A SEMÂNTICA DOS PREFIXOS de- e dis

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II Seminário Nacional em Estudos da Linguagem:
Diversidade, Ensino e Linguagem
06 a 08 de outubro de 2010
UNIOESTE - Cascavel / PR
A SEMÂNTICA DOS PREFIXOS DE- E DIS- PARA AS PALAVRAS DE BASE
SCHNEIDER, Luizane (FAF)
RESUMO: O foco deste trabalho volta-se para as ocorrências dos prefixos de- e dis-. O
presente estudo começa com as classificações encontradas nos livros didáticos de ensino
da gramática da língua portuguesa. Partindo-se desse ponto, a pesquisa avança com o
objetivo de identificar, rever e, por fim, tentar sistematizar os diferentes tipos de
influência semântica provocada por esses prefixos nas palavras, quando observadas em
contexto. Os primeiros resultados apontam para um tipo de classificação que, ao que
tudo indica, vai muito além daquela consagrada pelas gramáticas tradicionais.
PALAVRAS-CHAVE: Prefixos de- e dis-; polissemia; processos de formação de
palavras.
1- Introdução: a função da polissemia presente nos prefixos
A multiplicidade de sentidos ou ambiguidade lexical é um tema que, por todos
os motivos, interessa retomar aqui. Trata-se de um fenômeno linguístico que, até onde é
possível registrar, acontece em todas as línguas.
Assim como acontece com a produtividade lexical, para os dois tipos de
ambiguidade lexical (homonímia e polissemia), também não há consenso entre os
teóricos sobre como distingui-los com precisão absoluta. Mesmo que a polissemia possa
ser definida, conforme Tamba Mècz (2006) e outros, como a multiplicação de
significados aparentados de uma mesma palavra; e a homonímia, um caso em que uma
“mesma palavra” suporta vários significados sem qualquer relação de proximidade
semântica, determinar quando uma palavra é polissêmica ou homônima constitui uma
enorme dificuldade.
Embora haja muitas propostas voltadas para tentar estabelecer essa
diferenciação, ainda não existem critérios que possam ser considerados consistentes e
definitivos. Lyons (1987), por exemplo, embora reconhecendo o valor da etimologia
como um caminho distintivo, aponta falhas no método. A mais crucial delas é o fato de
ser muito difícil determinar o momento histórico em que uma dada palavra passou a
assumir esse ou aquele novo significado. Várias tentativas já foram feitas nesse sentido,
mas os resultados e a veracidade dos fatos, por razões diversas, acabaram se tornando
pouco ou nada confiáveis. O dinamismo com que as línguas evoluem e as diferentes
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situações cotidianas que se interpõem nesse percurso são os principais entraves para a
confirmação de tais resultados.
Dubois (2004, p.326) também tenta dar a sua contribuição, definindo homonímia
como sendo uma “palavra que se pronuncia e/ou se escreve como outra, sem ter o
mesmo sentido”. Mas, afinal, o que seria esse tal “sentido” a que o autor se refere?
Historicamente, a ambigüidade lexical, hoje é estudada com maior atenção, nem
sempre foi um fenômeno apreciado. Ao longo da história, muitos a censuraram. O
primeiro deles e, talvez o mais importante de todos, foi Aristóteles (apud ULLMANN,
1964). Para o filósofo, as palavras de significado ambíguo serviam, sobretudo, para
permitir ao sofista desorientar os seus ouvintes; ou seja, um obstáculo para a
comunicação. Segundo Basílio, se não fosse possível atribuir vários sentidos às palavras
e morfemas da língua, nossa memória estaria sobrecarregada. Para ela (1991, p.10).
(...) formamos palavras pela mesma razão que formamos frases, o
mecanismo da língua sempre procura atingir o máximo de
flexibilidade em termos de expressão simultaneamente a um mínimo
de elementos estocados na memória. É essa flexibilidade que nos
permite contar com um número gigantesco de elementos básicos de
comunicação sem termos que sobrecarregar a memória com esses
mesmos elementos.
Se já chama à atenção a capacidade que muitas palavras têm de suportar sentidos
variados, mais intrigante é perceber que esse recurso não se restringe às palavras na sua
acepção mais clássica. Prefixos e sufixos, em maior ou menor escala, também são
suscetíveis ao fenômeno.
2- Percurso gramatical do prefixo deComo este trabalho trata-se de uma sondagem inicial, especialmente de cunho
gramatical, em relação aos sentidos admitidos pelos prefixos de- e dis-, listam-se a
seguir esses teores semânticos.
A Gramática Histórica de Coutinho (1976, p. 177) classifica o de- como
pertencente à lista de prefixos oriundos do latim. Semanticamente, envolve ideia de
direção para baixo, origem, afastamento, separação, intensidade, sentido contrário. O
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autor cita os seguintes exemplos: declive, depor, decapitar, deportar, decrescer,
decompor, demover.
Em Faraco & Moura (1999, p. 168) o prefixo de- refere-se a movimento de cima
para baixo. Listam os exemplos: decair e decrescer
Já para Cunha & Cintra (2007, p. 99) o prefixo de- assinala a ideia de
movimento para baixo. Decair e decrescer são os exemplos enumerados pelos autores.
3- Percurso gramatical do prefixo disEm relação ao prefixo dis-, Coutinho (1976) mescla dois prefixos: o dis-, e o di-.
Remete-os à ideia de dualidade, divisão em duas partes, separação, movimento em
vários sentidos, afastamento, cessação, negação, falta, intensidade. Ocorrem muitos
exemplos com os prefixos citados: dissecar, disjungir, dissentir, disseminar, discutir,
dissidente, disforme, dissabor, distender, digerir, dilacerar, divagar, distilar.
Coutinho (1976) trata do dis- e do di-. Esses prefixos encerram a ideia de
dificuldade e significa duas vezes. São citadas as palavras dispesia, dispneia, disenteria,
disuria e dissílabo, díptero e diedro para exemplificar.
Faraco & Moura (1999, p. 168) demonstram que há um prefixo dis- de origem
grega e que indica dificuldade. Usam as palavras dispneia e disenteria para
exemplificar.
Faraco & Moura (1999, p. 169) referem-se conjuntamente aos prefixos dis-, di- e
ainda o dir-. Para os autores, esses prefixos remetem a ideia de separação, movimento
para diversos lados, negação. Utilizam-se dos seguintes vocábulos para ilustrar os teores
semânticos dos prefixos em destaque: dissidente, distender, dilacerar e dirimir.
Cunha & Cintra (2007, p. 99) colocam no mesmo grupo os prefixos dis-, di- e
dir-. Segundo os autores, referem-se à ideia de separação, movimento p€ara diversos
lados, negação. Citam as seguintes palavras: dissidente, distender, dilacerar, dirimir.
Cunha & Cintra (2007, p. 101) mencionam um prefixo dis- originado do grego e
que indica dificuldade e mau estado. São exemplos desses teores semânticos as palavras
dispneia e disenteria.
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4 - Uma trajetória diacrônica de alguns prefixos
De imediato, percebe-se uma mistura de alguns prefixos apresentados pelas
gramáticas. Não há uma divisão clara para cada teor semântico, especialmente do
prefixo dis-. Pressupõe-se que essa dificuldade decorre em relação à origem dos
prefixos. Pode-se dizer que, em alguns casos, ocorre o processo de alomorfia ou em
outros casos, poder-se-ia recorrer ao viés diacrônico para verificar a real origem do
prefixo.
Viaro, em seu livro Por trás das Palavras (2004), enumera alguns fenômenos
diacrônicos que explicam alguns casos. Para o autor, é difícil distinguir sincronicamente
os prefixos des-/ de-/ dis-. Esse caso seria parecido com a múltipla origem
pronome/conjunção que.
No entanto, segundo Viaro, é possível perceber que:
 Há um prefixo dis- provindo do latim (palavras de origem culta, como em
discernir);
 Há um prefixo dis- provindo do grego dys- (antigamente se escrevia com y),
como em disenteria;
 Há um prefixo de- provindo do latim, como em decapitar;
 Há um prefixo di- variante (ou, se quiser, "alomorfe") do dis- latino (dis+facilis
> difficilis > difícil, com assimilação e metafonia. Este prefixo é distinto do di- que
indica número dois (que é de origem grega, pois em latim seria bi-): por exemplo,
dicotomia.
Nesta sondagem inicial é importante verificar essas peculiaridades dos prefixos
em voga para que fiquem claras estas variações de origem, seja grega ou latina, bem
como as possíveis ocorrências de alomorfia.
5- Considerações finais
Os motivos desencadeadores desse novo processo de pesquisa se devem à
continuidade de investigação iniciada no mestrado em Letras a partir do prefixo des-.
Busca-se, neste momento, investigar novos prefixos.
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Elegeram-se os prefixos de- e dis-, uma vez que em algumas palavras
investigadas com o morfema des-, esses elementos vieram à tona, como em degelo, por
exemplo.
Desse modo, a investigação linguística que se propõe desenvolver tem o objetivo
geral de analisar a questão da produtividade lexical a partir de uma perspectiva
semântica, relacionada ao aspecto polissêmico e/ou multifuncional dos processos de
formação de palavras.
São inúmeras as dúvidas que emergem e que nos motivam a investigar esses dois
novos prefixos.
Assim, a pesquisa pretende tomar os seguintes rumos a fim de propor uma
sistematização atualizada dos prefixos de- e dis-. Pretende-se eleger um corpus com
ocorrências em contexto dos prefixos a serem analisados, investigar, de modo
aprofundado as possíveis origens do prefixo dis- , identificar processos de alomorfia
entre outros pontos que suscitarem no decorrer do desenvolvimento dessa nova
investigação linguística.
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