“o ser gaúcho” no norte do paraná: olhares sobre a

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
“O SER GAÚCHO” NO NORTE DO PARANÁ: OLHARES SOBRE A
IDENTIDADE TERRITORIAL DOS MIGRANTES GAÚCHOS
TATIANA COLASANTE1
Resumo: Resgatamos no Norte do Paraná a visão do migrante gaúcho diante da conformação de
novos elementos culturais resultantes do processo de reterritorialização que gera incertezas e
dualidades sobre a sua identidade territorial. Ao mesmo tempo em que estes sujeitos agregam
elementos culturais norte-paranaenses no seu cotidiano, procuram reavivar seus laços identitários
frequentando Centros de Tradições Gaúchas (CTGs). Neste processo de hibridização cultural, muitos
paranaenses se inserem nestes espaços de socialização, participando ativamente das festas
tradicionais gaúchas, trazendo à discussão, portanto, o “ser gaúcho” no norte paranaense.
Palavras-chave: Identidade territorial; migrantes gaúchos; paranaenses.
Abstract: We rescued from the North of Parana gaucho migrant's view on the conformation of new
cultural elements resulting from the repossession process which generates uncertainties and dualities
of its territorial identity. While these individuals add North Paraná cultural elements in their daily life,
seek to revive their identity ties attending Gaucho Traditions Centers (CTGs). In this cultural
hybridization process, many Paraná fall in these socialization spaces, actively participating in the
gaucho’s traditional festivals, bringing the discussion thus "being gaucho" in northern Paraná.
Key-words: Territorial identity; gauchos migrants; paranaenses.
1 – Introdução
Quando investigamos a migração gaúcha para o Paraná, notamos que
houve um fluxo intenso para a região Sudoeste quando da criação da Colônia
Agrícola General Osório na década de 1940 (CANGO) pelo então Governo de
Getúlio Vargas. Este projeto tinha por objetivo o incentivo à colonização da região
1
- Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista Campus
Presidente Prudente-SP. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. E-mail de
contato: [email protected]
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que sofria com conflitos pela posse de terras e assegurar os limites fronteiriços. Por
outro lado, o Norte do Paraná recebeu um grande número de migrantes paulistas e
mineiros que vinham atraídos pela prosperidade da região, principalmente, em
virtude da extensa lavoura cafeeira. Entretanto, a presença de migrantes gaúchos
nesta região do Estado ainda carece de assuntos mais aprofundados, pois, estes
sujeitos através de suas tradições vêm configurando novas territorialidades para o
norte-paranaense, principalmente, a partir da formação de Centros de Tradições
Gaúchas (CTGs) em dezenas de municípios. São estes espaços que nos trazem
ainda novos sujeitos sociais: os paranaenses que se consideram gaúchos e
participam assiduamente de festas tradicionais gaúchas mesmo que muitos deles
sequer tenham estado no Rio Grande do Sul.
Nosso estudo procura dar voz a estes migrantes gaúchos que estão
reterritorializados em Londrina e Maringá, municípios do norte-paranaense, ambos
constituídos em Região Metropolitana e que possuem similaridades no seu processo
de formação. Nossas inquietações recaem sobre a identidade territorial destes
sujeitos que vivem em um paradoxo entre dois territórios, presos a um passado de
tradições que tem orgulho de exaltar, ao mesmo tempo em que vivenciam novas
experiências a partir do contato com outras formas de cultura no território atual no
qual estão inseridos.
2 – Prolegômenos territoriais
De acordo com Raffestin (1993), o território é formado a partir do espaço. Ele
resulta da ação empreendida por um ator sintagmático, ou seja, aqueles que
produzem ações e, neste processo, se apropriam e territorializam o espaço. Assim,
o entendimento do território passa por uma perspectiva relacional, pois, são as
relações que possibilitam a leitura tanto do poder político quanto de suas
manifestações espaciais. Para Saquet (2011a, p. 22), o território “[...] é uma
construção social, histórica, relacional e está sempre vinculado a processos de
apropriação e dominação do espaço”. Segundo Haesbaert (2012, p. 121), o território
“[...] é o produto de uma relação desigual de forças, envolvendo o domínio ou
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controle político-econômico do espaço e sua apropriação simbólica, ora conjugados
e mutuamente reforçados, ora desconectados e contraditoriamente articulados”.
Quando pensamos em território devemos levar em consideração que existem
ações que resultam em diferentes territorialidades, pois, os sujeitos atuam de forma
individual e/ou coletiva e ocupam determinados pontos no espaço de acordo com
suas intencionalidades. Assim, temos uma multiplicidade de relações que ocorrem
no e a partir do território, resultando em uma dinâmica complexa de redes de
circulação e comunicação. Ao estabelecer a nossa territorialidade, por exemplo,
estamos também constituindo ações através de redes, nós e malhas que
possibilitam uma maior fluidez no território, incluindo-se aí uma expansão das
nossas redes de sociabilidade.
Para Saquet (2011b), a territorialidade se refere às relações sociais dos
sujeitos entre si e entre o espaço da vida. O território formado a partir das relações
sociais em dado período de espaço e tempo de forma contínua confere novas
representações para a territorialidade de acordo com cada grupo social que
engendra ações no território. Dessa forma, torna-se evidente que a dimensão
simbólica e a perspectiva cultural das relações são muito intrínsecas ao território.
Logo, tomamos como exemplo a identidade gaúcha que é fortemente construída a
partir das relações estabelecidas com o território, pois, os valores históricos que
tanto orgulham estes sujeitos encontram-se arraigados e constituídos naquele
território, somados a um forte regionalismo que possibilita que os gaúchos se
mantenham coesos em seus valores até mesmo estando em outro território.
2.1 – O paradoxo da migração gaúcha: as múltiplas identidades territoriais
No processo migratório, podemos relacionar a existência de múltiplas
interações reticulares que envolvem, simultaneamente, um território de origem e um
território de destino. Assim, nas redes migratórias, a identidade exerce papel
importante para os migrantes já que contribui para que os sujeitos se tornem mais
coesos e até mesmo acolhidos em um território estranho.
A desterritorialização não implica, necessariamente, na perda efetiva do
território,
mas
está
inserida
em
um
processo
que
envolve
constantes
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territorializações, como aponta Haesbaert (2004). Para o migrante, as identidades
territoriais se tornam inconstantes à medida que necessitam se adaptar a novos
costumes e novas relações cotidianas. Ao mesmo tempo, muitos ainda portam
vínculos (sobretudo, familiares) com seu território de origem, o que de certa maneira
contribui para que essa identidade tenha uma duplicidade, ou uma hibridez mais
acentuada, pois, se mantém indefinida entre dois territórios.
Ademais, existe outro aspecto que implica em uma complexidade maior nos
estudos sobre identidade e território que se refere ao grupo de migrantes que
buscam reproduzir seus valores em outros territórios, como é o caso dos gaúchos
que criam CTGs por todo o Brasil e em diversos países do mundo como forma de
manter vivas as tradições de seus antepassados. Com isso, acabam difundindo sua
cultura para outros sujeitos, os quais muitos sequer estiveram no Rio Grande do Sul
ou até mesmo vivenciaram determinados costumes. Cria-se, portanto, uma rede de
tradições gaúchas que perpassa as fronteiras sul rio-grandenses.
Estando fora do seu território de origem, muitos migrantes estabelecem uma
rede de relações que visam amenizar o sofrimento gerado por esta ruptura. Segundo
Bhabha (1998), trata-se de um tempo de reunião, onde os (i) migrantes se reúnem
em pequenos espaços a fim de evocar lembranças, compartilhar experiências
diversas, perspectivas de vida, ou seja, são espaços que remetem certo conforto,
pois, acabam trazendo de volta um passado de valores em comum, ao mesmo
tempo em que trazem elementos do presente, através das dificuldades vivenciadas
no novo território. Compreendemos, portanto, a necessidade de constituição dos
CTGs que, ao mesmo tempo em que servem para preservar e disseminar a tradição
gaúcha são utilizados também para momentos de socialização entre os gaúchos,
atuando como mecanismo de segurança à medida que propiciam um sentimento de
afetividade entre os sujeitos que passam por momentos de adaptação a uma cultura
diferente.
Nesta perspectiva de alteridade que se estabelece entre o sujeito e o território
mediados pela identidade, destacamos que embora haja um esforço por parte dos
gaúchos em manter a sua tradição, dificilmente esta ficará alheia a influências
externas, pois, conforme argumenta Hall (2006), os fluxos culturais que existem
entre os diferentes espaços geram identidades partilhadas e a apropriação cultural
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se torna inevitável, sobretudo, em tempos de globalização. Assim, quanto mais
entramos em contato com diferentes formas de cultura, mais estamos propensos a
desenvolver uma identidade desvinculada de lugares específicos, ou seja, mais
agregamos valores que nos condicionam a sermos sujeitos de múltiplas identidades.
Na nossa própria vivência, dificilmente podemos ficar alheios a influências de
culturas externas o que, de certa maneira, nos torna sujeitos instáveis no processo
identitário, pois, estamos condicionados a conviver com diferentes tipos de pessoas
e temos também a possibilidade de experienciar diferentes territórios. Enfatizamos
que o contato entre as culturas nunca é passivo, pelo contrário. Sempre vão existir
trocas, recombinações entre alguns elementos e incorporações de outros elementos,
resultando em novas formas de cultura ou, em outras palavras, um hibridismo
sociocultural, conforme Canclini (2001).
Os gaúchos se constituem um dos grupos sociais que mais preserva o
tradicionalismo no Brasil. Muitos destes valores culturais são impregnados de
elementos que fazem alusão à Revolução Farroupilha, de 1835, quando houve um
grande conflito de sul-rio-grandenses contra o governo imperial da época. A partir
desse contexto histórico marcado por um forte sentimento de tradicionalismo, houve
também os primeiros ensaios para a construção dos primeiros CTGs que
rapidamente se disseminaram por todo o território brasileiro e hoje existem até em
outros países, como Japão, Estados Unidos e Portugal.
2.2 – Ser gaúcho no Norte do Paraná: incógnitas de uma identidade territorial
Através de nossas entrevistas notamos que existe uma participação muito
grande de paranaenses em CTGs no norte do Paraná. Inclusive, alguns deles são
fundadores e até presidentes de CTGs. Mesmo durante as festas mais tradicionais
que ocorrem nos CTGs, como os bailes, é difícil encontrar um grande número de
gaúchos. Na sua maioria, são paranaenses que trazem a família para participar,
principalmente, em almoços nos quais se serve o típico churrasco gaúcho.
O ambiente familiar é apontado por vários migrantes gaúchos como uma das
motivações para frequentarem os CTGs, pois, acreditam que estes espaços
possibilitam uma vivência harmoniosa, onde podem levar a família com
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tranquilidade, sem medo da violência, como nesse relato: “[...] o ambiente é propício
pra
educação
dos
filhos,
pela
questão
de
responsabilidade
e
respeito.
Principalmente, respeito, tanto para os pais quanto para os outros” (Felipe, 42 anos,
casado, Analista de Recursos Humanos, natural de Sarandi-RS, casado, Analista de
Recursos Humanos e residente em Maringá-PR).
É interessante que até aqueles entrevistados que se mostraram um tanto
alheios ao tradicionalismo ou que não participam do CTG, acabam enaltecendo
aspectos peculiares da história do Rio Grande do Sul vinculados a própria
constituição do sujeito gaúcho, sobretudo, relacionados aos aspectos de uma
bravura indômita, de sujeitos que não se deixam vencer. De acordo com uma das
entrevistadas: “As mulheres gaúchas são, sobretudo, guerreiras. Antes de ser
brasileira, sou gaúcha. São pessoas muito fortes e batalhadoras” (Lígia, 42 anos,
casada, arquiteta e urbanista, natural de Arroio Grande-RS e residente em LondrinaPR). Para outro entrevistado, “[...] ser gaúcho é acreditar que possamos superar os
limites, sabermos tirar força de vontade de onde não tem, é ser desbravador, é criar
oportunidades” (Gustavo, 34 anos, solteiro, professor universitário, natural de Passo
Fundo-RS e residente em Londrina-PR).
O gaúcho é, portanto, visto com traços heroicos e de qualidades excepcionais
que supera os obstáculos e não tem medo de enfrentar as adversidades da vida.
Além disso, é percebido como um sujeito que contribui para a sociedade devido aos
seus valores peculiares e que faz a sua parte para melhorar o seu entorno.
[Pergunta: O que significa ser gaúcho para você?]
É ser um pouco desbravador [...], é ser persistente, atrás dos objetivos
que se tem. Acho que um pouco de manter e valorizar a cultura e tradição
[...], valorizar o ser gaúcho por essas características e por toda a história,
por tudo que se conhece da historia do gaúcho (Flávio, 35 anos, solteiro,
arquiteto, natural de Pelotas-RS e residente em Londrina-PR, grifo nosso).
Sobre a sua identidade territorial na atualidade, muitos entrevistados se
mostram em dúvidas ao serem questionados. Por um lado, alguns se mostraram
enfáticos ao afirmar sua identidade gaúcha: “Ah sou mais gaúcho ainda. Meu
sotaque não mudou nada, tanto é que todo mundo que fala comigo pela primeira vez
já sabe que sou de lá” (Edmilson, 44 anos, casado, empresário, natural de
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Bossoroca-RS e residente em Maringá-PR. Da mesma maneira, observamos na fala
de outro entrevistado:
Sou gaúcho. Não sou paranaense. Nem um pouco paranaense. Não tem
percentual, é 100% gaúcho. Eu estou aqui, mas eu não sou daqui, sou de
Bagé. Gosto muito daqui, me dou com muita gente daqui, se tiver que viver
o resto da minha vida aqui, vou viver, mas eu vou ser sempre gaúcho
(Walter, 45 anos, casado, vendedor/propagandista, natural de Bagé-RS e
residente em Maringá-PR).
Por outro lado, existem aqueles que se mostram divididos, pois, já
demonstram estar arraigados ao Estado do Paraná: “Olha, vou dizer para ti que eu
sou gaúcho de nascença e paranaense de coração. Diria que eu sou um gaúcho
misto. Amo meu Rio Grande, mas adoro o PR” (Odair, 68 anos, casado, aposentado,
natural de Pinheiro Machado-RS e residente em Maringá-PR). Em outra fala,
notamos a indecisão: “É meio a meio né? Porque já me adaptei aqui” (Marli, 59
anos, casada, dona de casa, natural de Espumoso-RS e residente em Maringá-PR).
Existem outros, porém, que pelo fato de estarem há bastante tempo no Paraná, já se
consideram mais paranaense do que gaúcho:
Acho que me considero mais paranaense porque apesar de ser gaúcho,
mais da metade dos meus hábitos já são daqui [do Paraná]: tomar tereré,
mais do que chimarrão; música sertaneja, antes eu não aturava, agora eu já
escuto, já tenho no pen drive ali do carro. Antes eu gostava mais do frio,
mas agora me adaptei ao calor, não tenho nada contra [...] os hábitos foram
mudando aqui pra região (Cristiano, 24 anos, solteiro, analista de PCP,
natural de Porto Alegre e residente em Maringá-PR).
Interessante ressaltar que, até mesmo entre os gaúchos que não frequentam
o CTG, existe um sentimento muito forte pelo Rio Grande do Sul. Para estes
migrantes, é motivo de orgulho ter nascido naquele Estado, sobretudo, por fazerem
parte de um grupo social que lutou pelos seus interesses, em grandes
acontecimentos históricos, como a Revolução Farroupilha.
Ser gaúcho é, acima de tudo, ter tradições e ser um idealista. Eu vejo o Rio
Grande do Sul como o precursor de grandes revoluções, principalmente, eu
vejo um Estado que se contrapõe à desonestidade, à truculência estatal. Eu
vejo um povo muito idealista, muito culto, muito coeso, muito unido
(Rodrigo, 33 anos, solteiro, empresário, natural de Santa Maria-RS e
residente em Maringá-PR).
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Assim, a identidade territorial gaúcha é muito atrelada a aspectos de coragem
e bravura. Constatamos também que a participação em CTGs não é a única forma
de sociabilidade gaúcha existente nos dois municípios de análise. Muitos
entrevistados destacaram que costumam se reunir com amigos quando ocorrem
partidas de futebol do Grêmio e do Internacional, que são clubes gaúchos. Além
disso, grupos de amigos gaúchos também costumam se reunir para cultuar a
tradição gaúcha, ouvindo músicas típicas, tomando chimarrão e fazendo comidas
típicas, como o arroz carreteiro e o churrasco. Dessa forma, a identidade não se
perde, mesmo estando em um território distante.
Verificamos que todos os entrevistados costumam voltar ao Rio Grande do
Sul com a finalidade de visitar parentes e amigos que ainda estão lá ao menos uma
vez por ano. Alguns deles, inclusive, mencionaram a vontade de regressar para lá
depois de se aposentarem. Estes sujeitos sociais encontram-se em constante
processo de idas e vindas, o que de certa forma, contribui para que os laços
identitários e os aspectos culturais gaúchos não se percam totalmente. Isso gera
certo conflito identitário já que vivem entre dois territórios: um marcado pelo tempo
passado, pelas lembranças familiares e atrelada a valores tradicionais e outro que é
o tempo presente, mas que representa também um tempo futuro, pois, a maioria não
pensa em retornar e pensa em criar os filhos no Paraná.
3 – Metodologias
Para investigar a trajetória de vida dos migrantes gaúchos no norteparanaense e conseguir seus relatos orais, a primeira etapa da nossa pesquisa
envolveu uma extensa pesquisa bibliográfica e documental. Pela escassez de
bibliografia sobre o tema, nos atentamos a obter informações diretamente com
órgãos tradicionalistas gaúchos, como CTGs e o Movimento Tradicionalista Gaúcho
do Paraná, que é o órgão que organiza todos os CTGs do Paraná. Como fonte
principal da pesquisa bibliográfica, o trabalho buscou focar em grandes temas
centrais: território; identidade e; migrações. Isso nos possibilitou demonstrar os
vínculos estreitos entre estes três temas abordados e a partir daí, compreender de
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que forma são constituídas as identidades territoriais e como a migração tem um
papel decisivo neste processo.
Através de informantes em Londrina e Maringá (ver figura 1), realizamos
entrevistas com um total de 26 sujeitos nascidos no Rio Grande do Sul, entre
homens e mulheres com idade entre 24 e 72 anos. As perguntas envolviam vários
temas como cultura, identidade, participação no CTG, tradicionalismo gaúcho,
dificuldades de adaptação no Norte do Paraná, lembranças do Rio Grande do Sul e
as perspectivas de voltar ao território de origem.
Figura 1 – Mapa de localização de Londrina e Maringá-PR
Fonte: IBGE (2012)
Organização: Tatiana Colasante/Patrícia Helena Milani (2015)
Com isso, partimos para outra escala de análise, buscando conhecer a
trajetória de vida dos sujeitos da nossa pesquisa, contribuindo assim para um melhor
entendimento sobre as razões da migração gaúcha para o Norte do Paraná e de que
forma estes migrantes se reconhecem enquanto sujeitos culturais: são gaúchos ou
são paranaenses? Neste aspecto, optamos por uma abordagem qualitativa a fim de
conseguir maior riqueza de detalhes das impressões dos migrantes gaúchos
mediante a técnica de entrevista.
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4 – Resultados
A respeito da migração gaúcha para o Norte do Paraná, nossos entrevistados
vieram das mais diferentes regiões do Rio Grande do Sul. Existem desde sujeitos
que vieram de municípios de forte tradicionalismo como Bagé e Pelotas, como de
colonização alemã, como Santa Cruz do Sul. Assim temos uma grande
heterogeneidade entre os entrevistados, já que os valores culturais adquiridos no
Rio Grande do Sul se processam de forma diferenciada. Entretanto, este fato não
minimiza o orgulho que os entrevistados sentem ao se referirem ao seu Estado de
origem, enfatizando sempre as qualidades dos seus conterrâneos.
Diferente da Região Sudoeste do Paraná, onde podemos falar em um fluxo
migratório de gaúchos e até mesmo periodizar, no Norte do Paraná isto não foi
possível devido a grande disparidade de informações relacionadas às motivações,
dificultando uma similaridade nas respostas. Assim, os motivos que levaram estes
gaúchos a se reterritorializar no Paraná passam por tempos distintos e desde razões
econômicas, como oportunidade de emprego, até razões familiares, para
acompanhar esposa/marido.
Nas nossas investigações, descobrimos um grande grupo de sujeitos os quais
estamos dominando paranaúchos - paranaenses que assimilaram a cultura gaúcha
e se consideram como tal, mesmo sem terem nascido no Rio Grande do Sul. Muitos
deles, inclusive, nem sequer conhecem o Rio Grande do Sul. Por outro lado,
identificamos a existência de microterritorialidades gaúchas que resultam de
reuniões de amigos gaúchos e paranaúchos que se reúnem para cultivar a cultura
gaúcha fora do CTG, ou seja, o CTG não é o elemento condicionante na
preservação da difusão da cultura gaúcha, mas um dos elementos que contribuem
para este processo. Muitas vezes, é nesses espaços familiares que alguns
paranaenses têm contato com a cultura gaúcha e passam a fazer uso de alguns
hábitos, como tomar o chimarrão e ouvir música tradicionalista.
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5 – Conclusões
A respeito da concepção de ser gaúcho, os nossos entrevistados
demonstraram certa contradição nas respostas. Ao mesmo tempo em que afirmam
que o vínculo com o Rio Grande do Sul é fundamental, também atribuem ao cultivo
das tradições, ou seja, um paranaense poderia ser gaúcho, basta se apropriar da
cultura gaúcha. Nesse sentido, o ser gaúcho perpassa territórios, pois, alguém que
nasce no Japão e passa a cultivar a tradição, pode ser considerado gaúcho. Por um
lado, essa concepção de ser gaúcho pelo modo de vida nos motiva a compreender a
atuação desses sujeitos sociais que surgem neste processo, os chamados
paranaúchos, por outro lado, nos converge para uma análise mais complexa da
identidade territorial gaúcha no Norte do Paraná.
Notamos assim, que a cultura gaúcha é bem aceita e vivenciada por muitos
paranaenses que até mesmo frequentam os CTGs. Em contrapartida, muitos
gaúchos que residem em Londrina e Maringá não costumam frequentar o CTG seja
por falta de costume ou até mesmo por acreditar que existe uma descaracterização
da cultura gaúcha nestes espaços. Assim, as ressignificações da cultura em
diferentes territórios nos conduzem a um olhar para o hibridismo, indicando que
somos resultado de múltiplas identidades territoriais.
Os migrantes gaúchos buscam preservar um pouco da sua tradição através
da construção dos CTGs, o que materializa sua territorialidade em várias regiões do
país. Podemos afirmar, portanto, que os gaúchos trazem para outros territórios
aspectos da identidade territorial do Rio Grande do Sul, ou seja, formada a partir do
seu território de origem, possibilitando uma coesão social desses indivíduos em
outros territórios. Estes indivíduos certamente possuíam uma identidade territorial
com seu estado de origem resultante da sua relação com o território, com mais ou
menos intensidade. Por sua vez, o Estado do Rio Grande do Sul possui uma
formação territorial distinta do estado do Paraná, o que acarreta diversas formas de
apropriação do território e, consequentemente de identidade.
A partir do momento em que estes indivíduos se reterritorializam no Norte do
Paraná, deparam-se com outra forma de vida, um tempo e um espaço diferente que
serão assimilados por estes indivíduos de forma subjetiva e objetiva, resultando em
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novas identidades territoriais, nas quais alguns elementos sociais perduram e
passam a coexistir com novos elementos desse intercâmbio cultural. Sem encerrar
totalmente a discussão, apresentamos novos contornos para a análise da identidade
territorial gaúcho no Norte do Paraná, sobretudo, a partir de novas formas de
socialização dos gaúchos, além dos CTGs, com a reunião em partidas de futebol ou
até mesmo na Semana Farroupilha que tem extrema importância para a cultura
gaúcha. Assim, a territorialidade não se limita aos espaços ditos oficiais, instituídos
através do Movimento Tradicionalista Gaúcho, mas se estende a microterritórios
cotidianos nos quais os gaúchos estabelecem contato com outros indivíduos
estreitando laços de identidade, adaptando sues costumes à realidade norteparanaense.
Referências Bibliográficas
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