A FILOSOFIA DE SÓCRATES Cesar Alberto Ranquetat Júnior Doutor em Antropologia -UFRGS INTRODUÇÃO Sócrates é o “herói-mítico” fundador da filosofia. Personifica Sócrates o filósofo ideal. preocupava-se, sobretudo, com questões de teor antropológico, ético e político. INTRODUÇÃO A filosofia era um modo de confrontação intelectual e moral, uma exortação constante para preocupar-se com a verdade e melhorar a alma (Luce). Em Sócrates a filosofia era concebida como um modo de auto-exame e auto-educação. O lema “ CONHECE-TE A TI MESMO” era central na filosofia socrática. A FIGURA DE SÓCRATES Busto de Sócrates A FIGURA DE SÓCRATES Sócrates ( 469- 399 A.C). Fundamentalmente o que sabemos de Sócrates encontra-se nos diálogos de Platão e em Xenofonte. Não deixou nada escrito. Expunha sua filosofia oralmente nas praças, nos mercados etc. Sócrates era, acima de tudo, um argumentador e um questionador (Taylor). A FIGURA DE SÓCRATES Andava pelas ruas de Atenas desafiando as pretensões de conhecimento dos outros e revelando suas inconsistências (Taylor). Sócrates leva seus interlocutores a examinar-se, a tomar consciência de si mesmos (Hadot). Fustigava seus interlocutores com questões que os obrigavam a prestar atenção a si mesmos, a tomar cuidado consigo mesmos (Hadot). A FIGURA DE SÓCRATES Buscava que todo homem examinasse sua própria vida, olhasse para si mesmo. Assim afirmava: “ uma vida não examinada, não é uma vida digna de ser humano”. Levava a todos a pensar seriamente no que considerava a mais importantes das questões: “Como um homem pode conduzir a sua vida? O ORÁCULO DE DELFOS Um amigo de Sócrates perguntou ao Oráculo de Delfos se existia alguém mais sábio que Sócrates. oráculo respondeu que “não”. Sócrates se questiona; o que o oráculo quis dizer? O Lança-se em uma longa investigação junto às pessoas que eram vistas como “sábias”(políticos, poetas, artesãos, oradores, etc.) O ORÁCULO DE DELFOS Ruínas do Templo de Delfos em Atenas. O ORÁCULO DE DELFOS interrogar estes “sábios”, descobria que eles na verdade não possuíam a sabedoria que diziam ter. Ao Concluiu, então, que era o mais sábio, pois ao menos tinha consciência da sua ignorância. Afirmou: “ Só sei que nada sei”. O ORÁCULO DE DELFOS A tarefa de Sócrates será fazer com que os outros homens tomem consciência de seu não saber (Hadot). de uma “missão divina” de cuidar das almas de seus concidadãos submetendo-os ao seu escrutínio (Taylor). Trata-se Quis mostrar aos homens que o único verdadeiro sábio é Deus, que a “sabedoria humana” pouco ou nada valia”. ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA O tema constante de sua filosofia gira em torno do que é o homem (Lima Vaz). Sócrates é o criador do conceito ocidental de “alma” no sentido de “homem interior” (Jaeger). Para Sócrates, o “humano” só tem sentido e explicação se referido a um princípio interior (Vaz). ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA Escultura de Sócrates em Atenas. ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA Esta dimensão de interioridade presente em cada homem é o que ele designou justamente com o termo de “alma” - psyché - (Vaz). A alma é a verdadeira essência do homem, é ela a sede das virtudes e das capacidades mais nobres. Sócrates, introduz, no campo das idéias antropológicas a noção de personalidade moral (Vaz). ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA A noção de “personalidade moral” é a base em que se assenta todo o edifício da Ética e do Direito em nossa civilização (Vaz). Com Sócrates emerge a valorização ética do indivíduo. Com ele se afirma a necessidade da “cura” e do cuidado com a “vida interior” (Vaz). ANTROPOLOGIA SOCRÁTICA Sócrates concede primazia intelectual no homem. à faculdade Concebe o homem como portador do logos (razão) e faz da relação dialógica, a relação humana fundamental (Vaz). Assim, Sócrates é provavelmente a fonte principal da definição do homem como animal racional (Vaz). SÓCRATES E OS SOFISTAS Sócrates confronta os “sofistas”. Os sofistas eram educadores-professores. professores “errantes” que viajavam de cidade em cidade oferecendo cursos dos mais variados. Eram Eram remunerados por seu ensino. SÓCRATES E OS SOFISTAS Instruíam os homens de Estado, a classe política. Era uma educação ,também, voltada para a formação do cidadão. Eram, acima de tudo, professores de oratória, erística e da “arte da política”. SÓCRATES E OS SOFISTAS Os sofistas eram “humanistas”. Protágoras, um dos mais importantes sofistas, afirmava: “O homem é a medida de todas coisas”. Eram céticos, agnósticos e relativistas. SÓCRATES E OS SOFISTAS Sócrates combate estes “pseudo-filosófos”. Não aceitava seus postulados ceticistas e antropocêntricos. Além disso, não concordava com a ideia de educação dos sofistas. Para os sofistas, ensinar nada mais era que informar sobre coisas e habilidades (Voegelin). SÓCRATES E OS SOFISTAS Para Sócrates ensinar era o movimento interior no qual uma alma adormecida desperta e se abre para uma alma madura e diferenciada (Voegelin). Sócrates não aceita o método de ensino dos sofistas baseado no discurso retórico e na oratória. Via este método como algo superficial, artificial, mero entretenimento que levava a uma atitude de autosuficiência. SÓCRATES E OS SOFISTAS Era uma método de ensino que não conduziria a uma investigação e a um debate filosófico sério (Voegelin). dizia que a “arte da persuasão”, não conduziria ao amor pela sabedoria e pela verdade. Sócrates Para Sócrates, os sofistas defendiam qualquer idéia, se isto fosse vantajoso. SÓCRATES E OS SOFISTAS Assim, corrompiam o espírito dos jovens, pois faziam o erro e a mentira valer tanto quanto a verdade (Chauí). “perigosos”, pois se definiam como peritos na mais importante das questões: “ Como se deve viver? (Luce)” Eram Mas, em realidade nada sabiam sobre isto. O MÉTODO SOCRÁTICO Consistia não em transmitir um saber, mas em interrogar os discípulos. Induzia seus ouvintes a dizer-lhe o que pensavam em vez de dizer-lhes o que deveriam pensar (Luce). Sócrates fazia perguntas sobre as idéias, sobre os valores nos quais os gregos acreditavam e julgavam conhecer (Chauí). O MÉTODO SOCRÁTICO Sócrates ao encontro de Alcibíades na Casa de Aspásia. Pintura de Jean-Léon Gérôme. O MÉTODO SOCRÁTICO O objetivo de seus questionamentos era estabelecer um entendimento adequado da terminologia moral usada (Luce). Por isto a primazia da pergunta “ o que é?” “o que é justiça?”, “ o que é a coragem?”, “ o que é a virtude?”. Indagava O MÉTODO SOCRÁTICO Ao fazer estas perguntas deixava seus interlocutores surpresos, embaraçados e irritados. quando tentavam responder a pergunta “ o que é?”, percebiam que não sabiam responder. Pois, Nunca tinham pensado em suas crenças, valores e idéias (Chauí). O MÉTODO SOCRÁTICO O método socrático baseava-se no diálogo, em perguntas e respostas. O diálogo socrático tinha uma forma dúplice, conforme se tratava de um adversário a refutar ou um discípulo a instruir (Franca). No primeiro caso, assumia humildemente a atitude de quem aprende. O MÉTODO SOCRÁTICO Ia multiplicando as perguntas até apanhar o adversário em evidente contradição e constrangê-lo à confissão de sua ignorância. No segundo caso, fazia várias perguntas, dirigindo-as para no fim obter um conceito. Por indução de casos particulares e concretos, chegava a um conceito, a uma definição geral do objeto em questão (Franca) O MÉTODO SOCRÁTICO A este processo pedagógico denominava “maiêutica”, que facilitava a “parturição das idéias”. Sócrates Supunha era um “parteiro de almas”. que o saber e a verdade deveriam ser engendrados pelo próprio indivíduo (Hadot). O MÉTODO SOCRÁTICO Afirmava que na discussão com outrem se contentava em desempenhar o papel de “parteiro” (Hadot). Ele mesmo nada sabe e nada ensina, contenta-se em questionar, e são suas interrogações, que auxiliam seus interlocutores a “parir” a verdade (Hadot). Tal imagem permite-nos entender bem que é na alma que se encontra o saber e que cabe aos indivíduos descobrí-la (Hadot). O MÉTODO SOCRÁTICO O método socrático nada mais era que o exame crítico das opiniões dos outros (Taylor). Buscava, assim, a essência verdadeira daquilo que era objeto de discussão. Procurava o conceito geral e não a mera opinião. O MÉTODO SOCRÁTICO A opinião é variável no tempo e no espaço. É instável e mutável, depende de cada um, de seus gostos e preferências (Chauí). O conceito, ao contrário, é uma verdade atemporal, universal e necessária alcançada pelo pensamento. O conceito é a essência de algo. É universal e necessário (Chauí). O MÉTODO SOCRÁTIVO Sócrates não perguntava se tal coisa era bela, justa ou boa, pois nossa opinião sobre ela pode variar. Perguntava: “ o que é a beleza?”, “ o que é o bem?”. Ou seja qual a essência ou conceito do belo, do justo, do bem. Perguntava: que razões rigorosas você possui para dizer o que diz e para pensar o que o pensa? Qual é o fundamento racional daquilo que você fala e pensa? (Chauí). A ÉTICA SOCRÁTICA As questões de ordem moral, os valores e virtudes são centrais na filosofia de Sócrates. estava preocupado com a “boa vida”, o “bem viver”, “ a vida virtuosa”. Sócrates ele, a “melhor vida” para o homem é a vida vivida de acordo com a exigência da moralidade. Para A ÉTICA SOCRÁTICA Elaborou um hierarquia, “ escala de valores”. Os bens exteriores (dinheiro e posse) no ponto mais baixo, os bens do corpo (saúde e força) um pouco mais acima, e os bens da alma (integridade e discernimento moral) no topo (Luce). Para Sócrates havia um íntima relação entre virtudes morais e sabedoria (conhecimento – inteligência). A ÉTICA SOCRÁTICA Segundo ele a virtude é conhecimento, e o vício é ignorância. BONDADE = CONHECIMENTO. Este conhecimento é “discernimento racional” dos príncipios de conduta (Luce). em suma, do “bem pensar” para o “bem viver” (Franca). Trata-se, A ÉTICA SOCRÁTICA O conhecimento é a única coisa realmente boa. Os outros bens como a riqueza, a coragem e a força, são bons para o agente apenas se utilizados adequadamente (Taylor). São usados adequadamente quando orientados pela sabedoria. A ÉTICA SOCRÁTICA A “ignorância” é o “desconhecimento” da verdadeira natureza do “bem”, daquilo que é bom para o indivíduo (Luce). dizia: “ ninguém age contrariamente ao que é melhor acreditando fazê-lo, mas por meio do erro”. Sócrates Ainda afirmava: intencionalmente”. “ninguém faz o mal A ÉTICA SOCRÁTICA Todos aspiramos ao que é melhor para nós, quando não alcançamos isto, a causa é a falta de entendimento. O modo mais seguro para melhorar nossa conduta é adquirir a espécie de “auto-conhecimento” ou “discernimento” que resultará inevitavelmente no “viver bem” (Luce). Este tipo de saber unificará e integrará a personalidade. A ÉTICA SOCRÁTICA dizia: “É melhor sofrer a injustiça que a cometer.” Sócrates Se a sofremos podemos perder nosso dinheiro, nossa liberdade e até a nossa vida, mas retemos nosso bem mais valioso, nossa integridade moral (Luce). Se a cometemos, podemos sair ganhando, mas o pior prejuízo é causado à nossa própria consciência que é desfigurada. A ÉTICA SOCRÁTICA Sócrates reconhece que, acima das leis mutáveis e escritas, há uma lei natural (eterna e divina). Esta lei divina é universal e independe do capricho humano. É ela a fonte primordial de todo o direito positivo, expressão da vontade divina, voz interna da consciência (Franca). O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES Sócrates é acusado de desrespeitar os deuses da cidade e de corromper a juventude. O caso foi a julgamento diante de um júri composta por cerca de 500 cidadãos, na primavera de 399 A.C. O júri decidiu pela execução. Foi condenado a pena de morte. O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES A MORTE DE SÓCRATES, PINTURA DE JAQUES LOUIS DAVID (1787). O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES Entre o julgamento e a execução houve um intervalo de um mês. Sócrates passou este período na prisão. Conforme sugere Platão no Críton, Sócrates teve a oportunidade de fugir da prisão. No entanto, Sócrates recusou-se a fugir. O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES É condenado à morte por envenenamento, ingere uma dose de cicuta. Sócrates enfrenta a morte com a mesma força moral que havia demonstrado ao longo de sua vida (Luce). Platão vê a acusação a Sócrates como um ataque não só ao indivíduo, mas à prática socrática do filosofar (Taylor). O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES A vida do filósofo em direção à morte e o julgamento da eternidade separam-se da vida das almas mortas (Voegelin). Afirmou no último momento de forma irônica Sócrates: “ Quem de nós toma o melhor caminho é algo que está escondido de todos, exceto de Deus”. O JULGAMENTO E A MORTE DE SÓCRATES Na Apologia, Sócrates prova que a acusação de impiedade é infundada. Não pode ser ímpio quem tenta reformar a pólis por ordem do Deus de Delfos (Voegelin). Enfatiza que é o único ateniense que acredita nos deuses a ponto de seguir suas ordens e arriscar à própria vida. É acusado de impiedade pelos mesmos homens cuja descrença nas coisa divinas é a razão da decadência grega(Voegelin). CONSIDERAÇÕES FINAIS O papel crucial de Sócrates no desenvolvimento da filosofia grega é salientado pela expressão “présocráticos” (Luce). Os pré-socráticos ocupavam-se com a natureza do universo (Luce). Sócrates A marca uma mudança definitiva. filosofia já não é mais o estudo da natureza, mas um “modo de viver”. CONSIDERAÇÕES FINAIS De Sócrates em diante, um novo tom faz-se ouvir na história da educação e da ética: o tom da importância da vida interior e da cultura espiritual (Luce). Filosofar não é mais, como queriam os sofistas, adquirir um saber, ou um saber-fazer. É pôr-se a si mesmo em questão, pois experimentase o sentimento de não ser o que se deveria ser (Hadot). CONSIDERAÇÕES FINAIS Trata-se de questionar a si mesmo e os valores que dirigem nossa própria vida (Hadot). A tarefa primeira de Sócrates é cuidar da inteligência,da verdade e da alma (Taylor).