Reforma Agrária e Agroecologia: a experiência da Família Rosa

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AS-PTA do Contestado | Ano 1 | Edição nº 06 |
Julho 2009
Reforma Agrária e Agroecologia:
a experiência da Família Rosa
com a Conservação da Floresta
e Geração de Renda.
Anísio e Isaura Rosa vivem com sua família no Assentamento Rondon III, no município de Bituruna.
Têm 3 filhos: Anisiane, Olcimar e Jessé. Anisiane
tem 29 anos, é casada e mora na cidade. Olcimar
tem 26 anos e trabalha como técnico do Movimento Sem Terra na região. Jessé tem 23 e vive na propriedade com a família. A propriedade é ecológica e
bastante diversificada com muita floresta preservada. Hoje a família tem uma boa qualidade de vida,
produzindo alimentos ecológicos e conservando a
natureza. Mas para conquistarem o que têm hoje
foi preciso muita luta.
Anísio nasceu em 1953 na comunidade do Encantilado, em Bituruna. Viveu com os pais e irmãos nesta comunidade até os nove anos. Depois a família se mudou para a comunidade de Santo Antônio do Iratim onde trabalhavam como arrendatários.
Em 1972 compraram 2 alqueires e meio de terra, construíram a casa e passaram a trabalhar neste pequeno pedaço de chão. Em 1977 Anísio casou-se com Dona Isaura Dias de Moura da comunidade do Pitanga. Construíram
uma casa perto da casa de seu pai, mas como a terra era pouca, Anísio passou a trabalhar como empregado em
uma madeireira onde ficou por 5 anos. Muitas famílias na região viviam a mesma situação. Queriam trabalhar,
mas não tinham acesso a terra, ao mesmo tempo em que existia (e ainda existe!) muita terra na mão de poucos.
Em 1984 surgiram as primeiras organizações para fundar os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais na região. Nesta
época começaram a se organizar para lutar pela reforma agrária.
Em 1986 foi fundado o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bituruna resultado da luta e organização dos
agricultores. Anísio participou deste trabalho. Pouco tempo depois o Movimento Sem Terra (MST) e o Sindicato
ocuparam a primeira fazenda no município de Teixeira Soares, hoje assentamento São Joaquim. Em 1988 o MST
ocupou com 250 famílias a fazenda JBettega do município de Bituruna. Infelizmente a ocupação durou apenas
um dia e uma noite pois o governo estadual mandou a Polícia despejar as famílias, contando com o apoio do prefeito. Sem terem para onde ir, as famílias ficaram por 8 meses acampadas no terreno do Sindicato, trabalhando
de forma coletiva para se manterem organizadas. Até que no dia 23 de abril de 1989, junto com alguns grupos
de outras regiões, ocuparam a fazenda Zata na localidade de Empoçado, também em Bituruna. A realização do
sonho das famílias veio em 1990 quando a terra foi comprada pelo governo para implantar o assentamento.
Anísio e sua família construíram casa no lote e vivem neste local há 18 anos. Nos primeiros anos começaram
plantando milho e feijão e com o tempo foram diversificando a propriedade com as criações de animais e vários
tipos de cultivos, cuidando das sementes crioulas, sem utilizar adubos químicos e agrotóxicos. Com esse sistema,
as despesas eram pequenas e aos poucos a renda foi melhorando.
Sempre tiveram como prioridade ter a maior diversidade possível de alimento ecológico para a família. Pensando assim produzem de tudo um pouco: feijão, milho,
abóbora, melancia, cebola, batata doce, mandioca, vários tipos de verduras, plantas
medicinais e diversos produtos da floresta. Segundo Anísio “Uma família de pequeno
agricultor deve primeiro produzir tudo o que for possível para seu consumo familiar,
quanto menos comprar do mercado melhor”. Isto é que é segurança alimentar!
Produzir a própria semente sempre foi muito importante para a família. Por este motivo
participam do grupo de experimentadores de sementes crioulas da comunidade.
Anísio faz parte do grupo que monta o campo comunitário de produção de sementes
do milho crioulo. Eles plantam a variedade Composto Amarelo Precoce. Este trabalho
começou em 2003 em uma parceria entre a AS-PTA e a Brigada do Contestado do
MST e envolve vários outros tipos de sementes crioulas. Com toda esta diversificação e com poucas despesas, garantem uma boa renda na propriedade , sendo que
a floresta contribui bastante para este resultado. Anísio e sua família desenvolveram uma experiência muito interessante de uso
sustentável da floresta. Manejam 2 alqueires de floresta nativa, enriquecidos com erva mate nativa a partir de mudas produzidas na
propriedade.
A idéia do manejo da erva mate na floresta vem das observações do que
acontece na natureza. A erva cresce na sombra de outras árvores. Desde
1998 Anísio participou dos trabalhos do grupo de agricultores experimentadores em Agroflorestas promovidos pela AS-PTA, na região. Através da observação, a família descobriu que na natureza cada tipo de árvore desempenha
uma função. As árvores que fazem sombra para a erva mate são as pioneiras
que crescem rápido e mudam o ambiente para as que vêm depois. Exemplos
de plantas pioneiras são as tupixavas, a bracatinga, o vassourão, carne de
vaca, alguns tipos de canelas, entre outras.
Como as pioneiras criam uma condição melhor para as árvores que vêm
depois, elas também são chamadas de “criadeiras” ou “adubadeiras”. Exemplos de espécies que crescem na sombra de outras árvores são a própria erva
mate, o pinheiro araucária, a imbuia, a canela sassafrás entre outras. Este
é o conceito da sucessão ecológica através do qual é possível produzir nas
agroflorestas sem prejudicar as suas funções ambientais. Este trabalho vem
sendo intensificado pela Brigada do Contestado que está fazendo experiências práticas em grupos, discutindo conceitos que ajudam a entender como produzir junto com a natureza nos diferentes ambientes
que existem.
Na agrofloresta do Anísio a erva mate cresce dentro de seu ambiente natural, mas com uma quantidade de sombra que é controlada
pelo manejo da copa das outras espécies, das rebrotas e das mudas novas. Como ele diz, “tudo vira matéria orgânica para alimentar
a vida da terra e da floresta”.
Sempre têm mudas novas de várias espécies garantindo a sucessão e manutenção da floresta. As vantagens da erva crescer neste
sistema é que, além de ter uma qualidade superior, o erval terá uma vida longa, não terá problemas de pragas e doenças, não precisa ser roçado e a família não tem despesa. Eles não compram nada fora.
Até as sementes e mudas da erva e de outras espécies são produzidas na
propriedade! Para isso foram selecionadas algumas árvores na floresta
para a coleta de sementes. Depois disto o trabalho é no viveiro que fica
dentro da floresta. Nele são produzidas, além da erva-mate, mudas de
frutíferas e espécies de árvores nativas. As mudas produzidas são utilizadas na propriedade e o que sobra é comercializado. A comercialização
da erva mate e das mudas geram um renda muito boa. Em função disto
a família está ampliando mais um alqueire de floresta. As lavouras e as
criações são apenas o suficiente para o consumo.
Outra grande vantagem desse sistema agroflorestal é ser muito resistente às mudanças climáticas. A seca ou excesso de chuva podem causar
grandes perdas nas lavouras, mas na agrofloresta a produção é garantida. Sem dúvida alguma, o trabalho desta família chama atenção para
muitos assuntos importantes e que podem ser o tema de muita prosa
em roda de chimarrão!
realização:
apoio:
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