A pubalgia e a Ressonância magnética nuclear

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Rev. Medicina Desportiva informa, 2013, 4 (5), pp. 8–9
A ressonância magnética
na pubalgia/hérnia do
desportista
Dr. Ricardo Sampaio
Radiologista, radiologia músculo-esquelética – Hospital da Boavista, Porto
1. Qual a utilidade da RM
na avaliação da pubalgia do
atleta?
A RM é um exame muito útil
na pubalgia do atleta pela sua
capacidade de mostrar o edema
da medula óssea e o edema da
osteíte púbica (lesão de stress
púbica), de permitir observar os
tendões, ligamentos e aponevroses desta região, de ser extremamente sensível ao edema
muscular e ainda de permitir
observar no mesmo exame,
ainda que de forma não dedicada, as articulações sacroilíacas, as
ancas, a escavação pélvica e o canal
inguinal.
Contudo, a RM é executada
com o atleta em decúbito dorsal e
em repouso. A verdadeira hérnia
inguinal, se for espontaneamente
redutível, é inaparente na RM. A dor
neuropática, como a neuropatia do
nervo ilioinguinal, não tem por regra
tradução anatómica e a neuropatia
do nervo obturador só tem tradução
se houver desnervação muscular
(caso em que, dependendo do tempo,
pode ser observado edema ou involução adiposa muscular). A dor miofascial também só tem tradução se
estiver associada a edema muscular.
2. É um exame de primeira linha?
Quando deve ser requisitada?
Não é um exame de primeira linha.
Como na esmagadora maioria das
apresentações músculo-esqueléticas, o exame de primeira linha é o
exame radiográfico. Uma simples
radiografia de face da bacia corretamente executada (corrigindo a
báscula da bacia), eventualmente
complementada com incidência
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de Dunn a 45 graus das ancas, se
houver suspeita de conflito femoro-acetabular, permite muitas vezes
fazer o diagnóstico da patologia
subjacente à sintomatologia, por
exemplo osteíte púbica, fratura,
arrancamento ósseo ou conflito
femoro-acetabular.
A RM para avaliação da pubalgia
deve ser requisitada como RM da
sínfise púbica apenas nos casos em
que a clínica não seja esclarecedora
e o exame radiográfico simples
não clarifique o quadro, quando o
atleta não responde ao tratamento
ou quando existe uma dissociação
entre a clínica e os achados radiográficos (por exemplo, o exame
radiográfico é pouco sensível a fraturas de fadiga na avaliação inicial e
o edema de stress não tem tradução
radiográfica).
3. Que diagnósticos diferenciais
permite fazer? O que é que a RM
mostra nesta patologia?
O protocolo de avaliação da pubalgia por RM deve incluir sequências dedicadas de alta resolução
para demonstrar a região, da qual
a sínfise púbica é o fulcro, e deve
incluir também sequências abertas
que mostrem a totalidade da bacia
e incluam as ancas, porque vários
processos patológicos da bacia
óssea, vísceras pélvicas, ancas e
região inguinal podem manifestar-se
por dor inguino-púbica. Essa é a primeira tarefa da RM: mostrar que a
pubalgia tem origem em alterações
do complexo osteo-tendino-muscular da região púbica.
Quando sujeitas a sobrecarga as
plataformas articulares dos ossos
púbicos sofrem um processo de
stress trabecular que, à semelhança
das alterações reativas das plataformas vertebrais Modic 1, induz um
processo reativo subcondral, que nas
imagens de RM se manifesta na fase
ativa como edema da medula óssea.
O próprio disco sofre alterações que
também são visíveis na RM.
A entese da aponevrose do músculo reto abdominal-adutor longo
na face anterior do corpo dos ossos
púbicos pode também sofrer um
processo reativo por sobrecarga,
que se manifesta por entesopatia de
tração, descolamento da aponevrose,
fratura trabecular da margem anterior dos ossos púbicos ou mesmo
arrancamento ósseo ou rotura da
aponevrose.
Nas sequências para avaliar a
região da sínfise púbica com detalhe,
a RM mostra facilmente as alterações de stress subcondral dos ossos
púbicos (osteíte púbica), em particular o edema da medula óssea que
lhe está associado e que também se
correlaciona com os sintomas, dado
que traduz atividade do processo
de remodelação da sínfise. Mostra
também entesopatia de tração ou
descolamento da aponevrose do reto
abdominal–adutor longo, fratura de
stress da origem do adutor longo,
reação de stress e fratura parasinfisária do corpo dos ossos púbicos,
rotura miotendinosa dos retos
abdominais e origem dos adutores,
reação de stress ou mesmo fratura
do anel obturador, dos acetábulos
e asas do sacro, e outra patologia
regional, como bursite do iliopsoas
ou edema por ressalto do iliopsoas.
Pode dar-se também o caso de
o atleta apresentar patologia das
ancas, como manifestações de conflito femoro-acetabular e patologia
do labrum acetabular, síndrome de
edema da medula óssea ou osteonecrose das cabeças femorais.
4. Deve ser usada no follow-up
durante o tratamento médico ou
após o cirúrgico?
No follow-up durante tratamento
médico a RM deve ser usada apenas
se o atleta não responde ao tratamento e após o tratamento cirúrgico
apenas quando não há resposta
ao tratamento e numa lógica de
procurar outras explicações para os
sintomas.
Fig. 1 — Osteíte púbica e lesão da origem
do adutor longo. (a) Incidência de Dunn a
45 graus. Leve esclerose subcondral dos
ossos púbicos. Cam incidental dos colos
femorais. (b) Imagem coronal DP-FatSat.
Edema subcondral simétrico nos ossos
púbicos. (c) Imagem axial oblíqua DP-FatSat. Descolamento da aponevrose do
reto abdominal-adutor longo esquerdo.
Fig. 2 — Stress parasinfisário. (a) Incidência de face. Sinfíse púbica normal.
(b e c) Imagens coronal e axial DP-FatSat.
Edema parasinfisário assimétrico, a traduzir reação de stress dos ossos púbicos.
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