Artigo Original - Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e

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Artigo Original
Triclosan versus clorexidina no controle químico da placa
e da gengivite em pacientes dentados com carcinoma
espinocelular de boca submetidos à radioterapia
pós-operatória
Triclosan versus chlorhexidine on the control of the dental bacterial
plaque and gingivitis in dentate patients with oral squamous cell
carcinoma undergone postoperative radiation therapy
RESUMO
Introdução: o acúmulo de placa bacteriana na superfície dos
dentes está relacionado ao aparecimento das duas principais
doenças dentárias, cárie e doença periodontal. Pacientes tratados
com radioterapia de cabeça e pescoço apresentam xerostomia,
que dificulta os cuidados com a boca e que requer o uso de solução
de bochecho como adjunto no controle químico da placa bacteriana dental. O uso da clorexidina como bochecho já é prática comum
em muitos centros de tratamento de câncer apresentando, todavia,
alguns pára-efeitos. Objetivo: avaliar os efeitos clínicos do uso do
triclosan versus a clorexidina no controle químico da placa
bacteriana dental e da gengivite em pacientes dentados com
carcinoma espinocelular de boca submetidos à radioterapia pósoperatória. Casuística e método: estudo prospectivo, duplo-cego,
que avaliou o efeito clínico do triclosan e da clorexidina em solução
de bochecho como adjunto ao controle mecânico da placa
bacteriana dental em pacientes que receberam radioterapia pósoperatória para o tratamento de carcinoma espinocelular de boca.
Trinta dias de estudo em vinte pacientes, sendo dez em cada
grupo. Todos os pacientes apresentaram, no mínimo, 10 dentes na
boca, sem utilizarem próteses ou aparelhos ortodônticos e não
apresentando dificuldades motoras. Todos receberam orientação
de higiene oral e tratamento periodontal inicial no dia 1. Medidas de
índice gengival e índice de placa foram tomadas nos dias 1, 15 e
30. As médias de cada superfície de cada dente de cada paciente
foram tomadas. A inferência estatística foi avaliada pela aplicação
da analise de variância (ANOVA) complementada pela aplicação
do teste de medidas repetidas do modelo geral linear. Em todas as
avaliações foi fixado um valor de 5% para descartar a hipótese de
nulidade (p< 0,05). Resultados: os pacientes que utilizaram a
substância clorexidina apresentaram menos gengivite do que os
pacientes que utilizaram a substância triclosan. As médias de placa
do grupo utilizando o triclosan foram menores, mas não houve a
mesma redução nos índices de gengivite. Conclusões: o uso de
solução de bochecho com clorexidina como adjunto ao controle de
placa bacteriana dental mostrou ser efetivo no combate à gengivite
em pacientes submetidos à radioterapia pós-operatória por
carcinoma espinocelular de boca. O uso de solução de bochecho
com triclosan não apresentou a mesma efetividade que a
clorexidina no controle da gengivite, embora seu uso demonstrasse redução dos níveis de placa bacteriana dental.
Karima Yustra Jaber1
Sergio Altino Franzi2,
Laurindo Moacir Sassi3,
Abrão Rapoport4
Maria Isabela Guebur5
Rogério A. Dedivitis6
ABSTRACT
Introduction: the presence of dental plaque is related to the
development of the two major dental diseases, caries and
periodontal disease. Some special situations such as radiotherapy
impair proper plaque control since the irradiated patient develops
xerostomia which dificults the oral care. In those cases, chemical
plaque control thorough the use of mouthrinse solutions has
become a common practice in many cancer treatment centers.
Chlorhexidine has been the substance of choice but it has some
side-effects. Objective: to evaluate the clinical effects of a
substance containing triclosan versus chlorhexidine on the plaque
control and gingivitis in dentate patients with oral squamous cell
carinoma receiving radiotherapy after surgery. Materials and
methods: a double-blind, prospective, thirty-day study evaluated
clinically the efficacy of triclosan and chlorexidine mouthrinses on
the plaque control and gingivitis in dentate patients with oral
squamous cell carcinoma 3 to 6 months after surgery and receving
adjuvant radiation therapy. Twenty patients were studied, being 10
in each group. All patients had at least 10 teeth, without prosthetics
or orthodontic appliances, neither with any incapability to perform
oral hiegiene measurements. They received oral hygiene
instructions and initial periodontal treatment on day 1. Baseline
examinations were performed on days 1, 15 and 30. The mean
values for each tooth surface in each tooth of every patient were
taken in all three examinations. Statistical inference was performed
by applying the analysis of variance (ANOVA) plus the test of
repeated measurements from the general linear model. The
confidence limit was 95% in all evaluations (p<0,05). Results: the
patients in the chlorhexidine group demonstrated less gingivitis
than the patiens in the triclosan group, despite the fact that the
patients in the triclosan group had less plaque that the patients in
the chlorhexidine group. Conclusions: the use of chlorhexidine
mouthrinse as an adjunct to mechanical plaque control disclosed to
be effective to reduce gengivitis in patients undorgoing radiotherapy after surgery for treatment of squamous cell carcinoma of the
mouth. The use of triclosan did not show the same efficacy of that
shown by chlohexidine to reduce gingivitis, despite the fact that
triclosan reduced the bacterial dental plaque level.
Key words: triclosan; Chlorhexidine; Squamous cell cancer;
Radiotherapy.
Descritores: triclosan; clorexidina; carcinoma espinocelular;
radioterapia.
1) Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis – Hosphel, São Paulo.
2) Doutor em Medicina pelo Curso de Pós-Graduação de Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Docente do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do
Hospital Heliópolis – Hosphel, São Paulo.
3) Mestre pelo Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, São Paulo. Chefe do Departamento de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Erasto
Gaertner, Curitiba.
4) Professor Livre Docente pelo Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo. Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Cirurgia de
Cabeça e Pescoço do Hospital Heliópolis.
5) Mestra em Ciências da Saúde pelo Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis – Hosphel, São Paulo. Pesquisadora do Departamento de Cirurgia e
Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Erasto Gaertner, Curitiba, Paraná.
6) Doutor em Medicina pelo Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Docente
do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, São Paulo.
Instituição: Departamento de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Erasto Gaertner, Curitiba.
Correspondência: Laurindo Moacir Sassi, Av. Sete de Setembro, 4698 sala 180580240-000 Curitiba, PR. E-mail: [email protected]
Recebido em: 13/02/2007; aceito para publicação em: 28/03/2007; publicado on line em 15/06/2007.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 2, p. 75 - 79, abril / maio / junho 2007
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INTRODUÇÃO
A correlação das doenças bucais com a presença de microorganismos associados à placa bacteriana dental já está
comprovada desde o clássico estudo da gengivite experimental
de Löe et al., 19651. Muito embora a teoria deste adviesse de
uma flora bacteriana comensal e tornou-se patogênica pelo
simples acúmulo de placa na superfície do dente, outros
pesquisadores demonstraram que muitas bactérias periodontais apresentam propriedades para a invasão tecidual, tendo
como vetor o Actinomyces actinomycetencomitans2 e em
relação à Porphyromonas gingivalis, sustentando uma outra
corrente de pensamento que acredita ser a doença periodontal
uma infecção3. O controle de placa tornou-se uma necessidade
de saúde pública, uma vez que a presença de patógenos
bucais pode interferir negativamente no status de saúde do
paciente.
Há necessidade de medidas adjuntas ao controle mecânico da
placa bacteriana (escovação e uso de fio ou fita dental) como,
por exemplo, o uso de substâncias químicas, como o triclosan
no controle químico da placa bacteriana4. Inúmeros trabalhos
têm demonstrado o efeito do digluconato de clorexidina2 no
controle da placa bacteriana5.
No entanto, sabe-se dos efeitos indesejáveis da substância de
bochecho clorexidina como, a queimação na língua, a pigmentação de dentes e de restaurações de resina, bem como a
alteração do paladar5. Faz-se necessário investigar o efeito do
triclosan como enxagüatório bucal em pacientes que foram
submetidos à radioterapia pós-operatória, que já saíram do
período crítico de ação da radioterapia convencional (6 a 9
semanas) e que necessitam de um bom padrão de higiene oral.
A presença de restaurações dentárias mal adaptadas e com
excesso que propiciam o acúmulo de placa bacteriana,
próteses dentárias mal ajustadas, entre outros cuidados devem
ser tomados anteriormente ao tratamento radioterápico, bem
como o cuidado com a manutenção de saúde bucal deve ser
mantido durante todo o período de tratamento e após o
tratamento radioterápico e/ou quimioterápico. Uma extensa
revisão da literatura coloca-nos a importância dos vários
aspectos de manutenção de saúde bucal em pacientes que irão
submeter-se ao tratamento radioterápico e/ou quimioterápico6.
A injúria ao osso pela radioterapia são extensamente descritos
na literatura e o fenômeno da osteoradionecrose é bastante
evidente, particularmente em mandíbula e, muito provavelmente, devido à menor vascularização da mandíbula em relação à
maxila7. A ação nociva da radioterapia pode ser observada
também nos tecidos pulpares, levando à fibrose pulpar
provocada pela alteração na vascularização. Alterações
ocorrem nas fibras do ligamento periodontal, aumento do
espaço ligamentar e propiciando as infecções que provavelmente precedem o processo de osteradionecrose. A radioterapia pode afetar também as glândulas salivares, o que leva à
xerostomia e, consequentemente, ao aumento de aparecimento de lesões cariosas. Há extensa perda de estruturas de
suporte periodontal em paciente com doença periodontal e
cárie, irradiado em ausência de cuidados de higiene oral8.
O triclosan, em diferentes doses, apresenta efeitos antibacterianos semelhantes aos da clorexidina9. Em estudo comparativo
da clorexidina, triclosan e outros dois produtos incluindo
substâncias-controle, o índice de placa e a superfície de placa
foram avaliados em 20 participantes em cinco modalidades
terapêuticas10. A clorexidina foi o mais efetivo, seguido pelo
triclosan e ambos foram bem mais efetivos que a solução salina
usada como controle. O efeito do triclosan com flúor fora
avaliado em comparação à clorexidina (controle positivo) e ao
placebo (controle negativo). Nesse estudo de quatro dias de
formação de placa, o triclosan com flúor apresentou um efeito
antibacteriano significativo.
Outros trabalhos também se referem ao triclosan na forma de
pasta ou creme dental como agente antibacteriano e antiinfla-
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matório11-13, porém, sem relatos de efeitos indesejáveis quando
do uso da substância triclosan. A eficácia das soluções de
bochecho contendo clorexidina foi estudada e oito voluntários
abandonaram o estudo na sexta semana do estudo devido aos
efeitos indesejáveis da clorexidina na mucosa (0,2%) e na
língua14. A clorexidina era utilizada em diferentes concentrações, 0,1% e 0,2%.
Em outro estudo comparativo entre a clorexidina e outras
substâncias, dois de nove participantes tiveram ulceração na
mucosa e um teve queimação na língua quando do uso da
clorexidina a 0,12%15. Outro problema do uso da clorexidina é a
pigmentação dentária e de próteses e a perda do paladar
quando do seu uso contínuo, como relatado em muitos
trabalhos. Isso se deve ao fato de que a clorexidina apresenta
bastante substantividade (capacidade de se manter no sítio de
ação) e, por essa razão, ela se liga a todas as estruturas da
cavidade oral, inclusive aos dentes, às restaurações e ao dorso
da língua. Ainda, os indivíduos tabagistas ou que ingiram
bebidas coloridas como café, vinho tinto, chocolates e demais
alimentos coloridos, terão mais pigmentações quando do uso
da clorexidina em soluções de bochecho, ao passo que o
triclosan reduziu o número de aftas em pacientes portadores de
afta recorrente16 e a clorexidina parece contribuir para a
formação de lesões na mucosa oral. Essas lesões em pacientes
irradiados constituem um problema, pois pacientes irradiados
terão menor produção de saliva. A xerostomia, um dos mais
importantes efeitos deletérios da radioterapia na região de
cabeça e pescoço, provoca um desequilíbrio significativo na
flora oral bacteriana e confirma o importante papel desempenhado pela saliva na manutenção da saúde dental17.
A perda da capacidade protetora salivar em conjunção com as
alterações microbianas e as mudanças nos hábitos gera uma
agressiva atividade cariogênica, que pode minimizada com o
uso de flúor. O edema e a presença de infiltrado inflamatório são
comuns durante o período inicial da irradiação e, mais tarde,
acontecem fibrose intersticial e degeneração dos ácinos com
atrofia glandular e degeneração e fibrose dos vasos sangüíneos
de pequeno calibre, reduzindo a vascularização dos tecidos18.
Portanto, escolhemos o triclosan como solução de bochecho
teste a fim de idealizarmos uma nova substância com propriedades anti-sépticas, mas com menor risco de causar danos à
mucosa dos pacientes.
No caso da clorexidina entendemos que os dados disponíveis
na literatura são irrefutáveis, possuindo excelente atividade
antimicrobiana. No entanto, seus efeitos colaterais, somado ao
fato de que o triclosan está bem documentado e apresenta
importantes propriedades antimicrobianas e antiinflamatórias
convida a estudar o tema.
O objetivo foi avaliar a resposta gengival dos pacientes
dentados portadores de carcinoma espinocelular de boca
submetidos à radioterapia após trinta dias do uso de um
enxaguatório bucal a base de triclosan versus um enxaguatório
bucal contendo clorexidina e quantificar superfícies de placa
bacteriana dental formada como medida adjunta na promoção
de higiene oral em pacientes dentados.
PACIENTES E MÉTODO
Avaliamos 20 pacientes portadores de carcinoma espinocelular
de boca, submetidos ao tratamento cirúrgico e radioterapia pósoperatória, após três meses e menos de seis meses do término
do tratamento radioterápico, os quais foram selecionados
dentre 400 prontuários do Hospital Erasto Gaertner, Curitiba,
para um estudo prospectivo duplo-cego teste-controle, no
período de outubro de 2005 a julho de 2006. O projeto foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Erasto
Gaertner.
Foram incluídos somente indivíduos com, no mínimo, 10 dentes
na boca. Foram fatores de exclusão: indivíduos portadores de
próteses parciais extensas, restaurações extensas, aparelhos
ortodônticos, indivíduos apresentando dificuldade motora que
impeça seu desempenho no auto-controle mecânico da placa
(escovação dos dentes). Após criterioso exame clínico
intrabucal, todos os indivíduos selecionados foram alocados
aleatoriamente em dois grupos. Após criterioso exame clínico
intra-bucal todos os indivíduos selecionados foram alocados
aleatoriamente em dois grupos. A escolha dos pacientes: o
primeiro foi sorteado para o grupo teste (grupo B) ou controle
(grupo A) após consecutivamente e alternando até o número
20.
Todos os indivíduos selecionados para participar do experimento receberam raspagens radicular e profilaxias na semana
que antecedeu ao início do experimento. O experimento teve
início no dia primeiro denominado D1 e terminou no dia 30
(D30).
Após exame intrabucal e profilaxias com raspagem e alisamento radicular para a remoção de cálculo e placa dental, os dois
grupos receberam instruções em higiene oral minuciosa no
primeiro dia do experimento e cada grupo recebeu aleatoriamente frascos contendo 1000 ml da solução triclosan ou da
1000 ml da solução de clorexidina, para uso como bochecho
duas vezes ao dia durante trinta dias.
As instruções de higiene oral foram passadas de maneira
verbal e demonstrativa, com a utilização de modelos, fios e fitas
dentais, escovas e escovas interdentais, pela periodontista
responsável pelos exames intrabucais. Cada paciente recebeu
um kit contendo escova dental macia número 35, fio dental,
escova interdental e frasco com enxaguatório bucal contendo
as substâncias utilizadas no ensaio clínico. Utilizamos a técnica
de escovação de Bass modificada, onde se colocava a escova
dental posicionada a 45 graus em relação à superfície do dente
e a realizava-se movimentos de vai-e-vém curtos e firmes; o
uso de fio dental foi demonstrado a cada paciente; o uso das
escovas interdentais, quando possível (tendo espaço interdental), também foi demonstrado a cada paciente.
Orientações, profilaxias e mensurações clínicas realizadas em
nos dias 1, 15 e 30. Exame clínico e sondagem foram realizados nos mesmos dias. Avaliação objetiva foi feita utilizando-se
dos seguintes parâmetros: índice gengival; índice de placa19
foram utilizados para mensurar os níveis de placa bacteriana e
de gengivite nos participantes por uma periodontista (autora)
calibrada com um nível de concordância intra-examinador e
através de uma sonda periodontal calibrada. Os parâmetros
clínicos foram avaliados em cada superfície de cada dente
presente (superfícies mesial, distal, palatina ou lingual e
vestibular). Superfícies com lesões cariosas e ou extensas
restaurações (restaurações com mais de três superfícies)
foram excluídas.
A inferência estatística foi avaliada pela aplicação da análise de
variância (ANOVA) complementada pela aplicação do teste de
medidas repetidas do modelo geral linear. Em todas as
avaliações foi fixado um valor de 5% para descartar a hipótese
de nulidade (p <0,05).
RESULTADOS
Os resultados relativos a inflamação gengival como medido
através do índice gengival podem ser observados na tabela 1.
Os resultados relativos a placa bacteriana dental medidos
através do índice de placa podem ser observados na tabelas 2.
Tabela 1 – Comparação entre o índice gengival (médias desvio
padrão) dos pacientes submetidos a diferentes tratamentos nos dias 1,
15 e 30.
Períodos de tratamento**
Grupos de estudo*
Dia 1
Dia 15
Dia 30
Clorexidina
0,88 ±
0,43
0,57 ±
0,26
0,56 ±
0,36
Triclosan
0,41 ±
0,10
* p = 0,018; ** p = 0,028
0,33 ±
0,10
0,46 ±
0,26
Tabela 2 – Comparação entre o índice de placa (médias desvio padrão)
dos pacientes submetidos a diferentes tratamentos nos dias 1, 15 e 30.
Grupos de estudo*
Períodos de tratamento**
Dia 1
Dia 15
Dia 30
Clorexidina
0,81 ±
0,22
0,92 ±
0,46
0,79 ±
0,35
Triclosan
0,73 ±
0,20
0,68 ±
0,26
0,55 ±
0,14
* p = 0,241; ** p = 0,322.
DISCUSSÃO
O conceito original para o uso de antissépticos em enxaguatórios bucais surgiu com a finalidade de reduzir a placabacteriana
dental20 e também para inibir a gengivite, que pode progredir
para uma periodontite com conseqüente perda de osso alveolar
e tecidos de suporte periodontal. Outra finalidade seria de
reduzir os níveis de patogenicidade da placa bacteriana dental.
Inúmeros estudos demonstraram preocupação com o teor de
acidez da placa bacteriana dental e que bochechos rápidos com
certos antissépticos podem inibir a formação da placa bacteriana dental por algumas horas. Presume-se que similar efeito seja
obtido em pacientes suscetíveis à doença periodontal.
Antissépticos são amplamente usados em periodontia como
agentes de prevenção primária da formação da placa bacteriana dental. A clorexidina, por exemplo, é usada há trinta anos na
periodontia21 e também reage com glicoproteínas salivares,
diminuindo a formação da película adquirida. A clorexidina é
uma bisguanadina catiônica, com um amplo espectro antimicrobiano, incluindo contra os microorganismos gram-positivos,
reduzindo o número de bactérias na boca por uma via bactericida direta e/ou através de propriedades bacteriostáticas. Ela se
prende às proteínas da saliva e impede a adesão das mesmas à
superfície dental, aderindo às bactérias da saliva, portanto,
interferindo na colonização bacteriana da superfície do dente.
Previne a aglutinação de bactérias na superfície do dente
através da competição com íons de cálcio21.
O triclosan tem sido usado como antimicrobiano tópico, sendo
incolor e cristalino, solúvel em água e esta solubilidade aumenta
rapidamente quando em soluções alcalinas. Possui efeito
antimicrobiano de largo espectro, sendo eficaz contra grampositivos e gram-negativos, micobacteria, anaeróbicos,
esporos e fungos como cândida. Age na membrana citoplasmática das bactérias, induzindo a quebra dos constituintes
celulares, causando lise da bactéria. Antes de sua inclusão na
Odontologia, fazia parte dos produtos cosméticos, sabões e
produtos dermatológicos, para o armanezamento e durante o
uso, reduzindo a contaminação dos mesmos. A toxicidade é
baixa. Foi recentemente introduzido nos cremes dentais e em
soluções de bochecho a fim de reduzir a formação da placa
bacteriana dental. Apresentou resultados antimicrobianos
promissores em estudos in vitro22. Mudanças quantitativas e
qualitativas na placa ocorrem com o uso do triclosan, com
redução da espessura da placa bacteriana23. Foi também
observado que o número de bactérias anaeróbicas e de
Actinomyces na placa reduziram em 21 dias de exposição ao
triclosan, podendo atuar na maturação da placa24. Não houve
relato de mudanças na flora quando do uso do triclosan e,
portanto, não há relato de formação de espécies resitentes a
ele25. O triclosan é solúvel em lipídios e deve ser solubilizado em
detergentes, soluções alcalinas ou solventes orgânicos para o
seu uso clínico. Essa solubilidade é considerada crítica para a
sua ação anti-placa e pode explicar sua melhor ação na
gengivite do que na placa22. Seu melhor efeito dá-se após três a
seis meses de uso, situação que difere consideravelmente da
clorexidina. Durante duas semanas sem limpeza mecânica,
mais placa bacteriana dental formou-se em participantes de
estudo que não utilizaram uma solução de bochecho a base de
triclosan do que em participantes que utilizaram uma solução de
77
bochecho a base de triclosan26. No entanto, o grau de gengivite
foi significativamente menor quando do uso do triclosan, sendo
sugerido algum efeito anti-inflamatório do triclosan junto aos
tecidos periodontais. Cento e vinte voluntários foram divididos
em dois grupos, um utilizando creme dental contendo triclosan
e outro grupo, não. Exames dos índices gengivais e índices de
placa foram realizados a cada seis semanas, durante seis
meses. Houve melhora significativa no grupo utilizando o
creme dental com triclosan27. Os pára-efeitos da clorexidina
constituem um problema, especialmente quando há uma
condição diferente na cavidade oral, como em pacientes
submetidos à radioterapia em cabeça e pescoço. A xerostomia
provoca um desequilíbrio significativo na flora oral bacteriana e
confirma o importante papel desempenhado pela saliva na
manutenção da saúde dental17. A perda da capacidade
protetora salivar em conjunção com as alterações microbianas
e as mudanças nos hábitos gera agressiva atividade cariogênica. Assim, o objetivo de testar a substância triclosan foi
baseado nesse fato. A clorexidina apresentou-se eficaz em
reduzir a inflamação gengival, mesmo com os índices de placa
elevados, reiterando seu uso em situações de dificuldade em
cooperar, como ocorre em pacientes sob o estresse do
tratamento radioterápico. Estudos longitudinais realizados em
países escandinavos demonstraram que pacientes que
recebem orientações e cuidados profissionais regulares
apresentam reduções siginficativas em seus índices de
doenças periodontais e cáries28,29. A motivação dos pacientes
também foi extensivamente estudada30, concluindo-se que,
para haver melhora na condição de saúde bucal, os pacientes
precisam entender o proceso de formação da doença e como
este é parte fundamental no seu controle. Para os pacientes em
tratamento radioterápico, existem muitos outros fatores que
ainda podem influenciar no processo de obtenção e manutenção da saúde bucal. Geralmente se encontram debilitados,
sentem dor e estão sob grande estresse emocional devido à
sua condição. Mais ainda, as alterações produzidas na mucosa
em função das alterações na qualidade e na quantidade da
saliva irão dificultar o processo de cooperação31. Nosso estudo
foi iniciado após cuidadosa orientação de higiene oral, onde
macro-modelos e brochuras foram utilizados, bem como o uso
de substância corante da placa bacteriana dental, a fim de que
o paciente fosse conscientizado do seu real estado de higiene
bucal. Todos os pacientes receberam cuidadoso tratamento
periodontal prévio, a fim de que não houvesse a presença de
placa, cálculo ou inflamação gengival prévia. A presença de
inflamação dos tecidos gengivais gera maior acúmulo de placa
do que tecidos gengivais normais12.
A introdução de um novo fármaco, o triclosan, como adjunto ao
controle mecânico da placa bacteriana dental foi o objetivo
deste trabalho, uma vez que a substância utilizada nos centro
de tratamento de câncer, a clorexidina, apresenta alguns páraefeitos que podem ser intoleráveis aos pacientes irradiados de
cabeça e pescoço, como a queimação na língua e a perda do
paladar quando do uso contínuo. No entanto, a redução da
inflamação dos tecidos gengivais foi significativamente maior
no grupo utilizando a clorexidina do que no grupo utilizando o
triclosan. Essa redução observada nos índices gengivais
quando do uso da clorexidina está de acordo com achados de
outros pesquisadores4,11. A redução de gengivite ocorreu com o
uso da clorexidina, apesar de os níves de placa terem-se
elevado nas medidas seguintes. Os pacientes submetidos ao
tratamento radioterápico apresentam dificuldade em cooperar,
por sentirem-se debilitados, o que dificulta cooperar. Mesmo
assim, pareceu-nos que a substância clorexidina foi capaz de
manter os índices gengivais melhorados mesmo quando os
níveis de placa bacteriana apresentaram-se elevados. Isso não
aconteceu com o triclosan.
O triclosan vem sendo pesquisado e empregado com bons
resultados em pacientes de manutenção periodontal27. Em
pacientes submetidos à radioterapia não havia relatos na
78
literatura. Em estudo para avaliar o efeito da clorexidina no
tratamento de mucosites após radioterapia, observou-se que
pode agravar o estado de mucosa daqueles pacientes em
comparação ao placebo32. Em outro estudo comparativo entre a
benzidamina e a clorexidina no tratamento preventivo de
mucosites orais em pacientes irradiados de cabeça e pescoço,
observou-se tendência para melhores resultados com o uso da
benzidamina33, apesar de a amostra ser pequena. O uso de
substâncias de bochecho como adjuntos na escovação é bem
fundamentada4 e a clorexidina demonstra os melhores
resultados5,34,35. Uma questão importante da clorexidina é a sua
substantividade que faz com que ela se mantenha na boca por
muito mais tempo do que outros antissépticos35. A clorexidina
não forma micelas e isso a torna mais potente9. A falta de
micelas faz com que suas moléculas possam ficar livres e em
grande número presentes na solução de bochecho e os
monômeros de clorexidina possam unir-se ao dente e à mucosa
oral muito mais efetivamente. O efeito do triclosan associado a
um co-polímero em dentifrício foi estudado em uma população
de pacientes periodontalmente susceptíves durante três anos.
No grupo que usou o dentifrício contendo o triclosan mais o copolímero, a recorrência foi estatisticamente menor12. O presente
estudo demonstrou que os pacientes apresentaram menos
placa e menos gengivite em ambos os grupos. Houve redução
na placa e na gengivite da primeira para a segunda medição, no
entanto, da segunda medida para a terceira, apenas o grupo da
clorexidina manteve os níveis menores de placa e gengivite. A
redução de gengivite no grupo da clorexidina está de acordo
com outros achados36,5. O presente estudo avaliou o efeito de
duas substâncias de bochecho no controle de placa bacteriana
e do estado de saúde da gengiva de pacientes submetidos à
radioterapia pós-operatória de carcinoma espinocelular de
boca. Mais estudos controlados são necessários para que
estabeleçamos o uso de outro fármaco que não a clorexidina
em pacientes submetidos à radioterapia pós-operatória.
CONCLUSÃO
O uso de solução de bochecho com clorexidina como adjunto
ao controle de placa bacteriana dental mostrou ser efetivo no
combate à gengivite em pacientes submetidos à radioterapia
pós-operatória portadores de carcinoma espinocelular de boca.
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