CAPÍTULO e31 Manifestações Cardíacas de Doenças Sistêmicas icas Eric H. Awtry Wilson S. Colucci QUADRO e31.1 ■ DESNUTRIÇÃO E DEFICIÊNCIAS DE VITAMINAS Desnutrição (Ver também o Cap. 75.) Nos pacientes cuja ingestão proteica, calórica, ou ambas seja muito deficiente, o coração pode se tornar fino, pálido e hipocinético com atrofia miofibrilar e edema intersticial. A pressão sistólica e o débito cardíaco caem e a pressão de pulso se estreita. É comum o edema generalizado que está relacionado com diversos fatores, incluindo redução da pressão oncótica sérica e dis- Doenças sistêmicas comuns e manifestações cardíacas associadas Doença sistêmica Manifestações cardíacas comuns Capítulo Diabetes melito DAC, angina atípica, miocardiopatia, ICC sistólica ou diastólica Desnutrição proteico-calórica Miocardiopatia dilatada, ICC 75 Deficiência de tiamina Insuficiência cadíaca de alto débito, miocardiopatia dilatada 74 Hiper-homocisteinemia Aterosclerose prematura 74 Obesidade Miocardiopatia, ICC sistólica ou diastólica Hipertireoidismo Palpitações, TSV, fibrilação atrial, hipertensão arterial 341 Hipotireoidismo Hipotensão, bradicardia, miocardiopatia dilatada, ICC, derrame pericárdico 341 Carcinoide maligno Doença valvar tricúspide e pulmonar, insuficiência cardíaca direita 350 Feocromocitoma Hipertensão arterial, palpitações, ICC 343 Acromegalia Insuficiência cardíaca sistólica ou diastólica 339 Artrite reumatoide Pericardite, derrame pericárdico, arterite coronária, miocardite, valvulite 321 Artropatias soronegativas Aortite, insuficiências aórtica e mitral, anormalidades da condução 325 Lúpus eritematoso sistêmico Pericardite, endocardite de Libman-Sacks, miocardite, tromboses arterial e venosa 319 HIV Miocardite, miocardiopatia dilatada, derrame pericárdico 189 Amiloidose ICC, miocardiopatia restritiva, insuficiência valvar, derrame pericárdico 112 Sarcoidose ICC, miocardiopatia dilatada ou restritiva, arritmias ventriculares, bloqueio cardíaco 329 Hemocromatose ICC, arritmias, bloqueio cardíaco 357 Síndrome de Marfan Aneurisma e dissecção aórticos, insuficiência aórtica, prolapso da valva mitral 363 Síndrome de Ehlers-Danlos Aneurismas aórtico e coronariano, prolapso das valvas mitral e tricúspide 363 Manifestações Cardíacas de Doenças Sistêmicas DIABETES MELITO (Ver também o Cap. 334.) O diabetes melito, tanto dependente quanto independente de insulina, é considerado um fator de risco independente para doença arterial coronariana (DAC; Cap. 241), sendo responsável por 14 a 50% dos novos casos de doença cardiovascular. Além disso, a DAC é a causa mais comum de morte em adultos portadores de diabetes melito. Na população de diabéticos a incidência de DAC é proporcional à duração do diabetes e ao grau de controle da glicemia, e sua patogênese envolve disfunção endotelial, aumento da peroxidação de lipoproteínas, aumento da atividade inflamatória, além das presenças de estado pró-trombótico e de alterações metabólicas associadas. Os pacientes diabéticos têm maior probabilidade de sofrer infarto do miocárdio, maiores complicações de DAC, seus infartos costumam ser maiores e evoluem com mais complicações pós-infarto, incluindo insuficiência cardíaca, choque e morte, do que os não diabéticos. É importante ressaltar que os pacientes diabéticos têm maior chance de apresentar sintomas isquêmicos atípicos; náuseas, dispneia, edema pulmonar, arritmias, bloqueio cardíaco ou síncope podem ser equivalentes anginosos. Além disso, a ocorrência de “isquemia silenciosa”, causada por disfunção no sistema nervoso autô- CAPÍTULO e31 As doenças sistêmicas que mais comumente apresentam manifestações cardíacas estão resumidas no Quadro e31.1. nomo, é mais comum entre pacientes diabéticos, chegando a 90% dos episódios isquêmicos nesses pacientes. Portanto, devemos ter um alto grau de suspeição para DAC nos pacientes diabéticos. O tratamento de pacientes diabéticos com DAC deve incluir controle agressivo dos fatores de risco (Cap. 344). A terapêutica farmacológica e a revascularização têm resultados semelhantes em pacientes diabéticos e não diabéticos, exceto que os primeiros apresentam maiores taxas de morbidade e mortalidade associadas à revascularização, com maiores riscos de re-estenose após intervenção coronária percutânea (ICP), e, provavelmente, melhor sobrevida quando tratados com cirurgia de revascularização miocárdica (CRM) em comparação com ICP nos casos de DAC em múltiplos vasos. Os pacientes com diabetes melito também podem apresentar disfunções sistólica e diastólica ventriculares esquerdas, refletindo DAC epicárdica concomitante e/ou hipertensão arterial, doença microvascular coronariana, disfunção endotelial, hipertrofia ventricular e disfunção autonômica. É possível haver miocardiopatia restritiva com relaxamento miocárdico anormal e pressões de enchimento ventricular elevadas. Histologicamente observa-se fibrose intersticial e as artérias intramurais podem apresentar espessamento da íntima, depósitos hialinos e alterações inflamatórias. Os pacientes diabéticos têm maior risco para o desenvolvimento de insuficiência cardíaca clinicamente manifesta, o que provavelmente contribui para as suas taxas elevadas de morbidade e mortalidade cardiovasculares. Há evidências de que a insulinoterapia melhore a disfunção miocárdica relacionada com o diabetes. 344 77 Nota: DAC, doença arterial coronariana; ICC, insuficiência cardíaca congestiva; TSV, taquicardia supraventricular. ©2013, AMGH Editora Ltda. Todos os direitos reservados. 31-1 função miocárdica. Esses estados de desnutrição proteica e calórica profundas, denominados, respectivamente, kwashiorkor e marasmo, são mais comuns nos países subdesenvolvidos. Entretanto, podem ocorrer doenças cardíacas nutricionais importantes em nações desenvolvidas, particularmente nos pacientes portadores de doenças crônicas como Aids, naqueles com anorexia nervosa e nos casos com insuficiência cardíaca grave nos quais a hipoperfusão e a congestão venosa gastrintestinais levem à anorexia e à má absorção. Os riscos relacionados com as cirurgias cardíacas abertas são maiores em desnutridos, e tais pacientes são beneficiados por hiperalimentação pré-operatória. PARTE X Doenças do Sistema Cardiovascular Deficiência de tiamina (Beribéri) (Ver também o Cap. 74.) A desnutrição generalizada geralmente é acompanhada por deficiência de tiamina, ainda que esta hipovitaminose também possa ocorrer em casos nos quais as ingestões proteica e calórica sejam adequadas, particularmente no Extremo Oriente onde o arroz polido, pobre em tiamina, pode ser um componente importante da dieta. Nas nações do ocidente, região onde está disseminado o uso de farinhas enriquecidas com tiamina, a deficiência dessa vitamina está restrita aos alcoolistas, aos indivíduos praticantes de dietas exóticas e aos pacientes sendo submetidos à quimioterapia. De qualquer forma, quando medimos a reserva desta vitamina por meio do efeito do pirofosfato de tiamina (PFT) encontramos deficiência em 20 a 90% dos pacientes com insuficiência cardíaca crônica. Tal deficiência parece ter origem na ingestão dietética reduzida e no aumento da excreção urinária da tiamina induzido por diuréticos. A administração aguda de tiamina a esses pacientes aumenta a fração de ejeção ventricular esquerda e as excreções de sal e água. Clinicamente, os pacientes com deficiência de tiamina geralmente apresentam evidências de desnutrição generalizada, neuropatia periférica, glossite e anemia. A síndrome cardiovascular clássica associada é caracterizada por insuficiência cardíaca de alto débito, taquicardia e, com frequência, elevação biventricular nas pressões de enchimento. A principal causa do estado de alto débito é a depressão vasomotora que leva à diminuição da resistência vascular periférica, sendo que o mecanismo exato ainda não foi esclarecido. O exame cardiológico revela pressão de pulso ampla, taquicardia, terceira bulha e, com frequência, sopro sistólico apical. A eletrocardiografia (ECG) pode revelar diminuição da voltagem, prolongamento do intervalo QT e anormalidades na onda T. A radiografia de tórax em geral demonstra cardiomegalia e sinais de insuficiência cardíaca congestiva (ICC). A resposta à administração de tiamina é frequentemente dramática, com elevação da resistência vascular periférica, diminuição do débito cardíaco, resolução da congestão pulmonar e redução da área cardíaca, todos esses efeitos ocorrendo no prazo entre 12 a 48 h. Ainda que a resposta ao uso de inotrópicos e diuréticos possa ser inadequada antes da terapia com tiamina, esses agentes talvez sejam importantes após a administração da tiamina, uma vez que o ventrículo esquerdo pode não ser capaz de lidar com o aumento da carga de trabalho que ocorre com o retorno do tônus vascular. Deficiências das vitaminas B6, B12 e folato (Ver também o Cap. 74.) As vitaminas B6, B12 e folato são cofatores no metabolismo da homocisteína. Sua deficiência provavelmente contribui para a maioria dos casos de hiper-homocisteinemia, um distúrbio associado à elevação do risco de aterosclerose. A suplementação dessas vitaminas reduziu a incidência de hiper-homocisteinemia nos EUA; entretanto, não foram comprovados benefícios cardiovasculares clínicos relacionados com a normalização nos níveis de homocisteína. ■ OBESIDADE (Ver também o Cap. 77.) A obesidade grave, particularmente a abdominal, está associada a aumento das taxas de morbidade e mortalidade cardiovasculares. Embora a obesidade em si não seja considerada uma doença, ela está relacionada com aumento na prevalência de hipertensão arterial, intolerância à glicose e DAC ateroscleróti- 31-2 ca. Além disso, os pacientes obesos apresentam uma anormalidade cardiovascular específica caracterizada por aumentos dos volumes sanguíneos total e central, do débito cardíaco e da pressão de enchimento do ventrículo esquerdo. A elevação do débito cardíaco parece ser necessária para suprir as necessidades metabólicas do tecido adiposo em excesso. A pressão de enchimento do ventrículo esquerdo, com frequência, se encontra no limite superior do normal em repouso e se eleva excessivamente com o exercício. Em parte como resultado da sobrecarga volumétrica crônica, é possível ocorrer hipertrofia cardíaca excêntrica com dilatação do coração e disfunção ventricular. Além disso, a alteração nos níveis das adipocinas secretadas pelo tecido adiposo talvez contribua para o remodelamento adverso do miocárdio via efeitos diretos sobre os miócitos cardíacos e outras células. Do ponto de vista patológico, observa-se hipertrofia do ventrículo esquerdo, e em alguns casos, também do direito, além de dilatação cardíaca generalizada. Podem sobrevir congestão pulmonar, edema periférico e intolerância ao exercício; entretanto, o reconhecimento desses sinais pode ser dificultado nos pacientes com obesidade mórbida. A redução do peso é a terapêutica mais efetiva, resultando em diminuição do volume sanguíneo e em retorno do débito cardíaco ao normal. Entretanto, a redução rápida do peso pode ser perigosa, já tendo sido descritas arritmias cardíacas e morte súbita causadas por desequilíbrio eletrolítico. O tratamento com inibidores da enzima conversora da angiotensina, restrição da ingestão de sódio, e diuréticos pode ser útil no controle dos sintomas de insuficiência cardíaca. Esta forma de doença cardíaca deve ser distinguida da síndrome de Pickwick (Cap. 264) que pode ter em comum diversas características cardiovasculares secundárias à obesidade grave, mas que, além delas, apresenta com frequência outros componentes como apneia central, hipoxemia, hipertensão pulmonar e cor pulmonale. ■ DOENÇA TIREOIDIANA (Ver também o Cap. 341.) O hormônio tireoidiano exerce grande influência sobre o sistema cardiovascular por meio de diversos mecanismos diretos e indiretos e não é surpreendente que os efeitos cardiovasculares sejam proeminentes tanto no hipo quanto no hipertireoidismo. O hormônio tireoidiano produz aumento no metabolismo total e no consumo de oxigênio o que indiretamente aumenta a carga de trabalho cardíaco. Além disso, o hormônio tireoidiano produz efeitos diretos inotrópico, cronotrópico e dromotrópico semelhantes àqueles observados com a estimulação adrenérgica (p. ex., taquicardia, aumento do débito cardíaco) que, ao menos em parte, são mediados tanto por efeitos transcricionais quanto por não transcricionais do hormônio tireoidiano sobre a miosina, a ATPase ativada pelo cálcio, a Na+,K+-ATPase e os receptores beta-adrenérgicos no miocárdio. Hipertireoidismo Entre as manifestações cardiovasculares mais comuns no hipertireoidismo estão palpitações, hipertensão sistólica e fadiga. A taquicardia sinusal está presente em cerca de 40% dos pacientes hipertireóideos e a fibrilação atrial em aproximadamente 15%. O exame físico pode revelar precórdio hiperdinâmico, pressão de pulso aumentada, aumento na intensidade da primeira bulha e do componente pulmonar da segunda bulha, além de terceira bulha. Foi descrita incidência elevada de prolapso da valva mitral em pacientes com hipertireoidismo nos quais é possível ouvir um sopro mesossistólico na borda esternal esquerda com ou sem clique mesossistólico. É possível auscultar ruído de atrito pleuropericárdico (atrito de Means-Lerman) no segundo espaço intercostal esquerdo durante a expiração o que se acredita seja resultado dos movimentos cardíacos hiperdinâmicos. Os pacientes mais idosos com hipertireoidismo podem se apresentar apenas com as manifestações cardiovasculares da tireotoxicose, como taquicardia sinusal, fibrilação atrial e hipertensão arterial, todas resistentes ao tratamento até que o hipertireoidismo seja controlado. É incomum a ocorrência de angina de peito assim como de ICC a não ser que haja cardiopatia concomitante; nesses casos, os ©2013, AMGH Editora Ltda. Todos os direitos reservados. sintomas com frequência se resolvem com o tratamento do hipertireoidismo. ■ FEOCROMOCITOMA (Ver também o Cap. 343.) Além da hipertensão arterial instável ou mantida, os níveis elevados de catecolaminas produzidos pelo feocromocitoma podem produzir também lesão miocárdica direta. Em cerca de 50% dos pacientes que morrem com feocromocitoma são ■ ARTRITE REUMATOIDE E DOENÇAS VASCULARES DO COLÁGENO Artrite reumatoide (Ver também o Cap. 321.) A artrite reumatoide pode estar associada a alterações inflamatórias em qualquer uma das estruturas cardíacas ou em todas elas, ainda que a pericardite seja o quadro mais frequentemente encontrado. Em 10 a 50% dos pacientes com artrite reumatoide é possível encontrar derrame pericárdico em eletrocardiografia, particularmente naqueles com nódulos subcutâneos. Ainda assim, apenas uma pequena fração desses pacientes apresenta pericardite sintomática que, quando presente, costuma ter curso benigno apenas ocasionalmente evoluindo para tamponamento cardíaco ou pericardite constritiva. O líquido pericárdico geralmente é um exsudato, com baixas concentrações de complemento e glicose e com colesterol elevado. Em cerca de 20 % dos casos há arterite coronária com inflamação da íntima e edema, mas tais casos raramente evoluem com angina de peito ou com infarto do miocárdio. A inflamação e a formação de granuloma podem afetar as valvas cardíacas, na maioria das vezes a mitral e a aórtica, sendo possível que haja regurgitação clinicamente significativa em razão da deformidade valvar. A miocardite é incomum e raramente resulta em disfunção cardíaca. O tratamento deve ser dirigido à artrite reumatoide subjacente podendo incluir o uso de glicocorticoides. Nos pacientes com tamponamento deve-se proceder a pericardiocentese em regime de urgência, mas a pericardiectomia geralmente se faz necessária nos casos com constrição pericárdica. Manifestações Cardíacas de Doenças Sistêmicas ■ CARCINOIDE MALIGNO (Ver também o Cap. 350.) Os tumores carcinoides na maioria das vezes se originam no intestino delgado e produzem diversas aminas vasoativas (p. ex., serotonina), quininas, indóis e prostaglandinas que se acredita sejam responsáveis por sinais como diarreia, rubor e labilidade na pressão arterial, que caracterizam a síndrome carcinoide. Cerca de 50% dos pacientes com síndrome carcinoide têm envolvimento cardíaco, que geralmente se manifesta na forma de anormalidades nas estruturas do lado direito do coração. Tais pacientes invariavelmente apresentam metástases hepáticas o que permite que as substâncias vasoativas perpassem o metabolismo hepático. O envolvimento do lado esquerdo do coração é raro e, quando presente, indica carcinoide pulmonar ou shunt intracardíaco. Do ponto de vista patológico, as lesões carcinoides são placas fibrosas formadas por células musculares lisas envolvidas por estroma de glicosaminoglicanos e colágeno. Elas ocorrem nas valvas cardíacas onde causam disfunção, assim como no endotélio das câmaras cardíacas e dos grandes vasos. A doença cardíaca carcinoide na maioria das vezes se apresenta como insuficiência tricúspide, estenose pulmonar, ou ambas. Em alguns casos, pode haver estado de alto débito, presumivelmente como resultado da diminuição na resistência vascular sistêmica causada pelas substâncias vasoativas liberadas pelo tumor. O tratamento com análogos da somatostatina (p. ex., octreotida) ou com ␣-interferon melhora os sintomas e a sobrevida dos pacientes com doença cardíaca carcinoide, mas não parece produzir qualquer melhora nas anormalidades valvares. Em alguns pacientes com sintomas graves, está indicada a substituição da valva. É possível haver espasmo coronariano em pacientes com síndrome carcinoide, presumivelmente em razão da circulação de substâncias vasoativas. ■ ACROMEGALIA (Ver também o Cap. 339.) A exposição do coração a excesso de hormônio de crescimento pode resultar em ICC causada por débito cardíaco elevado, disfunção diastólica em razão de hipertrofia ventricular (com aumento das dimensões da câmara ventricular esquerda ou espessamento da parede), ou disfunção sistólica global. Ocorre hipertensão arterial em até 33% dos pacientes com acromegalia, caracterizada pela supressão do eixo renina-angiotensina-aldosterona e aumento do sódio corporal total e do volume plasmático. Em cerca de 33% dos pacientes observa-se alguma forma de cardiopatia e a acromegalia está associada a risco dobrado de morte cardiovascular. CAPÍTULO e31 Hipotireoidismo As manifestações cardíacas do hipotireoidismo incluem reduções de débito cardíaco, volume sistólico, frequência cardíaca, pressão arterial e pressão de pulso. Cerca de 33% dos pacientes apresentam derrame pericárdico que raramente evolui com tamponamento e provavelmente é resultado do aumento da permeabilidade capilar. Outros sinais clínicos são cardiomegalia, bradicardia, pulsos arteriais débeis, abafamento das bulhas cardíacas e derrame pleural. Embora os sinais e sintomas de mixedema possam ser confundidos com os da ICC, a insuficiência miocárdica é rara na ausência de outra cardiopatia. O ECG geralmente revela bradicardia sinusal e baixa voltagem podendo haver também prolongamento do intervalo QT, diminuição da voltagem da onda P, retardo na condução AV, distúrbios na condução intraventricular e anormalidades inespecíficas no segmento ST-T. A radiografia de tórax pode revelar cardiomegalia, muitas vezes com uma configuração em “garrafa d’água”, derrame pleural e, em alguns casos, sinais de ICC. Do ponto de vista patológico, o coração mostra-se pálido e dilatado e, com frequência, apresenta edema miofibrilar, perda das estrias e fibrose intersticial. Os pacientes com hipotireoidismo frequentemente apresentam elevação do colesterol e dos triglicerídeos e, consequentemente, DAC aterosclerótica precoce. Antes do tratamento com hormônio tireoidiano, os pacientes com hipotireoidismo não costumam apresentar angina de peito, presumivelmente em razão das demandas metabólicas menores típicas de sua doença. Entretanto, podem ocorrer angina e infarto do miocárdio no início da reposição hormonal, especialmente em pacientes idosos que tenham cardiopatia subjacente. Portanto, a reposição deve ser feita com cuidado, iniciando-se com doses menores a serem aumentadas gradualmente. encontradas necrose miocárdica focal e infiltração celular inflamatória, fatores que podem contribuir para a ocorrência de falência ventricular esquerda clinicamente significativa e edema pulmonar. Além disso, a hipertensão arterial associada resulta em hipertrofia ventricular esquerda. A disfunção do ventrículo esquerdo e a ICC podem se resolver após a remoção do tumor. Artropatias soronegativas (Ver também o Cap. 325.) As artropatias soronegativas, incluindo espondilite anquilosante, artrite reativa, artrite psoriática e as artrites associadas à retocolite ulcerativa e à enterite regional, estão fortemente associadas ao antígeno de histocompatibilidade HLA-B27 e podem estar acompanhadas de pancardite e de aortite proximal. A inflamação aórtica geralmente é limitada à raiz da artéria, mas pode se estender comprometendo a valva aórtica, a valva mitral e o miocárdio ventricular resultando em insuficiências aórtica e mitral, anormalidade da condução e disfunção ventricular. Cerca de 10% desses pacientes apresentam insuficiência aórtica significativa e 33%, distúrbios da condução; ambos são mais comuns em pacientes com envolvimento das articulações periféricas e doença com evolução prolongada. Pode ser necessário tratamento com substituição da valva aórtica e implante de marca-passo permanente. Ocasionalmente a regurgitação aórtica precede a artrite e, portanto, a possibilidade de artrite soronegativa deve ser considerada em pacientes jovens do sexo masculino com insuficiência aórtica isolada. Lúpus eritematoso sistêmico (LES) (Ver também o Cap. 319.) Um percentual significativo dos pacientes com LES apresenta envolvimento cardíaco. A pericardite é comum, ocorrendo em cerca de 66% dos pacientes, e geralmente segue um ©2013, AMGH Editora Ltda. Todos os direitos reservados. 31-3 PARTE X curso benigno, ainda que possa evoluir com tamponamento ou constrição. As lesões endocárdicas características do LES são alterações verrugosas nas valvas, conhecidas como endocardite de Libman-Sacks. Elas, na maioria das vezes, se localizam sobre as valvas cardíacas esquerdas, particularmente sobre a superfície ventricular dos folhetos posteriores da mitral e são formadas quase inteiramente por fibrina. Tais lesões podem embolizar ou infectar, mas raramente causam regurgitação valvar hemodinamicamente significativa. A miocardite geralmente corre em paralelo à atividade da doença e, ainda que seja histologicamente comum, raramente resulta em insuficiência cardíaca clinicamente evidente a não ser que esteja associada à hipertensão. Embora possa ocorrer arterite das artérias coronárias epicardiais, raramente há isquemia miocárdica. No entanto, observa-se aumento na incidência de aterosclerose coronariana que provavelmente está mais relacionada com fatores de risco associados e com o uso de glicocorticoides do que com o próprio LES. Os pacientes com síndrome do anticorpo antifosfolipídio podem ter maior incidência de anormalidades cardiovasculares, incluindo regurgitação valvar, tromboses arterial e venosa, AVE precoce, infarto do miocárdio, hipertensão pulmonar e miocardiopatia. BIBLIOGRAFIA Bhattacharyya S et al: Carcinoid heart disease. 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