UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE PSICOLOGIA TRANSTORNOS ALIMENTARES: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SORAYA PIACENTINI ITAJAÍ, 2008 1 SORAYA PIACENTINI TRANSTORNOS ALIMENTARES: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do titulo de Bacharel em Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí. Orientadora: Prof.º MSc. Maria Celina Ribeiro Lenzi. Itajaí SC, 2008 2 FOLHA DE APROVAÇÃO Membros da Banca ______________________________________ Profº. Dr. Eduardo Legal ______________________________________ Profº. Msc. Giovana Delvan Stuhler ________________________________________ Profº. Msc. Maria Celina Ribeiro Lenzi 3 RESUMO Comportamentos patológicos são aqueles que desviam-se dos padrões comportamentais considerados como aceitáveis pela sociedade. Entre estes, encontramos os transtornos psicológicos, os quais são disfunções prejudiciais considerados como um comportamento perturbado, atípico e injustificável. Neste contexto em que se descrevem os transtornos psicológicos foi selecionado para estudo, os Transtornos Alimentares. Estes são caracterizados por graves perturbações do comportamento alimentar; são síndromes comportamentais cujos critérios diagnósticos vêm sendo amplamente estudados nos últimos 30 anos. Nesta etiologia existem três entidades nosológicas: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) e Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação (TASOE). Esta é uma pesquisa bibliográfica que possui como objetivo desenvolver um estudo bibliográfico caracterizando os Transtornos Alimentares, ou seja, identificando a etiologia, levantando as principais características, identificando a incidência do comportamento, verificando quais as formas de tratamento, o curso e o prognóstico deste transtorno e descobrindo quais as co-morbidades envolvidas. Apesar da dificuldade em se encontrar material diferenciado, foi possível obter uma ampla gama de informações, que por sua vez possibilitaram uma boa compreensão desse transtorno tão comentado nos últimos tempos. Palavras-Chave: Transtornos Alimentares; Etiologia; Prognóstico; Co-morbidades. 4 LISTA DE QUADROS Quadro 1 ............................................................................................................ 63 Quadro 2 ............................................................................................................ 64 Quadro 3 ............................................................................................................ 74 5 LISTA DE ABREVIATURAS AN – Anorexia Nervosa BN – Bulimia Nervosa DM – Diabetes Mellitus TA – Transtornos Alimentares TASOE – Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação TCAP – Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica 6 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................ 08 2 METODOLOGIA..................................................................................... 12 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................. 14 3.1 ANORMALIDADE x NORMALIDADE..................................................... 3.2 COMPORTAMENTO PATOLÓGICO...................................................... 15 3.3 ETIOLOGIA............................................................................................. 18 3.4 TRANSTORNOS ALIMENTARES.......................................................... 24 3.4.1 Anorexia Nervosa (AN)........................................................................... 24 3.4.1.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR..................................................... 28 3.4.1.2 Formas de Tratamento............................................................................ 29 3.4.1.3 Curso e Prognóstico da Doença............................................................. 3.4.2 Bulimia Nervosa (BN).............................................................................. 41 3.4.2.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR..................................................... 45 3.4.2.2 Formas de Tratamento............................................................................ 46 3.4.2.3 Curso e Prognóstico da Doença............................................................. 3.4.3 Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação (TASOE)................ 54 3.4.3.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR..................................................... 54 3.4.3.2 Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP)......................... 14 40 52 55 3.4.3.2.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR..................................................... 57 3.4.3.2.2 Formas de Tratamento............................................................................ 59 3.4.3.2.3 Curso e Prognóstico da Doença............................................................. 62 3.5 CO-MORBIDADES.................................................................................. 64 3.5.1 Transtornos de Ansiedade...................................................................... 65 3.5.2 Transtornos de Humor............................................................................ 68 3.5.3 Transtornos Relacionados a Substâncias............................................... 70 3.5.4 Transtornos de Personalidade................................................................ 3.5.5 Diabetes Melittus..................................................................................... 72 3.5.6 Osteoporose............................................................................................ 73 4 CONCLUSÃO......................................................................................... 5 REFERÊNCIAS....................................................................................... 82 71 75 7 GLOSSÁRIO........................................................................................... 89 8 1 INTRODUÇÃO Para uma melhor compreensão do comportamento patológico, a psiquiatria desenvolveu diversas formas de estudo, dentre elas pode-se citar as definições de comportamento normal e comportamento patológico. Para Atkinson (2002), um indivíduo com bem-estar emocional, ou seja, um indivíduo considerado normal é aquele que possui uma percepção adequada da realidade, capacidade de exercer controle voluntário sobre o comportamento, auto-estima e aceitação, produtividade, e, capacidade de formar relacionamentos afetivos. Já aqueles que não possuem tais características, são considerados anormais, ou seja, aqueles que apresentam comportamentos patológicos. Por comportamentos patológicos pode-se entender aqueles comportamentos que se desviam dos padrões impostos por determinada sociedade; este pode ser identificado ao se averiguar como tal comportamento afeta o bem-estar do indivíduo e do grupo social. Neste contexto encontram-se os transtornos psicológicos, os quais são vistos como disfunções prejudiciais, ou seja, são considerados comportamentos perturbados (MYERS, 2003). Frente aos vários transtornos psicológicos existentes, selecionou-se para este estudo, os Transtornos Alimentares, os quais, de acordo com Ballone (2002), são definidos como desvios do comportamento alimentar que podem levar ao emagrecimento extremo (caquexia) ou à obesidade, entre outros problemas físicos e incapacidades. Dentro dos Transtornos Alimentares, classificam-se três entidades nosológicas principais: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) e Transtornos Sem Outra Especificação (TASOE). A AN pode ser definida como uma inanição deliberada e auto-imposta, sendo seguida de uma busca interminável pela magreza e por um medo extremo de engordar, que leva a sérios graus de emagrecimento (GARFINKEL apud NUNES et al, 1998). A BN define-se pela presença de compulsão alimentar, sendo esta a ingestão, em um período limitado de tempo, de uma grande quantidade de alimento acompanhado do sentimento de falta de controle sobre o consumo alimentar durante o episódio. É seguida de comportamentos compensatórios para a prevenção de ganho de peso. Já o termo TASOE é aplicado quando existem sintomas de comportamento alimentar perturbado, mas que não apresentam por completo o 9 quadro da AN ou da BN. Esses quadros são conhecidos como quadros atípicos. No TASOE também encontramos o Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Tanto na AN quanto na BN existe uma excessiva preocupação com a forma e o peso corporal que leva o paciente a adotar comportamentos inadequados dirigidos à perda de peso; essa preocupação excessiva costuma basear sua autocrítica e o leva a perseguir o sonho de alcançar um corpo magro “ideal”. Há muito tempo que os padrões de beleza femininos vêm passando por uma constante mudança; e dentro do nosso contexto sociocultural atual pode-se observar nitidamente uma mudança nos padrões de beleza feminina, tendo como ideal um corpo cada vez mais magro. O culto à magreza transmite a idéia de que um corpo magro e esbelto está diretamente relacionado à imagem de poder, autonomia e sucesso. Em conseqüência disso, as pessoas, sendo a grande maioria mulheres, passam a se preocupar mais com a sua estética corporal visível. Em função dessa transformação nos padrões de beleza e o medo desenvolvido, principalmente nas mulheres, da rejeição social devido à obesidade, as pessoas têm aderido à cultura da magreza, muitas vezes, de maneira incorreta. De acordo com Galvão et al. (2006b), esse tipo de comportamento citado acima decorre de uma pressão social relacionada à magreza exposta pela mídia e pode criar um ambiente psicológico favorável ao desenvolvimento dos Transtornos Alimentares (TA) quando associados a outros fatores de risco ou vulnerabilidades, como baixa auto-estima, perfeccionismo, traços obsessivo-compulsivos, entre outros. Retomando o aspecto citado acima, de que as mulheres são mais vulneráveis a desenvolver os TA temos como prova um estudo realizado por Ballone (2005) onde se mostra que 90% das pessoas portadoras de TA são mulheres e, entre elas, normalmente são aquelas com idade entre 14 e 18 anos. Nos países industrializados, aos 15 anos de idade, uma em cada quatro meninas faz regime para emagrecer, sem que, em quase nenhum caso, se constatem problemas de peso acima de uma faixa de normalidade. Respondendo a pergunta "você se vê gorda, mesmo que os outros te vejam magra?", 58% das meninas de 15 anos contestaram afirmativamente a opinião dos outros que as consideravam normais, magras ou não gordas (BALLONE, 2005). Os TA tem sido um assunto muito comentado nos últimos tempos, porém há carência de material científico publicado, dificultando, de certa forma, um maior 10 conhecimento sobre este transtorno. A maioria dos trabalhos publicados relata as mesmas coisas, às vezes sendo até as mesmas palavras, ou seja, são poucos os livros e artigos científicos brasileiros que trazem descobertas e informações diferenciadas. Devido a este fato, o presente trabalho possui como objetivo investigar em literatura científica especializada os principais tipos de TA. De forma mais específica buscará conhecer sua etiologia, as formas de tratamento, o curso e o prognóstico da doença, as co-morbidades e complicações clínicas associadas. Para o desenvolvimento deste trabalho, foi feito um estudo bibliográfico a partir da coleta de fontes na biblioteca da UNIVALI, em acervo particular e na Biblioteca Virtual de Saúde, PsiqWeb e SCIELO. Nas bibliotecas a busca foi feita pelo índice dos assuntos através das palavras chaves (Anorexia, Bulimia, Compulsão Alimentar e Transtornos Alimentares), Os materiais considerados foram livros publicados entre os anos 1998 e 2008 e artigos científicos com ano de publicação entre 2002 e 2008. Após a coleta de dados, foi feita a sistematização de todo o material encontrado na tentativa de facilitar o acesso ao conteúdo existente sobre os TA, além de correlacionar as idéias de diversos autores sobre o mesmo assunto. A sistematização deste material pretende contribuir como um instrumento de pesquisa aos pesquisadores e profissionais da saúde que trabalham diretamente com os TA. No segundo capítulo será apresentada a metodologia que foi utilizada para a elaboração deste trabalho bibliográfico, apresentando todos os aspectos utilizados, da obtenção de dados à elaboração do trabalho. No terceiro capítulo serão abordados temas como a abrangência do significado de normalidade e anormalidade, ou seja, o que pode ser considerado como um comportamento comum (normal) ou incomum (anormal). Assim que esclarecidos os significados designados a tais palavras, foi retratado o conceito de patologia, o qual, por sua vez, engloba também o conceito de transtornos psicológicos. Dentro destes encontramos os Transtornos Alimentares (TA) aos quais o presente trabalho se refere. É também apresentada a etiologia dos TA, a qual abrange os fatores que predispõem, precipitam e perpetuam determinada patologia. Além disso, foram esclarecidos os principais pontos de cada patologia relacionada aos TA, serão elas: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) e Transtornos 11 Alimentares Sem Outra Especificação (TASOE), dentro deste último optou-se tratar de maneira ampla sobre o Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Foram abordadas também as co-morbidades psiquiátricas ligadas a cada patologia (AN, BN e TCAP) e algumas complicações clínicas que podem surgir no decorrer do quadro clínico. 12 2 METOLOGIA O procedimento utilizado para atingir os objetivos foi a pesquisa bibliográfica, ou seja, baseado no material que a pesquisadora teve acesso em relação ao tema de estudo. De acordo com Marconi e Lakatos (1999, p.73) a finalidade da pesquisa bibliográfica “é colocar o pesquisador em contato com tudo aquilo que já foi escrito sobre determinado assunto. [...] Dessa forma, não é mera repetição, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem”. Para a pesquisa foi seguida uma ordem, a qual visou estabelecer uma melhor organização dos resultados da pesquisa bibliográfica (MARCONI & LAKATOS, 1999). Para tanto, a presente pesquisa compreendeu as seguintes etapas: 1. Escolha do tema: o tema e o assunto que se deseja provar ou desenvolver; 2. Elaboração do plano de trabalho: nesta fase foi observado a estrutura do trabalho cientifico, introdução, desenvolvimento e conclusão; 3. Identificação: é a fase de reconhecimento do assunto pertinente ao tema em estudo. Nesta etapa foi realizado um levantamento bibliográfico que buscou informações do material já publicado sobre o tema em questão. A pesquisa foi realizada nas bibliotecas da UNIVALI, em acervo particular, na Biblioteca Virtual de Saúde, PsiqWeb e SCIELO. Nas bibliotecas a busca foi feita pelo índice dos assuntos através das palavras chaves (Anorexia, Bulimia, Compulsão Alimentar e Transtornos Alimentares), os materiais a serem considerados foram livros publicados entre os anos 1998 e 2008 e artigos científicos com ano de publicação entre 2002 e 2008. 4. Localização: reunião sistemática contida nos livros, revistas ou publicações avulsas; 5. Fichamento: à medida que a pesquisadora teve em mãos fontes de referência, foram transcritos os dados em fichas; O fichamento se baseou na análise de todos os dados encontrados e selecionados possibilitando a junção das informações para a elaboração do trabalho proposto. Nesta fase foram utilizados os livros e os artigos científicos para a elaboração dos resumos e esboços. 13 6. Análise e interpretação: a primeira fase foi composta pelas criticas do material bibliográfico, a segunda fase compreendeu a decomposição dos elementos essenciais e sua classificação. 7. Redação: elaboração do texto para o projeto do trabalho de conclusão de curso, priorizando objetividade, clareza, precisão, consciência, linguagem impessoal e uso do vocabulário técnico. 14 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 NORMALIDADE X ANORMALIDADE Antes de abordar o tema do presente trabalho, é necessário a apresentação de alguns conceitos para o melhor entendimento do mesmo, iniciando pelo conceito de normalidade. Não existe um conceito específico para “o que é normalidade”, mas, segundo Atkinson et al. (2002), existem algumas características principais que indicam o bem-estar emocional de um indivíduo. Essas características são: percepção adequada da realidade; capacidade de exercer controle voluntário sobre o comportamento; auto-estima e aceitação; capacidade de formar relacionamentos afetivos; e, produtividade. Logo, um indivíduo considerado anormal é aquele que não apresenta estas características. Para complementar a definição de Atkinson et al. (2002), Dalgalarrondo (2000) divide o conceito de normalidade em nove critérios, os quais serão citados abaixo: • Normalidade como ausência de doença: aqui define-se como indivíduo normal, aquele que não é portador de algum tipo de transtorno mental definido; • Normalidade ideal: neste aspecto se considera a normalidade como uma certa “utopia”, pois é estabelecido uma norma ideal, ou seja, aquilo que supostamente é considerado como “sadio”; • Normalidade estatística: este tipo de normalidade identifica norma e freqüência. É um conceito que se refere especialmente a fenômenos quantitativos, ou seja, o normal passa a ser aqueles comportamentos que são possíveis de serem observados mais freqüentemente; • Normalidade como bem-estar: pode-se estabelecer neste aspecto a definição de saúde feita pela Organização Mundial de Saúde em 1958, na qual se descreve saúde como o completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente como ausência de doença; 15 • Normalidade funcional: normalidade é aquele fenômeno que não se considera como patológico, ou seja, não causa sofrimento para o próprio individuo e nem para o seu meio de convívio social; • Normalidade como processo: aqui são considerados os aspectos dinâmicos do desenvolvimento psicossocial, das desestruturações e reestruturações ao longo do tempo, de crises, de mudanças próprias a certos períodos etários; • Normalidade subjetiva: neste aspecto se dá uma ênfase maior à percepção subjetiva do próprio indivíduo em relação ao seu estado de saúde; • Normalidade como liberdade: este conceito de normalidade atribui ao indivíduo possibilidades que o permitem estabelecer certas relações entre os sofrimentos e as limitações inerentes à condição humana e, então, usufruir o resquício de liberdade e prazer que nos é oferecido pela existência; • Normalidade operacional: neste último aspecto define-se os conceitos de normalidade operacionalmente e patologia com tais a priori, conceitos, buscando aceitando, trabalhar assim, as conseqüências de tal definição prévia. 3.2 COMPORTAMENTO PATOLÓGICO A partir daquilo que define-se como comportamento anormal, encontram-se os comportamentos patológicos, os quais são aqueles que se desviam acentuadamente dos padrões, ou normas, impostos pela sociedade como sendo comportamentos aceitáveis. Além disso, este comportamento geralmente é estatisticamente infreqüênte naquela sociedade. Um dos critérios mais importantes para se identificar um comportamento patológico, é averiguar como o comportamento afeta o bem-estar do indivíduo ou do grupo social. Segundo este critério, o comportamento é patológico quando há inadaptação, ou seja, quando ele tem efeitos adversos sobre o indivíduo ou sobre uma sociedade. Alguns tipos de 16 comportamento desviante prejudicam o bem-estar do indivíduo, assim como outras formas de comportamento desviante são prejudiciais à sociedade (ATKINSON et al, 2002). Dentro dos comportamentos patológicos encontram-se os transtornos psicológicos, os quais são, por diversas vezes, vistos como disfunções prejudiciais. Disfunção significa não funcionar como a seleção natural predispõe nossa espécie a se comportar; e prejudicial significa uma avaliação de indesejabilidade. Dessa forma, o comportamento é rotulado como perturbado quando considerado como atípico, conturbado, desajustado e injustificável (MYERS, 2003). Neste contexto em que se descrevem os transtornos psicológicos, foi selecionado discutir sobre os Transtornos Alimentares (TA), os quais são considerados como doenças dos países ocidentais desenvolvidos, considerando-se casos raros em culturas orientais (NUNES et al., 1998). Os TA são caracterizados por graves perturbações no comportamento alimentar; são síndromes comportamentais cujos critérios diagnósticos atualmente vêm sendo amplamente estudados. São descritos como transtornos e não como doenças pelo fato de sua etiologia patológica ainda não ser bem conhecida (CLAUDINO e BORGES, 2007). Estes transtornos são determinados por uma diversidade de fatores que interagem entre si de uma maneira complexa para produzir e, diversas vezes, perpetuar a doença. Distinguem-se os fatores: 1) predisponentes, que aumentam as chances do surgimento do TA, mas não o tornam inevitável; 2) precipitantes, que marcam o aparecimento dos sintomas do TA; e, 3) mantenedores, que determinam se o transtorno será perpetuado ou não (MORGAN et al, 2002). Nesta etiologia existem três entidades nosológicas, a Anorexia Nervosa (AN), que caracteriza-se por uma recusa a manter o peso corporal em uma faixa normal mínima; a Bulimia Nervosa (BN), que caracteriza-se por repetidos episódios de compulsões alimentares seguidas de comportamentos compensatórios inadequados; e os Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação (TASOE), que são compostos pelos quadros atípicos de AN e BN; esses quadros atípicos representam manifestações mais leves ou incompletas, muito mais freqüentes que as síndromes completas e com risco de evoluírem para as mesmas, além de quadros de compulsão alimentar sem o uso de comportamentos compensatórios, sendo conhecido como Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Entre os TASOE, as classificações também citam os quadros de ruminação e pica (mais 17 comuns na infância), a hiperfagia (episódios de compulsão alimentar) e algumas alterações do comportamento alimentar sem critérios específicos que parecem melhor representar sintomas do que síndromes propriamente ditas (CLAUDINO e BORGES, 2007). Existem dois critérios importantes a serem seguidos para que seja feito o diagnóstico de uma patologia, seja ela AN, BN ou TASOE. O primeiro aspecto refere-se à necessidade de se esclarecer e definir qual é a dimensão da imagem corporal que está sendo avaliada e discutida, estando diante de pesquisas ou de pacientes com TA. O segundo aspecto trata da necessidade de melhor diferenciar a distorção da imagem corporal entre os diferentes grupos com esse transtorno (STENZEL, 2006). Tanto na AN como na BN, uma das principais características, é a existência de uma perturbação na percepção da forma e do peso corporal (APA, 2002). É possível observar que no TA o descontentamento com a aparência física não é o único aspecto que define a chamada distorção de imagem corporal, pois esta pode estar mais centrada nas sensações corpóreas. Em relação a isso, Stenzel (2006) cita como exemplo o fato de que um paciente em tratamento pode ter grande dificuldade de avaliar o quanto está comendo, enquanto a noção sobre sua aparência física e seu peso corporal pode estar relativamente preservada. Uma revisão sistemática de 12 estudos de incidência cumulativa realizada por Pawluck e Gorey, em 1998, mostrou uma estimativa de incidência de forma geral da média anual da população como um todo de 18,46 por 100.000 em mulheres e de 2,25 por 100.000 em homens quando relacionado à AN. Em relação à BN, relata-se também uma maior incidência em relação às mulheres, com estimativa de 28,8 em mulheres e 0,8 em homens (NUNES et al, 2006). Essa incidência de fato existe devido a um nítido contraste entre a supervalorização da magreza, das dietas restritivas e do destaque dado pela mídia de imagens de modelos magérrimas, além da grande disponibilidade de comidas baratas, calóricas e palatáveis. A idealização da magreza afeta muito mais as mulheres do que os homens, como demonstra o estudo acima; para a maioria delas esse padrão de beleza significa possuir autocontrole, competência e atratividade sexual. Portanto, essa pressão social relacionada à magreza apresentada pela mídia facilita a criação de um ambiente psicológico favorável ao desenvolvimento dos TA quando a pessoa apresenta vulnerabilidades, tais como baixa auto-estima, 18 perfeccionismo, traços obsessivo-compulsivos, entre outros. Em acordo com este fato, Vilela et al. (2004), relatam que o papel da nossa cultura, valorizando mulheres com corpos delgados, está ligado ao aumento da ocorrência desses distúrbios, relevando dessa forma a importância dos fatores culturais, especialmente o culto à magreza, no desenvolvimento dessas patologias. Além da mídia, a influência de familiares e amigos também é considerada de grande valia, tanto no desencadeamento quanto na perpetuação dos sintomas alimentares. De acordo com estudos realizados por Polivy & Herman (2002 apud GALVÃO et al. 2006b), a opinião da família e de amigos sobre esses jovens tem maior impacto do que o da mídia. A opinião da família, principalmente a da mãe, possui grande significado na formação da opinião dos filhos em relação a aparência, peso e forma do corpo. Galvão et al (2006b), salienta que estudos do padrão temporal do desenvolvimento de sintomas de AN e BN mostram que em média 50% dos pacientes com anorexia desenvolvem bulimia e, entre os pacientes bulímicos, cerca de 30% apresentam história de AN e outros 30%, história de obesidade. 3.3 ETIOLOGIA Os TA são determinados por fatores diversos que interagem entre si de maneira complexa, para produzir e, na maioria das vezes perpetuar a doença. Como já dito anteriormente, podem-se distinguir três fatores: os predisponentes, os precipitantes e os mantenedores do TA. Morgan e Claudino (2005), acreditam que os fatores predisponentes são aqueles que caracterizam o aparecimento da patologia pela exposição do indivíduo aos fatores de risco que aumentam as possibilidades de aparecimento da mesma; os fatores precipitantes, por sua vez, se caracterizam pela ocorrência de fatores que precipitam a doença, marcando, então, o aparecimento dos sintomas alimentares; e, os fatores mantenedores são responsáveis por determinar a perpetuação do transtorno. Diante desses três fatores principais, será feita um aprofundamento de cada um deles, na tentativa de buscar uma melhor compreensão dos aspectos mais relevantes. 19 • Fatores Predisponentes Os fatores predisponentes, de acordo com Morgan e Claudino (2005), surgem antes do aparecimento dos TA e deixam o indivíduo predisposto ao seu aparecimento. Até o momento, pouco se sabe sobre os fatores de risco para o desenvolvimento do TCAP, no entanto, de maneira geral, os fatores de risco para se desenvolver os TA dividem-se em três aspectos: os pessoais, os familiares e os socioculturais. O fator de caráter pessoal engloba características hereditárias, de personalidade, tendência à obesidade e experiências traumáticas na infância. Estudos realizados no ano de 2000 por Bulik et al. mostraram que a BN é resultante de uma ação genética aditiva, com uma hereditariedade estimada de aproximadamente 50% dos casos, nesse transtorno. Há também evidências de transmissão familiar comum entre TA e outros transtornos de comportamento, como por exemplo, na BN encontram-se influências genéticas comuns com o Transtorno do Pânico e Fobias, e no caso a AN encontram-se influências genéticas comuns com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (SILVA, 2005; MORGAN e CLAUDINO, 2005). Morgan & Claudino (2005), ainda relatam que os TA são mais comuns entre parentes de 1º grau que possuem a patologia do que entre parentes de 1º grau considerados saudáveis. Quando relacionado às características da personalidade, características como perfeccionismo, obsessividade, introversão, passividade e auto-avaliação negativa são bastante comuns entre pacientes portadores de AN, principalmente na AN restritiva. Os pacientes com BN costumam apresentar impulsividade e instabilidade afetiva. A baixa auto-estima e a maior suscetibilidade ao estresse são características de personalidade comuns entre AN, BN e TCAP e representam fatores de risco para as três entidades nosológicas (SILVA, 2005; MORGAN e CLAUDINO, 2005). A tendência à obesidade é citada como um fator de risco, pois as pessoas vulneráveis a isso tendem a fazer mais dietas em decorrência de serem normalmente submetidas a freqüentes brincadeiras depreciativas, relacionadas aos seus respectivos pesos, que acabam trazendo-lhes efeitos negativos na auto-estima, na formação de imagem corporal, além de aumentarem a pressão social para a perda de peso. Alguns estudos de caso mostram que pacientes que estão 20 suscetíveis a essas situações podem desenvolver BN ou TCAP (SILVA, 2005; MORGAN e CLAUDINO, 2005). Silva (2005) ainda salienta que os eventos traumáticos ocorridos na infância aumentam a vulnerabilidade aos transtornos de comportamento em geral. Logo, pode ser considerado como um fator de risco principalmente para a BN e TCAP, e, em menor grau, para a AN. Os fatores predisponentes de caráter familiar envolvem os padrões desfavoráveis e precoces na relação entre mãe e filho, além da postura dos pais diante de certos valores, como forma física, controle alimentar dos filhos, atividades físicas e rigidez educacional, que influenciam na origem dos sintomas alimentares (SILVA, 2005). Em relação aos fatores socioculturais, acredita-se que eles são os que mais têm influenciado nos últimos tempos, devido a isso ele será amplamente abordado para uma melhor compreensão. De acordo com Stice (2002 apud SAIKALI et al. 2004), há evidências que suportam a idéia de que a mídia ajuda a promover os distúrbios de imagem corporal e alimentar. Algumas análises estabelecem que modelos, atrizes e ícones femininos, vêm se tornando cada vez mais magras ao longo dos anos. Pessoas com TA sentem uma demasiada pressão vinda da mídia, pressão a qual exige um corpo magro e esbelto, logo, essas pessoas relatam terem aprendido técnicas nãosaudáveis de controle de peso, como dietas drásticas, indução de vômitos, etc., através desse veículo. A AN distribuí-se entre as diferentes culturas, tendo manifestado aumento da incidência em mulheres jovens ao longo do século XX, com possível estabilização nas ultimas três décadas (HOEK, 2006 apud FREITAS et al., 2007). Por sua vez, a BN vem aumentando sua incidência tanto em regiões ocidentalizadas quanto em regiões em fase de desenvolvimento sociocultural (SCHMIDT, 2003 apud FREITAS et al., 2007). Pode ser estimado que, no mínimo, 10% das mulheres jovens apresentam algum quadro de TA. Estes, por sua vez, geram grandes prejuízos às saúdes física e psicológica, tendo a AN a mais alta taxa de mortalidade entre as doenças psiquiátricas (5% por década, em média) (HOEK, 2006 apud FREITAS et al., 2007). Outro aspecto com grande relevância, retrata os prejuízos socioeconômicos ainda pouco conhecidos. Considerando-se a faixa etária mais freqüentemente 21 acometida nos deparamos com adolescentes que tem de adiar ou até mesmo interromper seus projetos de vida, seja pelo TA em si, seja pelas freqüentes complicações clínicas ou co-morbidades psiquiátricas prevalentes nessa população. A literatura sugere que os custos sociais e de saúde tidos com os TA podem ser superiores àqueles gastos com graves doenças psiquiátricas como a Esquizofrenia e o Transtorno de Humor Bipolar (SCHMIDT, 2003 apud FREITAS et al., 2007). Uma pesquisa etiológica na área, realizada por Schmidt (2003), permite-nos dizer que nos encontramos diante de patologias multifatoriais. Os avanços biotécnológicos informam que a genética pode contribuir com aproximadamente 30% a 80% do risco de se desenvolver tais patologias, como já foi dito anteriormente, porém os achados de aumento de incidência desses transtornos nos últimos 40 a 50 anos nos fazem refletir sobre o impacto que as mudanças socioculturais exercem e sua contribuição como fatores desencadeantes e de manutenção (FREITAS et al., 2007). Os valores culturais impostos ao peso e à forma corporal podem de fato estimular o início e a manutenção de dietas restritivas para perda de peso. Essas dietas são responsáveis em grande parte por desencadear padrões e comportamentos alimentares alterados, como compulsões alimentares e a utilização de métodos inadequados de controle de peso. Em alguns grupos ocupacionais, como bailarinas, modelos e esportistas, o baixo peso corporal é percebido como um dos principais responsáveis para se atingir o sucesso profissional. Dessa forma esses profissionais encontram-se em risco aumentado para o desenvolvimento do TA (HOEK et al, 2003 apud FREITAS et al., 2007). Embora não se possa apontar a indústria da moda como “culpada” pelo desenvolvimento do TA, acredita-se que determinadas exigências nessa área favorecem a instalação tanto de padrões alterados de comportamento alimentar como de quadros completos dos TA (FREITAS et al, 2007), pois a beleza sintética e de consumo passaram a ser eficazmente administradas por normas econômicas e pela mídia de massa, as quais são responsáveis por determinar o que é belo e qual é o padrão estético de beleza, principalmente, a feminina (SILVA, 2005). Atualmente nos deparamos com um processo de globalização da beleza, da padronização das formas; vivemos mergulhados em um ideal de “beleza magra”, que carrega diversos significados simbólicos, como sucesso, felicidade e poder. Devido a esse fato, somos bombardeados com imagens de corpos considerados 22 perfeitos e confrontados com a redução dos manequins pelas confecções, nos quais precisamos caber como numa fôrma corporal. Ao buscarmos uma identificação com os modelos padronizados e inatingíveis de beleza, acabamos por nos afastar da nossa própria identidade, resultado de uma bela miscigenação que necessita ser respeitada e valorizada (FREITAS et al., 2007). Para complementar o que foi citado acima, Silva (2005) salienta que a maneira como os extremos da busca de um corpo considerado perfeito podem transformar sofrimentos humanos em espetáculos televisivos, como no caso de alguns reality shows, os quais começam a se interessar pelos “defeitos” que as pessoas possam ver em seus corpos e, então, se propõem a ajudá-las na realização de uma transformação radical, proporcionando tratamentos, dietas, ginástica, personal trainers, cabeleireiros, aulas de moda e etiqueta, maquiadores e cirurgias plásticas. E no fim de todo esse processo doloroso mostram-se as reações de surpresa e fascínio diante das imagens paralelas e simultâneas do “antes” e do “depois”. Devido a esse tipo de acontecimento pode-se observar que homens e mulheres, apesar de livres, parecem condenados a uma incessante repetição de um padrão de robotização de seus corpos, os quais acabam por distorcer seus pensamentos e aprisionar a sua capacidade de auto-reflexão, seguindo um modelo que carece de sentido e prazer e que, freqüentemente, utilizam-no como uma forma de proteção diante das situações de perigo e desamparo. • Fatores Precipitantes Dentre os fatores precipitantes, destacam-se as dietas e os fatores estressantes. Segundo Morgan e Claudino (2005), as dietas feitas para a perda de peso são o fator precipitante mais freqüente dos TA, mas ela por si só não é suficiente para gerar o TA, sendo necessário que a mesma interaja com outros fatores de risco. Silva (2005) reafirma relatando que alguns estudos realizados com pessoas portadoras de TA demonstram que seguir dietas aumenta consideravelmente o risco de vir a desenvolver algum tipo de transtorno relacionado à alimentação. Sobre os fatores estressantes, Silva (2005) e Morgan e Claudino (2005) acreditam que episódios vitais relacionados a mudanças, transições, que de alguma forma ameaçam a integridade física de uma pessoa, costumam anteceder 23 freqüentemente os TA, especialmente a BN, e podem adquirir função desencadeadora, pois realimentam sentimentos de insegurança, inadequação e baixa auto-estima. O tamanho do impacto desses fatores em uma pessoa é determinado por recursos prévios que o indivíduo possui como o suporte familiar e social a que ela dispõe para enfrentar as situações de estresse ocorridas. • Fatores Mantenedores Esses fatores originam-se a partir de alterações fisiológicas e psicológicas causadas pela desnutrição, no caso da AN, e por constantes episódios de compulsão alimentar e purgação, como no caso da BN, que propiciam a perpetuação do transtorno. Pode-se dizer que a privação alimentar é um dos principais aspectos responsáveis no desencadeamento de episódios de compulsão alimentar e também na ocorrência de pensamentos obsessivos sobre a comida, que acabam reforçando a necessidade inicial de controle, desenvolvendo então um círculo vicioso causador de muito sofrimento (SILVA, 2005; SAPOZNIK et al., 2005a). Nos casos de AN nota-se algumas alterações de níveis sangüíneos de substâncias como o cortisol, o CRH (hormônio responsável pela liberação do cortisol) e a leptina. Essas alterações provocadas pela enorme perda de peso podem vir a favorecer a manutenção de sintomas como a recusa alimentar, perda de libido, irritabilidade, inquietação e dificuldade em recuperar e manter o peso ideal. Nos casos de BN e TCAP, os episódios de consumo excessivo de alimentos podem vir a alterar o metabolismo da glicose e da insulina, seguidos de um aumento significativo da glicemia quando o indivíduo está em jejum e da resposta à insulina, o que favorece que esses indivíduos utilizem o jejum prolongado como uma forma de compensação alimentar, com isso, ao passar do tempo, o ciclo de novos episódios bulímicos é reforçado (SILVA, 2005; MORGAN e CLAUDINO, 2005). Os mesmos autores ainda concordam que os fatores psicológicos desenvolvidos em uma dinâmica familiar podem dificultar a melhora do TA, pois os pacientes, especialmente os anoréxicos, se sentem vitoriosos quando conseguem perder e manter o seu próprio peso, e esse “êxito” tão valorizado em nossa cultura atual, pode funcionar como uma forma de troféu raro e supervalorizado para 24 pessoas que dividem seu dia-a-dia com sentimentos de desvalorização, insegurança e sensação total de controlar sua própria vida. 3.4 TRANSTORNOS ALIMENTARES 3.4.1 Anorexia Nervosa (AN) O termo anorexia, deriva do grego orexis (apetite) acrescido do prefixo an (privação, ausência), este termo, o qual significa perda de apetite de origem nervosa, não é considerado como a expressão mais adequada, pelo fato de que, ao menos no início do quadro, existe uma luta ativa contra a fome (NUNES et al., 1998), pois não existe uma falta de apetite real e sim um controle alimentar rígido e auto-imposto devido ao medo extremo de engordar. Desta forma pode-se observar na evolução clínica que esses pacientes, de fato, só perdem o apetite depois que se encontram em estado de caquexia física (emagrecimento extremo) (SILVA, 2005). Este transtorno caracteriza-se, essencialmente, por uma perturbação significativa na percepção da forma ou do tamanho do corpo e, também, de um temor intenso de se ganhar peso, este último já dito anteriormente. Segundo Claudino e Borges (2005), estas características representam o aspecto psicopatológico central da anorexia. Além disso, segundo Claudino e Borges (2007), a AN envolve uma disfunção hormonal identificada pela amenorréia, ou seja, ausência da menstruação (em mulheres que se encontram na fase pós-menarca), e perda do interesse e potência sexual (em homens). No entanto, segundo Claudino e Borges (2005) a amenorréia corre risco de exclusão dos critérios diagnósticos da AN devido ao fator de que 20 a 30% das pacientes apresentam amenorréia antes de ter uma perda significativa de peso e assim podem permanecer até a sua plena recuperação. Outro fator aponta para o fato de que até 30% das pacientes podem vir a apresentar o quadro completo da AN sem amenorréia, e o último fator se refere a uma inexistência de um critério paralelo para homens. Porém, apesar de todos esses fatores, a permanência desse critério justifica-se por ajudar a distinção de mulheres com AN de mulheres normais com baixo peso, evidenciando a disfunção 25 hipotalâmica e deixando em alerta os potenciais de seqüela (osteoporose e infertilidade). Cordás (2004) também caracteriza a AN por perda de peso intensa e intencional devido à adoção de dietas extremamente rígidas com uma busca desenfreada pela magreza, baseada em uma distorção grosseira da imagem corporal e com alterações do ciclo menstrual em mulheres. Vilela et al. (2004) relata que a AN é uma doença que leva à inanição e que possui como uma de suas principais características a excessiva perda de peso (auto-imposta) e um grande desgaste físico e psicológico. Devido a uma distorção da imagem corporal, os indivíduos com AN não se percebem magros, mas sempre gordos e, então, continuam a restringir suas refeições em forma de ritual. Pacientes que se encontram em período pré-púbere podem ter atraso na maturação sexual, no desenvolvimento físico e no crescimento, além disso, não atingem a estatura esperada. A AN possui sérias complicações associadas à desnutrição, tais como comprometimento cardiovascular, desidratação, distúrbios na motilidade gastrointestinal (capacidade de fazer movimentos espontâneos no estômago e no intestino), infertilidade, hipotermia (diminuição da temperatura corporal), entre outras evidências do hipometabolismo. Os comportamentos anoréxicos dirigidos a diminuir o ganho energético ou aumentar o seu gasto não são uniformes, ou seja, há diferenças no padrão alimentar e nos métodos utilizados por essas pessoas portadoras deste transtorno para alcançar a perda de peso ou evitar o ganho do mesmo. Sendo assim, alguns pacientes conseguem perder peso por meio de uma rígida restrição alimentar e, na maioria das vezes, com atividade física intensa e excessiva. Outros, de acordo com Beaumont (1995 apud GALVÃO et al., 2006a), além de controlar a dieta, também induzem vômitos, tomam purgantes, fazem uso freqüente de diuréticos ou de drogas anorexígenas (drogas feitas à base de anfetaminas que inibem o apetite e provocam vários efeitos colaterais), hormônios tireoidianos ou outras substâncias. Conforme o peso real diminui, maior se torna a preocupação com o ganho de peso ponderal, ou seja, o indivíduo nunca se sente satisfeito com seu peso e sua forma corporal. Alguns até chegam a se sentirem magros, mas desenvolvem uma preocupação excessiva com algumas partes de seu corpo, como abdômen, nádegas e coxas (EBERT et al., 2002). Essas preocupações excessivas com partes do corpo caracterizam aspectos fenomenológicos mais evidentes como o negativismo, a 26 irritabilidade e principalmente, a distorção da imagem corporal (GORGATI e AMIGO, 2005). A auto-estima dos pacientes com essa patologia depende extremamente da sua forma e peso corporais, e a partir dessa obsessão pelo tamanho do corpo esses pacientes passam a se pesar excessivamente, medem constantemente as partes de seu corpo e, persistentemente, usam o espelho para a verificação das áreas percebidas como “gordas”. A perda de peso é percebida como uma grande conquista e como sinal de autodisciplina, e conseqüentemente, o ganho de peso é percebido como um grande fracasso do autocontrole (EBERT et al., 2002). A AN se desenvolve, principalmente, em pessoas com idade entre 10 e 30 anos, sendo a faixa etária dos 12 aos 16 anos do sexo feminino a mais acometida na prática clínica. A taxa de mortalidade na AN é altíssima, estudos apontam uma ocorrência entre 4 e 30% dos casos, levando-se em consideração a idade de início do quadro, a precocidade do diagnóstico e o tratamento instituído a cada paciente acometido (SILVA, 2005). Silva (2005) ainda relata que na maioria absoluta dos casos, os familiares só constatam a perda de peso das pacientes após muito tempo do início do quadro. Isso ocorre em decorrência do fato de que as pacientes evitam ingerir suas meras quantidades de comida perto deles ou em locais públicos, e quando o fazem, levam horas para terminar um simples almoço à base de folhas, mantendo os alimentos na boca por vários minutos sem serem mastigados. Apesar de recusarem a alimentação, os pacientes anoréxicos geralmente desenvolvem extrema preocupação com a alimentação de seus familiares, pois procuram orientá-los, de forma obsessiva, sobre o valor calórico de cada alimento e a adequação às necessidades diárias de consumo de cada um deles. Ainda sob a mesma perspectiva pode-se citar que os pacientes portadores de anorexia não procuram tratamento de forma espontânea, pois para eles a doença não é um problema e sim uma solução para suas insatisfações físicas, ou seja, manter-se abaixo do peso considerado normal para determinada idade e altura é considerado como uma prova de sucesso em meio a tantas dúvidas sobre as reais capacidades. A AN divide-se em dois subtipos: a AN restritiva, que são aquelas que reduzem e controlam seu peso pela restrição alimentar baseada em alimentos de baixas calorias e/ou pelo excesso de atividades físicas, e a AN bulímica/purgativa, 27 que são aquelas que após ingerirem quantidades significativas de alimentos, induzem o vômito, fazem o uso de laxantes, diuréticos e moderadores de apetite para eliminar e/ou controlar seu peso (SILVA, 2005). Pacientes com AN sem sintomas bulímicos revelam, com freqüência, estilos de personalidade marcados por rigidez, controle excessivo e perfeccionismo (GALVÃO et al., 2006b). Segundo Claudino e Borges (2005), pacientes com AN do tipo bulímico apresentam mais comportamentos impulsivos como abuso de substâncias, automutilação e tentativas de suicídio; tipos de personalidade mais impulsivas, como bordeline, narcísica e anti-social; e mais antecedentes de obesidade pessoal e familiar. Os dois subtipos de AN são norteados pelo grandioso medo de ganhar peso. Para controlarem a situação, costumam aceitar alimentos oferecidos pelos pais, porém escondem-nos embaixo da cama, em fronhas de travesseiros, em mochilas ou bolsas, etc. Perdem a autopercepção do próprio corpo considerando-se acima do peso mesmo que todas as evidências enquadrem-nas como extremamente magras ou caquéticas (SILVA, 2005). De acordo com a mesma autora citada acima, os pacientes anoréxicos, principalmente os de tipo restritivo, estabelecem pesos ideais muito além dos necessários para satisfazer os padrões mínimos de saúde, e para conseguirem alcançá-los se submetem a rituais alimentares rígidos e agressivos. Os rituais alimentares mais significativos em termos comportamentais são: obrigar os familiares a não comerem enquanto os pacientes estiverem em casa, comer sozinhos, horários rígidos de refeições, utilizar apenas alimentos cortados em pequenos pedaços e bem espalhados pelo prato, verificar se não há algum alimento considerado como proibido entre os alimentos de seu prato e retirar do mesmo as substâncias consideradas com alto teor calórico. Nos pacientes de tipo bulímico/purgativo nota-se a alternação de jejuns prolongados com episódios de compulsão alimentar seguidos de métodos compensatórios. Para Galvão et al. (2006b) Transtornos de Humor, de Ansiedade e ObsessivoCompulsivo na infância e a presença de traços perfeccionistas de personalidade, aparentemente são fatores de vulnerabilidade para o desenvolvimento dos TA. Os pacientes com AN tipo restritivo apresentam freqüentes traços de ansiedade, perfeccionismo, obsessividade e introversão. Estudos com pacientes com AN tipo 28 purgativo sugerem que o estilo de personalidade desses indivíduos é mais semelhante ao de pacientes bulímicos com peso normal do que ao de pacientes com AN tipo restritivo. Os traços perfeccionistas, segundo Gorgati e Amigo (2005), podem ser avaliados através da rigidez, dos padrões irreais de sucesso e esforço para alcançálos, das falhas na conquista desses objetivos, vividas como falhas pessoais, e através da falta de habilidade para assumir os riscos necessários da maturidade e das relações sociais. Silva (2005) e Gorgati e Amigo (2005), citam algumas características aparentes em pacientes com AN tais como pele amarelada e seca, cabelos finos e quebradiços e, até mesmo, leve alopecia (perda temporária ou definitiva, senil ou prematura, de pêlos e cabelos). Essas características propiciam ao paciente uma aparência envelhecida. Os pacientes com AN do tipo bulímico costumam a apresentar erosão do esmalte dentário e “calosidades” no dorso das mãos, provocados pela indução de vômito, essas últimas características também podem ser observadas em pacientes com BN, que será apresentado mais adiante. 3.4.1.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR Para facilitar a identificação da anorexia nervosa, o DSM-IV-TR (APA, 2002) descreve quatro critérios diagnósticos principais: A – Recusa a manter o peso corporal em um nível igual ou acima do mínimo normal adequado à idade e à altura (p. ex., perda de peso levando à manutenção do peso corporal abaixo de 85% do esperado; ou incapacidade de atingir o peso esperado durante o período de crescimento, levando a um peso corporal menos que 85% do esperado). B – Medo intenso de ganhar peso ou de engordar, mesmo estando com peso abaixo do normal. C – Perturbação no modo de vivenciar o peso ou a forma do corpo, influência indevida do peso ou da forma do corpo sobre a auto-avaliação, ou negação do baixo peso corporal atual. 29 D – Nas mulheres pós-menarca, amenorréia, isto é, ausência de pelo menos três ciclos menstruais consecutivos. (Considera-se que uma mulher tem amenorréia se seus períodos ocorrem apenas após a administração de hormônio, p. ex., estrógeno). Especificar tipo: Tipo Restritivo: durante o episódio atual de Anorexia Nervosa, o indivíduo não se envolveu regularmente em um comportamento de comer compulsivamente ou de purgação (i. é, indução de vômito ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas). Tipo Compulsão Periódica/Purgativo: durante o episódio de Anorexia Nervosa, o indivíduo envolveu-se regularmente em um comportamento de comer compulsivamente ou de purgação (i., é, indução de vômito ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas). 3.4.1.2 Formas de Tratamento a) Tratamento Farmacológico Segundo o relato de Claudino (2005) e Appolinario et al. (2006), a farmacoterapia na AN se divide em duas fases: a aguda e a de manutenção. Na primeira fase, o uso de medicamentos tem como objetivo favorecer a recuperação de peso e a redução dos sintomas nucleares da AN, tais como fobia de peso, distorção de imagem corporal, preocupação obsessiva com a comida, comportamentos compulsivos (exercícios físicos excessivos, contagem calórica, rituais alimentares) e sintomas bulímicos. Nessa mesma fase também se contempla o tratamento da sintomatologia associada: ansiosa, obsessiva e depressiva. Na segunda fase, a de manutenção, o principal alvo é evitar recaídas com piora dos sintomas nucleares e diminuição do peso corporal. De acordo com Nunes e Ávila (2006), o uso de psicofármacos no tratamento da AN, agem como coadjuvantes no tratamento e são utilizados quando nos deparamos com sintomas ou transtornos psiquiátricos em co-morbidade. 30 • Antidepressivos Claudino (2005) salienta que os antidepressivos tem sido explorados no tratamento da AN. Estes freqüentemente desenvolvem sintomas depressivos, ansiosos, obsessivos e bulímicos. Existe também a identificação de disfunção serotoninérgica na AN e em outros transtornos psiquiátricos, os quais são identificados mais adiante como co-morbidades, nos quais comprovou-se a eficácia de agentes serononinérgicos, e ganho de peso favorecido pelo uso de algumas drogas antidepressivas. Pode-se considerar que, como algumas dessas drogas antidepressivas podem levar ao ganho de peso, como dito anteriormente, elas poderiam ser úteis como auxiliares na terapêutica de ganho de peso. Os agentes mais estudados são os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), fluoxetina, citalopram e sertralina. De maneira geral, estudos abertos sugerem que esses agentes são bemtolerados e têm um efeito positivo na recuperação e manutenção de peso, além de melhorarem o humor (APPOLINARIO et al., 2006). Sapoznik et al. (2005b), complementa afirmando que os inibidores seletivos de recaptação de serotonina são os medicamentos mais utilizados, principalmente quando são associados aos sintomas depressivos, ou do espectro do Transtorno Obsessivo-Compulsivo. • Antipsicóticos O uso de antipsicóticos no tratamento da AN envolve a idéia de eles poderem atuar nas distorções de imagem corporal e também o potencial uso terapêutico do ganho de peso induzido por esses agentes (CLAUDINO, 2005). Estudos realizados até o momento, testaram a risperidona e a olanzapina; estes mostraram resultados positivos em relação ao ganho de peso e alguns sintomas nucleares da AN, como o medo mórbido de engordar e as distorções de imagem corporal (POWERS; SANTANA, 2004 apud APPOLINARIO et al., 2006). Em uma pesquisa realizada pelos mesmos pesquisadores, Powers e Santana, no ano de 2002, estudou-se o uso da olanzapina em pacientes com AN e descreveu os resultados favoráveis em relação ao peso corporal, sintomas anoréxicos e melhora clínica global, com efeitos adversos mínimos (APPOLINARIO et al., 2006). Em outro estudo realizado por Mondraty et al (2005 apud APPOLINARIO et al., 2006), foi 31 possível demonstrar a eficácia da olanzapina nos sintomas de ruminações anoréxicas, considerados também como um sintoma nuclear da AN. Claudino (2005) salienta que os principais efeitos colaterais dos antipsicóticos são tonturas, ganho de peso e sedação. • Orexígenos O uso desses agentes no tratamento da AN tem por base a sua ação sobre o apetite e o peso corporal. A ciproeptadina, substância testada desse grupo, é um agente antagonista serotoninérgico, com leves efeitos anticolinérgicos e antihistamínicos. Apesar de ter apresentado uma boa tolerância, essa substância tem sido pouco utilizada na prática clínica do transtorno em questão (APPOLINARIO et al., 2006). • Outros Agentes Agentes como naltrexona, tetraidrocanabinol, clonidina e hormônio de crescimento (GH), foram estudados na AN, mas não houve apoio para efeitos positivos (CLAUDINO, 2005; ZWAAN; ROERIG, 2003 apud APPOLINARIO et al., 2006). • Orientações para Uso de Medicamentos no Tratamento da AN O uso de medicamentos no tratamento de indivíduos com AN deve ser individualizado e ter como base os sintomas psicopatológicos do paciente. Dessa forma, os agentes antidepressivos podem ser utilizados visando à redução de sintomas depressivos e obsessivos associados. Dentre os antidepressivos, os inibidores seletivos de recaptação de serotonina apresentam um perfil de efeitos adversos mais seguro na população de pacientes deprimidos. A medicação deve ser iniciada de forma gradual, buscando de certa forma doses semelhantes às utilizadas para depressão. Deve-se considerar o uso da fluoxetina em pacientes com AN do tipo bulímico, mas por sua vez em doses mais elevadas que as usuais para depressão (60 mg/dia, se tolerada) (APPOLINARIO et al., 2006). Ainda sob a mesma perspectiva, os inibidores seletivos de recaptação de serotonina podem ser utilizados para a prevenção de recaídas. Desta forma sugere- 32 se a utilização durante o primeiro ano pós-recuperação de peso. É necessário ter o cuidado com o uso abusivo desses agentes pelos pacientes anoréxicos com a finalidade de tentar controlar o apetite. Appolinario et al. (2006) relatam que os antipsicóticos normalmente são receitados para pacientes que apresentam alta resistência, agitação, com graves distorções de auto-imagem ou com outros sintomas com características psicóticas. É importante ressaltar o fato de que os pacientes apresentam muita resistência frente a aceitação do uso de antipsicóticos atípicos devido ao acesso de informações sobre o ganho de peso associado a esses agentes. Alguns agentes ansiolíticos também são utilizados durante a fase inicial do tratamento, ou seja, na fase de reabilitação nutricional, principalmente naqueles pacientes que apesar de demonstrarem colaboração diante do tratamento encontram enormes dificuldades diante do aumento de ansiedade durante as refeições e nos momentos antecedentes a esta (APPOLINARIO et al., 2006). É necessário atentar para a negligência dos pacientes diante do uso de medicamentos por apresentarem resistência ao tratamento. Em pacientes que apresentam sintomas purgativos, deve-se ter o cuidado de ministrar os medicamentos em horários distantes das refeições em que costumam purgar. Devido as mudanças na composição de proteínas e gorduras corporais, deve-se atentar aos maiores riscos de efeitos colaterais e toxicidade, dessa forma recomenda-se todo cuidado no uso de medicamentos nesses pacientes (APPOLINARIO et al., 2006). b) Tratamento Hospitalar O processo de recuperação da AN normalmente se dá após alguns anos de tratamento. Ainda não foi estabelecido qual é a melhor combinação adequada de tipos de intervenção para as diferentes fases da doença e qual o tempo necessário para o tratamento, ou seja, ainda não foi definido qual o melhor setting (NUNES e ÁVILA, 2006). De acordo com Silva (2005), uma das primeiras dificuldades com as quais nos deparamos no caso da AN é se o paciente deve ou não ser internado. Geralmente, 33 esses pacientes são levados a se tratarem por se encontrarem em condições físicas muito precárias. Dessa forma, a hospitalização torna-se uma condição terapêutica que possui a finalidade de reduzir os riscos de letalidade os quais esses pacientes estão expostos. Os pacientes que geralmente necessitam de hospitalização são os mais sintomáticos, seja pelo surgimento de complicações médicas ou psiquiátricas graves, ou pela gravidade de sintomas ligados à AN. O tratamento hospitalar deve contar com uma boa equipe de enfermagem disponível para poder levar o paciente ao aumento de peso. Este tipo de tratamento deve ser indicado em casos específicos e no momento que a equipe multidisciplinar considerar que o paciente necessita de um enfoque mais rígido e abrangente em relação ao seu comportamento alimentar. É necessário ter conhecimento de que caso a internação não seja bem-indicada, essa forma de tratamento pode se tornar ineficaz e as reincidências se tornarem freqüentes (NUNES e ÁVILA, 2006). De acordo com as autoras citadas acima, para que ocorra a reposição do peso corporal, é de fundamental importância a inclusão dos familiares no tratamento, estabelecendo dessa forma uma aliança terapêutica e junto desta, ajudar o paciente a evitar a negação de seus sintomas. Em decorrência desta realidade, as equipes responsáveis pela intervenção e tratamento deste transtorno têm feito de tudo para oferecer aos pacientes diversas alternativas de tratamento que incluem internações hospitalares com uma equipe multidisciplinar de apoio, internação parcial na forma de hospital-dia e, também, internações domiciliares. Devido aos altos custos de uma hospitalização, o hospital-dia tem sido considerado como uma alternativa importante para a diminuição de gastos. A hospitalização geralmente ocorre em virtude de situações emergenciais, tais como restauração do peso corporal e co-morbidades médicas ou psiquiátricas, como diabetes, auto-agressão, depressão, sintomas obsessivos graves ou purgação excessiva. Somente caso o tratamento ambulatorial não seja efetivo, a hospitalização torna-se necessária. Sapoznik et al. (2005b) acredita que a forma de tratamento hospital-dia é geralmente indicado em casos onde os pacientes já foram tratados sob esquema de internação, e quando os mesmos apresentam baixo risco de auto-agressão, apresentam impossibilidade ou incapacidade de auto-cuidado e demonstram ausência de doenças clínicas agudas. No entanto, na prática esta forma de tratamento é indicado para aqueles pacientes que não responderam ao tratamento 34 ambulatorial e estão interessados e motivados pela proposta terapêutica, além de concordarem com as abordagens grupais de tratamento. No ano de 1990, Flaherty (apud SILVA 2005), descreveu três critérios que deveriam ser levados em conta para determinar se há ou não a necessidade de internação do paciente. Seriam eles: a perda de peso rápida e maior que 30% ao longo de seis meses, a severa perda de energia (vista a partir da execução de tarefas diárias) e hipocalemia (baixa de potássio no sangue). Seguindo a idéia de Flaherty, a Associação Psiquiátrica Americana (APA) publicou no ano de 2000 o Guia Prático Para o Tratamento dos TA, o qual tem o intuito de uniformizar e padronizar os procedimentos terapêuticos nesta área. Serão citadas abaixo algumas recomendações que podem ser utilizadas como critérios indicativos para a hospitalização de pacientes portadores de AN (Sapoznik et al., 2005b; Nunes e Ávila, 2006): • Pacientes que não estejam altamente motivados para o tratamento ambulatorial; • Pacientes apresentando uma perda rápida e contínua de peso; • Peso corporal menor que 75% do peso mínimo esperado para a idade e altura; • Índice de Massa Corporal (IMC) abaixo da faixa de 13 a 14 kg/altura²; • Pacientes com instabilidade metabólica importante (principalmente em certos grupos, como crianças e adolescentes, em vista de repercussões dessas alterações para o desenvolvimento): hipotensão arterial grave, bradicardia, hipoglicemia e hipopotassemia; • Rede de suporte social instável ou fraca; • Necessidade de monitorização estreita das condições clínicas do paciente: disfunção cardíaca, renal ou hepática, sintomas de desidratação e desnutrição graves. As autoras Nunes e Ávila (2006), propõem outras condições nas quais a internação também deveria ser considerada: • Necessidade de interromper comportamentos inadequados, tais como vômitos e episódios de compulsão alimentar periódica, que, pela freqüência e/ou duração, podem levar a sérias complicações clínicas; • Para uma avaliação diagnóstica mais adequada; 35 • Para o tratamento das complicações psiquiátricas associadas, como o risco elevado de suicídio e a auto-agressão, com ideação e planos de suicídio evidentes; • Para confrontar o paciente com sua negação da doença; • Como forma de prepará-lo para um futuro tratamento ambulatorial. “A perda de peso exagerada, principalmente de forma aguda, em geral é acompanhada por sinais de desnutrição: bradicardia, hipotensão, extremidades frias e dificuldades de memória e concentração. É consenso que o IMC igual ou menor que 13,5 representa um importante sinal de gravidade do caso. A manutenção do baixo peso corporal prejudica ou até inviabiliza qualquer abordagem psicoterápica proposta. A dieta seletiva dos pacientes anoréxicos não é tão preocupante quanto o abuso de laxantes ou a freqüência dos vômitos. Tais comportamentos podem levar o paciente a distúrbios hidreletrolíticos importantes. O distúrbio eletrolítico desenvolve-se, na maioria das vezes, de forma gradual, de modo que não exige necessariamente hospitalização. Sem dúvida, é nesses momentos que a presença de uma equipe médica familiarizada com o tratamento dos TA se impõe”. (NUNES e ÁVILA, 2006, p. 185). Quando a hospitalização integral ou parcial é usada de maneira consciente e afetiva, ela proporciona ao paciente um ambiente seguro o qual permite que o mesmo restabeleça seu equilíbrio emocional e sua capacidade de lidar com o ambiente externo. Para o êxito da hospitalização é preciso que a família e o paciente aceitem essa intervenção como um meio para se buscar o bem-estar de todos (NUNES e ÁVILA, 2006). Ainda seguindo as autoras citadas acima, a instituição hospitalar deve contar com uma equipe multidisciplinar, composta por psicólogos, nutricionistas, psiquiatras, enfermeiros, clínicos e terapeutas ocupacionais, os quais necessitam ter mais coesão de idéias do que qualquer saber específico sobre um tratamento. A ênfase nos aspectos psicológicos torna necessário o treinamento da equipe em métodos de treinamento psiquiátrico e psicológico em decorrência da compreensão do TA como uma doença psiquiátrica. De acordo com Nunes e Ávila (2006), não é possível especificar um tempo exato em relação à duração da internação, e ainda citam que: “Para pacientes mais crônicos, as internações costumam ser mais breves, apenas corrigindo as reagudizações. Pacientes que ganham peso rapidamente, com o único objetivo de ter alta hospitalar, tendem a ter recaídas e resistir a reinternações. Ao contrário, pacientes que recebem alta após adquirir um peso normal costumam ter um prognóstico melhor” (p. 186). 36 De maneira geral, o tempo de duração médio das internações varia entre 8 e 16 semanas, dependendo de condições como o peso corporal inicial e as complicações médicas e psiquiátricas. Normalmente, o tempo de permanência hospitalar se divide em duas etapas: a primeira, na qual o principal objetivo é a correção das complicações médicas e do peso corporal, e a segunda, quando o objetivo principal é a modificação dos hábitos alimentares, pensamentos errôneos e práticas consideradas anormais (NUNES e ÁVILA, 2006). As autoras ainda salientam que geralmente na primeira internação os pacientes portadores de AN sentem-se assustados com o novo ambiente e, devido a não aceitação de seus sintomas, não aceitam ficar sob o controle da equipe. Os pacientes não costumam aceitar a hospitalização livre e espontaneamente, porém por diversas vezes eles expõem a necessidade de ajuda pelo sofrimento intenso e pela dificuldade em seguir o esquema ambulatorial proposto. É importante deixar claro ao paciente que após um período de evolução da patologia, em conseqüência da cronificação dos sintomas, existe uma diminuição da capacidade de se alimentar e de avaliar de forma adequada sua própria vida. Nunes e Ávila (2006) relatam que a equipe deve possuir flexibilidade para compreender que cada paciente deve ser considerado individualmente para uma melhor adequação do tratamento, principalmente em relação à reposição de peso e ao alívio de comportamentos de risco. Ainda sob a perspectiva das autoras citadas acima, no primeiro momento do tratamento hospitalar, os familiares devem estar cientes dos limites desta abordagem. Recomenda-se que os pacientes sejam internados sem o acompanhamento de seus familiares. É necessário que seja estabelecido um bom vínculo entre a família e a equipe para que se facilite a comunicação entre eles, de forma a aumentar o esclarecimento e transparência do tratamento não só para o paciente como também para sua família, visando então o aumento das chances de se obter bons resultados. Caso a internação hospitalar seja de fato necessária, ela deve ser feita em um hospital geral e deve ser viabilizada a instalação de vigorosos cuidados de enfermagem, administração de dieta hipercalórica via oral ou em forma de alimentação parenteral em casos da persistente recusa do paciente em se alimentar (SILVA, 2005). 37 A hospitalização deve ter em vista o bem-estar geral do paciente, principalmente o retorno a um funcionamento mental mais saudável. A reposição do peso dificilmente é alcançada sem mudanças nas atitudes e crenças distorcidas dos pacientes. O estabelecimento de um vínculo terapêutico entre o paciente e equipe é de fundamental importância para se alcançar o sucesso no tratamento. Este vínculo marca o seu início na persuasão do paciente para que o mesmo aceite a hospitalização. Sempre que ocorre o acompanhamento pela equipe, o paciente sente-se aliviado e aceita com maior facilidade as combinações propostas. É muito importante esclarecer os objetivos do tratamento ao paciente e também ajudá-lo a expressar suas inquietações, seus sentimentos e suas necessidades de uma maneira que não por meio do seu corpo que emagrece (NUNES e ÁVILA, 2006). As mesmas autoras relatam que durante a estadia do paciente no hospital, é importante encorajá-lo a repor o seu peso até o mais próximo possível do peso considerado normal e tentar mantê-lo em um nível que se considere saudável. c) Tratamento Nutricional O tratamento nutricional tem como objetivo a reposição do peso através da reeducação alimentar, pois mesmo tendo um amplo conhecimento sobre o valor calórico dos alimentos, os pacientes portadores da patologia em questão pouco sabem sobre uma nutrição saudável, em decorrência disto é necessário que o paciente seja informado e educado sobre o que é uma nutrição adequada. Recomenda-se que a equipe oriente o paciente a manter uma alimentação saudável variada, contendo diversos tipos de nutrientes, além de ingerir uma quantidade adequada de carboidratos. Os alimentos que em geral são evitados, também devem ser incluídos de forma lenta em sua dieta. Depois de realizar uma anamnese alimentar do paciente, o nutricionista elabora um esquema nutricional básico, e então discute individualmente cada aspecto do tratamento, da reposição à manutenção de peso. O valor calórico estipulado para cada refeição vai depender do ritmo de ganho de peso, adequado ao tamanho do paciente e a seu conforto em relação à dieta. O controle de ganho de peso do paciente é avaliado através de suas 38 pesagens, que são realizadas de duas a três vezes por semana, antes do seu desjejum (NUNES e ÁVILA, 2006). De acordo com as autoras citadas acima, durante a hospitalização, o nutricionista fica encarregado de fornecer informações sobre trocas e balanceamento das refeições, as quais são servidas ao paciente em bandejas individuais e revisadas pela pessoa da equipe que fica encarregada de realizar o acompanhamento, controlando-se o tempo de cada refeição, tendo como limite de tempo 60 minutos. Após o término das refeições, essas bandejas são checadas, sendo anotado o que foi consumido. Caso o paciente se recuse a se alimentar de forma adequada, o ambiente hospitalar permite o uso de uma sonda nasogástrica (sonda presa ao nariz e que vai até o estômago) ou nasoenteral (sonda presa ao nariz e que vai até ao intestino) para a realização da mesma. Nunes e Ávila (2006) citam que é estabelecido como critério de alta uma reposição de 95% do peso corporal esperado. Assim que o paciente ganha alta, ele recebe um esquema nutricional que esteja de acordo com as suas necessidades nutricionais, para que ele então possa manter o seu peso. d) Tratamento Psicoterápico Os pacientes portadores de AN, como já citado anteriormente, sentem-se vitoriosos por conseguirem manter um peso abaixo do considerado normal para certa idade e altura, sentindo-se “poderosos” por dominarem de forma absoluta o controle de seu próprio apetite. Em decorrência desse fato, eles temem qualquer medida que seus familiares possam vir a tomar que possa de alguma forma interferir nesse autocontrole. Por temerem qualquer atitude que contrarie seus ideais, adquirem uma postura arisca e inatingível nas primeiras tentativas de tratamento (SILVA, 2005; GORGATI e AMIGO, 2005). No entanto, no início do tratamento, continuarão com suas idéias consideradas “bem-sucedidas” e ações sobre alimentação e perda de peso. Estando a par dessas atitudes, deve-se trabalhar no sentido de construir, pacientemente, uma relação terapêutica baseada na confiança e no comportamento de ambas as partes (terapeuta e paciente) (SILVA, 2005). Cabe ao terapeuta ser humilde, e ter disposição para flexibilizar essas “jovens 39 doutoras” que dizem saber tudo sobre alimentação e muito pouco sobre trocas afetivas e terapêuticas (SILVA, 2005; GORGATI e AMIGO, 2005). Diferentemente da BN, como veremos mais adiante, a abordagem mais recomendada para pacientes com AN é a psicoterapia individual, pois essas pacientes geralmente demonstram ter mais dificuldades em expor seus sentimentos, retraimento no relacionamento interpessoal e atitude competitiva no sintoma (STEFANO et al., 2005). A psicoterapia deve visar a reestruturação de uma forma direta da forma de pensar e estabelecer conceitos por parte dos pacientes, principalmente quando se relaciona aos seus valores, à sua maneira de ver e se relacionar com o mundo, às suas referencias pessoais e ao desenvolvimento de seu talentos acoplados aos seus projetos de vida. O principal objetivo do tratamento é a normalização do peso corporal, mesmo que ele ainda não apresente risco de vida iminente para o paciente. Deverão ser aplicadas técnicas de distração nos pacientes após as refeições, pois elas tendem a ajudar a diminuir a sensação de desconforto após a ingestão de alimentos pelo mesmo (SILVA, 2005). Ainda sob a perspectiva da mesma autora, as excessivas atividades físicas devem ser reduzidas vagarosamente e então, devem ser substituídas por atividades que possibilitem o desenvolvimento de relações interpessoais e, conseqüentemente, o desenvolvimento de habilidades sociais. É necessário que o nível de expectativa de desempenho do paciente seja reduzido, com a finalidade de ocasionar menor frustração e melhorar a sua autoestima. Além disso, se deve também utilizar técnicas de prevenção de recaída, pois auxiliam na manutenção dos resultados e as possíveis dificuldades futuras passam a ser menos temidas (SILVA, 2005). De acordo com Nunes e Ávila (2005), existe um consenso de que o tratamento psicológico é fundamental nesse transtorno independente do nível, seja ele ambulatorial ou hospitalar, mas também se sabe que o paciente anoréxico pouco se beneficia do tratamento psicoterápico se o seu peso corporal estiver muito abaixo do normal, de forma que a reposição do peso torna-se o objetivo principal. Logo, a intervenção hospitalar serve como um meio que auxilia na correção do peso, facilitando então as abordagens psicoterápicas e nutricionais. Seguindo o relato de Nunes e Ávila (2005), Stefano (2005) afirma que o tratamento psicológico deve se iniciar assim que o paciente começa a sua 40 recuperação nutricional, buscando abordar conflitos psicodinâmicos, desenvolvimento cognitivo, defesas psicológicas, as complexas relações familiares e a presença de co-morbidades psiquiátricas. Normalmente, as intervenções psicológicas nesses pacientes são necessárias por longos períodos, em média 6 anos, em função da natureza duradoura de seus sintomas e da necessidade de suporte durante a recuperação. 3.4.1.3 Curso e Prognóstico da Doença Segundo Freitas (2006), os fatores prognósticos nos possibilitam informar os pacientes e seus familiares sobre o curso da doença e qual a estratégia terapêutica seria a melhor para o caso. É necessário ter em mente que nem sempre a evolução da doença ocorre conforme o esperado, podendo, em algumas vezes, evoluir de maneira completamente oposta à esperada. No ano de 1977, Russell fez uma observação, ainda válida nos dias de hoje, que a AN possui uma imprevisibilidade de prognóstico individualizado. São considerados aspectos prognósticos desfavoráveis fatores como vômito auto-induzido, episódios de compulsão alimentar, cronicidade, aspectos obsessivo-compulsivos e métodos purgativos. No entanto, considera-se como fator favorável os aspectos histriônicos de personalidade. Assim como Russell (1977) aponta aspectos positivos e negativos, Silva (2005), relata alguns aspectos favoráveis e desfavoráveis os quais normalmente se apresentam na vida dessas pessoas e podem contribuir para uma evolução e prognóstico mais fáceis ou mais difíceis. Os aspectos positivos são: início precoce do tratamento; maior flexibilidade em lidar com problemas e frustrações; ambiente familiar flexível; contar com boa referência interna e gostar e reconhecer suas virtudes; ambiente social menos rígido em relação ao desempenho pessoal e à aparência física; saber suas limitações e ter persistência e boa vontade em melhorálas; e, ser confiante e cúmplice com as pessoas que fazem parte de seu tratamento. Os aspectos desfavoráveis são: baixa auto-estima; pais exigentes, dominadores e controladores; perfeccionismo e autocontrole; elevadas expectativas do desempenho pessoal; humor depressivo; famílias que valorizam de forma excessiva a beleza física e impõem dietas aos filhos; perdas afetivas importantes e precoces; 41 caráter facilmente influenciável; dificuldades em lidar com mudanças, principalmente quando ocorridas na adolescência; e, história de abuso sexual na infância. O curso da AN é consideravelmente prolongado, e seus diversos fatores contribuem para a sua manutenção ou perpetuação, o risco de recaídas durante o processo de recuperação ou até mesmo após um longo período dessa ocorrer, pode ser previsto e esperado. Esse fato não pode comprometer a relação de cumplicidade e confiança estabelecido entre paciente, médico e terapeuta. Muitos pacientes omitem suas recaídas, consideradas por eles como pecados, e este fato pode desencadear um afastamento afetivo, o qual, na maior parte das vezes, leva ao abandono do tratamento. Diante disto, é necessário conscientizar o paciente para esse fato e lhe garantir sua dedicação incondicional. Existe, também, a possibilidade da passagem da AN para outras formas de sintomatologia alimentar, especialmente a BN. Em frente a essa situação, é de suma importância que o paciente entenda que a passagem para outro tipo de TA não significa um fracasso, e sim uma mudança de patamar de gravidade (SILVA, 2005). Ainda diante da mesma perspectiva, é importante saber que apesar de recuperados, muitos pacientes ainda apresentam padrões idealizados, gerando de certa forma frustrações e limitações sociais. Essas características refletem o tipo de personalidade dos pacientes com AN e que os predispõem à própria doença e aos demais TA. A inflexibilidade social que eles possuem é considerada a principal matéria-prima a ser trabalhada na terapia desses pacientes. Sullivan (apud GORGATI E AMIGO, 2005), descreve um resumo de dados obtidos através da literatura referentes ao prognóstico da AN, incluindo estudos de até 10 anos após constatação da instalação da patologia em questão. Os resultados são: aproximadamente 10% de morte; 10% de persistência do quadro; 15% de remissão parcial dos sintomas; 15% de crossover (quando a AN cursa para a BN) e 50% sem diagnóstico para TA no seguimento do estudo. 3.4.2 BULIMIA NERVOSA (BN) O termo bulimia deriva do grego bou (grande quantidade de) ou de boul (boi) e limos (fome), designando fome raivosa ou fome de comer um boi (STUNKARD 42 apud NUNES et al., 1998). Na bulimia, assim como na anorexia, existe uma excessiva idealização da magreza e um preconceito contra a obesidade, em razão disso, a forma e o peso do corpo acabam por influenciar excessivamente a autoavaliação do indivíduo. Esse transtorno, então, caracteriza-se essencialmente por episódios de hiperfagia (compulsão alimentar), sintoma o qual pode estar presente em diversas doenças orgânicas, síndromes neurológicas ou genéticas ou até mesmo em transtornos mentais (NUNES et al., 1998); através de métodos compensatórios inadequados para se evitar o ganho de peso, e por um medo mórbido de engordar. Para que esse transtorno possa ser qualificado como patológico, é necessário que a compulsão periódica e os comportamentos compensatórios inadequados ocorram, em média, no mínimo duas vezes por semana durante três meses (APA, 2002). Cordás (2004) relata, também, que a BN caracteriza-se por uma grande ingestão de alimentos com sensação de perda de controle, porém a preocupação excessiva com o peso e a imagem corporal direcionam o paciente a fazer o uso de métodos compensatórios inadequados para que se possa ter um controle do peso, como vômitos auto-induzidos, uso de medicamentos (diuréticos, inibidores de apetite, laxantes, etc.), dietas e exercícios físicos excessivos. “A crise bulímica é tipicamente desencadeada por estados de humor disfóricos, estressores interpessoais, intensa fome após restrição por dietas, ou sentimentos relacionados a peso, forma do corpo e alimentos. A crise bulímica pode reduzir temporariamente a disforia, mas autocríticas e humor deprimido ocorrem logo após” (APA, 2002, p. 561). Para o diagnóstico da BN é exigido o engajamento em métodos compensatórios inadequados após os episódios de compulsão alimentar. De acordo com Galvão et al. (2006a), o vômito auto-induzido é o método mais freqüente (ocorrendo em média em 90 a 95% dos casos), de mais fácil identificação e que melhor delimita o final de uma compulsão. Para Claudino e Borges (2005), pacientes com Diabetes buscam evitar o ganho de peso deixando de fazer uso da insulina (e a conseqüente absorção de glicose pelas células). A BN assim como a AN é mais comum no sexo feminino, tendo como proporção 9:1. Seu início tende a ser mais tardio que o da AN, ocorrendo por volta dos 18 anos de idade, então é possível observar significativas taxas de prevalência, sendo de 5% a 15% nas populações femininas de cursos secundários e 43 universitários, e ainda 2% a 3% deste transtorno na população feminina adolescente e juvenil (SILVA, 2005). Complementando este dado, Sapoznik et al. (2005a), relatam que a faixa etária de maior incidência para BN se encontra entre os 18 e 23 anos de idade, em mulheres. Para alguns pacientes bulímicos a simples ingestão de alimentos altamente calóricos, mesmo sendo essa uma ingestão em quantidade normal, é considerada como compulsão alimentar (binge subjetivo), pois o fato de terem ingerido um alimento de alto teor calórico facilita o ganho de peso. Os tipos de alimentos ingeridos durante um ataque de hiperfagia variam, mas normalmente os pacientes dão preferência a alimentos de alto teor calórico, e fáceis de engolir e regurgitar como bolos, sorvetes, leite condensado, chocolate, entre outros, consumindo-os em exagero. Entretanto, as crises bulímicas caracterizam-se mais pelo excesso de alimentos ingeridos do que pela ingestão de apenas um determinado tipo de alimento, como carboidratos. Esta ingestão excessiva de alimentos ocorre de forma rápida e, normalmente, termina no momento em que a pessoa sente-se desconfortável, ou até mesmo dolorosamente repleta. Porém, devido à purgação após a ingestão desses alimentos o peso da pessoa bulímica permanece relativamente estável, e isso permite que esses indivíduos consigam manter seu distúrbio alimentar oculto por mais tempo do que os anoréxicos (ATKINSON et al, 2002). Assim como Atkinson et al (2002), Vilela et al. (2004), relatam que os bulímicos, geralmente mantém seu peso próximo ao peso normal ou até mesmo com um leve sobrepeso, pois altera crises de hiperfagia com vômitos auto-induzidos. Além da purgação por indução do vômito, alguns também utilizam laxantes e diuréticos como método purgativo. Além disso, os indivíduos podem jejuar por um dia ou mais, ou exercitar-se excessivamente na tentativa de compensar o excesso de alimento ingerido. Esses exercícios são considerados excessivos quando interferem em atividades importantes, quando ocorrem em momentos ou contextos inadequados ou quando o indivíduo continua a se exercitar mesmo possuindo lesões ou outras complicações médicas (APA, 2002). Silva (2005) afirma que a família possui uma função de extrema importância no diagnóstico e no tratamento dessas doenças. Pois somente eles podem observar se há algum comportamento estranho na(o) filha(o), como por exemplo se após a refeição a(o) filha(o) sempre se dirige ao banheiro e se tranca por um tempo, eles já 44 podem identificar essa situação como uma alerta a ser cuidadosamente observado e avaliado. Essas famílias devem ter em mente que julgamentos e críticas sobre suas posturas costumam não ter resultados favoráveis, ou seja, a verdadeira ajuda só ocorre quando se reconhece o sofrimento dos outros e quando se é estendida a mão com possibilidades reais que permitem a todos escolherem qual será o melhor caminho na direção da real felicidade. De acordo com Galvão et al. (2006a), a maioria dos pacientes que utilizam métodos purgativos o faz devido aos episódios de compulsão alimentar e, portanto, buscam compensar dessa forma os riscos de ganho de peso. É comum também a ingestão excessiva de água para facilitar a indução de vômito. A presença dos episódios de compulsão alimentar e o recorrente uso de métodos compensatórios geram uma grande instabilidade no peso do paciente. Alguns deles não chegam a se empenhar nos métodos purgativos, porém alternam dietas muito restritivas ou jejuns aos episódios de compulsão alimentar. As pacientes bulímicas que utilizam os métodos purgativos normalmente apresentam um grau maior de psicopatologia, geralmente são mais jovens, têm um curso pior de doença e um grau maior de insatisfação em relação ao corpo quando comparadas às pacientes que utilizam os métodos não-purgativos (GARFINKEL e MITCHELL apud NUNES et al., 1998). Em pacientes com BN pode-se observar uma incapacidade de controle de impulsos, não apenas no comportamento alimentar, como também em outras áreas da vida do indivíduo (GALVÃO et al., 2006b). Em relação a isso, Silva (2005) relata que situações de estresse funcionam como um estímulo e também como um fator mantenedor dos episódios bulímicos. Estes pacientes normalmente apresentam pensamentos dicotômicos (pensam em extremos relacionados à sua aparência ou é muito crítico em relação a ela) ou extremos do tipo “tudo” ou “nada”, crenças sem fundamentos acerca de seus conhecimentos sobre alimentos, calorias, métodos compensatórios e dificuldade no controle de impulsos (SILVA, 2005; SAPOZNIK et al., 2005a). As principais complicações existentes devido ao comportamento bulímico são os distúrbios eletrolíticos, irritação e sangramento gástrico e esofágico, anormalidades intestinais, erosão do esmalte do dente e aumento das parótidas (VILELA et al, 2004). 45 Um estudo realizado por Nielsen (2001 apud NUNES, 2006), relata que no período de 10 anos após o transtorno ter sido diagnosticado, os indivíduos bulímicos apresentam chance de 1,5 vez maior de morte, quando comparados a indivíduos saudáveis do mesmo gênero e faixa etária. Silva (2005) e Sapoznik et al (2005a), relatam as principais queixas e características apresentadas pelos pacientes portadores de BN, são eles: • Sinal de Russel: presença de calos ou feridas no dorso das mãos, originados pelo atrito dos dentes no ato de indução do vômito; • Corrosão no esmalte dos dentes provocada pela acidez dos vômitos; • Aumento das glândulas parótidas, pela prática dos vômitos. As glândulas parótidas ficam na região da face junto às orelhas. O rosto fica com uma forma mais arredondada; • Alterações do ciclo menstrual; • Costumam apresentar, após o episódio bulímico, distensão abdominal seguida de dor, náusea e mal-estar; • Diarréia, constipação intestinal ou desidratação, pelo uso abusivo de laxantes e diurético; • Taquicardia, irritabilidade ou sonolência, sudorese, devido ao uso de anorexígenos, hormônios tireoidianos, diuréticos, etc.; • Dor ou “queimação” no estômago em decorrência dos vômitos ou lesões esofagianas específicas causadas pela acidez do conteúdo vomitado; • Fadiga, após as ações purgativas ou atividades físicas intensas (em média 4 a 5 horas por dia). 3.4.2.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002), existem cinco critérios de avaliação diagnóstica para a Bulimia Nervosa: A – Crises bulímicas recorrentes. Uma crise bulímica é caracterizada por ambos os seguintes aspectos: 46 (1) Ingestão, em um período limitado de tempo (p. ex., dentro de um período de 2 horas) de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria durante um período similar e sob circunstâncias similares. (2) Um sentimento de falta de controle sobre o comportamento alimentar durante o episódio (p. ex., um sentimento de incapacidade de parar de comer ou de controlar o tipo e a quantidade de alimento). B – Comportamento compensatório inadequado e recorrente, com o fim de prevenir o aumento de peso, como indução de vômito, uso indevido de laxantes, diuréticos, enemas ou outros medicamentos, jejuns ou exercícios excessivos. C – A crise bulímica e os comportamentos compensatórios inadequados ocorrem, em media, pelo menos duas vezes por semana, por 3 meses. D – A auto-imagem é indevidamente influenciada pela forma e pelo peso do corpo. E – O distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de Anorexia Nervosa. Especificar tipo: Tipo Purgativo: durante o episódio atual de Bulimia Nervosa, o indivíduo envolveu-se regularmente na indução de vômitos ou no uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas. Tipo Não-Purgativo: durante o episódio atual de Bulimia Nervosa, o indivíduo usou outros comportamentos compensatórios inadequados, tais como jejuns ou exercícios excessivos, mas não se envolveu regularmente na indução de vômitos ou no uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas. 3.4.2.2 Formas de Tratamento A busca por um tratamento especializado normalmente ocorre entre dois e cinco anos depois da instalação do quadro clínico. Isso acontece devido a vergonha que os pacientes sentem e por sua crença ilusória de que possuem conhecimento e métodos suficientes e eficazes para controlarem sozinhos a situação (SILVA, 2005). 47 a) Tratamento Farmacológico Os antidepressivos são os fármacos mais estudados e utilizados na prática clínica relacionada à BN. “A farmacoterapia da BN visa à redução e/ou remissão dos episódios de compulsão alimentar periódica, dos comportamentos compensatórios para controle do peso corporal, como vômitos auto-induzidos, e ao tratamento dos sintomas co-mórbidos (depressão, impulsividade)” (APPOLINARIO et al., 2006, p. 160). • Antidepressivos Segundo Sapoznik et al. (2005a) e Appolinario et al. (2006), a fluoxetina, dentre todos os antidepressivos, tem sido a droga de primeira escolha, pois até então ela é o único medicamento aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), com o uso preconizado na dose de 60 mg/dia. Os efeitos colaterais mais comuns notados com o uso desse medicamento são tremores, insônia e náusea, com intensidade leve. A fluoxetina reduz os sintomas de ansiedade e depressão, além de tratar os sintomas típicos da doença, como compulsão alimentar, purgações, preocupações com peso e forma corporal. Nos casos de intolerância aos efeitos colaterais da fluoxetina, utilizam-se a sertralina e a fluvoxamina como boas alternativas ao tratamento preconizado com a fluoxetina. • Anticonvulsivantes O topiramato aumenta a atividade do ácido gama-aminobutírico (GABA), antagoniza os receptores do glutamato (AMPA e Kainato) e inibe a anidrase carbônica, devido a esse contingente de ações ele é considerado um agente neuroterapêutico de larga escala, sendo aprovado como terapia adjuntiva no tratamento da eplepsia parcial em adultos e na profilaxia da enxaqueca. O topiramato tem propiciado uma melhora nos sintomas relacionados à preocupação com o peso, ao desejo de comer compulsivamente e de provocar purgações, devido a esses fatores ele tem se destacado como potencial agente terapêutico no tratamento da BN. Além dos aspectos positivos já citados, aparentemente, essa 48 substância também reduz o desejo excessivo de consumir carboidratos, eleva a saciedade e estabiliza o humor (APPOLINARIO et al., 2006). Complementando o relato de Appolinario et al. (2006), Silva (2005) cita que o topiramato também auxilia na redução significativa do desejo de comer compulsivamente, preocupação com o peso corpóreo, necessidade de efetuar purgações, fissura por doces, massas e refrigerantes. Seus efeitos também incluem o aumento da saciedade e uma melhora na estabilização do humor. • Outros Agentes O ondansetron tem sido considerado como uma nova opção no tratamento de BN, pois ele é inibidor periférico dos receptores de serotonina do tipo 5-HT3, sendo então utilizado no tratamento de náusea induzida por antineoplásicos. Estudos mostram a redução de 50% dos episódios de compulsão alimentar periódica e aumento de 33% das refeições sem o uso de métodos compensatórios, sem maiores efeitos sobre outros sintomas da BN (FARIS et al., 2003 apud APPOLINARIO et al., 2006). • Orientações Gerais para Uso de Medicamentos em Pacientes com BN O uso de medicamentos no tratamento da BN deve estar sempre associado a outras abordagens psicológicas. Os medicamentos que se mostraram mais eficazes na redução de episódios de compulsão alimentar periódica e nos sintomas purgativos, são os antidepressivos. Entre estes, os inibidores seletivos de recaptação de serotonina são os mais seguros. Dentre eles, a fluoxetina é o medicamento de primeira escolha, como já dito anteriormente, em doses de 60 a 80 mg/dia (APPOLINARIO et al., 2006). b) Tratamento Hospitalar Na BN a internação hospitalar não costuma ser necessária, já que o seu nível de gravidade e letalidade é bastante reduzido quando comparado à AN (SILVA, 49 2005). Porém, quando acontece a internação hospitalar no caso da BN, está relacionada com a presença de complicações médico-psiquiátricas. O abuso de substâncias, o risco de suicídios e a gravidade de determinados comportamentos relacionados aos Transtornos de Personalidade podem vir a exigir uma intervenção hospitalar. Assim como graves perturbações no comportamento alimentar também podem indicar uma necessidade de hospitalização para que se possam interromper os episódios de compulsão alimentar periódica do paciente, porém essa internação não garante que esses episódios continuem cessados após a alta do paciente. No entanto, na maior parte dos casos o tratamento da BN ocorre em meio extrahospitalar através de abordagens psicoterápicas, aconselhamento nutricional e uso de psicofármacos (NUNES e ÁVILA, 2006), sendo que este último já foi visto anteriormente. Complementando esta informação, Sapoznik et al. (2005b) sugere que a internação hospitalar no caso da BN pode ocorrer em decorrência de indicações clínicas, secundárias aos sintomas purgativos persistentes, convulsões e distúrbios hidroeletrolíticos (desidratação), sendo que este último também é uma característica da AN. Nunes e Ávila (2006) citam algumas condições estabelecidas pelo Guia Prático Para o Tratamento dos TA, elaborado pela APA (2000), que devem ser consideradas caso haja necessidade de hospitalização para pacientes com BN: • Pacientes com graves problemas clínicos concomitantes; • Pacientes com problemas psiquiátricos que necessitem de internação psiquiátrica, independentemente do diagnóstico de transtorno alimentar; • Pacientes com sintomas graves e incapacitantes (por exemplo, episódios de compulsão alimentar periódica ou episódios purgativos tão intensos ou freqüentes que perturbem de forma significativa as atividades ocupacionais cotidianas e não-remissão de abuso de laxantes); • Pacientes que não tenham respondido adequadamente às estratégias iniciais de tratamento ambulatorial. O modelo de tratamento hospitalar de pacientes portadores da patologia em questão se baseiam nos modelos de hospital-dia. O caso tem a necessidade de ser acompanhado por uma equipe multiprofissional, assim como no caso da AN. Os episódios de compulsão alimentar periódica e os métodos compensatórios merecem 50 uma atenção especial. Para tanto, o hospital deve ter uma adaptação adequada para que permita a padronização da ingestão alimentar do paciente através de uma dieta balanceada, facilitando o controle dos comportamentos inadequados associados ao transtorno (NUNES e ÁVILA, 2006). De acordo com as autoras citadas acima, o tratamento normalmente se inicia através de uma orientação comportamental aonde o paciente vai recebendo mais privilégios de acordo com a sua adesão às normas progressivas da internação. Nos casos mais graves é necessária a supervisão direta em todas as atividades, inclusive quando se trata do uso do banheiro. Ainda sob o mesmo ponto de vista, na fase de transição do tratamento hospitalar para o ambulatorial, gradualmente o paciente vai recebendo maior autonomia e responsabilidade, ocorrendo dessa forma uma diminuição da supervisão diante do seu comportamento. Diante disso, o paciente começa a se responsabilizar por sua própria alimentação. Essa forma de transição de tratamento permite ao paciente ter um contato gradual e progressivo com os agentes estressores responsáveis pelo desencadeamento dos episódios de compulsão alimentar periódica e seus conseqüentes métodos compensatórios, sendo possível treinar em seu ambiente de origem as novas habilidades aprendidas durante a internação. “Para garantir a manutenção dos ganhos obtidos durante a internação, faz-se necessária, contudo, a reestruturação do sistema de crenças do paciente, que, ao final da internação, deve ter adquirido uma noção de alimentação adequada. O paciente também deve ter uma visão crítica dos fatores que contribuíram para o desenvolvimento e a manutenção do transtorno alimentar e deve estar treinado em técnicas de autocontrole. Procedimentos para aumento da auto-estima e melhoria de habilidades sociais devem ter sido implementados. O envolvimento da família no tratamento é essencial para que esta torne o meio facilitador da manutenção dos ganhos obtidos” (NUNES e ÁVILA, 2006, p. 191). c) Tratamento Nutricional O tratamento nutricional, segundo Nunes e Ávila (2006), tem como objetivo interromper o ciclo composto por episódios de compulsão alimentar periódica e seus conseqüentes comportamentos compensatórios inadequados, além de tratar de suas co-morbidades. 51 Durante o início do tratamento, este visa estabilizar o peso e normalizar o comportamento alimentar. Após as refeições o paciente é obrigado a permanecer na sala de estar ou na presença de outra pessoa, por um período de uma hora e não lhe é permitido beliscar ou comer alimentos entre uma refeição e outra. Depois da estabilização de um comportamento alimentar considerado normal, inicia-se a segunda fase do tratamento, onde as refeições continuam sendo supervisionadas e a permanência na sala de estar por uma hora após as refeições ainda é exigida. Na última parte do tratamento ocorre uma fase de adaptação ao mundo exterior e reorganização. Caso os episódios de compulsão alimentar periódica voltem a se repetir, deverá ser aplicado um programa excepcional relacionado à fase de tratamento em que o paciente se encontra (NUNES e ÁVILA, 2006). Diante do relato das autoras citadas acima, pode-se estabelecer uma correlação entre as etapas do tratamento da AN e da BN, pois assim como na AN, o tratamento da BN se inicia após a realização de uma anamnese alimentar, onde é possível obter informações sobre a ingestão atual, os episódios de compulsão alimentar periódica, freqüência dos comportamentos compensatórios e restrição alimentar. A partir daí, se realiza a avaliação antropométrica (avaliação da gordura corporal através das dobras cutâneas) do paciente para se identificar o seu estado nutricional atual. Depois dessa avaliação é determinado um plano dietoterápico para o paciente, este plano é composto de seis a oito refeições diárias servidas em bandejas individuais. Após o termino de cada refeição, as bandejas são recolhidas e, então, é feito o registro dos alimentos que foram ingeridos, assim como na AN. A pesagem do paciente é feita uma vez por semana, antes do seu desjejum. Depois de receber alta, o paciente se orienta por uma conduta nutricional para a perda de peso, caso seja necessário, com a cessação dos comportamentos bulímicos. É necessário que ocorra a restauração do peso normal e a estabilização do comportamento alimentar para que se encontre uma solução para os conflitos e problemas relacionados à manutenção do TA (NUNES e ÁVILA, 2006). 52 d) Tratamento Psicoterápico No tratamento psicoterápico é essencial incluir uma abordagem que seja capaz de flexibilizar e reconceituar os valores e interesses nesses pacientes. Assim como na AN, deve ser abordado questões relacionadas à auto-estima, à relação com a imagem corporal e com o sistema de crenças disfuncionais. Um dos principais objetivos desse tratamento é o controle de episódios de compulsão alimentar e a indução de vômitos, para que isso seja possível o terapeuta deve disponibilizar informações ao paciente sobre a ocorrência de tais episódios, suas complicações clínicas e psicológicas, assim como sua pequena eficiência na redução do peso corporal. Também é de suma importância ressaltar que as dietas restritivas aumentam a possibilidade de ocorrência de episódios de compulsão alimentar e estes, por sua vez, aumentam o medo de ganhar peso (SILVA, 2005; STEFANO et al., 2005). A autora ainda cita que assim como na AN, técnicas de prevenção de recaída devem ser utilizadas, onde paciente e terapeuta planejam formas para lidar com as possíveis dificuldades futuras. De acordo com Sapoznik et al. (2005b), o atendimento psicoterápico pode se desenvolver de forma individual, familiar ou grupal, dependendo das particularidades de cada caso. 3.4.2.3 Curso e Prognóstico da Doença Segundo Silva (2005) e Sapoznik et al. (2005a), a uniformização dos dados na BN se mostra bastante complexa, uma vez que os fatores metodológicos dos estudos e pesquisas avaliam que curso e prognóstico nos pacientes bulímicos se diferenciam em critérios diagnósticos, intervalos de tempo das avaliações e conceito de recuperação, o qual por diversas vezes torna-se vago e inconsistente. Tendo por base essas limitações, pode-se levar em conta os estudos de Herzog et al. (1999) e os de Keel e Mitchell (1997). No primeiro considera-se um intervalo de seguimento entre 5 e 11,5 anos, e seus dados indicam que 73,8% dos pacientes avaliados 53 apresentaram recuperação total ao longo dos anos. No segundo estudo, mostraramse índices de recuperação na faixa de 69,9% de recuperação após 11,5 anos de acompanhamento. A mesma autora ainda salienta que na prática clínica aproximadamente 60% dos pacientes apresentam remissão total do quadro em algum momento nos primeiros dois anos de tratamento. No entanto, esse percentual tende a declinar com o passar dos anos e então é possível encontrar uma significativa relação entre o retorno dos sintomas bulímicos de maneira acentuada e o abandono do acompanhamento médico e psicoterápico. Outros dados sugerem que 25% dos pacientes ainda sofrem de BN após dez anos de acompanhamento, o que aponta para um alto índice de cronificação da doença. Diferentemente do que foi citado acima, Freitas et al. (2006) relatam que ainda não há resultados de estudos desta patologia que permitam a chegada de conclusões sobre o prognóstico da mesma. Pouquíssimos fatores se replicaram nos estudos, a lista de variáveis não se associaram ao desfecho e ultrapassa aquelas que se relacionaram. Portanto, os estudos realizados até o momento não conseguiram encontrar resultados significativos, assim como as variáveis que relacionaram-se ao desfecho desfavorável associam-se às perdas de seguimento. No entanto, aspectos obtidos em alguns estudos associados a um desfecho favorável determinam menor tempo de doença e menor idade de início do transtorno. Os aspectos que contribuem para o desfecho desfavorável contam com maior gravidade da sintomatologia relacionada ao TA, maior duração dos sintomas, transtorno de personalidade, impulsividade, co-morbidade psiquiátrica e baixa autoestima. Assim como na AN, na BN também pode ocorrer uma migração para outros TA, em especial para o TCAP. Essa migração tem de ser avaliada cuidadosamente, pois pode ser temporária e refletir a própria BN como remissão parcial de seus sintomas. O impacto de um tratamento adequado por determinado tempo aponta para um bom prognóstico dessa patologia. Essa conduta revela uma significativa melhora nos seus sintomas. É possível também observar, que os pacientes que são precocemente tratados apresentam maiores probabilidades de alcançarem a plena recuperação quando comparados com aqueles que começaram o tratamento tardiamente (SILVA, 2005). 54 Segundo Sapoznik et al. (2005a), a BN assim com a AN apresenta fatores prognósticos favoráveis e desfavoráveis. Os favoráveis incluem início menos tardio da BN, curta duração da doença e papel conclusivo na dinâmica famíliar, os aspectos desfavoráveis por sua vez incluem aspectos como baixo peso, episódios de compulsão alimentar, restrição alimentar, depressão, tentativas de suicídio, abuso de drogas, ansiedade, Transtorno de Ansiedade Bordeline, baixa auto-estima, auto-avaliação negativa na infância, comportamento impulsivo, perfeccionismo, alcoolismo, papel inconclusivo na dinâmica familiar e relacionamento instável com parceiro. 3.4.3 Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação (TASOE) De acordo com Claudino e Borges (2005), os transtornos atípicos de AN e BN têm recebido maior reconhecimento, não apenas por manifestarem-se com freqüência igual à AN e BN, mas por, também, representarem fonte substancial de morbidade. Apesar de serem manifestações mais leves e/ou incompletas da AN ou BN, possuem risco de evoluírem para as mesmas em até 50% dos casos. No entanto, as características clínicas desses transtornos atípicos não se acham bem estabelecidos em decorrência da falta de estudos descritivos onde a psicopatologia tenha sido bem explorada. 3.4.3.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR Segundo o DSM-IV-TR (APA, 2002), essa última categoria, Transtornos de Alimentação Sem Outra Especificação serve para classificar os transtornos da alimentação que não satisfazem os critérios para qualquer Transtorno da Alimentação específico. Exemplo: 1 – Mulheres para as quais são satisfeitos todos os critérios para Anorexia Nervosa, exceto pelo fato de que as menstruações são regulares. 55 2 – São satisfeitos todos os critérios para Anorexia Nervosa, exceto que, apesar de uma perda de peso significativa, o peso atual está na faixa normal. 3 – São satisfeitos todos os critérios para Bulimia Nervosa, exceto que a compulsão alimentar e os mecanismos compensatórios inadequados ocorrem menos de duas vezes por semana ou por menos de 3 meses. 4 – Uso regular de um comportamento compensatório inadequado por um indivíduo de peso corporal normal, após consumir pequenas quantidades de alimento (p. ex., vômito induzido após o consumo de dois biscoitos). 5 – Mastigar e cuspir repetidamente, sem engolir, grande quantidades de alimentos. 6 – Transtorno de compulsão periódica: crises bulímicas recorrentes na ausência do uso regular de comportamentos compensatórios inadequados, característicos da Bulimia Nervosa. Frente a dificuldade de se encontrar material específico sobre os quadros incompletos da AN e da BN que caracterizam, também, os TASOE, foi definido discutir mais amplamente somente sobre o TCAP, o qual é um transtorno que vem ganhando mais atenção com o passar dos anos e tem se tornado mais comum nos dias de hoje. 3.4.3.2 Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP) Até o momento, o TCAP tem sido o diagnóstico mais pesquisado entre os TASOE. Por sua vez, o TCAP é descrito como episódios recorrentes de compulsão alimentar na ausência de uso regular de comportamentos compensatórios inadequados característicos da BN (CLAUDINO e BORGES, 2005). O TCAP pode ser distinguido da BN em alguns pontos, tais como, os portadores de TCAP normalmente apresentam índice de massa corporal (IMC) superior aos portadores de BN (GELIEBTER, 2002 apud AZEVEDO et al., 2004). Além disso, a história natural da BN geralmente revela a ocorrência de dietas e perda de peso, enquanto que os comportamentos prévios do TCAP são mais variáveis (STRIEGEL, 2001 apud AZEVEDO et al., 2004). Assim, pacientes com BN 56 mostram maiores níveis de restrição alimentar quando comparados aos portadores de TCAP (GRILO, 2000 apud AZEVEDO et al., 2004). O TCAP é caracterizado por episódios bulímicos do tipo binge eating (NUNES et al., 1998), ou seja, pela ingestão compulsiva de grandes quantidades de alimento, devido à sensação de perda de controle sobre o que se está ingerindo, em no mínimo duas vezes por semana, feito isso durante seis meses. Caso a compulsão alimentícia não ocorra dentro desse espectro, ela não pode ser considerada como um TA. Uma segunda opinião relata que o TCAP pode caracterizar-se pela ocorrência de episódios de total descontrole alimentar, onde se pode constatar uma ingestão pesada e desenfreada de alimentos, tendo em decorrência desse comportamento uma “ressaca moral” dominada por grandes doses de auto-reprovação e inundada de sentimentos de culpa de primeira grandeza (SILVA, 2005). A ingestão descontrolada de uma grande quantidade de alimentos não visa apenas saciar uma fome exagerada, mas também está relacionada a uma série de estados emocionais ou situações estressantes. Esses episódios geralmente são secretos e rápidos, e somente acabam com a chegada súbita de outra pessoa (interrupção externa), mal-estar físico ou por esgotarem-se os alimentos. Em conseqüência dessa ingestão excessiva de alimentos, o indivíduo sente-se angustiado devido à ausência de comportamentos regulares voltados para a eliminação do excesso alimentar. Os pacientes chegam ao empanturramento por experimentarem um verdadeiro descontrole e, mais raramente, segundo Galvão et al. (2006a), até franca despersonalização ou desrealização, lembrando um fenômeno dissociativo (como se não agissem por conta própria). De maneira geral, tudo ocorre de forma rápida, de modo que os pacientes engolem os alimentos sem ao menos saboreá-los. Galvão et al. (2006a) cita que atualmente concebe-se que um episódio de compulsão alimentar envolve uma ingestão alimentar excessiva para aquele momento ou circunstância, levando-se em conta quando e como se deu a última refeição que antecedeu a compulsão alimentar. O episódio de compulsão alimentar não é encontrado apenas em pessoas obesas, mas também é considerada como uma das principais características da BN, o que ocorre é que no caso do TCAP não existem comportamentos compensatórios. De acordo com Stefano et al. (2002), alguns indivíduos até chegam a fazer uso de 57 métodos purgativos, contudo não costumam fazê-lo com muita freqüência e regularidade. Alguns estudos brasileiros, segundo Silva (2005), indicam que 15% dos obesos apresentam este tipo de transtorno. Indivíduos com diagnóstico de TCAP diferenciam-se dos indivíduos obesos sem compulsão alimentar e de indivíduos com BN devido à gravidade de sintomas psicopatológicos, os quais associam-se à quantidade e qualidade da comida ingerida em dias normais e em dias de compulsão alimentar (GALVÃO et al., 2006a). “Devlin e cols. abordaram o estado atual da nosologia do TCAP resumindo exaustivamente as evidências que pudessem apoiar ou refutar quatro formas de conteituá-lo. No primeiro modelo conceitual, o TCAP é considerado um subtipo distinto de transtorno alimentar; no segundo, um subtipo da BN; no terceiro, é visto como subtipo comportamental de obesidade; e, no último modelo hipotético, o TCAP é considerado uma condição clínica que ocorre quando dois transtornos primários coexistem (a obesidade e a depressão, ou a obesidade e a impulsividade)”. (DEVLIN e cols. apud APPOLINARIO, 2004, p. 2). Os principais traços de personalidade encontrados em indivíduos com TCAP são: baixa auto-estima, perfeccionismo, impulsividade e pensamentos dicotômicos (BORGES et al., 2007). A compulsão alimentar pode ocorrer em um transtorno depressivo maior, com características atípicas. Além disso, a presença de comportamento alimentar bizarro, como a ingestão de alimentos não nutritivos, pode ocorrer, também, em pacientes esquizofrênicos e deficientes mentais (NUNES et al., 1998). 3.4.3.2.1 Critérios Diagnósticos do DSM-IV-TR De acordo com o Apêndice-B do DSM-IV-TR, os critérios estabelecidos para o diagnóstico do TCAP são: A – Episódios recorrentes de comer compulsivo. Um episódio de comer compulsivo é caracterizado pelos dois critérios a seguir: 1) Ingestão, em um período limitado de tempo (por exemplo, dentro de um período de duas horas), de uma quantidade de alimentos nitidamente maior do 58 que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, sob circunstancias similares; 2) Um sentimento de falta de controle sobre o consumo alimentar durante o episódio (por exemplo, uma sensação de não conseguir parar de comer ou controlar o que ou o quanto está comendo). B – Os episódios de comer compulsivo estão associados com três (ou mais) dos seguintes critérios: 1) Comer muito mais rapidamente que o normal; 2) Comer até sentir-se incomodamente repleto; 3) Ingerir grandes quantidades de alimentos quando sem fome; 4) Comer sozinho, em virtude do embaraço causado pela quantidade de alimentos que o indivíduo ingere; 5) Sentimento de repulsa por si próprio, depressão ou demasiada culpa após comer em excesso. C – Acentuada angústia relacionada ao ato de comer compulsivamente; D – O comer compulsivo ocorre, em média, pelo menos dois dias por semana, durante seis meses. Observação: O método de determinação da freqüência difere daquele usado para a BN; as futuras pesquisas devem dirigir-se à decisão quanto ao método preferencial para o estabelecimento de um limiar de freqüência, isto é, contar o numero de dias nos quais ocorre o comer compulsivo ou contar o numero de episódios de comer compulsivo. E – O ato de comer compulsivamente não está associado com o uso habitual de comportamentos compensatórios inadequados (por exemplo, purgação, jejuns, exercícios excessivos), nem ocorre exclusivamente durante o curso da AN ou BN. 59 3.4.3.2.2 Formas de Tratamento a) Tratamento Farmacológico Para a escolha de um agente farmacológico para o tratamento do TCAP existem três pontos que devem ser levados em consideração, seriam eles, o comportamento alimentar alterado, ou seja, os episódios de compulsão alimentar periódico, a psicopatologia freqüentemente associada (depressão, impulsividade) e o peso corporal. As classes de medicamentos mais estudadas no momento para o tratamento do TCAP incluem os antidepressivos, os agentes antiobesidade e os anticonvulsivantes (FREITAS et al., 2005; APPOLINARIO; MCELROY, 2004 apud APPOLINARIO et al., 2006). • Antidepressivos De acordo com Sapoznik et al. (2005b) e Appolinario et al. (2006), devido a semelhança entre os sintomas da BN e do TCAP e a eficácia do uso de antidepressivos no tratamento da primeira, reforça-se a idéia da possível utilidade desses agentes no tratamento do TCAP. Os inibidores seletivos de recaptação de serotonina são os agentes antidepressivos mais pesquisados nos pacientes portadores da patologia em questão. Esses agentes reduzem a freqüência de episódios de compulsão alimentar periódica, porém não ocorre perda de peso significativa, do ponto de vista clinico. A venlafaxina, outro agente antidepressivo, mostra-se semelhante ao agente antiobesidade sibutramina, tendo como mecanismo de ação o bloqueio da recaptação da serotonina e da noradrenalina (APPOLINARIO et al, 2006). • Agentes Antiobesidade A compulsão alimentar correlaciona-se a alterações da regulação do comportamento alimentar devido ao aumento do apetite e redução da saciedade; com relativa freqüência o TCAP é associado ao sobrepeso, obesidade e depressão; 60 os agentes antiobesidade, normalmente, diminuem o apetite, aumentam a saciedade e induzem a perda de peso, assim como também podem reduzir os sintomas depressivos (FREITAS et al., 2005; APPOLINARIO; MCELROY, 2004 apud APPOLINARIO et al., 2006). A sibutramina age como inibidor da recaptação de serotonina e noradrenalina, e induz a perda de peso em conseqüência do aumento da saciedade e da prevenção da diminuição do gasto energético que ocorre em decorrência da perda de peso. Sua eficácia frente à indução inicial de perda de peso com subseqüente manutenção a longo prazo encontra-se bem estabelecida (APPOLINARIO et al, 2006). • Anticonvulsivantes Segundo o relato de Freitas et al. (2005) e Appolinario et al. (2006), existem alguns fatores que sugerem a eficácia dos anticonvulsivantes no tratamento do TCAP, dentre elas vale destacar a associação entre o TCAP e o Transtorno Bipolar. Além disso, o topiramato, como já citado anteriormente, auxilia na redução dos episódios de compulsão alimentar periódica e do peso corporal. Nos pacientes que fazem uso da zonisamida observa-se a redução significativa dos episódios de compulsão alimentar periódica, da fome, da gravidade global da doença e do peso corporal. Tanto o topiramato quanto a zonisamida apresentam uma boa tolerância, particularmente se o seu uso inicia-se em baixas doses e sofrem um aumento gradual relacionado à resposta terapêutica e os efeitos adversos (APPOLINARIO et al., 2006). • Orientações Gerais para Uso de Medicamentos em Pacientes com TCAP Os inibidores seletivos de recaptação de serotonina eram considerados os agentes de primeira escolha no tratamento do TCAP, mas diante de estudos negativos realizados com os mesmos foi necessário questionar a sua indicação para o tratamento dos pacientes obesos com compulsão alimentar periódica. Em decorrência deste fato, o topiramato é indicado como uma boa opção terapêutica e potencialmente mais indicado para pacientes com transtorno bipolar ou labilidade de 61 humor. Uma outra opção indicada para pacientes que não correspondem aos agentes citados anteriormente e que não apresentam co-morbidades psiquiátricas importantes, é a sibutramina, na dose de 15 mg/dia. Porém, esta droga, mesmo sendo considerada relativamente segura, pode provocar alterações na pressão arterial e na freqüência cardíaca (APPOLINARIO et al., 2006). b) Tratamento Psicoterápico No tratamento do TCAP buscam-se a modificação nos hábitos alimentares, o início da atividade física e a redução de peso em caso de obesidade associada. Para a mudança nos hábitos alimentares, deve-se abordar a auto-estima, dando uma atenção especial aos sentimentos de vergonha e de inferioridade, que normalmente acompanham os pacientes com esse tipo de transtorno. O paciente também deve modificar suas crenças relacionadas ao seu peso, mantendo expectativas realistas com relação à meta de peso e formato corporal (SILVA, 2005). A mesma autora cita que o paciente precisa diminuir a sua exposição às condições que facilitam a alimentação inadequada. De início, o paciente deve escolher uma atividade física que lhe seja reforçadora de alguma maneira e que tenha um tipo de programa razoavelmente flexível. No tratamento deste paciente, também devem ser utilizadas técnicas para prevenção de recaídas. De acordo com Passos et al. (2005), estudos indicam que pacientes com TCAP apresentam uma maior propensão a responder a seus sentimentos e a situações de caráter emocionais com alimentos. Esses pacientes consideram como condições antecedentes aos atos de compulsão alimentar sentimentos de solidão, tédio, ansiedade, raiva e estresse. Eles apresentam também baixa auto-estima, auto-imagem negativa, excessiva autocrítica e propensão a comportamentos impulsivos. Quando comparados a pessoas obesas, apresentam maiores índices de insatisfação corporal e pior imagem do mesmo, assim como distanciam mais o peso desejado do peso real, como conseqüência, apresentam maiores dificuldades em construir expectativas realistas sobre os tratamentos. 62 3.4.3.2.3 Curso e Prognóstico da Doença De acordo com o relato de Freitas et al (2006), o fato de o TCAP ser considerado recentemente como uma nova entidade nosológica, pouco se sabe sobre o seu curso natural. Em estudos realizados por Fairburn e colaboradores no ano de 2000, relata-se que, após cinco anos de seguimento, apenas 18% das pacientes participantes realmente apresentavam alguma forma clínica de TA, entretanto 39% eram obesas, quando comparadas a 21% do início da pesquisa. No final da mesma, obteve-se o resultado que grande maioria dessas mulheres diagnosticadas com TCAP se recuperaram (PASSOS et al, 2005; FREITAS et al, 2006). “Gravidade e prognóstico em TCAP demonstram maior relação com o comportamento alimentar e não com o peso corpóreo em si. Freqüências mais elevadas de compulsões ligam-se a maiores índices de psicopatologias associadas e maior comprometimento de aspectos psicológicos, acarretando piores prognósticos. A gravidade de aspectos psiquiátricos e psicológicos associados estabelece ciclos cada vez mais intensos de compulsões: sentimentos de auto-reprovação e menos valia podem levar a compulsões, que, por sua vez, fortalecem esses sentimentos, ocasionando novas compulsões” (PASSOS et al., 2005, p. 68). Alguns estudos apontam a psicoterapia como intervenção do TCAP mostram reduções de cerca de 90% na freqüência dos episódios de compulsão alimentar, e cerca de 80% de remissão dos mesmos em curto prazo, porém a manutenção desses resultados em longo prazo tem sido menor (PASSOS et al., 2005). A seguir, serão apresentados dois quadros. O primeiro (Quadro 2) tem por finalidade proporcionar uma melhor compreensão das correlações de dados, apresentando quais os subtipos de cada patologia associada aos TA, seus comportamentos característicos, seus respectivos tipos de tratamento e o prognóstico da doença. O próximo quadro (Quadro 3) tem a finalidade de descrever quais as principais características das 3 patologias principais (AN, BN e TCAP), estabelecendo então suas diferenças básicas. 63 Quadro 1: Principais Aspectos Etiológicos Subtipos Comportamentos AN BN TASOE AN restritiva e AN Bulímica Greve de fome sem fins ideológicos BN purgativa e BN não purgativa Episódios de compulsão alimentar seguidos de comportamentos compensatórios. Antidepressivos (fluoxetina, sertralina e fluvoxamina), Anticonvulsivantes (topiramato) e outros agentes (ondasetron) Quadros atípicos da AN e BN; e TCAP Episódios de compulsão alimentar característicos Tratamento farmacológico Orientação nutricional Tratamento Antidepressivos (inibidores seletivos de recaptação da serotonina, fluoxetina, citalopram e sertralina), Antipsicóticos (risperidona e olanzapina), Orexígenos (ciproeptadina) e outros agentes (naltrexona, tetraidrocanabinol e clonidina) Reposição e manutenção Normalizar o do peso e reeducação comportamento alimentar alimentar e estabilizar o peso Individual e familiar Individual, grupal psicoterápico Prognóstico Imprevisibilidade prognóstico individualizado familiar ou Antidepressivos (inibidores seletivos de recaptação da serotonina, venlafaxina), Antiobesidade (sibutramina) e Anticonvulsivantes (topiramato e zonisamida) - Individual ou grupal de Vago e inconsistente Vago 64 Quadro 2: Diferenças Básicas entre os Tipos de Transtornos Alimentares AN Predominância excessiva em mulheres Restrição alimentar severa Costumam purgar por auto-indução Abusam de diuréticos, laxantes e/ou atividades físicas Diferenças Grave perda de peso básicas Predomina em adolescentes, principalmente dos 12 aos 16 anos Grande distorção de imagem corporal Ausência de menstruação (amenorréia) Normalmente introvertidas Julgam seu comportamento alimentar como “normal” e defendem suas atitudes como corretas BN Predominância mulheres TCAP em Predominância mulheres em Episódios de compulsão alimentar periódica Provocam purgação após compulsão alimentar Abusam de diuréticos, laxantes, anorexígenos, hormônios tireoidianos, etc Peso normal ou acima do peso Predomina em adultos jovens, na faixa etária dos 18 aos 23 anos Episódios de compulsão alimentar periódica Não fazem uso de métodos compensatórios Não praticam atividades físicas Distorção de imagem corporal menos acentuada que na AN Menstruação irregular Não apresentam distorção da imagem corporal Menstruação normal Normalmente extrovertidas Apresentam culpa acentuada por seu comportamento alimentar Alternam introversão e extroversão Apresentam muita culpa por seu comportamento alimentar Grande maioria são pessoas obesas Predomina em adultos, na faixa etária de 30 a 35 anos 3.5 CO-MORBIDADES O termo co-morbidade implica a ocorrência simultânea de dois ou mais transtornos mentais, ou de quadro psiquiátrico associado à condição médica. O fato de o paciente estar sofrendo de um transtorno mental aumenta consideravelmente a sua vulnerabilidade a outro tipo de transtorno. Os pacientes com TA que possuem algum tipo de co-morbidade clínica ou psiquiátrica demonstram algumas alterações, em decorrência disso, na evolução do quadro clínico de base, na eficácia do tratamento prescrito e nos custos sociais da doença (AMIGO, 2005). 65 Estudos realizados até o momento mostram que os portadores de AN, BN e TCAP apresentam com freqüência outros transtornos psiquiátricos associados tais como Transtorno de Humor, de Ansiedade, do Controle de Impulsos, de Abuso de Substâncias e de Personalidade (FONTENELLE et al., 2003; O’BRIEN; VINCENT, 2003; DAWE; LOXTON, 2004; KAYE et al., 2004; HUDSON; HUDSON; POPE, 2005; apud NASCIMENTO et al., 2006). A presença de outros transtornos psiquiátricos pode influenciar o curso do TA, camuflar a presença de um TA subjacente, influenciar a procura de assistência e, também, causar um impacto no planejamento do tratamento (GRILO, 2002, apud NASCIMENTO et al., 2006). Segundo Silva (2005), é de fundamental importância a identificação diagnóstica dessas co-morbidades para que possam ser estabelecidos as possibilidades terapêuticas desses pacientes, determinando o local onde os tratamentos poderão ser realizados e de suas respectivas avaliações posteriores. Existem quatro transtornos psiquiátricos classificados como sendo mais comuns entre os portadores de TA. São eles: Transtornos de Ansiedade, Transtorno de Humor, Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtorno da Personalidade. A seguir será feito um breve relato sobre cada um deles. Além dessas patologias citadas, enquadram-se nas co-morbidades complicações clínicas graves como Diabetes Melito e Osteoporose, as quais também serão abordadas neste capítulo. 3.5.1 Transtorno de Ansiedade Os Transtornos de Ansiedade mais comumente encontrados nos quadros de TA são Transtorno de Ansiedade Generalizada, Fobia Específica e Transtorno Obsessivo-Compulsivo, os mesmos serão descritos a seguir. De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002), a Fobia Social caracteriza-se principalmente por um medo acentuado e persistente de situações sociais ou de desempenho nas quais o paciente poderia sentir-se envergonhado. A exposição a este tipo de situação provoca uma resposta imediata de ansiedade, a qual pode assumir a forma de um Ataque de Pânico ligado à situação ou predisposto pela 66 mesma. Em decorrência disso, a situação social passa a ser evitada, porém, em algumas ocasiões, ela é suportada com pavor. Seguindo o mesmo ponto de vista, o Transtorno de Ansiedade Generalizada caracteriza-se por demasiada ansiedade ou preocupação, ocorrendo todos os dias durante um período de no mínimo seis meses, acerca de diversos eventos ou atividades. Essa ansiedade e preocupação excessivas são relacionadas com pelo menos três sintomas adicionais, como inquietação, dificuldade de concentração, irritabilidade, perturbação do sono e tensão muscular. No caso da AN a ansiedade e preocupação excessivas se encontram diante do medo mórbido de engordar. Os pacientes que sofrem de Transtorno de Ansiedade Generalizada relatam sofrimento subjetivo devido à constante preocupação, pois apresentam dificuldades em estabelecer um controle sob a mesma, ou apresentam prejuízo no funcionamento social ou ocupacional, ou até mesmo em outras áreas importantes. O Transtorno Obsessivo-Compulsivo, segundo o DSM-IV-TR (APA, 2002) caracteriza-se por obsessões ou compulsões recorrentes suficientemente graves a ponto de consumirem tempo, normalmente mais de uma hora por dia; ou causarem sofrimento acentuado ou prejuízo significativo. Por obsessão se entende idéias, pensamentos, impulsos ou imagens persistentes, as quais são vivenciadas como intrusivas e inadequadas e causam acentuada ansiedade ou sofrimento. O indivíduo com essas obsessões, geralmente, tenta ignorar ou suprimir essas idéias ou impulsos; ou neutralizá-los com algum outro pensamento ou ação. A compulsão é caracterizada por comportamentos repetitivos ou atos mentais cujo objetivo é prevenir ou reduzir a ansiedade e sofrimento, ao invés de oferecer prazer ou gratificação. Tanto na AN de tipo restritivo quanto na de tipo bulímico, os transtornos de ansiedade mais comuns são a Fobia Social, o Transtorno de Ansiedade Generalizada e o Transtorno Obsessivo-Compulsivo, com prevalência variando entre 31 e 55%; 24 e 49%, e 21 e 62%, respectivamente (HALMI, 2003; GODART et al., 2000; GODART et al., 2003, apud NASCIMENTO et al., 2006; AMIGO, 2005). Já nos tipos de bulimia purgativa e não-purgativa, os Transtornos de Ansiedade que apresentam maior freqüência são a Fobia Social e o Transtorno de Ansiedade Generalizada, com prevalências que variam entre 30 e 59%, e 23 e 55%, respectivamente (GODART et al., 2000, 2003; HALMI, 2003, apud NASCIMENTO et al., 2006). O TCAP também está relacionado com maior freqüência aos Transtornos 67 de Ansiedade com prevalência de pelo menos um tipo de Transtorno de Ansiedade em cerca de 44% dos pacientes (FONTENELLE et al., 2003, apud NASCIMENTO et al., 2006). Em estudos realizados por Godart et al. (2000), observou-se que a freqüência de episódios de compulsão alimentar e comportamentos purgativos em pacientes bulímicos estão diretamente ligados à intensidade da sintomatologia ansiosa (NASCIMENTO et al., 2006). Obsessões relacionadas à forma corporal, ao peso e à comida são os aspectos psicopatológicos importantes dos TA (Nascimento et al., 2006), e os portadores destes transtornos podem desenvolver compulsões, como rituais elaborados para comer, contagem de calorias, assim como realizar exercícios compulsivos. “Estudos atuais, utilizando amostras clínicas, encontraram taxas de comorbidade entre Transtorno Obsessivo-Compulsivo e AN variando entre 9,5 e 35% e entre Transtorno Obsessivo-Compulsivo e BN variando entre 18,5 e 40% (LAESSLE et al., 1989; KAYE et al., 2004). Em pacientes com diagnósticos duplos (AN e BN), a freqüência do Transtorno Obsessivo-Compulsivo pode chegar a 44% (KAYE, 2004). A freqüência, deste transtorno, em pacientes obesos portadores de TCAP não difere da apresentada por pacientes obesos sem TCAP (FONTENELLE et al., 2003 apud NASCIMENTO et al., 2006, p. 85)”. Segundo Milos et al (2002) apud Silva (2005), o Transtorno ObsessivoCompulsivo pode estar presente de forma associada em cerca de 29% dos casos de AN, principalmente naqueles que apresentam o subtipo restritivo. No entanto, estudos realizados por Gorgati & Amigo (2005), revelam o Transtorno ObsessivoCompulsivo se associa a pacientes com AN em uma incidência que varia entre 10 a 13%. Em estudos realizados por Godart et al. (2000) e por Halmi (2003), relata-se que o Transtorno Obsessivo-Compulsivo antecede os Transtornos Alimentares em uma média de 65 a 88% dos casos. Entretanto, em um estudo realizado por Fontenelle, Cordás e Sassi (2002) encontra-se uma pequena diferença de dados, onde se relata que até 42% dos portadores deste também podem apresentar TA (NASCIMENTO et al., 2006). 68 3.5.2 Transtornos de Humor Quando se refere aos Transtornos de Humor pode-se notar uma maior incidência nos quadros de TA do Transtorno de Depressão Maior e do Transtorno Bipolar do tipo I. Os Transtornos de Humor, segundo o DSM-IV-TR (APA, 2002), são aqueles caracterizados principalmente por possuir algum tipo de perturbação no humor. Esses transtornos são divididos em Transtornos Depressivos (Transtorno Depressivo Maior, Transtorno Distímico e Transtorno Depressivo Sem Outra Especificação), Transtornos Bipolares (Transtorno Bipolar I, Transtorno Bipolar II, Transtorno Ciclotímico e Transtorno Bipolar Sem Outra Especificação), Transtorno de Humor Devido a uma Condição Médica Geral e Transtorno de Humor Induzido por Substância. O Transtorno Depressivo Maior é caracterizado pelo DSM-IV-TR (APA, 2002) por um ou mais episódios depressivos maiores, ou seja, são, no mínimo, 2 semanas de humor deprimido ou perda de interesse, acompanhados por, pelo menos, 4 sintomas adicionais de depressão, tais como, alterações no apetite ou peso, sono e atividade psicomotora; diminuição da energia; sentimentos de desvalia ou culpa; dificuldades para pensar, concentrar-se ou tomar decisões; ou pensamentos recorrentes sobre morte ou ideação suicida, planos ou tentativas de suicídio. O Transtorno Bipolar do tipo I, de acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002), caracteriza-se por um ou mais episódios maníacos ou mistos, normalmente acompanhado de episódios depressivos maiores, e o Transtorno Bipolar do tipo II é caracterizado por um ou mais episódios depressivos maiores, seguidos por pelo menos um episódio hipomaníaco. Os sintomas depressivos são mais freqüentes nos indivíduos portadores de TA, e sua prevalência pode chegar a 98% na AN (RASTAM; GILLBERT, 1995 apud NASCIMENTO et al., 2006). O diagnóstico clínico de depressão maior é significativamente mais freqüente nas pessoas com TA do que na população em geral, sua prevalência é de 50 a 68% na AN e de 38 a 63% na BN (BRAUN; SUNDAY; HALMI, 1994; HERZOG; NUSSBAUM; MARMOR, 1996 apud NASCIMENTO et al., 2006). A prevalência de qualquer Transtorno de Humor nos indivíduos com TCAP, varia entre 32 e 34,3%, também sendo mais freqüente que na 69 população geral (FONTENELLE et al., 2003 apud NASCIMENTO et al., 2006). A depressão maior é indicada como o Transtorno de Humor mais freqüente entre os pacientes portadores de TA. Já o Transtorno Bipolar do Humor, é mais ligado a BN, com prevalência entre 2 e 12% (HALMI, 2003 apud NASCIMENTO et al., 2006). De acordo com Sapoznik et al. (2005a), a depressão aparece em até 83% dos casos de BN, e em contrapartida com a informação dada por Halmi apud Nascimento et al. (2006), o Transtorno Bipolar do Humor pode atingir de 5 a 12% dos pacientes com BN. Existem hipóteses que tentam de alguma forma explicar a relação dos Transtornos de Humor com os TA. Uma delas é de que maior parte dos sintomas de humor poderiam ser explicados pela desnutrição e pelo padrão alimentar caótico adotado pelo paciente com TA. Uma segunda evidência trata da relação direta da sintomatologia depressiva com a presença ou não do TA em atividade, observandose uma menor co-ocorrência de sintomas depressivos em pacientes em remissão do que em pacientes com TA ativo, independente do subtipo do mesmo (TROOP; SERPELL; TREASURE, 2001, apud NASCIMENTO et al., 2006). Existe também, uma outra hipótese que procura explicar a associação entre sintomas depressivos e TA, esta acredita que ambos seriam parte de uma mesma síndrome. Para corroborar essa ultima hipótese, os Transtornos de Humor deveriam ser precedentes do TA e permanecer após a remissão do mesmo. A literatura tornase conflitante neste ponto, pois existem autores a favor da hipótese de que os TA seriam uma variante dos Transtornos de Humor e, no entanto, parte de uma mesma síndrome (TROOP; SERPELL; TREASURE, 2001, apud NASCIMENTO et al., 2006). Alguns autores defendem a hipótese de que os Transtornos de Humor poderiam ser considerados como fatores de risco para o desenvolvimento da BN, portanto, é considerado que o principal fator determinante do desenvolvimento de TA é, possivelmente, a presença de sintomas alimentares (NASCIMENTO et al., 2006). 70 3.5.3 Transtornos Relacionados a Substâncias Dentre os Transtornos Relacionados a Substâncias, o de maior ocorrência nos quadros do TA é o Transtorno por Abuso de Substância. De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002), esse tipo de transtorno engloba desde transtornos relacionados ao consumo de uma droga de abuso, até os efeitos colaterais de um medicamento e a exposição a toxinas. As substâncias tóxicas capazes de causar esse tipo de transtorno incluem metais pesados, raticidas contendo estricnina, pesticidas contendo nicotina, inibidores de acetilcolinesterase, gases nervosos, etileno glicol (anticongelante), monóxico e dióxido de carbono. Substâncias voláteis são classificadas como inalantes, quando usadas com intenção de intoxicação, e são classificadas como toxinas, se a exposição é acidental ou faz parte de envenenamento intencional. Os sintomas mais comuns associados com substâncias tóxicas são prejuízos na cognição ou no humor, porém, ansiedade, alucinações, delírios ou convulsões também podem vir a ocorrer. Esse tipo de transtorno subdivide-se em dois grupos, os Transtornos por Uso de Substâncias (Dependência de Substância e Abuso de Substância), e os Transtornos Induzidos por Substâncias. Segundo o DSM-IV-TR (APA, 2002), o Abuso de Substâncias caracteriza-se principalmente por um padrão mal adaptativo de uso de substâncias, manifestado por conseqüências adversas recorrentes e significativas ligadas ao repetido uso da substância. A Dependência de Álcool pode ser indicada por evidências de tolerância ou sintomas de abstinência, principalmente quando associada a algum histórico de abstinência, a dependência fisiológica é indicativa de uma evolução clínica mais grave. Portanto o Abuso de Álcool pode ser menos grave do que a Dependência, e apenas é diagnosticado quando se estabelece a ausência desta. O Abuso de Substâncias é consideravelmente mais freqüente em pacientes que apresentam episódios de compulsão alimentar (BRAUN; SUNDAY; HALMI, 1994; CORCOS et al., 2001 apud NASCIMENTO et al., 2006). Em um estudo realizado por Corcos e Colaboradores (2001), com mulheres portadoras de TA, obteve prevalências de abuso de qualquer tipo de substância psicoativa de 4,5% na AN de tipo restritivo, de 18,2% na AN de tipo bulímico, de 24,4% na BN de tipo purgativo e de 26,3% na BN de tipo não purgativo. No mesmo estudo demonstrou-se 71 também que o abuso e dependência de álcool e outras drogas psicoativas estão associadas ao comportamento impulsivo. Ainda neste mesmo estudo relata-se que o consumo de álcool tem uma freqüência maior em pacientes com BN e AN de tipo bulímico, com prevalências de 12,4 e 10,9% respectivamente; derivados do tetraidroxicanabinol (cannabis e derivados) e estimulantes também são utilizados frequentemente por pacientes com TA (NASCIMENTO et al., 2006). Sapoznik et al. (2005a) complementa esses dados relatando que pacientes portadores de BN apresentam risco elevado de co-morbidade com Transtorno por Uso de Substâncias, atingindo 30 a 37% dos casos, sendo que abuso de diuréticos, anorexígenos e laxantes tem índice de 20 a 40% dos casos. Silva (2005) apresenta taxas relevantes em pacientes bulímicos, atingindo entre 30% e 37% dos casos, são os Transtornos por Uso de Substâncias em Geral, como nicotina, cafeína, álcool, etc. Quando avalia-se o abuso de substâncias específicas como diuréticos, laxantes e redutores de apetite (anorexígenos), os índices podem variar entre 20% e 40% dos casos. 3.5.4 Transtornos de Personalidade Os Transtornos de Personalidade que mais se mostra presente nos quadros dos TA é o Transtorno de Personalidade de tipo Bordeline. De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2002), os Transtornos de Personalidade possuem como característica essencial um padrão persistente de vivência íntima e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas culturais do indivíduo e manifesta-se em no mínimo duas das seguintes áreas: afetividade, cognição, controle de impulsos ou funcionamento interpessoal. Este padrão persistente não tem flexibilidade e abrange uma ampla faixa de situações pessoais e sociais, além de provocar sofrimento significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Esse transtorno subdivide-se em onze tipos (Transtorno de Personalidade Paranóide, Transtorno de Esquizotípica, Personalidade Transtorno de Esquizóide, Personalidade Transtorno de Anti-Social, Personalidade Transtorno de Personalidade Bordeline, Transtorno de Personalidade Histriônica, Transtorno de 72 Personalidade Narcisista, Transtorno de Personalidade Esquiva, Transtorno de Personalidade Dependente, Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva, Transtorno de Personalidade Sem Outra Especificação). A principal característica do Transtorno de Personalidade de tipo Bordeline, segundo o DSM-IV-TR (APA, 2002), é uma grande instabilidade nos relacionamentos interpessoais, da auto-imagem e dos afetos, assim como uma acentuada impulsividade que se inicia no começo da idade adulta e se apresenta em uma variedade de contextos. Esses indivíduos fazem grandes esforços no sentido de evitar um abandono real ou imaginário, eles são muito sensíveis às circunstâncias ambientais, pois experimentam intensos temores de abandono e raiva inadequada, mesmo estando frente a uma separação real de tempo limitado ou quando há mudanças inevitáveis em seus planos. Sendo assim, eles acreditam que este tipo de “abandono” implica que eles são pessoas “más”. Dados demonstram que 53 a 93% dos indivíduos portadores de algum tipo de TA apresentam pelo menos um Transtorno de Personalidade, e que 37 a 56% preenchem os critérios necessários para dois ou mais Transtornos de Personalidade (AMIGO, 2005). Alguns estudos disponíveis relatam que a taxa de co-morbidade entre os TA e Transtornos de Personalidade varia entre 27 e 94%, relata também que o Transtorno da Personalidade de tipo Bordeline é o mais freqüente, estado presente em 31% dos pacientes com BN e em 14% daqueles com AN (GRILO, 2002 apud NASCIMENTO et al., 2006). 3.5.5 Diabetes Mellitus Segundo Gross et al. (2002), Diabetes Mellitus (DM) engloba um grupo de doenças metabólicas que se caracterizam pela hiperglicemia, decorrente de defeitos na secreção da insulina e/ou em sua ação. A hiperglicemia manifesta-se através de sintomas como poliúra, perda de peso (como no caso da AN), hiperfagia, polidipsia e visão turva ou por complicações agudas que podem levar o paciente a correr risco de vida, como a cetoacidose diabética e a síndrome hiperosmolar hiperglicêmica não cetótica, esta última é uma complicação aguda clássica do DM tipo II. A 73 hiperglicemia crônica associa-se ao dano, disfunção e falência de órgãos, principalmente os olhos, os rins, os nervos, o coração e os vasos sangüíneos. Ainda sob o mesmo ponto de vista, relata-se que as alterações da tolerância à glicose relacionam-se a um aumento do risco de doença cardiovascular e de desenvolvimento futuro de diabetes. Alguns estudos recentes demonstram que existe a possibilidade de diminuir de forma significativa a incidência de novos casos através de medidas de intervenção, tais como realização de exercícios físicos e redução de peso (no caso de pacientes obesos, onde normalmente há incidência de TCAP). De acordo com Papelbaum (2007), há um enorme contingente de evidências que sugerem que existe um aumento de psicopatologia em pacientes diagnosticados com DM, dentre eles a Depressão e os TA são os transtornos psiquiátricos que mais chamam a atenção de clínicos e pesquisadores. Alguns estudos evidenciam um aumento na ocorrência de BN e de TA subclínicos em mulheres portadoras de DM do tipo I quando comparadas com indivíduos sem esse tipo de DM. Outros estudos apontam um aumento nos episódios de compulsão alimentar entre adolescentes com DM do tipo I, incluindo uma taxa de 11% de omissão das doses de insulina para, então, evitar o aumento de peso. Quando relacionado aos portadores de DM do tipo II, estudos encontram taxas elevadas de ocorrência do TCAP. Diante dessa afirmação, Andrade et al (2004) relata que os TA são particularmente comuns em mulheres com DM do tipo I, onde mais de um terço delas desenvolve essa patologia. Portanto, estas devem ser vistas com um rigor maior, devido ao aumento de complicações microvasculares e metabólicas. 3.5.6 Osteoporose A osteoporose é definida como uma doença que se caracteriza por baixa massa óssea e deterioração da microarquitetura do osso, aumentando a fragilidade óssea e, em conseqüência, elevando o risco de fraturas. Entretanto, apesar da importância da massa óssea, a National Health Institutes, define a osteoporose como uma doença caracterizada por uma resistência óssea comprometida e elevado risco de fratura (COSTA-PAIVA et al., 2003). 74 De acordo com Oliveira et al. (2003), o desenvolvimento de padrões alimentares anormais acarreta na disfunção menstrual e, em conseqüência, à osteoporose, sendo, então, necessário o controle dos sintomas dessas alterações. A osteoporose, por sua vez, é mais identificada nos casos de pacientes que praticam algum tipo de atividade física, sendo então, considerados como atletas. A seguir será apresentado um quadro a fim de sistematizar as principais comorbidades de cada patologia, possibilitando dessa forma um melhor entendimento sobre o assunto. Quadro 3: Co-morbidades Associadas aos Transtornos Alimentares Co-morbidade AN BN TCAP Transtorno de Ansiedade (Fobia Social 31 a 55%; Transtorno de Ansiedade Generalizada 24 a 49%; Transtorno ObsessivoCompulsivo 21 a 62%), Transtorno de Humor (Depressão 50 a 68%), Transtorno de Abuso de Substancias (Substancias psicoativas 4,5 a 18,2%; Consumo de álcool 10,9%) e Transtorno de Personalidade (Bordeline 14%) Transtorno de Ansiedade (Fobia Social 30 a 58%; Transtorno de Ansiedade Generalizada 23 a 55%), Transtorno de Humor (Depressão 38 a 63%; Transtorno Bipolar 2 a 12%), Transtorno de Abuso de Substancias (Substâncias psicoativas 24,4 a 26,3%; Consumo de álcool 12,4%; Abuso de diuréticos, laxantes e anorexígenos 20 a 40%) e Transtorno de Personalidade (Bordeline 31%) Transtorno de Ansiedade 44% e Transtorno de Humor 32 a 34,3% 75 4 CONCLUSÃO Este estudo buscou na literatura científica vigente os principais tipos de TA. De forma mais específica investigou sua etiologia, as formas de tratamento, o curso e o prognóstico da doença, as co-morbidades e complicações clínicas associadas. Desta forma, pode-se inferir que seus objetivos foram alcançados, uma vez que a sistematização dos dados apresentou material suficiente para desenvolver as conclusões descritas a seguir. Observa-se que nos últimos anos alguns comportamentos associados à alimentação e à imagem corporal têm sido divulgados demasiadamente por meios de comunicação, fenômeno este que por sua vez tem sido constatado principalmente na cultura ocidental. Os jornais, as novelas, as revistas, os documentários, os programas de entrevista ou os de caráter informativo, em geral, vem carregado de informações distorcidas que vendem a imagem do corpo magro associado ao ideal, ao poder e ao sucesso. São meios de comunicação que direcionam a sua abordagem para um público jovem, no qual os TA costumam apresentar suas primeiras manifestações. Desta forma, reafirma-se que nas sociedades ocidentais, o preconceito relacionado à obesidade é muito forte e este culto à magreza se associa diretamente à imagem de poder, beleza e mobilidade social, gerando um quadro contraditório quando relacionado à mídia da indústria de alimentos, pois esta por sua vez, vende gordura, com apelo aos alimentos hipercalóricos. Os TA mais relevantes no momento são a Anorexia Nervosa, a Bulimia Nervosa e o Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica. Esta relevância se deve ao aumento significativo do número de casos constatados ultimamente, se pode pensar em usar o termo “epidemia do culto ao corpo”, principalmente quando referidos à AN e à BN. É de suma importância destacar que os TA são patologias que precisam ser diagnosticadas e tratadas o mais precocemente possível, em decorrência do fato que sua incidência tomou grandes proporções e sua gravidade tem feito muitas vítimas. No entanto, não se pode deixar de ver o aspecto sociocultural destas patologias, uma vez que a formação da auto-imagem corpórea e dos hábitos alimentares de cada pessoa são fortemente influenciados pela maneira como os 76 membros de uma sociedade pensam e agem em relação ao que seja ter um corpo e uma alimentação saudáveis. Os fatores etiológicos não podem ser divididos por patologia, pois acredita-se que eles são basicamente os mesmos para todos os tipos de TA. Com base em todo o material pesquisado até então, pode-se pensar em dizer que os fatores socioculturais são de grande influencia no desenvolvimento dos TA. Pois, como pode-se observar no caso da AN a mídia muitas vezes fica responsável por divulgar corpos de atrizes e modelos magérrimas, que acabam se tornando um tipo de modelo padrão, mulheres que são magras, mas nem sempre saudáveis, que atingem o sucesso. A partir daí, alguns jovens passam a querer o mesmo para elas, achando que a magreza extrema vai levá-las conseqüentemente ao sucesso, logo essas jovens podem deixar de se alimentar de maneira saudável, tornando-se pessoas doentes e acabam por desenvolver, na grande maioria quando associada a outros fatores etiológicos, uma doença grave com alto índice de mortalidade, chamada Anorexia Nervosa. Na BN, pode-se constatar um pensamento dicotômico, no qual as jovens ficam divididas entre esses padrões “não-saudáveis” de beleza e as “apetitosas” propagandas de alimentos hipercalóricos. Dessa forma, elas se deixam levar pelos alimentos gordurosos, porém desenvolvem um grande sentimento de culpa que as fazem recorrer aos métodos compensatórios (vômito, uso de laxantes, exercícios físicos excessivos, etc.), fazendo com que isso se torne um ciclo vicioso, no qual elas não passam vontade, ingerindo os alimentos que a mídia vende, mas tentam evitar o ganho de peso, fazendo o uso dos métodos compensatórios. Este ciclo vicioso normalmente mantém o peso corpóreo estável, tendo uma pequena variação de peso, dessa forma essa patologia se torna mais sigilosa, e a sua descoberta normalmente se dá devido ao sofrimento pessoal do indivíduo. O TCAP não engloba os corpos delgados que a mídia vende como modelo para ser uma pessoa bem-sucedida, mas pode-se dizer que ele “compra” os alimentos hipercalóricos que a mídia “vende”. Pessoas com essa patologia perdem total e absoluto controle diante dos alimentos, e estes por sua vez não são alimentos considerados saudáveis, e sim alimentos extremamente gordurosos e calóricos, os quais levam o indivíduo a um considerável aumento de peso. Apesar da produção científica disponível sobre o tema não se diferenciar muito uma das outras, observa-se uma grande mobilização nas equipes de saúde no 77 sentido de criar estratégias de tratamento para esse transtorno, desenvolvendo um trabalho multidisciplinar a fim de estabelecer um ambiente mais apropriado para esses pacientes. É de suma importância que esse tratamento multidisciplinar seja fortalecido, relevando o início do tratamento, quando o paciente se encontra em uma fase muito propensa a recaídas e conseqüentes desistências. Em decorrência dessas prováveis desistências, principalmente nos casos de pacientes com AN, sugere-se o tratamento em ambiente hospitalar, onde é possível obter um maior controle sob a evolução do quadro clínico desses pacientes. No tratamento de pessoas portadoras de TA é necessário também acompanhamento da família no seu dia-a-dia, pois acredita-se que a presença desta pode auxiliar na criação de um ambiente terapêutico mais seguro e familiar, melhorando conseqüentemente a aceitação do paciente diante do tratamento, além do fato desta poder acompanhar de perto a evolução do paciente e compreender melhor quais são as suas reais necessidades e dificuldades. Os psicofármacos têm sido coadjuvantes fundamentais no tratamento desses transtornos, principalmente quando se encontram associados com algumas comorbidades, como Transtorno de Personalidade, Transtorno de Humor, Transtorno Relacionado a Substâncias, etc., mas eles apenas se apresentam de forma eficaz quando associado a outras formas de tratamento, como o nutricional e o psicoterápico. Aliás, nenhuma dessas formas de tratamento mostra bons resultados quando realizadas sozinhas, aqui eles necessitam estar interligados, é de suma importância que haja o tratamento de forma multiprofissional, como dito anteriormente, para que o paciente possa ter um melhor benefício. No tratamento farmacológico, os medicamentos mais utilizados nas três entidades nosológicas são a fluoxetina e os inibidores seletivos de recaptação de serotonina, sendo então possível observar o grande uso dos antidepressivos no tratamento dos TA devido ao grande sofrimento apresentado por pessoas que sofrem dessa patologia. No tratamento psicológico também pode-se notar uma grande igualdade entre os métodos utilizados, o individual tem o maior nível de aceitação, porém a terapia em grupo é bastante indicada especialmente nos casos de BN e TCAP, para que os indivíduos possam estar compartilhando o seu sofrimento e, conseqüentemente, ajudando uns aos outros. 78 Pelo fato de o TCAP ser considerado como uma entidade nosológica recente, há pouco material publicado sobre ele, dificultando seu conhecimento. Diferentemente da AN e da BN, não se achou muito material científico publicado sobre o tratamento de ordem nutricional do TCAP, contudo, acredita-se que este tipo de tratamento tem como objetivo normalizar o comportamento alimentar, cessando com os episódios de compulsão alimentar, assim como na BN, além de reduzir o peso corporal do paciente, pois estes normalmente se encontram acima de um peso considerado normal e saudável, sendo então classificados como obesos. Em relação ao tratamento hospitalar, também não há muito material publicado, considerando-se que este tipo de tratamento somente se torna necessário caso o transtorno se associe com alguma complicação clínica de suas respectivas co-morbidades. Sobre as diferenças básicas observadas entre as patologias dos TA, pode-se observar que este é um transtorno que ocorre principalmente nas mulheres, acometendo várias faixas etárias. Na AN podemos notar que ela se desenvolve principalmente entre os 12 e 16 anos, idade que caracteriza o período de adolescência em que ocorrem algumas mudanças corporais, as quais acarretam o aumento de gordura corporal, principalmente no corpo das meninas que passa a ser um corpo mais curvilíneo. A BN acomete pessoas com idade entre 18 e 23 anos, quando se inicia a fase adulta, e o TCAP, por sua vez, predomina em mulheres adultas com idade entre 30 e 35 anos. Pode-se observar que na AN há ausência de menstruação, pois o estado de desnutrição em que mulheres se encontram, geram alterações hormonais que geram sérias conseqüências, dentre elas a ausência do período menstrual e a infertilidade. Na BN este período sofre algumas alterações, como atrasos, porém nada muito grave; no TCAP a mulher permanece com o ciclo menstrual normalizado. Características fisicamente visíveis são: a excessiva magreza, pele amarelada e seca, cabelos finos e quebradiços e, até mesmo, queda dos cabelos e pêlos do corpo na AN. Entre AN do tipo bulímico, e BN é possível estabelecer uma correlação nas características, pois em ambas os pacientes apresentam erosão do esmalte dentário e “calosidades” no dorso das mãos, devido à purgação. Na BN podemos também observar nos indivíduos um rosto mais arredondado por conta do aumento das glândulas parótidas, decorrente da purgação excessiva. Nos indivíduos com TCAP notamos um grave nível de obesidade, pois estes têm o costume de apresentar um nível mais alto de gordura corporal que os obesos comuns. 79 Vale a pena salientar que qualquer uma das três entidades nosológicas apenas pode ser considerada como transtorno se os comportamentos característicos de cada patologia, seja ela AN, BN ou TCAP, persistirem por mais de 6 meses, se repetindo no mínimo duas vezes por semana. A única entidade nosológica do TA que possui um prognóstico bem definido é a AN, em relação a BN existem algumas informações contraditórias e quanto ao TCAP não há muito material publicado (como já foi dito anteriormente), pois os seus estudos ainda estão em fase de desenvolvimento. Pacientes com AN possuem fatores prognósticos favoráveis e desfavoráveis que surgem no decorrer do tratamento auxiliando ou dificultando a evolução do mesmo. Como exemplo de aspecto favorável é possível citar aquelas pessoas que tem mais facilidade em lidar com os problemas e com certas situações, pessoas que de certa forma são mais flexíveis, como aspecto desfavorável, podemos dar como exemplo pessoas que apresentam rigidez diante dos seus próprios problemas, ou seja, aquele tipo de pessoa que não aceita opiniões alheias, estas normalmente são perfeccionistas, dominadoras e controladoras. A AN é uma doença que tem um curso prolongado, pois devido às características pessoais que os pacientes apresentam existem diversos fatores que influenciam na manutenção e até mesmo perpetuação da doença, aumentando consideravelmente o risco de recaídas. É valido ressaltar que a AN é considerada uma doença com alto índice de mortalidade em decorrência da rigidez apresentada diante do tratamento. Sobre a BN não é possível ter uma conclusão bem definida sobre o seu prognóstico, pois alguns autores citaram a remissão total dos sintomas enquanto outros relatam que os estudos ainda não foram finalizados. Em pacientes bulímicos também existem aspectos favoráveis e desfavoráveis. Um exemplo de aspecto favorável é o início tardio da doença, visto que este acomete principalmente pessoas com idade entre 18 e 23 anos. Como aspecto desfavorável podemos citar pessoas ansiosas, que fazem uso de drogas lícitas e ilícitas, entre outros. O pouco material encontrado sobre o prognóstico do TCAP, relata uma alta incidência de recuperação, bem como relacionam a gravidade dessa patologia com as co-morbidades envolvidas. 80 É possível notar que o tratamento precoce de todas as entidades nosológicas do TA aumentam as probabilidades de se alcançarem uma plena recuperação, favorecendo um bom prognóstico. Em relação às co-morbidades, pode-se analisar o fato que pelo TCAP ser considerado um novo campo de estudo pouco se sabe sobre o mesmo, sendo divulgadas apenas informações generalistas. Na AN e na BN podem-se observar dados mais detalhados sobre a porcentagem de cada subtipo de transtorno psicológico que acomete a população, sendo possível estabelecer uma correlação entre ambos. É possível observar que tanto a Fobia Social quanto o Transtorno de Ansiedade Generalizada acometem grande parte da população com AN e BN, assim como a Depressão, o Abuso de Substâncias Psicoativas, Abuso de Álcool e o Transtorno de Personalidade Bordeline. Existem estudos que relatam uma taxa que varia entre 27 e 94% de ocorrência dos Transtornos de Personalidade em pessoas com TA. Os sintomas depressivos, característicos dos Transtornos de Humor, acometem 98% dos pacientes com AN. Outro transtorno com grande incidência é o Transtorno Obsessivo-Compulsivo que acomete entre 65 a 88% dos casos. Considera-se necessário uma exploração um pouco mais fundamentada das informações que certas fontes publicam, pois esta distorce alguns dados e deixa tantos outros de maneira superficial, generalizando de certa forma os conceitos, principalmente da BN e da AN. E relevando o aspecto que essas informações abrangem em sua maioria um público jovem, o qual passa a crer que desenvolvendo os sintomas desses transtornos (privação alimentar, purgação, atividade física excessiva, etc.), é a maneira mais fácil de se atingir seus objetivos préestabelecidos. Em contrapartida existe uma necessidade urgente de publicação de informações corretas, divulgando as características principais da doença, quais os seus aspectos negativos e suas conseqüências à saúde da pessoa, uma vez que este transtorno é uma doença silenciosa que tem acometido diferenciadas classes sociais. Podemos deixar como sugestão o desenvolvimento de pesquisas qualitativas que tenham como objetivo principal a descoberta do processo de migração de uma patologia para outra, ou seja, em que ponto e quais os reais motivos que levam os pacientes com AN passarem a desenvolver BN e pacientes com BN passarem para TCAP. 81 Outra sugestão importante é uma pesquisa, também qualitativa, relacionando a Diabetes Mellitus com os episódios de compulsão alimentar periódica. Sugere-se também uma pesquisa bibliográfica que sistematiza um levantamento do TCAP, visto que este é considerado como uma nova patologia ainda encontrando-se no apêndice-b do DSM-IV-TR. 82 5 REFERÊNCIAS American Psychological Association. DSM-IV-TR – Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Trad. Cláudia Dornelles; - 4º ed. revisada – Porto Alegre: Artmed, 2002. AMIGO, V. L. Comorbidades clínicas e psiquiátricas. In: CLAUDINO, A. M.; ZANELLA, M. T. Guia dos transtornos alimentares e obesidade. 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Lentidão excessiva na ação do coração, normalmente com uma freqüência cardíaca abaixo de 60 batimentos por minuto. Cetoacidose diabética. Disfunção metabólica grave causada pela deficiência relativa ou absoluta da insulina, associada ou não a uma maior atividade dos hormônios contra-reguladores (cortisol, catecolaminas, glucagon, hormônio do crescimento). Hipopotassemia. Concentração anormalmente baixa de potássio no sangue; ela pode resultar de perda excessiva de potássio pela via renal ou gastrintestinal, de ingestão diminuída ou de desvios transcelulares. Ela pode ser manifestada clinicamente por distúrbios neuromusculares variando de fraqueza à paralisida, por alterações eletrocardiográficas, por doença renal e por distúrbios gastrintestinais. Leptina. Proteína reguladora que informa ao cérebro o possível excesso de gordura do corpo, a fim de que sejam liberadas substancias que facilitem o emagrecimento. 90 Parótidas. A maior das glândulas salivares. Situada atrás do ramo ascendente do maxilar inferior, ligeiramente abaixo do conduto auditivo externo. Prolonga-se em profundidade na direção do músculo masseter. Pica. Caracteriza-se por consumo persistente de substâncias não nutritivas. A substância típica tende a variar com a idade. Bebês e crianças mais jovens tipicamente comem reboco, tinta, cabelos cordões e tecidos. Crianças mais velhas podem comer fezes de animais, insetos, areia, folhas ou pedregulhos. Adolescentes e adultos podem consumir argila ou terra. Não existe aversão à comida. Polidpsia. Sede constante, exagerada, levando à ingestão sucessiva de líquidos. Poliúria. Eliminação de uma grande quantidade de urina com um aumento na freqüência urinária, comumente visto em diabetes. Ruminação. A característica essencial do Transtorno da Ruminação consiste na repetida regurgitação e re-mastigação de alimentos, que se desenvolve em um bebê ou criança após um período de funcionamento normal. O alimento parcialmente digerido é regurgitado sem náusea, esforço para vomitar, repugnância ou transtorno gastrointestinal aparentes. O alimento é, então, ejetado da boca, ou, mais comumente, mastigado e engolido de novo.