Armadilhas da Linguagem!

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Bete Masini
Chamo de Armadilhas da linguagem palavras ou expressões que costumam trazer dúvidas ao
autor de textos e aos falantes da nossa língua materna. Além disso, o uso equivocado de tais
expressões ou palavras mostra falta de domínio da norma culta e, com frequência, traze
problemas de coerência (articulação de conteúdos) aos textos.
Seguem as primeiras 11 armadilhas da nossa língua selecionadas para você!
1. Uso do ESTE, do ESSE e de seus familiares
✓ Anáfora
Observe como o uso dos pronomes tem um papel fundamental na associação entre as partes do texto.
Verifique o uso do “essas” – grande dificuldade da língua portuguesa! Esse pronome recupera
algo a que já se fez referência antes: o tipo de questão da prova.
Alguns pronomes referenciais são anafóricos – estabelecem referências com o que já
“apareceu” no texto; outros buscam a referência para frente: o termo pressuposto aparece
depois do item coesivo. (Catáfora)
Uso dos pronomes referenciais ESTE (e seus familiares) e ESSE (e seus familiares)
Os pronomes acima são demonstrativos. Têm a função básica de apontar a localização no
espaço físico. Entretanto, também desempenham a função de marcar as referências no
contexto linguístico: texto falado ou escrito e no tempo.
No espaço:
Este e demais familiares: indicam o que está próximo de quem fala/escreve:
Esse e demais familiares: indicam o que está próximo de quem ouve/lê:
No texto: atenção, o uso adequado é muito importante!
Este e demais familiares: referem­se a algo que será dito/escrito: O ouvidor disse isto na
reunião: Precisamos resolver sobre o relatório que será enviado. (Catáfora)
Esse e demais familiares: referem­se a algo que já apareceu no texto/na fala: O curso
ministrado em Brasília teve a duração de trinta horas. Esse curso foi dirigido a
colaboradores do SERPRO. (Anáfora)
Outro exemplo:
HALVERSON, B. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br>.
Observe que o uso do “Isso não está previsto” faz referência ao pedido de Calvin: “Vamos
recontar os votos! Impeachment”.
Após você ler e analisar a décima primeira Armadilha, você verá que há um equívoco no uso
da grafia do “por que” – último quadrinho. Qual é?
No tempo:
Este e demais familiares: indicam tempo atual, presente – em relação ao momento da fala:
Este momento que estamos vivendo será inesquecível para todos nós!
Esse e demais familiares: indicam um tempo anterior próximo ou posterior próximo: A
capa da revista Época dessa semana trouxe uma nova polêmica: A turma da algazarra.
(a revista era do início da semana quando finalizei o material – 21 de janeiro)
A meteorologia prevê que esse fim de semana será chuvoso.
2. Posto isto? Posto isso? Isso Posto? Isto posto?
Com certeza, você já se deparou com todas essas formas de escrita. Qual a correta?
Ela significa: Uma vez posta a fundamentação,....... . Com isso, já podemos concluir que ela
retoma a análise já feita e, portanto, devemos usar o ISSO.
Quanto à estrutura, nos períodos como “Começada a aula, os participantes iniciaram seus
questionamentos”; “Terminado o relatório, deixaram, para o dia seguinte, a continuação dos
trabalhos”; “Proferida a sentença, o juiz encerrou os trabalhos”, o verbo inicia a frase.
Trata­se – apenas para nomear – de uma oração reduzida de particípio.
A estrutura “Posto isso” é igual. Então, o correto é POSTO ISSO.
3. Como escrever corretamente as HORAS: 12hrs? 12:00? 12hs?
12hs00min?
O correto é: A reunião será às 14h00. Não será às 14h30min como havia sido programado.
Entretanto, pelo uso, a norma culta passou a aceitar as formas 12h e 12h30.
4. Atenção: o MESMO não faz nada
Não use a palavra MESMO com artigo para substituir substantivo ou pronome! Observe as
frases abaixo e a maneira correta de as escrevermos:
a) A consultora voltou de viagem hoje e “a mesma” já marcou uma reunião.
Veja que o “ela” deveria substituir “a mesma” – e isso nem seria necessário: A consultora
voltou de viagem e ela já marcou uma reunião.
b) O diretor vai definir as contratações e, na próxima semana, os demais colaboradores
conhecerão a decisão “do mesmo”.
Veja que a contração “dele” resolveria o problema: (...) os demais funcionários conhecerão
a decisão dele. Poderíamos usar “sua decisão” já que não há outra possibilidade de
referência além do diretor.
c) “Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra­se parado nesse
andar”.
Agora ficou fácil corrigir!
Algumas expressões muito parecidas costumam ser um problema quando escrevemos textos e
até quando falamos. Vejamos três:
5. AO ENCONTRO DE X DE ENCONTRO A
As duas expressões não tem o mesmo significado como muitos pensam.
Ir ao encontro de significa: 1­ se encontrar com alguém: Ele foi ao encontro de seus pais.
2­ estar a favor de/concordar com: As minhas ideias vão ao
encontro das suas.
Ir de encontro a significa: 1­ bater/ choque físico: Ela foi de encontro à parede!
Machucou­se muito.
2­ estar contra/discordar: Suas ideias iam de encontro às
minhas. Não pudemos continuar conversando.
6. A PRINCÍPIO X EM PRINCÍPIO X POR PRINCÍPIO
A Princípio significa “no início”: A princípio, considerava correta a análise que fazia da
situação, mas, depois, percebeu o equívoco.
Em princípio corresponde a “antes de qualquer coisa ou consideração”, “em tese”: Em
princípio, todos são iguais perante a justiça.
Por princípio equivale a “por convicção”: Por princípio, ele não aceita injustiças.
7. Em vez de X Ao invés de
A expressão “em vez de” significa “no lugar de”; ideia de substituição. A expressão “ao invés
de” traz a ideia de oposição – ao contrário de, por isso, seu uso é bem restrito.
Ao invés de baixar, os preços dos seguros subiram!
Ao invés de entrar, o ouvidor saiu. Ninguém entendeu o fato.
Em vez de escrever o relatório, a colaboradora escreveu a carta ao cliente.
Paguei R$85,00 pelo livro em vez de R$120,00. Fiz, com isso, uma excelente compra!
O bom é que a expressão “em vez de” também pode ser usada no sentido de oposição.
Então, na dúvida, use o “em vez de”.
8. “Através de” é diferente de “por meio de”
A expressão através de significa “ao longo de”, “por dentro de”, “de um lado a outro”. Não
pode, portanto, ser usada no sentido de “por meio de”. Vejamos alguns exemplos de uso
correto do “através de”:
1­ Ela nos olhava através da janela.
2­ Viajaram horas através de estradas movimentadas.
3­ Mantivemos nossa amizade através de anos.
4­ A água passou através das casas durante a enxurrada.
Observe como é diferente o sentido de “por meio de”:
1­ Soube do ato terrorista por meio da TV.
2­ As alterações nas contratações da empresa foram divulgadas por meio de e­mails.
3­ Ele manifestou­se contrário à decisão por intermédio de um relatório minucioso.
4­ Reconheceu o amigo pelas fotografias.
9. Precisado ou preciso? “Ponhado” ou posto?
Essa é uma das dúvidas mais frequentes. É fácil verificarmos que esse problema ocorre
porque há verbos que apresentam mais de uma forma. São chamados de verbos abundantes.
Vamos resolver essa dúvida para sempre!
As formas são: regulares – terminam em ADO e IDO: precisado, enxugado, ganhado
irregulares – mais curtas: preciso, enxuto, ganho
Quando usar essas formas?
Regulares são usadas com os auxiliares TER e HAVER: Ele tinha aceitado o convite para a
audiência. A estagiária havia enxugado o teclado, pois derrubara café nele.
Irregulares são usadas com os auxiliares SER e ESTAR: O horário da reunião foi aceito por
todos. O teclado estava enxuto.
Evite o uso de PEGO – ELE É BEM DA LINGUAGEM ORAL. Abomine o uso de Chego!
Atualmente, já se admite o uso dos verbos GANHO, PAGO e GASTO tanto com o auxiliar
haver, como com o auxiliar ter. Assim, tinha gastado ou gasto; ganhado ou ganho; pagado ou
pago muito dinheiro.
Vale a pena lembrar que, antes de particípio, usamos “mais bem” e “mais mal” em vez de
“melhor” ou “pior”. Observe os exemplos:
1. Era o ouvidor mais bem preparado da Seguradora. (e não melhor preparado)
2. Era o texto mais mal escrito que eu já havia lido. (e não pior escrito)
3. Nunca vi palavra mais mal/mais bem utilizada que essa. (e não pior ou melhor utilizada)
Demais casos não costumam causar dúvidas:
1. Conhecia a legislação melhor do que pensavam.
2. Mesmo que quisesse, não faria pior o trabalho.
3. Veja os que saíram melhor e pior no Exame da Ordem. (As palavras ficam no singular)
Quanto ao “ponhado” no título da Armadilha, que deve ter­lhe causado, no mínimo,
estranhamento ou sorriso de “como assim?”, é uma variante da norma culta. Se você
consultar, por exemplo, o Dicionário Aurélio, verá que há lá uma definição!
10. DE + O nem sempre é igual a DO
Observe as frases abaixo:
Os colaboradores da Seguradora concordaram com a decisão de a assembleia ser
transferida para o próximo mês. (ser = verbo no infinitivo)
Apesar de aquele funcionário ter reclamado, a mudança ocorreu. (ter = verbo no
infinitivo)
O fato de a testemunha mover a ação obrigou­os a resolver o impasse. (mover =
infinitivo)
Existe a possibilidade de eles participarem da reunião. (participarem = infinito flexionado)
A questão consiste em os brasileiros adotarem posturas mais críticas e menos
individualistas em relação às questões sociais. (adotarem = infinitivo flexionado)
Em virtude de esse aviso não ter sido publicado, os colaboradores não precisam
cumpri­lo.
Apesar de o Ministério da Saúde ter liberado Campinas a pagar o dobro do que é pago
no restante do país, preço baixo ainda afasta novos hospitais do SUS. (Manchete de jornal
da cidade)
A campanha eleitoral é uma forma de o candidato divulgar suas propostas políticas.
Por que isso? Veja que os sujeitos dos períodos envolvidos na questão são respectivamente: a
assembleia, aquele funcionário, a testemunha, eles, os brasileiros, esse aviso, o Ministério da
Saúde, o candidato. Além disso, o sujeito nunca é introduzido por preposição.
11. O uso de por que, porque, por quê e porquê
Observe o diálogo abaixo:
A: Por que você não veio ao trabalho ontem?
B: Não vim, porque estava acamado.
A: Por quê?
B: Estava com um resfriado muito forte. Mas, por que você tem tanto interesse nisso?
A: É que eu sempre me interesso pelos seus porquês!
Veja que, na primeira pergunta, podemos substituir a expressão por qual razão/por que
motivo. Na última fala de B, o sentido é igual.
Na primeira resposta de B, o “porque” utilizado é o da conjunção causal. Veja que podemos
substituir por visto que, já que.
Na segunda pergunta de A, a expressão aparece com acento por estar próxima a sinal de
pontuação – isso a torna tônica.
O uso acento, na última fala, ocorre, visto que a palavra assume a função de um substantivo:
seus motivos.
Há ainda o uso de “por que” em lugar do relativo pelo qual/ pela qual e os respectivos plurais:
São incríveis as situações por que passamos.
Essas são apenas algumas das armadilhas que a nossa língua materna nos oferece. Fique
atento/a, pois errar o significado das palavras compromete a clareza de sua fala ou de sua
escrita e mostra desconhecimento da norma culta.
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