Planejamento de atividade com imagem como fonte histórica Disciplina: Didática e Prática de Ensino da História II Prof.ª Carina Martins Al.: Felipe Macedo Tema do conjunto de aulas: Imperialismo no século XIX Tema da atividade: Representações do Imperialismo Britânico Série dos alunos: Aula para 1o ou 2o ano do ensino médio, dependendo de quando a matéria esta prevista no planejamento Conteúdo da aula: Análise do quadro “The Secret of England's Greatness” (1863) do pintor inglês Thomas Jones Barker, a Imagem 1 do anexo e outras relacionadas. Duração da atividade: 50 minutos Sequência didática anterior: Aula 1 – Fim da Era Napoleônica, Congresso de Viena (1815), a nova ordem internacional instaurada, reorganização do poder, o predomínio britânico, etc.. Aula 2 – Independências na América e Doutrina Monroe, porque a Europa se volta para África e Ásia. Aula 3 – Consolidação do Capitalismo, a economia no século XIX, exemplos de França Inglaterra e o início de suas empreitadas neocolonialistas (ampliar o mercado consumidor e fornecedor de bens primários). Transformações na sociedade, urbanização, industrialização, classes sociais (proletários e proprietários). Aula 4 – O Discurso Civilizatório, o nacionalismo, o despotismo esclarecido, o positivismo, o darwinismo social, entre outras correntes de pensamento do século XIX. O orientalismo, doutrinas raciais, como os não-ocidentais eram considerados selvagens, desprovidos de razão e moral. Aula 5 – Atividade com a imagem Sequência didática posterior: Aula 6 – Disputas territoriais na África e na Ásia, os principais conflitos e estratégias. Aula 7 e 8 – Unificação da Itália e da Alemanha e seu imperialismo tardio. Aula 9 – A Conferência de Berlim, suas razões e implicações. Aula 10 – Crise do Imperialismo e antecedentes da I Guerra Mundial Atividades da aula: 1) Organização da sala – 5 minutos 2) Retomando os principais pontos da última aula – 7 minutos Retomar a ideia do eurocentrismo, da suposta superioridade dos europeus sobre as outras “raças”, como que esse discurso legitimava a dominação sobre outros povos, como esses povos eram retratados como primitivos, desprovidos de razão e ética. 3) Apresentando a Inglaterra no século XIX – 8 minutos A Inglaterra se torna a maior potência econômica e militar do mundo, a Pax Britannica, Império onde o Sol nunca se põe. O objetivo é mostrar aos alunos que a Inglaterra era a potência dominante no cenário internacional e, por esse motivo, a grande força do imperialismo. Por ser um Império, a figura da Rainha Vitória era o símbolo mais alto de todo esse poder. Essa força vinha da capacidade produtiva do capitalismo consolidado que buscava novas fronteiras comerciais através do Imperialismo, justificado pelos discursos já falados. 4) Apresentando a imagem – 5 minutos Nessa etapa, mostrarei a imagem por meio de PowerPoint (ou darei uma para cada aluno dependendo dos recursos encontrados), pedirei para que olhem com atenção e anotem os principais pontos que acham importantes dentro do que nós vimos debatendo nas últimas aulas. 5) Análise da imagem – 25 minutos De primeiro, eu perguntaria o que a turma achou do quadro, esperando que alguém inicie o debate. Como essa parte é difícil de prever, isto é, não se sabe exatamente como a turma vai proceder, considerarei que eles não digam nada, colocando os pontos do quadro que eu acho que deveriam ser abordados. Esses pontos serão os balizadores do debate que pretendo conduzir, mas não precisam ser abordados nessa ordem. Deixarei que a dinâmica da aula mostre por quais devo começar. - A principal característica a ser notada num quadro como esse é quem está sendo retratado, porque essas pessoas estão representadas. É provável que algum aluno da turma diga que a senhora no primeiro plano de vestido branco é a rainha, o que de fato é correto, mas é pouco provável que ele saiba identificar os outros elementos. Além da Rainha Vitória do Reino Unido, que governou de 1837 a 1901, período auge do Império Britânico, um negro ajoelhado ocupa o primeiro plano. É fundamental fazer o aluno compreender que não se trata de um africano comum, mas de um líder de seu povo, devido aos ornamentos que carrega. Algumas perguntas como “Vocês acham que qualquer pessoa na África tinha uma capa de pele de leopardo? E essas jóias e vestuário bem trabalhado? Quem que poderia ser representado com todos esses ornamentos” poderiam ajudar nesse sentido. É provável que alguém pergunte “de que povo ele é rei?”. Não há uma resposta certa para essa pergunta, o negro retratado é uma figura generalizada. Apesar de alguns críticos indicarem a origem provável de certos ornamentos, o negro, diferente dos outros personagens do quadro, não é uma figura específica, poderia ser qualquer um, qualquer tribo, não importa exatamente, pois todos estão igualmente sujeitos ao poder imperial. No segundo plano, vemos o Príncipe Albert, marido da Rainha. Nesse ponto vale explicar como que, na Inglaterra, o monarca não precisava ser do sexo masculino e, caso não fosse, seu cônjuge era o príncipe consorte, assim como é hoje em dia na Inglaterra. No fundo, vemos uma senhora à esquerda, Elizabeth Wellesley, duquesa de Wellington, a “Mistress of the Robes”, uma espécie de chefe das damas de companhia da Rainha nomeada na época pelo primeiro ministro, sendo responsável pelos seus trajes e compromissos sociais. Além dela, dois senhores no fundo, que no caso são o primeiro-ministro e o secretário de estado de assuntos internacionais à época, Lorde Palmerston e Lorde John Russel, respectivamente. - Identificados os personagens, cabe perguntar quem pintou o quadro. Conduzirei o debate entre os alunos para o ponto de que não era qualquer pintor que faria um quadro desse, pois estava sendo retratada a maior figura do império mais poderoso do mundo. Apenas pintores de muito renome poderiam fazer um quadro desse, mesmo hoje em dia. No caso, o pintor é Thomas Jones Barker, nascido em 1815 em Bath, na Inglaterra, filho de Thomas Barker, também pintor. Seu pai já era bastante renomado tendo exposto alguns quadros na Royal Academy, a instituição diretamente ligada à monarquia britânica para divulgação e incentivo às artes. Seguindo essa tradição familiar, Barker foi estudar em Paris, onde foi discípulo de Horace Vernet, um renomado pintor de campos de batalha e de temas orientalistas. Ainda na França, Barker pintou quadros para a monarquia francesa que lhe renderam a Legião de Honra como prêmio pelos serviçoes prestados. De volta a Inglaterra em 1845, Barker continuou pintando cenas de batalha e retratos, também participando de exposições na Royal Academy. Como artista de tal importância nos altos círculos sociais, Barker era solicitado para pintar retratos e cenas de importantes batalhas para a memória do Império, isto é, suas pinturas eram geralmente relacionadas ao alto escalão da política britânica. Logo, esse quadro, como mensagem, destinava-se a esse alto escalão, à “propaganda” do poder real, contendo elementos que o corroboravam. A circulação desse quadro foi feita em um tour nacional, na qual reproduções do quadro eram vendidas com o nome de “A Bíblia”, o que mostra a intenção deliberada da propaganda imperialista dentro da Inglaterra, colocando-a (personificada por sua rainha) como a provedora do conhecimento (da civilização) para os povos conquistados. - O posicionamento de cada personagem do quadro também é fundamental na simbologia. Primeiramente, todos os brancos do quadro estão em pé, enquanto o único negro está abaixado, quase que de joelhos, mesmo sendo uma representação de um líder africano, devido ao seu vestuário. Se houvesse apenas o negro e a rainha no quadro, o gesto de reverência que ele faz já seria significante, mas outros membros do alto escalão da política do Império Britânico não estão reverenciando a mesma, o que certamente coloca o negro numa posição bastante inferior. Isso não significa, porém, que a figura da rainha não esteja destacada dentre os outros ingleses da foto. Ela ocupa o primeiro plano, enquanto os outros estão em segundo plano e olhando para ela. É certo que o negro também ocupa o primeiro plano, mas devido a sua posição já comentada, vale a interpretação de que o objetivo principal passado pelo pintor é evidenciar sua sujeição em vez de valorizá-lo. A figura mais valorizada é, indiscutivelmente, a rainha, soberana do Império Britânico com todas as suas colônias e colonizados, dentre eles o negro. No plano imediatamente posterior, encontra-se o Príncipe Albert, o que sugere a hierarquia da monarquia na composição dos planos, pois apenas no último plano estão os políticos e a duquesa. O Príncipe Albert também não parece olhar diretamente para a rainha, o que sugere, por sua dupla condição de súdito e cônjuge, além de importante membro de outras famílias nobres europeias que não as inglesas, que ele por si só é uma figura também importante, sua nobreza não depende do tronco nobiliárquico inglês somente. A rainha parece olhar diretamente de cima para baixo para o negro, mas o contrário não se verifica. O negro não olha nos olhos da rainha, seu olhar está direcionado para o livro. Dificilmente em um quadro tão simbólico esse detalhe seria gratuito. O negro não está em condição de sequer olhar para a rainha, mas simplesmente para o “conhecimento” que ela pretende passar, representado pela figura do livro. - Os símbolos envolvidos também são muito importantes. Também é provável que algum dos alunos já comece mencionando a questão do livro, que é o destaque do quadro. Apesar de não ficar totalmente claro, o consenso indica que o livro é de fato a bíblia, o que é aceito pela National Portrait Gallery, instituição que guarda a obra. O nome do quadro, “O segredo da grandeza da Inglaterra” (tradução minha), tem origem numa possível anedota da época de que, uma vez perguntada por uma missão diplomática qual era esse segredo, a rainha respondeu entregando uma bíblia a quem perguntou. Esse simbolismo foi representado pelo autor (a cena é imaginada) e caracteriza a própria ideia do imperialismo de “civilizar” ou, no vocabulário dos dias de hoje, ocidentalizar os povos que dominavam. O negro, ao aceitar de joelho o “presente” dado pela rainha, estava aceitando uma intervenção na sua cultura por parte de uma cultura “superior”. O trono da rainha também é interessante. Eu perguntaria a turma se eles notam algum detalhe especial que lhes chama atenção, esperando como resposta os leões. Caso não houvesse resposta ou dissessem simplesmente leão, eu apresentaria a Imagem 2 do anexo, na qual David Beckham veste a camisa da seleção inglesa de futebol, perguntando o que havia de comum entre essa imagem e o quadro, ou porque teria um leão nos dois. A resposta que pretendo chegar é que o leão é o símbolo da monarquia inglesa desde seu primeiro rei Plantageneta, é um dos símbolos máximos do poder real e, ironicamente, é um animal de origem africana. - Por último, eu mostraria aos alunos a Imagem 3 do anexo, uma reinterpretação contemporânea do quadro feita por Twinkle Troughton e Tinsel Edwards, duas artistas plásticas britânicas. Na releitura, os personagens são substituídos por personalidades atuais. Victoria Beckham ocupa o lugar da rainha e, em vez de um livro, dá uma bolsa Channel a Barack Obama, que ocupa o lugar do líder africano original. No lugar do Príncipe Albert, temos Simon Cowell, famoso por ser jurado em programas de calouro e uma grande celebridade na Inglaterra. No plano de fundo, o prefeito de Londres, Boris Johnson, ocupa o lugar de Lorde John Russel. Não consegui descobrir quem está no lugar de Lorde Palmerston, mas tudo indica que seja outro político britânico segundo uma entrevista com uma das autoras do quadro. A sátira, na visão das autoras, mostra como hoje em dia as celebridades e o mundo midiático são muito mais valorizadas pela opinião pública do que os políticos ou suas ações. A bolsa Channel representaria o materialismo e apego às grandes marcas e o luxo e, entregue a Barack Obama como o segredo da grandeza da Inglaterra, mostra o que ele deveria saber para governar seu povo, isto é, que o que vale é ter uma boa aparência por meio de grifes e outros símbolos de poder econômico que, numa sociedade capitalista, são elemento de distinção social. Essa é uma visão da própria artista sobre a qual especulo um pouco, mas tentarei deixar a interpretação aberta para os alunos antes de entrar com essa leitura. Fontes: Site da National Portrait Gallery: http://www.npg.org.uk/collections/search/portrait/mw00071/The-Secret-of-EnglandsGreatness-Queen-Victoria-presenting-a-Bible-in-the-Audience-Chamber-atWindsor?search=ap&npgno=4969&eDate=&lDate= Artigo do Journal of the Association for the Study of Australian Literature: http://www.nla.gov.au/openpublish/index.php/jasal/article/viewFile/2876/3603 Entrevista com Twinkle Troughton: http://oakazine.com/2010/11/interview-london-artist-twinkle-troughton/ Site de arte: http://www.degreeart.com/abstract-prints/twinkle-troughton/secret-englands-greatness E artigos na Wikipédia sobre todos os personagens históricos envolvidos Anexo: Imagem 1 Imagem 2 Image m3