaram na associação. Poucos anos
mais tarde, instituiu-se a Comissão Especial de Coordenação Latino Americana
(CECLA, 1964), a Área de Livre Comercio do Caribe (CARIFTA, 1968), que se
transformou, em 1973, em Comunidade e Mercado Comum do Caribe (CARICOM), e o
Grupo Andino (GRAN, 1969).
O principal objetivo, tanto do MCCA como da ALALC, era estimular o
comércio intra-regional, a partir de uma zona de livre comércio e possibilitar o processo
de substituição de importações à escala regional. A ampliação do mercado viria através
da retirada das medidas protecionistas por parte dos países membros com negociações
de caráter multilaterais e a redução de tarifas e restrições aduaneiras.
O Mercado Comum Centro Americano, nos seus primeiros anos, teve um
importante incremento comercial, acompanhado por um forte crescimento econômico.
Já a Associação Latino Americana de Livre Comércio, teve resultados bastante
limitados. Em função desses resultados, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Peru
estabeleceram em 1969, o chamado Pacto Andino, através do acordo de integração subregional de Cartagena, que previa a implantação de um programa de redução das taxas
aduaneiras, tarifa externa comum, tratamento diferenciado a investimentos estrangeiros
e a criação de um órgão de financiamento para programas setoriais de desenvolvimento
regional. Isto ocasionou o aumento do comércio na região, mas, em 1975, vários termos
do acordo já haviam sido descumpridos.
Em maio de 1987, modificou-se o acordo que deu origem ao “Pacto”. Reunidos
na cidade de Quito, Equador, os países participantes buscaram flexibilizar o tratado e
adaptá-lo a nova realidade internacional, suavizando mecanismos e prazos. Mais
recentemente, adotou-se uma série de medidas que buscam intensificar as atividades
comerciais na América Latina, com o objetivo de chegar a níveis mais profundos de
integração.
Outro recurso utilizado por vários países, entre eles os que atualmente formam o
Mercosul, foi a adoção de acordos binacionais. Por exemplo, em 1974, a convenção de
complementaridade econômica levou a Argentina e Uruguai a firmarem o Convênio de
Cooperação Econômica (CAUCE), no ano de 1975, enquanto que, em 1976, Brasil e
Uruguai firmaram o Protocolo de Expansão Comercial (PEC). Em 1980, frente às
crescentes dificuldades no setor externo5, a ALALC foi substituída pela Associação
Latino America de Integração (ALADI), através do Tratado de Montevidéu, de agosto
de 1980 – TM 80 – que está composto pela totalidade dos países latino americanos,
menos os países da América Central.
Em 12 de agosto de 1980, todos os países integrantes da ALALC, acrescidos da
Bolívia e da Venezuela, resolveram substituí-la com a instituição da Associação Latino
Americana de Integração - ALADI, que dotada de personalidade jurídica àquela
sucedeu em direitos e obrigações.
Isso promoveu um avanço do Tratado de Montevidéu, que era limitado ao livre
comércio, prosseguindo no processo de integração com o estabelecimento de uma
política de tarifas aduaneiras e comércio. Tem por órgão supremo o Conselho de
Ministros das Relações Exteriores e demais órgãos institucionais a Conferência de
Avaliação e convergência, o Comitê de Representantes e a Secretaria Geral, e vige por
prazo indeterminado.
O seu maior objetivo é atingir, de forma gradual e progressiva, um mercado
comum latino-americano.
2.2 A origem do Mercosul
Em julho de 1986, em Buenos Aires, os presidentes do Brasil e da Argentina
assinaram a Ata para a Integração e Cooperação Econômica (PICE), cujo objetivo era o
de propiciar a abertura seletiva dos dois mercados, principalmente nos setores em que
houvesse um maior grau de complementaridade das duas economias.
Em 1988, os dois países deram um passo adiante ao assinarem o Tratado de
Integração, Cooperação e Desenvolvimento, onde manifestaram o desejo de
promoverem a liberalização comercial entre os dois países, com eliminação, num
espaço de dez anos, de todos os obstáculos tarifários e não-tarifários, bem como a
adoção de políticas macroeconômicas harmonizadas.
Até o início de 1991, o processo de integração comercial dos dois países foi
avançando, tendo sido assinados, nesse período, 24 protocolos sobre bens de capital,
produtos alimentícios industrializados, trigo, cooperação nuclear, automóveis, etc.
Finalmente, em agosto de 1991, foi assinado o Tratado de Assunção para a Constituição
5
Principalmente pelo aumento da dívida externa, o aumento do protecionismo e os acordos feitos pelos
países centrais contra terceiros países latino-americanos.
do Mercado Comum do Sul – o Mercosul - ao qual se juntaram, naquela mesma data,
Uruguai e Paraguai.
O tratado de Assunção – que se constitui na base da criação do Mercosul – foi
complementado por vários protocolos adicionais, destacando-se o Protocolo de Brasília,
para a Solução de Controvérsias no MERCOSUL, assinado em dezembro/91, e o
Protocolo de Ouro Preto, sobre os Aspectos Institucionais assinado em dezembro/95 ,
pelo qual foi estabelecida a estrutura institucional do Mercosul.
Na realidade, o Tratado de Assunção se constitui num acordo-marco onde foram
definidos os mecanismos destinados à formação de uma Zona de Livre Comércio e de
uma União Aduaneira na sub-região. Outro aspecto importante é que, pelo Tratado de
Assunção, os países membros da Associação Latino-americana de Integração (ALADI)
poderiam solicitar seu ingresso no Mercosul, mas sua admissão só poderia ocorrer cinco
anos após a assinatura do Tratado de Assunção. O país solicitante poderia ser aceito
antes, desde que não estivesse ligado a outro mecanismo de integração regional ou subregional fora da ALADI e os pedidos de ingresso teriam que ser aprovados por
unanimidade.
Atualmente, o Mercosul conta com cinco Estados membros: Argentina, Brasil,
Paraguai, Uruguai e Venezuela; cinco Estados associados: Bolívia, Chile, Peru,
Colômbia e Equador; e o México como país observador.
Em 2012, em meio a muita polêmica, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo,
sofreu impeachment e foi deposto. A Unasul (União das Nações Sul-Americanas)
considerou o processo uma quebra de democracia. Vários países latino-americanos se
posicionaram contra o impeachment e o país acabou sendo suspenso do Mercosul.
Poucos dias depois, Brasil, Argentina e Uruguai aceitaram a adesão da Venezuela ao
bloco. O Paraguai era o único país que ainda não havia ratificado a participação deste na
integração.
3. Vulnerabilidade Macroeconômica
A vulnerabilidade externa pode ser entendida como a capacidade de um país
quitar dívidas e obrigações, bem como, a sua suscetibilidade diante de acontecimentos
na economia mundial.
De acordo com Mariano (1995), a vulnerabilidade externa refere-se à capacidade
de um agente arcar com os custos de mudanças e políticas necessárias para lidar com
possíveis alterações no panorama externo.
O grau de vulnerabilidade de um país pode ser influenciado por fatores como: o
saldo da conta corrente, se este é deficitário ou superavitário; a abertura da conta capital,
ou seja, a facilidade para entrada e saída de capitais estrangeiros; o nível das reservas
internacionais; além de outros aspectos relacionados ao balanço de pagamentos, como
as entradas e saídas do mesmo.
Dentro deste contexto, destacam-se dois fenômenos recentes que evidenciaram a
análise da vulnerabilidade de um país: a globalização da economia e a integração
econômica.
A globalização da economia (SILVA, 2000) é um processo que dinamiza as
atividades econômicas, aumentando o comércio internacional graças à redução nos
custos de transporte e comunicação e à liberação de fluxos comerciais e financeiros.
Segundo Gonçalvez (1998), esse processo tem transformado as relações de
interdependência entre as economias nacionais num sistema cada vez mais complexo,
limitando, parcialmente, a autonomia dos Estados.
Esse sistema, porém, não é simétrico e acaba traduzindo as relações
internacionais, onde os agentes têm limitações, mas podem driblá-las com o uso de
instrumentos mais efetivos, maior influência no cenário internacional e menor
vulnerabilidade para repassar os possíveis custos decorrentes destas para outros agentes
menos poderosos.
“As relações de interdependência resultam em custos para os atores
nelas envolvidos em consequência da restrição à autonomia de cada
um. De acordo com o poder de cada ator e da natureza da relação é
que serão especificados os custos e os benefícios, assim como a forma
como ambos serão distribuídos” (MARIANO, 1995, p.17).
Por ser uma relação assimétrica, ela transforma grande parte dos países em
desenvolvimento em agentes mais fracos que apresentam grande sensibilidade frente à
eventos externos, enquanto eventos internos não apresentam impactos significativos
sobre a economia mundial.
A UNCTAD (2007) chegou à conclusão de que a melhor alternativa disponível
para reduzir a vulnerabilidade de um país em desenvolvimento é a integração
econômica. A integração econômica ou regionalização não deve ser vista com um
fenômeno antagônico à globalização, pois esta é um processo catalisador da
regionalização por criar a necessidade de economias mais dinâmicas e competitivas,
portanto, estes dois fenômenos são complementares, podendo, muitas vezes, ser
confundidos entre si.
A integração consiste em agentes que se organizam a fim de possibilitar uma
cooperação com o objetivo de atingir resultados somente possíveis através da ação dos
demais agentes envolvidos, em detrimento da sua total soberania operacional. Por fim,
os países acabam assumindo compromissos que serão mantidos, enquanto os demais
também cumprirem os mesmos. Os ganhos decorrentes dessa integração podem ser
diferentes entre os agentes participantes, ainda assim, a não cooperação é menos
atrativa, pois pode não trazer ganho nenhum ao agente.
Na visão de Cunha et al. (2008), o forte quadro de vulnerabilidade externa
presente nos países da América Latina ocorre pela ausência de uma dinâmica mais
robusta de institucionalização da cooperação financeira regional.
“Esse pequeno histórico dos esforços de se tratar o tema da integração
(e cooperação) monetária e financeira revela que apesar das intenções
formais de se harmonizar as políticas macroeconômicas e cambiais no
MERCOSUL, nunca se chegou a aplicar, plenamente, as normas
sugeridas” (CUNHA et al., 2008, p.5).
Quando há uma análise na relação de interdependência entre Brasil e Argentina
nota-se que, no que se refere à simetria da relação, a Argentina sofre com mais
intensidade os efeitos de choques externos.
Nos últimos anos, se faz presente um cenário onde as principais economias
latino-americanas têm demonstrado um bom desempenho com bons níveis de
crescimento econômico e uma importante redução da vulnerabilidade externa.
4. Material e Método
Para a análise do grau de vulnerabilidade externa de um país pode-se utilizar
dados do Balanço de Pagamentos, tendo como referência a maior (ou menor)
necessidade de uma economia recorrer ao mercado financeiro internacional para
renegociar posições financeiras em aberto (ou seja, que não possam ser pagas de
imediato), mesmo ao custo de taxas de juros e prazos desfavoráveis.
O Índice (baseado em Paula e Alves Junior, 1998) compara as obrigações reais e
virtuais, em moeda estrangeira, de uma economia e sua respectiva capacidade de
pagamento, permitindo, assim, uma avaliação da evolução dessa vulnerabilidade.
IVFE = (M+Dj+Dos+A+CCP-1+PLA-1)/(X+Rj+Ros+RE-1+Id+Eml)
Onde:
M = importações;
Dj = despesas com juros “j”;
Dos = despesas com outros serviços;
A = Amortizações de empréstimos;
CCP-1 = Capitais de curto prazo acumulados defasados em um período;
PLA-1= Investimentos líquidos em portfólio acumulados, defasados em um
período;
X = Exportações;
Rj = Receitas com juros “j” ;
Ros = Receitas com outros serviços;
RE-1 = Reservas internacionais acumuladas até o período anterior
Id = Investimentos diretos;
Eml = Empréstimos de médio e longo prazo.
As obrigações de pagamentos reais reúnem despesas com importações, serviços
e as amortizações de empréstimos. As obrigações virtuais incluem estoques de capitais
de curto prazo e investimentos de portfólio acumulados, defasados em um período.
Essas variáveis representam as obrigações mais importantes de um país em um
determinado trimestre, que podem ser honradas através das reservas, das receitas com
exportações e serviços (juros e outros serviços), dos empréstimos de médio e longo
prazo e dos investimentos diretos.
Quanto mais elevado for o valor do índice, maior é a propensão de um país ser
afetados por mudanças na conjuntura internacional (por exemplo, mudanças nas taxas
de juros externas) e menor sua capacidade de cumprir compromissos financeiros
imediatos, tornando-se mais dependente de refinanciamento externo ou de “queima” de
reservas. Por outro lado, quanto menor o valor deste índice, maior é a capacidade de
um país cumprir seus compromissos mais imediatos sem ser necessário recorrer ao
refinanciamento e aos seus estoques de reservas. Em outras palavras, as obrigações reais
e virtuais, à medida que o índice diminui, estão sendo cobertas por receitas correntes e
por fontes de financiamento de prazo mais dilatado.
Por exemplo, caso haja uma ampliação no financiamento de curto prazo, a
fragilidade do país se elevaria se, no período seguinte, as obrigações virtuais
aumentassem frente a recursos financeiros obtidos no período, às receitas correntes e às
reservas internacionais. O equilíbrio do balanço de pagamentos, neste caso, passaria a
depender, cada vez mais, de políticas econômicas atrativas ao capital de curto prazo, de
natureza especulativa.
Cabe ainda, destacar que a noção de fragilidade financeira depende de
convenções, pois envolve expectativas formuladas pelos agentes a respeito do
comportamento futuro dos mercados financeiros e, por isso, é muito difícil definir com
precisão, se uma economia atingiu (ou não) um grau excessivo de fragilidade.
Para trabalharmos com o índice utilizamos dados trimestrais de cada um dos
países analisados do MERCOSUL, Brasil e Argentina. Num período de 1994 a 2011.
5. Resultados
5.1 Brasil
O Brasil apresenta na projeção grandes picos de elevada vulnerabilidade externa,
o que indica que o país é bastante sensível a choques externos. Na década de 90
notamos um acentuado índice de vulnerabilidade que oscila por diversas vezes e começa
a decair no início dos anos 2000, no entanto volta a crescer de forma acentuada entre
2007 e 2009, para depois voltar a decair e obter seus menores números nos últimos
anos.
Segundo Batista (2002), nos anos noventa o Brasil apresentava grande déficit na
conta corrente, grande abertura da conta de capitais e uma insuficiência no nível de
reservas internacionais, o que proporcionava a situação da elevada vulnerabilidade
externa do país. Tudo isso em meio à implantação do plano real que contribuiu para o
aumento do endividamento público e o desequilíbrio das contas externas do país no
período.
O primeiro grande choque externo no período analisado foi a crise econômica do
México de 1994, que teve repercussões mundiais. Esta foi provocada pela falta de
reservas internacionais, causando desvalorização do peso, durante os primeiros dias da
presidência de Ernesto Zedillo. O índice teve sua maior alta no período do primeiro
trimestre de 1995, causada pelo aumento das importações de 52% em relação ao terceiro
trimestre de 1994, aumento das amortizações de empréstimos de 60%, uma queda nas
exportações 14% em relação ao semestre anterior e queda de quase 5 bilhões de dólares
das reservas internacionais. Pode-se dizer que a crise anulou os ganhos obtidos no Plano
Real, devido a queda de 35% do mercado brasileiro na crise. Como consequência, o
Brasil adota o sistema de Bandas cambiais.
Gráfico 1: Demonstração dos resultados Brasil
Fonte: Elaborado pelos autores
Logo após, em julho de 1997, teve início no leste da Ásia uma crise econômica
que marcaria época. Ela começou na Tailândia, mas logo se espalhou para outros países
da região, atingindo de forma grave a Indonésia, a Malásia, as Filipinas e a Coréia do
Sul. Todos eles eram países bem-sucedidos, que vinham se desenvolvendo rapidamente,
em especial a Coréia. A violência da crise causou grande perplexidade no mundo. A
crise fez com que o índice alcançasse dois altos picos, o primeiro no último trimestre de
1997 e o segundo no terceiro trimestre de 1998. No final de 1997, a despesa com juros
aumentou mais de 80% (mais de 2 bilhões de dólares), os investimentos em carteira
aumentaram mais de 131%, as receitas com juros caíram 17,60% no trimestre, as
reservas internacionais caíram quase 10 bilhões de dólares e um déficit de (2903,059) na
balança comercial ajudou para o agravamento da conjuntura. O segundo pico é
alavancado, principalmente, pelo acumulo de déficit na balança comercial desde o
primeiro trimestre de 1996 e a reserva internacional caiu 36% em relação ao semestre
anterior.
A crise da moratória russa veio logo em seguida. O Brasil presenciou uma
grande fuga de capitais e demonstrou grande dependência financeira, precisando da
ajuda do FMI e do G-7. Com a crise, o país registrou seu maior índice de
vulnerabilidade externa até então. Com o baixo nível de reservas internacionais, o país
pôs fim no regime de câmbio vigente na época e voltou à livre flutuação. Despesas com
juros aumentaram 86% e o investimento em carteira aumentou 172%.
Em 2000, a desvalorização da moeda brasileira começou a ser revertida, dando
sinais da recuperação da economia, o que fez com que o Brasil suspendesse, por hora, a
ajuda recebida do FMI. Contudo, graças a um agravamento na crise argentina em 2001,
o Brasil viu a necessidade de voltar a utilizar os créditos do FMI.
No período entre 2003 e 2006, a estabilidade econômica mundial manteve o
índice em níveis bastante razoáveis. Anos depois, a crise norte americana, trouxe
impactos para a economia brasileira, que já se encontrava recuperada e fortalecida. O
efeito imediato foi a queda das ações na bolsa de valores, dificuldades na exportação de
produtos devido a recessão das economias mais afetadas, prejudicando, assim, o
comércio externo. Isso fez com que o índice tivesse seu maior pico no período
analisado.
Após a crise do Subprime, o Brasil conseguiu fortalecer sua economia
novamente e aplicar políticas que auxiliaram nesse processo, diminuindo assim seu
índice de vulnerabilidade externa consideravelmente e mantendo-o baixo nos últimos
dois anos.
5.3 Argentina
Numa análise superficial, nota-se que a Argentina não apresentou no período
grandes elevações no índice, excetuando-se poucas ocasiões onde atingiu picos. Em
relação ao Brasil, a Argentina apresenta um baixo índice de vulnerabilidade.
Na década de 90 alguns acontecimentos podem explicar o desempenho do
índice. No início do período analisado, temos a Crise Mexicana. O efeito tequila fez
com que o país atingisse o maior índice de vulnerabilidade no terceiro trimestre de
1994. Um dos fatores responsável foi a saída de capitais de curto prazo que aumentaram
61%. O alto gasto com investimento em carteira de 5746,15% em relação ao trimestre
anterior teve um peso significativo para o aumento do índice. O déficit na balança
comercial alcançou o patamar de 991,6 milhões de dólares no terceiro trimestre de
1994, e neste mesmo período, a balança comercial atingiu um déficit de 1.038,7 milhões
de dólares. No entanto, a não elevação do índice a valores mais altos pode ser explicada
pelo acordo feito entre o FMI e a Argentina para promover a estabilidade do país e
garantir a manutenção da âncora cambial por mais um ano.
Gráfico 2: Demonstração dos resultados Argentina
Fonte: Elaborado pelos autores
A crise Asiática, que veio em 1997, afetou também a economia argentina. A
bolsa de valores de Buenos Aires chegou a registrar quedas de aproximadamente 30%.
O país novamente fez um acordo com o FMI, mas teve dificuldades para cumprir as
metas exigidas. Logo em seguida, a crise Russa fez despencar indicadores como o
comportamento da produção industrial, o ritmo da construção civil e também a
produção de petróleo. Houve redução no preço de commodities e no ingresso de
produtos estrangeiros, o que ocasionou uma diminuição dos investimentos no processo
produtivo do país.
Foi em 1999, com a desvalorização do Real que a Argentina sofreu mais, pois a
situação das contas externas do país foi agravada, o que consequentemente acelerou a
pressão pelo fim do plano de convertibilidade e a desvalorização cambial. O país passou
logo após uma crise da economia interna devido à quebra do sistema bancário e a
inconsequente adoção das imposições do FMI.
A crise dos Estados Unidos afetou a economia argentina, o país adotou medidas
protecionistas como, por exemplo, restringir importações para determinados setores e a
re-estatização da Previdência. Atualmente, o índice argentino não se mostra muito
elevado e não apresenta grandes picos, mas, se comparada com o brasileiro, é superior
devido ao momento vivido pelo país, onde há grande recessão, desvalorização
monetária e alta inflação.
Gráfico 3: Cruzamento do grau de vulnerabilidade externa Brasil/Argentina
Fonte: Elaborado pelos autores
Quando se analisa conjuntamente os resultados do índice para Brasil e
Argentina, percebe-se que os movimentos são, em geral, no mesmo sentido, embora
com proporções diferentes. No Brasil o índice atingiu picos muito superiores aos da
Argentina durante o período de vigência do plano de convertibilidade. Em um primeiro
momento, a crise Mexicana foi mais severa na Argentina, com fechamento de bancos e
instituições financeiras. No Brasil, obrigou a equipe econômica do Plano Real a passar a
um sistema de Bandas Cambiais. As crises Asiática e Russa afetaram o Brasil de forma
mais intensa, como mostra o gráfico 3. O fim do plano de convertibilidade elevou a
vulnerabilidade argentina, enquanto o Brasil passava por um período de estabilidade.
Por outro lado, a crise americana parece ter sido inicialmente mais impactante no Brasil,
embora a Argentina esteja apresentando uma vulnerabilidade crescente desde então.
6. Considerações Finais
O índice depende do comportamento do balanço de pagamentos, que é o
resultado não planejado das ações dos agentes autônomos. Logo, a importância de se
calcular a vulnerabilidade externa de um país pode determinar sua dependência de
refinanciamentos para que possa sustentar o “equilíbrio” do balanço de pagamentos
(PAULA e ALVES JUNIOR, 1998).
O índice calculado neste estudo mostrou de maneira acentuada, os efeitos das
crises do México (1994-5), da Ásia (1997), da Rússia (1998), do Brasil (1999 e 2002),
da Argentina (2001) e dos Estados Unidos em (2007-2009). O déficit na balança
comercial, a elevada captação de recursos externos, altas taxas de juros, ingresso
massivo de capitais voláteis e fugas de capitais de curto prazo contribuíram para
elevação da vulnerabilidade dos principais membros do MERCOSUL.
No período entre 2003 e 2006 a queda do índice ocorreu com a contribuição de
uma conjuntura internacional favorável. Mas, mesmo com a melhora nos fundamentos
econômicos a simples possibilidade de instabilidade no mercado financeiro era
suficiente para acentuar a vulnerabilidade externa.
Portanto, parece evidente que a vulnerabilidade das economias periféricas, Brasil
e Argentina, está associada à volatilidade dos fluxos de capital. Logo, se faz necessário
mudanças nas políticas internas de Brasil e Argentina, reduzindo juros, minimizando a
captação de recursos externos pelo setor público, melhorar o volume de reservas
internacionais, aplicar reformas fiscais e, principalmente, estabelecer mecanismos de
controle no fluxo de entrada e saída de capitais
7. Referências
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