Imunização: a chave para o controle da cinomose na população canina Aline Santana da Hora 1, Paulo Eduardo Brandão 2 1. Introdução O vírus da cinomose canina (VCC) é um patógeno de grande importância para cães há a milhares de anos (DEEM et al., 2000), causando elevada morbidade e mortalidade naqueles não vacinados por todo o mundo. A prevalência da doença é alta em cães e emergente em animais silvestres suscetíveis. No Brasil a cinomose é endêmica e pode representar 6% de todas as ocorrências clínicas e até 11% dos óbitos de cães (NEGRÃO et al., 2006). Manifestações sistêmicas graves, como o comprometimento dos sistemas respiratório, gastroentérico e nervoso são observadas no curso da doença, que muitas vezes é fatal. Não há tratamento específico contra o VCC e aqueles cães que sobrevivem à doença permanecem com sequelas, geralmente em decorrência do acometimento do sistema nervoso central (SNC) (GREENE; APPEL, 2006). Nos anos 50, houve uma diminuição acentuada na incidência da cinomose em cães com o advento da vacinação contra o VCC (CHAPPUIS, 1995). Contudo, estima-se que nos países desenvolvidos apenas 30% a 50% dos 1 D.V.M., MSc., Doutoranda do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Saúde Animal (VPS), Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), Universidade de São Paulo. 2 D.V.M., MSc., PhD, Professor Doutor do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Saúde Animal (VPS), Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), Universidade de São Paulo. 1 animais de companhia sejam vacinados e que este percentual é significantemente menor nos países em desenvolvimento (DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). Dada a importância da imunização de cães contra a cinomose como principal medida profilática, este trabalho tem por objetivo enfatizar tal prática como a forma mais eficaz de prevenção e controle da infecção pelo VCC. 2. Cinomose, o agente etiológico e a doença Segundo a classificação mais recente do Comitê Internacional de Taxonomia dos Vírus (ICTV), o vírus da cinomose canina (VCC) pertence à ordem Mononegavirales, família Paramyxoviridae, subfamília Paramyxovirinae e gênero Morbillivirus. O agente etiológico da cinomose é um vírion envelopado (Fig.1) que apresenta um genoma RNA de fita simples, não segmentado e de polaridade negativa, o qual codifica a proteína de matriz (M), duas glicoproteínas [F (fusão) e H (hemaglutinina)], duas proteínas associadas à transcriptase [P (fosfoproteína) e L (proteína grande)] e a nucleoproteína (N) que envolve o RNA viral (FAUQUET et al., 2005). As glicoproteínas F e H, localizadas no envelope lipídico, apresentam importantes epítopos imunodominantes e são os principais alvos da resposta imune do hospedeiro (SIMON-MARTINEZ et al., 2008). 2 Figura 1 - Representação esquemática do vírus da cinomose canina Assim como outros vírus envelopados, o VCC não sobrevive no meio ambiente por longos períodos. Em tecidos excisados ou secreções permanece infectante por 1 hora a 37C e por 3 horas a 20C. Em ambientes mais frios (40C) sobrevive por semanas (DEEM et al., 2000; GREENE; APPEL, 2006). Adicionalmente, as práticas rotineiras de limpeza e desinfecção imediatamente eliminam a infectividade do vírus (MARTELLA; ELIA; BUONAVOGLIA, 2008). Contudo, o vírus é altamente contagioso e a transmissão ocorre principalmente por meio do contato direto entre os animais ou por contato indireto pela exposição aos aerossóis infectantes. A eficiência desta forma de transmissão decorre dos altos títulos de partículas virais encontrados nas secreções e excreções de animais infectados (ELIA et al., 2006; GREENE; APPEL, 2006). Estima-se que de 25% a 75% dos cães suscetíveis apresentam infecção assintomática, disseminando o vírus no ambiente sem demonstrar nenhuma 3 alteração física (GREENE; APPEL, 2006). Os cães mais susceptíveis são aqueles com idade correlacionada à diminuição da imunidade adquirida maternalmente (de 3 a 6 meses de idade), pois a maioria dos cães adultos possui imunidade adquirida pela vacinação (MARTELLA; ELIA; BUONAVOGLIA, 2008). O período de incubação da doença varia de 1 a 4 semanas ou mais. Picos transitórios de febre ocorrem entre 3 a 6 dias pós-infecção e estão associados à fase inicial de disseminação viral pelo organismo. Perda de apetite, depressão leve, secreção nasal e ocular e tonsilite são as manifestações clínicas que podem estar presentes. Nesta fase, a progressão ou não da doença e a gravidade dos sinais irão depender da virulência da cepa, da idade do animal e da efetividade do seu sistema imune. Nos casos em que há forte resposta do sistema imune, o vírus é eliminado dos tecidos e o cão se recupera completamente da infecção. Entretanto, nos casos de fraca resposta imune, o vírus alcança os tecidos epiteliais e o SNC, levando ao aparecimento de manifestações clínicas relacionadas a estes sistemas orgânicos. Como resultado da localização epitelial, sinais respiratórios, intestinais e dermatológicos ocorrem 10 dias após a infecção. Muitas vezes, as manifestações clínicas estão exacerbadas com resultado de infecções bacterianas secundárias. A presença do vírus no SNC causa desmielinização aguda ocasionando morte em 2 a 4 semanas após a infecção na maioria dos cães (APPEL; MENDELSON; HALL, 1984; GREENE; APPEL, 2006). 4 O tratamento da cinomose consiste na terapia de suporte e administração de antibióticos para prevenir infecções bacterianas secundárias, as quais são frequentes em animais imunossuprimidos (GREENE; APPEL, 2006; MARTELLA; ELIA; BUONAVOGLIA, 2008). 3. O impacto da cinomose e da sua prevenção sobre a população de animais silvestres Além de canídeos silvestres, epizootias do VCC são observadas em hospedeiros atípicos, como leões e focas. A introdução de infecções, como pelo vírus da raiva ou da cinomose, por cães domésticos pode levar ao risco de extinção as populações de animais silvestres suscetíveis (CLEAVELAND et al., 2006). A cinomose já foi diagnosticada em espécies silvestres que ocorrem no Brasil, como quati (Nasuanasua), jurupás (Potos flavus), lobo-guará (Chrysocyon brachiurus), raposinha (Lycalopex vetulus), cachorro-do-mato (Cerdocyon thous) e cachorro-vinagre (Speothos venaticus) (FILONI, 2007; MEGID et al., 2009; MEGID et al., 2010). No Quadro 1, observa-se a ampla diversidade de animais silvestres suscetíveis ao VCC (APPEL et al., 1991; APPEL et al., 1994; APPEL; SUMMERS, 1995; CUBAS, 1996; HAAS et al., 1996; ROELKE-PARKER et al., 1996; DEEM et al., 2000; WILLIAMS, 2001; VAN DE BILDT et al., 2002). 5 Quadro 1 - Animais silvestres terrestres suscetíveis ao vírus da cinomose canina. Famílias suscetíveis Canidae Mustelidae Hyaenidae Procyonidae Ursidae Felidae Viverridae Tayassuidae Myrmecophagidae Hospedeiros naturais Cão selvagem da Austrália, da África, raposa, coiote, lobo, chacal, lobo-guará, cachorro vinagre, cachorro-domato, raposinha, dingo, lobo-etíope, hiena, guaxinim europeu Furão, doninha, marta, jaritataca, texugo, lontra, vison, arminho Hiena Guaxinim, quati, panda vermelho, jupará Urso marrom, urso negro, urso-de-óculos, panda gigante Leão, leopardo, tigre, guepardo, suçuarana, gatomaracajá, leopardo-das-neves Civeta, binturong Cateto Tamanduá Recentemente, em alguns países, campanhas de imunização em massa foram utilizadas para o manejo conservacional de carnívoros selvagens e, também, com a finalidade de prevenir a transmissão do vírus da raiva e da cinomose aos cães (CLEAVELAND et al., 2006). 4. A história das vacinas: da variolação à imunização, lições para o futuro A variolação foi o primeiro método utilizado para controlar a varíola; o vírus, isolado de pústulas de indivíduos infectados era administrado por insuflação ou escarificação em pessoas não-imunes. A variolação foi realizada por séculos na China e na Índia, antes de ser introduzida no oeste europeu em 1723, 6 e foi a única forma de proteção contra a varíola até a vacinação ser introduzida, em 1796, por Edward Jenner (LOMBARD; PASTORET; MOULIN, 2007; ALCAMI; MOSS, 2010). Jenner foi um médico inglês que buscou uma alternativa para a variolação. Ao observar pessoas que trabalhavam com gado leiteiro apresentavam infecção localizada nas mãos pelo vírus da varíola bovina, notou que as mesmas tornavam-se protegidas contra a varíola humana. A partir desta observação, Jenner coletou amostras das lesões de uma mulher que trabalhava na ordenha e vacinou uma criança com este material. Em seguida, a criança foi desafiada e resistiu à infecção, iniciando a era da vacinação. A prática da vacinação rapidamente tomou o lugar da variolação, por ser mais segura (ALCAMI; MOSS, 2010). Em 1980, a varíola foi declarada como erradicada (Fig. 2), como resultado do Programa Global de Erradicação da Varíola da Organização Mundial de Saúde, o qual teve início em 1959 (ALCAMI; MOSS, 2010). A varíola foi a única doença humana erradicada como resultado de uma campanha global de vacinação e este feito permanece como um dos maiores triunfos da medicina (SMITH; MCFADDEN, 2002). Além disso, é considerado como uma inspiração para o desenvolvimento de biológicos e programas para a imunização contra várias doenças em humanos e animais (MCVEY; SHI, 2010). 7 Figura 2 - Capa da revista da Organização Mundial da Saúde, edição de maio de 1980, que trazia informações sobre a erradicação da varíola. Disponível na internet: http://www.nlm.nih.gov/exhibition/smallpox/sp_success.html Na segunda metade do século XIX, Louis Pasteur, Robert Koch e Joseph Lister contribuíram para o desenvolvimento de vacinas para outras doenças com a teoria da existência de microrganismos. Em 1881, Pasteur foi o primeiro a usar o termo vacina para imunógenos direcionados a outras doenças além da varíola. Adicionalmente, ele descobriu a possibilidade de modificar artificialmente a virulência de um agente infeccioso, tornando-o atenuado ou inativado. Os estudos iniciais que levaram aos conceitos de inativação química de patógenos foram conduzidos com a Pasteurella multocida, agente etiológico da cólera aviária, e anthrax. O grupo de pesquisa liderado por Pasteur também avaliou a passagem do vírus da raiva em macacos e coelhos, e do bacilo Erysipelothrix rhusiopathiae em pombos, como métodos para reduzir a virulência destes patógenos (BAZIN, 2003; MCVEY; SHI, 2010). Com Émile Roux, Charles Chamberland e Louis Thuillier, Pasteur desenvolveu uma vacina atenuada eficaz contra a raiva nos cães e, em 1885, aplicou-a pela primeira vez em um ser 8 humano – o menino Joseph Meister, atacado por um cão raivoso. Meister sobreviveu e o conceito de Pasteur sobre vacinação tornou-se mundialmente aceito. Este trabalho iniciou um método de produção de vacinas baseado no uso de tecido nervoso de animais infectados, o qual continuou a ser usado até a primeira metade do século XX, com modificações para melhorar a inativação viral. Atualmente, as vacinas antirrábicas para a imunização de animais e humanos são produzidas em cultivos celulares (ARVIN; CHEN, 2009). Após a II Guerra Mundial, seguido por avanços na produção das vacinas, iniciaram-se programas de controle da raiva canina em larga escala como forma de prevenir a raiva humana por meio de campanhas de vacinação. Em decorrência destes esforços, no final dos anos 70 a raiva canina foi controlada nos EUA. Com o uso de programas semelhantes, a Europa também obteve o status de raiva canina controlada (VELASCO-VILLA et al., 2008; WANDELER, 2008; BLANTON; PALMER; RUPPRECHT, 2010). Atualmente, membros de centros referência em pesquisa sobre raiva e de centros que colaboram com a OMS estão trabalhando ativamente para desenvolver estratégias multidisciplinares especificas, as quais promovem muitas das coligações atualmente existentes comprometidas com o controle da raiva, principalmente na África (GLOBAL ALLIANCE FOR RABIES CONTROL, 2011). No Brasil, os casos de raiva humana decorrentes do contato com cães raivosos vêm diminuindo graças à cobertura vacinal de cães e gatos e a vigilância 9 epidemiológica. No ano de 2009, a cobertura vacinal canina foi de 81% segundo os dados parciais da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS). Como consequência, houve uma diminuição dos casos de raiva canina e humana (Fig. 3), em comparação com dados referentes aos anos anteriores (SVS, 2010). Figura 3 - Casos humanos transmitidos por cães, casos de raiva canina e cobertura vacinal antirrábica canina no Brasil, 2000 a 2009 (dados parciais ano 2009) - SVS, 2010 Além da erradicação da varíola e do controle da raiva canina, reduções drásticas de outras doenças infecciosas como a poliomielite, difteria, tétano, coqueluche, sarampo, caxumba e rubéola comprovam o fato de que a vacinação é a estratégia mais factível e efetiva para prevenir, controlar e erradicar as doenças infecciosas (ANDRE, 2003). 10 5. Tipos de vacinas contra a cinomose Atualmente, para a imunização de cães contra a cinomose, a maioria das vacinas comercializadas é composta por vírus vivos modificados (VVM). Geralmente, estes imunobiológicos contêm as cepas Rockborn, Snyder Hill, Onderstepoort, Lederle ou outras, com títulos virais variados. Apesar de existirem muitos biótipos do VCC, os quais podem causar sinais clínicos variáveis em muitas espécies, a diferença sorológica entre os isolados é insignificante e a proteção heteróloga é induzida. A vacinação com qualquer uma das cepas confere imunidade protetora contra qualquer biótipo (DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). Reações adversas decorrentes da vacinação com VVM são descritas, incluindo encefalites com corpúsculos de inclusão (KRAKOWKA et al., 1982; CORNWELL et al., 1988; HIRAYAMA et al., 1991). Algumas cepas vacinais do VCC podem ser patogênicas para animais selvagens (DURCHFELD et al., 1990) ou quando administradas em conjunto com adenovírus canino tipo I (CORNWELL et al., 1988; MCCANDLISH et al., 1992). As vacinas inativadas não estão disponíveis comercialmente, não são efetivas e não devem ser utilizadas na imunização contra a cinomose (DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). Graças à revolução da biologia molecular, iniciada na década de 50 com os estudos de James Watson e Francis Crick, técnicas moleculares modernas são 11 usadas atualmente para o desenvolvimento de novos tipos de vacinas (Quadro 2). Quadro 2 - Classificação segundo o Departamento de Agricultura dos EUA dos imunobiológicos produzidos por engenharia genética e disponíveis para o uso em Medicina Veterinária* Categoria Descrição I Vacinas que contêm organismos recombinantes inativados ou antígenos purificados derivados de organismos recombinantes II Vacinas contendo organismos vivos que contem deleções genomicas ou genes heterólogos marcados III Vacinas que contém vetores vivos que expressam genes heterólogos para antígenos imunogênicos *Adaptado de TIZARD (2009). No Brasil e em outros países, a tecnologia da vacina recombinante contra a cinomose é produzida apenas pelo laboratório Merial Saúde Animal. No mercado brasileiro são comercializadas como vacinas multivalentes, com os nomes de Recombitek® C4/CV e Recombitek® C6/CV. Consideradas como grande inovação tecnológica, as vacinas recombinantes são organismos híbridos resultantes de trocas de material genético in vitro, apresentando um imenso potencial de conferirem um DNA imunogênico e seguro ao animal hospedeiro. A Recombitek® Cinomose utiliza porções genômicas que codificam proteínas imunogênicas (H e F) do vírus da cinomose inserida em vetor avirulento (Fig.4). O vetor utilizado é o vírus da varíola dos canários (canaripox) 12 e é particularmente, um vetor único quanto à segurança e eficácia (POULET et al., 2007). Figura 4 - Representação esquemática da produção da vacina Recombitek®. Após a vacinação, o poxvírus penetra nas células do animal vacinado, ocasionando a síntese e a expressão das proteínas específicas do vírus da cinomose, desencadeando a estimulação da imunidade humoral e celular (TIZARD, 2009), sem causar a infecção pelo vírus da cinomose que pode ocorrer com o uso de vacinas de VVM (GREENE; SCHULTZ, 2006). O uso do poxvírus como um vetor iniciou-se com o desenvolvimento da vacina Raboral V-RG®, também do laboratório Merial Saúde Animal, para a 13 imunização contra o vírus da raiva para animais selvagens (BLANCOU et al., 1986). Esta vacina contribuiu para a erradicação da raiva em determinados animais selvagens de alguns países da Europa, e é usada para o controle da raiva em guaxinins e coiotes na América do Norte (MACKOWIAK et al., 1999). Atualmente, várias vacinas que utilizam como vetor o canaripox são licenciadas para o uso em cães, gatos, furões e cavalos (POULET et al., 2007). 6. Imunização para a prevenção da cinomose canina Segundo o último Guia de Vacinação Canina da World Small Animal Veterinary Association (WSAVA), a vacina que protege contra a cinomose é considerada essencial para cães, assim como as vacinas contra o adenovírus canino, o parvovírus canino tipo 2 e o vírus da raiva. As vacinas denominadas de essenciais são aquelas que protegem os cães de doenças infecciosas graves, associadas ao risco de morte e que possuem distribuição global (DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). No Quadro 3, observa-se as recomendações para a vacina da cinomose descritas no referido guia. Quadro 3 - Guia de vacinação canina contra a cinomose, segundo recomendações da WSAVA, 2010 Cães que vivem como Cães em vivem em situações de Fase animais de companhia abrigos de animais 14 Filhotes 16 semanas: 1ª dose a partir de 8-9 semanas de idade, então a cada 3-4 semanas, até 1416 semanas de idade. Total de 3 doses. Primovacinação Adultos ≥ 16 semanas: 2 doses, com intervalo de 3-4 semanas, porém apenas é 1 dose é considerada protetora. Revacinação 1 ano após a primovacinação e então a cada 3 anos. Filhotes 16 semanas: 1ª dose antes ou no momento da admissão ao abrigo, repetir com intervalo de 2 semanas até o cão atingir 16 semanas de idade, caso permaneça no abrigo. Idealmente, os filhotes devem ser vacinados a partir de 6 semanas de idade, porém nestes casos, filhotes podem ser vacinados a partir de 4 semanas. Adultos ≥ 16 semanas: 1ª dose antes ou no momento da admissão ao abrigo, repetir com intervalo de 2 semanas. 1 ano após a primovacinação. Os filhotes permanecem protegidos pelos anticorpos maternos (AM) nas primeiras semanas de vida. Em relação à cinomose, geralmente, os AM permanecem, em média, por 9-12 semanas de vida do filhote (GILLESPIE et al., 1958), e sua concentração sérica depende do título de anticorpos colostrais e da quantidade de AM absorvidos após o nascimento (GREENE; SCHULTZ, 2006). Caso o título de anticorpos neutralizantes adquiridos pelo colostro seja alto, estes irão interferir na imunização ativa com vacinas do tipo VVM, ao passo que títulos muito baixos deixam os filhotes expostos à infecção. Já a vacina Recombitek ® 15 Cinomose é capaz de produzir anticorpos em filhotes que possuem AM (PARDO et al., 2007). Um estudo conduzido por LARSON et al. (2006), avaliou o tempo de resposta imune em cães imunizados com a Recombitek® ao mimetizar uma situação de abrigo, ou seja, 4 horas após a vacinação os animais eram colocados em uma sala com outros animais com cinomose. Os cães vacinados foram observados por um período de 4 semanas e não desenvolveram nenhuma manifestação clínica da cinomose. Tais informações ressaltam a importância da vacinação de cães antes da entrada em abrigos, principalmente com vacinas que promovem uma resposta imune protetora rápida. Também foi demonstrado que a duração da imunidade contra a cinomose após a vacinação com Recombitek® foi de 5 anos (LARSON; SCHULTZ, 2007; DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). Em áreas geográficas ou em instalações de isolamento, onde o VCC não é endêmico em animais domésticos ou silvestres suscetíveis, as vacinas do tipo VVM não devem ser utilizadas, pois o risco de introdução do vírus na população é inaceitável. Nestes casos é indicado o uso das vacinas recombinantes (DAY; HORZINEK; SCHULTZ, 2010). A Recombitek® é proveniente das novas tecnologias vacinais e apresenta algumas vantagens sobre as vacinas convencionais do tipo VMM (Quadro 3), além daquelas já citadas previamente. 16 Quadro 3 - Comparação da vacina Recombitek® Cinomose com as vacinas vivas modificadas Recombitek® Cinomose Vacinas Vivas Modificadas O VCC inteiro não é usado neste tipo de O VCC atenuado pode se tornar vacina, apenas parte do seu genoma virulento no hospedeiro, produzindo O vetor viral (canarypox) não se replica encefalite pós-vacinal em células de mamíferos Anticorpos maternos não interferem com Anticorpos maternos neutralizam o a resposta imune induzida pela vacina vírus vacinal, portanto interferem na eficácia da resposta imune produzida Indução rápida de imunidade Indução rápida de imunidade Alta capacidade de estimular a produção de anticorpos em cães previamente vacinados com vacinas VVM ou com vacina recombinante Longa duração da imunidade (3 anos) Longa duração da imunidade (3 anos) Confere elevada proteção da doença Confere elevada proteção da doença (≥98%) (≥98%) Segura para mamíferos silvestres Fatal para raposa cinza, pandavermelho, furões, guepardo, tigres, pumas, leopardos e raposas da Ilha de Santa Catalina Não causa imunossupressão em filhotes Causa imunossupressão em filhotes Não usa adjuvantes, menor reação Contem adjuvantes inflamatória no local da aplicação Pode ser usada em filhotes com menos de Não pode ser usada em filhotes com 4 semanas de idade menos de 4 semanas de idade 7. Perspectivas para a eliminação da cinomose na população canina com vacinas No Brasil, dados da indústria apontam que apenas 7 milhões de cães são vacinados anualmente contra a cinomose, numa população estimada em 30 17 milhões. Desde 2009, a Merial se uniu com a WSPA Brasil - Sociedade Mundial de Proteção Animal para acabar com a cinomose no Brasil (Fig. 5). Durante os meses de abril e maio de cada ano, 5% das doses vendidas da vacina Recombitek® foram doadas à WSPA para uso por suas organizações afiliadas espalhadas pelo país. A campanha “Cinomose aqui não” arrecadou no primeiro ano mais de 6.000 doses, seguidas por mais de 5.500 doses no ano seguinte e neste ano mais de 7.500 doses (MERIAL, 2011). Na campanha de 2011, com o objetivo de conscientizar os donos de cães sobre a necessidade da vacinação contra Cinomose, a Merial organizou uma passeata virtual contra a doença, que percorreu todos os Estados brasileiros durante os dois meses de campanha. Fig. 5 - Um dos materiais promocionais da campanha “Cinomose aqui não” do ano de 2011. Nos países em que a cinomose é endêmica, como no Brasil, milhares de cães morrem todos os anos, e este cenário só poderá ser mudado quando houver um considerável investimento contínuo em campanhas de vacinações por parte 18 de empresas produtoras de vacinas e da classe médica veterinária, além da conscientização de proprietários da importância de tal mobilização. Seguindo o exemplo do que ocorreu no passado, o passo dado pela Merial é muito significativo para a erradicação da doença, pelo investimento em biotecnologia e pelo comprometimento da empresa com o bem-estar animal e pela consciência de que a cada ano os esforços deverão ser intensificados para se atingir um número maior de cães imunizados contra a cinomose, reduzindo as chances de epizootias da doença. Referências ALCAMI, A.; MOSS, B. Scientific review of variola virus research, 1999–2010. Smallpox vaccines. 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