XII Curso de Atualização em Pediatria de Londrina - Módulo 03 Doenças transmitidas por animais domésticos Tony Tannous Tahan Coordenador da Infectopediatria HC-UFPR Membro do Comitê de Infectopediatria da SPP ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO - BRASIL Segunda maior população de animais de estimação do mundo em milhões de animais 12 OUTROS 17 30 Instituto Pasteur - 2005 ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO - BRASIL 4ª. maior população de animais de estimação do mundo – 132 milhões 2ª. maior em cães (52 mi), gatos (22 mi) e aves 9ª. maior em répteis e pequenos mamíferos 10ª. maior em peixes ornamentais IBGE - 2013 ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO - BRASIL Razões da existência de milhões de mascotes: Urbanização Mudança estrutura familiar Maior n° de solteiros, idosos, viúvos Aumento da demanda da criação de répteis e outros animais exóticos ??? ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO Maior contato com os animais de estimação! ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO Benefícios “Pet therapy” “ cães estimulam a memória em pacientes com Alzheimer” ( Centro de Medicina do idoso no HU de Brasília) “pacientes com animal de estimação tem menores níveis de pressão arterial e de triglicerídeos” ( The American Journal of Cardiology – 2003) “ acariciar animais de estimação diminui ansiedade” ( estudo em Tel Aviv – 2003) ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO Benefícios Crianças com câncer tem menos efeitos colaterais da quimioterapia Melhora na atenção e no rendimento escolar em crianças com déficit de atenção e hiperatividade Contato com animais diminui sintomas de depressão Animais em prisões e hospitais psiquiátricos atenuam tensões e agressividade Journal of the Royal Society Medicine - 1995 excelentes ... companhias! Quando você recebe uma carinhosa lambida de seu animal de estimação, pode estar compartilhando algo mais que sentimentos de afeto... Doenças transmitidas por animais de estimação O contato humano-animal pode estar associado a transmissão de várias doenças ! Zoonoses Parasitárias Doença/Patógeno Animais Meios de disseminação Cryptosporidium Animais domésticos, gado Ingestão de alimentos contaminados, contato direto (animais com diarreia) Larva migrans cutânea (bicho geográfico) Cães, gatos Penetração da pele pelas larvas que se desenvolvem no solo, fezes de animais Giardíase Animais domésticos e selvagens, cães e gatos Ingestão de cistos, via fecaloral, água ou alimentos contaminados Toxoplasmose Gatos e gado Ingestão de oocistos, de fezes de gatos, consumo de carne mal cozida Toxocaríase , larva migrans visceral Cães e gatos (filhotes) Ingestão de ovos do solo contaminados por fezes do animal Zoonoses Bacterianas Doença/Patógeno Animais Meios de disseminação Capnocytophaga canimorsus Cães, raramente gatos Mordida, arranhadura, contato com secreções Doença da arranhadura do gato (Bartonella henselae) Gatos, raramente outros animais Arranhadura, mordidas Leptospirose Rato, cães, gado Contato de urina de animais e água contaminada Pasteurella multicida Gatos, coelhos, maia raramente cães Mordidas, arranhaduras Psitacose Aves (arara, papagaio, periquito) Via respiratória, inalação de poeira, contaminada por dejetos dos animais Salmonelose Aves, répteis, cães, roedores, tartarugas, iguanas Ingestão de água e alimentos contaminados e contato direto Zoonoses Fúngicas Doença/Patógeno Animais Meios de disseminação Criptococose Aves, especialmente pombos Inalação de aerossóis, acumulados em fezes de pombos Histoplasmose Morcegos, pássaros Inalação de aerossóis, acumulados em fezes Esporotricose Cães, gatos, cavalos e roedores Contato direto com lesões dos animais e com solo. Inalação de esporos. Dermatofitoses Trychophyton, Microsporum Gatos, cães, roedores e coelhos Contato direto Outras zoonoses • Vírus: Raiva e outras encefalites • Ectoparasitas: – Sarna sarcóptica por contato com homem • As sarnas negra e de ouvido dos cães não passam para o homem Mordedura animal - Cão É a mais frequente - 80% 20% tornam-se infectadas Crianças são as mais afetadas ( 5-9 anos) Locais mais acometidos: adultos: mãos crianças: cabeça , pescoço e tronco Importância dessas mordeduras: Transmissão de raiva Infecções Deformidades Health Scj J. 2000- Mar Vet Clin Exot Anim 14 (2011) 421-426 Mordedura animal - Gato 3 a 15% das mordeduras 50% tornam-se infectadas Acomete com mais facilidade articulações e periósteo É mais frequente em adultos (membros superiores) Rev Chil Infect - 2006 Mordedura animal - Hamster Pode transmitir vírus da coriomeningite linfocitária: Infecções assintomáticas Meningite asséptica, parotidite, encefalite, miocardite Fetos mais vulneráveis Risco tétano Reações anafiláticas graves Rev Chil Infect 2006 Mordedura animal - Furão Podem atacar de forma inesperada Crianças são as mais afetadas Microbiota ainda não foi bem descrita Transmissão raiva Anafilaxia grave Rev Chil Infect - 2006 Mordedura animal - Iguana Lesões superficiais Traumas faciais Celulite ( Serratia marcescens) Não há risco transmissão de raiva Imunização anti-tetânica Anafilaxia grave Rev Chil Infect - 2006 Mordedura Humana Mais complicações e mais infecções Germes: S. viridans, SBHGA, S. Aureus, H. influenzae, K. pneumoniae, Bacteroides spp, Fusobacterium 45% dos anaeróbios isolados são resistentes a penicilina Rev Chil Infect 2006 Harrison, 2015 Mordeduras - Manejo Exame físico: Localização e número de lesões Sinais de infecção Presença de fraturas, comprometimento de tendão e articulação Mordeduras - Manejo Tratamento: Limpeza com água e sabão Debridamento de tecidos necróticos Profilaxia tétano e raiva Hospitalização? Fechamento por 1 intenção? Profilaxia antimicrobiana? Mordeduras - Manejo Hospitalização: Comprometimento de tendão ou articulação Manifestações sistêmicas Cirurgia reparadora Celulite grave Paciente imunocomprometido Falha do tratamento oral Mordeduras - Manejo Fechamento por 1° intenção: - Não deve realizar: Lesões puntiformes profundas Lesões infectadas Com mais de 24 horas de evolução - Localizadas em mãos Mordeduras - Manejo microbiologia: etiologia polimicrobiana Anaeróbios Aeróbios Peptostreptococcus spp Bacteroides fragilis Provotella spp Fusobacterium spp Veillonella spp Clostridium tetani Streptococcus spp Staphylococcus aureus Eiknella corrodens Pasteurella multocida Capnocytophaga canimorsus Staphylococcus intermedius Corynebacterium spp Rev Chil Infect - 2006 Mordeduras - Manejo Uso de ATB profilático: Observar feridas limpas, superficiais ATB feridas profundas, mãos e pés, cirurgia ATB sempre Escolhas ATB sempre ATB sempre amoxicilina/ ácido clavulânico clindamicina + SMT/ TMP macrolídeo: uso limitado Rev Chil Infect - 2006 RAIVA HUMANA Etiologia: RNA-vírus (Rhabdoviridae) Transmissão • mordedura animal • arranhadura animal • penetração mucosa oral e nasal • inter-humana RAIVA HUMANA RAIVA – Risco de transmissão Animais de alto risco: risco morcegos e animais silvestres Animais de médio risco: risco cão, gato Animais de baixo risco: risco roedores RAIVA - clínica Período de incubação (2 a 8 semanas) Período prodrômico Período de excitação ( hipersensibilidade a estímulos, mania aguda, insônia,hidrofobia, crises convulsivas, rigidez de nuca ) Período paralítico (paresia seguida de paralisia, comprometimento músculos respiratórios óbito) RAIVA - tratamento Letalidade ~ 100% Tentativas de protocolos Profilaxia anti-rábica pré - exposição pós - exposição RAIVA - Profilaxia Vacinas / Soro Efeitos colaterais Fuenzalida & Palácios Manifestações locais Manifestações sistêmicas Manifestações neurológicas - 1: 8 mil ttos Produzida em cultura células Manifestações neurológicas - 1: 500 mil ttos (humanas, rins de macaco, embrião de galinha, embrião de pato) Soro antianti-rábico (soro de equinos hiperimunizados) Imunoglobulina humana anti--rábica anti Doença do soro = 1 a 6,2% Reação anafilática = 1: 40 mil tratamentos Reações locais Condição animal Animal sadio Sinal sugestivo Desaparecido Lesão Leve Condutaanimal Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Grave Iniciar esquema 3 doses e observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Soro-vacinação Condição animal Lesão Animal sadio Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Fuenzalida & Palácios 3 doses IM (0,2,4) + observação Sinal sugestivo Desaparecido Leve Condutaanimal Cultura celular 3 doses IM (0,7,28) + observação Iniciar esquema 3 doses e Grave observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Soro-vacinação Condição animal Animal sadio Sinal sugestivo Desaparecido Lesão Leve Condutaanimal Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Grave Iniciar esquema 3 doses e observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Soro-vacinação Condição animal Animal sadio Sinal sugestivo Desaparecido Lesão Leve Condutaanimal Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Grave Iniciar esquema 3 doses e observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Fuenzalida & Palácios Soro-vacinação 7+2 (9 doses) IM Cultura celular 5 doses (0,3,7,14,28) IM Condição animal Animal sadio Sinal sugestivo Desaparecido Lesão Leve Condutaanimal Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Grave Iniciar esquema 3 doses e observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Soro-vacinação Condição animal Animal sadio Sinal sugestivo Desaparecido Lesão Leve Condutaanimal Observar 10 dias Observação Profilaxia Sadio Encerrar caso Doente Esquema “animal com sinal sugestivo” Grave Iniciar esquema 3 doses e observação Leve Inicio imediato vacinação Grave Soro-vacinação Fuenzalida & Palácios 10+3 (13 doses) IM + soro Cultura celular 5 doses (0,3,7,14,28) IM + soro RAIVA - Profilaxia dispensa tratamento profilático, salvo condições excepcionais soro-vacinação RAIVA - Prevenção Vacinar animais de estimação !!! Diminuir animais soltos / abandonados !!! Evitar contato íntimo!!! Saber indicar profilaxia!!! DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO EUA – principal causa de linfadenopatia crônica na infância 80% ocorre em < 20 anos Pediatric Infect Dis J, 2005 DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO Agente etiológico Bartonella henselae Bartonella quintana Bartonella baciliformes Bartonella elizabethae DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO Transmissão 76% - arranhadura gato 2% - mordedura/ arranhadura cão 22% - nenhum Pediatric Infect Dis J, 2005 DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO CLÍNICA Lesão inoculação Aparece 3-10 dias após a inoculação da bactéria Vesícula ou pústula Linfadenopatia Manifestação mais comum Aparece 2 semanas após inoculação Tamanho: 10-12 cm Regridem 2 – 4 meses (1-2 anos) Paciente BEG (30% febre, cefaléia, fadiga, anorexia) DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO CLÍNICA Formas atípicas Síndrome oculoglandular Granuloma conjuntival + linfadenopatia pré auricular Síndromes neurológicas Alteração súbita estado mental + convulsões (1-2 semanas) DAG sistêmica Febre, mialgia, fadiga, perda de peso, exantemas, hepatoesplenomegalia, lesões osteolíticas, massas mediastinais, Púrpura, anemia hemolítica DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO Diagnóstico História de contato Teste intradérmico positivo Sorologia positiva Histopatologia linfonodo compatível Exclusão clínica DOENÇA DA ARRANHADURA DO GATO Tratamento Macrolídeos, tetraciclina, rifampicina, cefalosporinas 3° Profilaxia Não há medidas preventivas específicas TOXOCARÍASE (Larva Migrans Visceral) Doença mais frequentemente transmitida do animal para o homem Maior frequência em crianças até 7 anos Agente etiológico: Toxocara canis Toxocara gati TOXOCARÍASE - Transmissão TOXOCARÍASE - Epidemiologia Fatores para infecção por Toxocara Contaminação do solo por ovos embrionados RJ – 1976: 41,6% Goiânia-- 1987: 66,6% Goiânia Tamanho população cães e gatos Geofagia e onicofagia J. Pediatria RJ - 2005 TOXOCARÍASE – 3 formas clínicas Toxocaríase ocular granuloma retiniano endoftalmite catarata ceratite comprometimento visual Formas atípicas dor abdominal recorrente cefaléia astenia hepatomegalia TOXOCARÍASE – 3 formas clínicas Toxocaríase Visceral febre hepatoesplenomegalia adenomegalia artrite edema generalizado anemia manifestações pulmonares manifestações neurológicas TOXOCARÍASE – Diagnóstico Sinais clínicos Epidemiologia Dados laboratoriais Hipereosinofilia IgG, IgM, IgE isohemaglutininas Diagnóstico sorológico TOXOCARÍASE – Tratamento Albendazol 7 dias Tiabendazol 7 dias Corticóides sistêmicos - acometimento pulmonar grave - ocular TOXOCARÍASE – Prevenção Recolher Recolher fezes de cães e gatos Lavar Lavar mãos após contato com animais Tratar Tratar filhotes com antianti-helmínticos Centro de Zoonoses-SP OUTRAS DOENÇAS Doença Clínica Leptospirose Forma anictérica Forma ictero-hemorrágica Penicilina Eritromicina Outros animais Compostos Leishmaniose Tegumentar Americana (Leishmania braziliensis) Giardíase Tratamento antimoniais pentavalentes Anfotericina B Pentamidina Má absorção intestinal Diarréia prolongada Metronidazol Doença Clínica Escabiose Tratamento Outros animais Auto-limitada Ivermectina Permetrina 5% Larva migrans cutânea erupção linear serpiginosa Ivermectina Albendazol Tiabendazol Tinha capitis Placas descamação Griseofulvina Gatos Doença Toxoplasmose Clínica Assintomática RN: triade * Coriorretinite * Calcificações * Hidrocefalia Tratamento Sulfadiazina Pirimetamina Ácido folínico Espiramicina Peixes Doença Mycobacterium marinum Clínica granulomas cutâneos tenossinovite artrite séptica osteomielite Tratamento Controverso Macrolídeos Tuberculostáticos Quinolonas Aves Doença Clínica Histoplasmose Assintomáticos Forma pulmonar Forma disseminada Tratamento Anfotericina B Psitacose Tetraciclina Eritromicina Pneumonia atípica Erupções cutâneas Epistaxe Delírios Tartarugas, iguanas Doença Salmonelose (Salmonela enteriditis) Clínica Gastroenterocolite (autolimitada) TTO Geralmente não requer terapêutica Outros animais Caso Clínico • Lesões crostosas em coxa D (associou à trauma) Caso Clínico • Lesão em face Caso Clínico • Edema em 3 QDE Hipóteses diagnósticas Exames - imagem Dactilite Spina ventosa J Bone Joint Surg [Br]2009;91-B:1054-7. Exames – Biópsia da lesão • AP: Fibrina com células inflamatórias, histiócitos epitelióides. Reação granulomatosa e neutrofílica (sem padrão de TB) • GRAM, micológico direto e Ziehl-Neelsen – negativos • Teste rápido para TB: material insuficiente • Pesquisa de Leishmania em andamento • Culturas (biópsia e secreção da lesão): – TB: em andamento – Fungo: + para Sporothrix schenckii Esporotricose Sporothrix schenckii Fonte de contaminação Formas clínicas • Linfo-cutânea Formas clínicas • • • • • Linfo-cutânea Pulmonar Osteo-articular Meníngea Disseminada Diagnóstico e tratamento • Cultura – Padrão ouro – Geralmente cresce em até 5 dias • Histopatologia – Lesão granulomatosa / piogênica – Patógeno geralmente não é visualizado • Tratamento ( 2 a 4 sem após melhora da lesão – até 1 ano) – Itraconazol – 6 a 10 mg/kg/d (max 400mg) – Anfotericina – Iodeto de potássio Evolução do caso • Durante investigação aparecimentos de novos nódulos subcutâneos. • Aparecimento de epidemiologia positiva para contato com gato doente e coelhos. • Após laudo da cultura: Iniciado Itraconazol Exame físico (evolutivo) • 6º dia de tratamento Prevenção doenças transmitidas animais domésticos Evitar contato com animais doentes Evitar contato com fezes animais Cuidados com caixas de areia em áreas de recreação infantil Lavar as mãos após contato com animais Limpeza de aquários com luvas Evitar contato com animais exóticos Lembrar : animais requerem cuidados especiais!!! Considerações Finais Muitos são os benefícios do contato humano-animal Animais de estimação podem transmitir várias doenças ao homem Crianças e imunossuprimidos são mais susceptíveis a essas doenças Um animal saudável também pode transmitir doenças Importância do RECONHECIMENTO e PREVENÇÃO “ Nunca sonhei ao pensar numa doença encontrarencontrar-lhe um tratamento, mas sim um modo de preveníprevení-la.” Pasteur OBRIGADA OBRIGADO OBRIGADA Agradeciecimento: Dra. Gislaine Blum e Dra. Isabela Maran