Doentes crônicos tiram a vida de letra

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Doentes crônicos tiram a vida de letra
Fonte: Diário de Natal
Eles possuem doenças crônicas, algumas sem cura, no entanto não perderam a
vontade de viver. Diariamente lutam pela vida, independente de suas limitações pessoais ou
financeiras. Juntos, familiares e especialistas, médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e
psicólogos, buscam se não a cura, qualidade de vida. A dona de casa Maria Cristina Oliveira
Macêdo, 44; a lavadeira Avanir Arruda Duarte, 56; o empresário Ailson Pereira,66, e o técnico
ambiental José Gilson Vilaça, 54, são exemplos de que enfrentar a doença e não desanimar
diante das dificuldades faz toda diferença.
Nos quatro casos citados, os personagens se apóiam no tratamento médico para não
perder as esperanças.
O neurologista Mário Emílio Dourado chama atenção para esta questão, ele destacou
que ao contrário do que algumas pessoas pensam, o fato de possuir uma doença crônica não
significa dizer que a vida acabou. ‘‘De fato o diagnóstico inicialmente amedronta, porém, aos
poucos é assimilado pelo paciente, que com a ajuda do médico, aprende a conviver com a
patologia. É preciso deixar claro que não se pode perder as esperanças, a medicina está muito
avançada e pesquisas são realizadas a todo o momento, tanto em busca da cura, quanto do
melhor tratamento possível para determinadas doenças’’, destacou.
O especialista comentou que procura mostrar para seus pacientes o lado positivo da
doença, assim ele encontrará forças para realizar o tratamento, que no caso de doenças
neuromotoras são muito específicos, e varia de caso para caso. Em seu consultório ele orienta
os pacientes a procurarem psicólogos para evitar a depressão, patologia bastante comum nos
pacientes que enfrentam problemas de saúde graves. Mário Emílio defende o
acompanhamento de uma equipe multidisciplinar para curar e cuidar das doenças
neuromotores, dentre elas a Esclerose múltipla Amiotrófica (E.l.a), a demência e a distrofia
muscular.
Paciente do neurologista há cerca de 10 anos, Maria Cristina de Oliveira Macêdo tem
seguido a orientação de seu médico. Ela conta que no começo, há 13 anos, quando recebeu o
diagnóstico de que possuía uma doença auto-imune chamada neuropatia motora multifocal, na
qual perde a força muscular e que provavelmente ficaria paralítica, ficou muito abalada.
Perguntava-se como ia ser dali para frente, quem cuidaria dela e de seus três filhos, na época
dois eram pré-adolescentes e um ainda criança. Após alguns meses de terapia passou a ver a
doença com outros olhas. Chamou para si responsabilidade por se manter saudável e desde
então muita coisa mudou em sua vida. Hoje, mais madura, afirma ser outra pessoa, passou a
ver as coisas de outra forma e aprendeu a perdoar, o que antes era muito difícil para ela.
Quem a vê não imagina que possua uma doença crônica, muito bem humorada, lida
com sua limitações muito bem. Sabe que não consegue segurar por exemplo o copo com uma
única não, estão segura com as duas, sebe que não deve usar salto alto, estão usa sapato
baixo. ‘‘Em vez de ficar em um canto chorando e vendo o tempo passar, decidi viver
intensamente. Tenho um lema que diz, não devo, mas posso, estão tudo que quero fazer faço,
claro que respeitando os meus limites’’, ressaltou.
Como ainda não existe cura para sua doença, ela faz tratamentos que lhe
proporcionam qualidade de vida, dentre eles o Pilates, como fisioterapia de recuperação. A
fisioterapeuta Andréia Bezerra explicou que como no problema de Maria Cristina ela está
perdendo a força e equilíbrio, o Pilates ajuda a manter a postura, trabalha a força e a
respiração, o que proporciona qualidade de vida e bem estar a Maria Cristina. A próxima meta
é fazer a hidroginástica, que também vai auxiliar no tratamento.
Após três anos e meio de pilates a dona de casa já percebe os resultados, tem caído
menos, uma vez o tratamento lhe ajuda a manter o equilíbrio. Com o bom humor que lhe é
característico, Maria Cristina mostra os joelhos marcados ‘‘Antes do pilates eu caia muito, tanto
é que meu joelho parece joelho de criança, cota sorrindo.
Ao invés da esclerose a vida na plenitude
Desde 2002 o técnico ambiental José Gilson Vilaça, 54, vive os sintomas da Esclerose
Múltipla Amiotrófica, popularmente conhecida como E.L.A, doença do neurônio motor,
caracterizada pela fraqueza muscular e atrofia por denervação. O diagnóstico mesmo foi
fechado em 2004, após dois anos de peregrinações em médicos que não descobriam o que
estava ocasionado cãibras e perda de movimentos nos dedos.
Com a descoberta da doença, primeiro ocorreu o baque de saber que não tem cura e
que progressivamente ele iria perder todos os movimentos do corpo e no fim, perderia a vida.
Posteriormente veio a busca por informações, leu sobre a patologia na internet, participou de
congresso sobre a doença e tirou suas dúvidas. A partir dai decidiu que queria viver, aproveitar
ao máximo todos os momentos e ser feliz. Não foi muito difícil tomar essa decisão, afinal Vilaça
sempre foi muito ativo e gostou de trabalhar e passear.
Hoje sua vida não mudou muito, apesar das limitações, trabalha diariamente no Idema
e realiza suas consultorias ambientais. No lado profissional ficou impossibilitado de participar
dos trabalhos de campo e sente falta dessa atividade, no entanto não desanima por isso. Faz
seu trabalho, mantêm a mente ocupada e se sente útil. Não consegue escrever, mas fala, e um
estagiário digita no computador o conteúdo do trabalho. No tocante a vida social, se antes era
agitada, hoje ele não perde uma programação. Vai a todas as festas de amigos e familiares,
além de frequentar quase todos os jogos de ABC, só não vai ao estádio quando os jogos são à
noite. Em virtude da doença está sempre acompanhado de um familiar ou de um enfermeiro, e
do aparelho de respiração, pois já está com ela comprometida. Contudo isso não o intimida.
Sua vontade de viver é maior do que isso. A forma como ele lida com a doença chamam
atenção e é uma verdadeira lição de vida.
Engana-se quem pensa que por estar doente o técnico não faça planos para o futuro.
Ano que vem ele e sua esposa, Idalina do Rêgo Vilaça completarão 25 anos de casados e ele
já está programando a festa. Emocionado, Gilson declarou ‘‘Não é porque estou doente que
deixei de planejar minha vida. Estou vivo, me mantenho vivo e por isso planejo meu futuro’’.
Ele comentou que manter a mente ocupada foi a estratégia que criou para não ficar
pensando na doença e não ter a famosa depressão. Se não está trabalhando em algum
projeto, assiste filmes, jogos ou realiza pesquisas na internet. ‘‘Gosto de estar sempre em
atividade, se ficar parado vem a depressão. Me decide pela vida, estão estou vou vivendo da
melhor forma possível’’, disse. Questionado de onde vem a força para lutar por sua vida ele
responde que é da esperança na medicina, de que ela evolua cada vez mais e descubra a
cura, além da fé que tem em Deus.Não só seu Vilaça, mas também toda sua família decidiram
que enfrentariam a E.L.A de frente e que não mudariam radicalmente suas vidas em função
disso. Todos continuam trabalhando e se divertindo. Na medida que é necessário fazer
adaptações, fazem e seguem em frente, comentou Idalina.
Casos parecidos, realidades diferentes
A lavadeira Avanir Arruda 56, e o empresário Ailson Pereira 66, sofreram no ano
passado um acidente vascular cerebral, conhecido popularmente por AVC. No momento os
dois estão em recuperação e realizado tratamento para reverter as seqüelas ocasionadas pela
doença. As ‘‘coincidências’’ param por aqui. Sem recursos financeiros, a lavadeira não tem
como realizar o tratamento de fisioterapia, hidroterapia e fonoaudióloga necessários para voltar
a falar e a ter os movimentos do lado direito de seu corpo.
Seu filho, Robencleide Arruda Duarte, 28, conta que a mãe perdeu o movimento do
braço e da perna direita e não consegue falar. Preocupado, revela que não tem como pagar
pelo tratamento, e que teme pelo estado de saúde de sua mãe. Ele relatou que o SUS oferece
o tratamento, porém a família enfrenta inclusive dificuldade para se deslocar aos pontos de
tratamento, sem contar que a fila para atendimento é longa e isso dificulta ainda mais o
tratamento de Avanir.
Enquanto a lavadeira não obtêm sucesso em seu tratamento, o empresário Ailson
Pereira que chegou a ficar andando de cadeiras de rodas após o AVC, sete meses após o
ocorrido, já está andando com o auxilio de moletas. Assim como Avanir, ele havia perdido o
movimento do braço e da perna, mas com o tratamento intensivo de fisioterapia e hidroterapia
está se recuperando. ‘‘Ainda dependo muito de meus familiares. Meus filhos e minha esposa
precisam estar sempre por perto e isso me incomoda um pouco pois não gosto de depender de
ninguém, sempre fui muito independente e agora não posso fazer minhas coisas como antes’’,
comentou.
Ailson disse ainda que no começo, logo após o AVC ficou um pouco depressivo, mas a
vontade de viver, e os resultados obtidos com o tratamento lhe deram novo ânimo. Agora ele
só pensa em melhorar para voltar a ter a mesma vida de antes.
Tratamento
A fisioterapeuta do empresário, Sintia Maria Queiroz, confirmou que no começo Ailson
não interagia muito, pois estava triste com sua situação, contudo, quando os resultados do
tratamento começaram a aparecer ele mudou. A especialista ressaltou que assiduidade no
tratamento é outro fator que contribui para recuperação do paciente. ‘‘Ter o acompanhamento
de uma equipe multidisciplinar é de suma importância para que uma paciente que sofreu um
AVC se recupere. É importante também que seja assíduo as sessões, e ter vontade de ficar
bom’’, afirmou.
Bem-estar psicológicomelhora dia-a-dia
A psicóloga Milena Câmara explica que diante de uma doença, seja ela crônica,
degenerativa ou não, o paciente sente sua vida ameaçada pela possibilidade da morte, como
se com a doença, a morte se tornasse algo possível, mais próximo, o que até seu adoecimento
não era levado em consideração. Ela explica que a morte é a grande certeza do ser humano,
mais também sua maior fonte de angústia. ‘‘Vivemos como se não fôssemos morrer, reação
que nos protege emocionalmente, porém, quando ficamos doentes nos fragilizamos, pois
lembramos que somos finitos’’, comentou.
A especialista destacou que as pessoas reagem de formas diferentes a situações
difíceis. Algumas ficam mais fragilizadas e outras menos. Tem aquelas que paralisam, e outras
se fortalecem, transformam a dor em luta. Saber como cada um vai reagir é impossível, mas
diante da personalidade, espiritualidade (fé), rede de apoio e momento de vida, dá para se ter
uma idéia de como vai se portar uma determinada pessoa diante do diagnóstico de uma
doença crônica por exemplo.
Assim como o neurologista Mário Emílio Dourado, ela defende que o paciente saiba o
que está lhe acometendo, e em função disso, afirma que ter acompanhamento psicológico
nesse momento é mais uma ferramenta de apoio, de escuta diante das mudanças, limitações e
medos que surgem, tanto para o paciente como para a família que vivencia tudo ao lado de seu
ente querido.
Segundo ela, o bem estar psicológico do paciente contribue para que ele tenha mais
qualidade de vida. ‘‘No caso de doenças crônicas é preciso o paciente saber que ele deve
procurar viver da melhor forma possível, independente de suas limitações, e não se entregar,
porque já está comprovado que em alguns casos, quando o paciente se entrega a doença, ela
evolui muito mais rápido do que aquele que enfrentou as dificuldades e viveu da melhor forma
possível’’, afirmou.
A psicóloga disse ainda ser importante respeitar o doente, o que ele quer e a forma
como ele mesmo lida com suas limitações. Estar junto, acolher, compreender, e estar disposto
a oferecer o que ele quer, é a melhor contribuição que amigos e familiares podem oferecer.
Milena ressalta que respeito e tolerância é muito importante em situações difíceis, pois cada
um reage de uma forma, e as reações precisam ser aceitas, sem cobranças, como forma de
amor. ‘‘Quando estamos doentes o sentimento de impotência é muito grande e muitas vezes
não sabemos como lidar com a dor, seja ela nossa ou do outro, pois sempre achamos que
devemos fazer algo, as vezes o que temos a fazer é falar, chorar e estar junto’’, finalizou a
especialista.
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