Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2012. ISSN 2317-9759 O CONHECIMENTO GEOGRÁFICO NAS SÉRIES INICIAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA – O CASO DO MUNICÍPIO DE RESERVA/PR SILVA, Adriana de Fátima da PIMENTEL, Carla Silvia INTRODUÇÃO Este trabalho resulta de uma pesquisa sobre o conhecimento geográfico de alunos egressos das séries iniciais e ingressantes no 6º ano do Ensino Fundamental II, do município de Reserva-PR. Buscamos reconhecer as noções e conceitos geográficos expressos nas propostas curriculares das séries iniciais do Ensino Fundamental para identificarmos, sob a ótica dos professores do 6º ano, os conhecimentos de Geografia que os alunos egressos das 5º ano revelam. Esta pesquisa teve abordagem qualitativa e, para tratamento das informações, seguimos as orientações da metodologia de análise de conteúdo (BARDIN, 2007). As análises fundamentaram-se nas Diretrizes Curriculares Estaduais de Geografia, nas Orientações Pedagógicas para os Anos Iniciais e em entrevistas realizadas com professores de Geografia do 6º ano do referido município e com as pedagogas responsáveis por acompanhar o trabalho dos professores das séries iniciais da rede municipal. O CONHECIMENTO GEOGRÁFICO E SUA IMPORTÂNCIA NA ESCOLA Ao refletirmos sobre a importância do conhecimento geográfico na vida das pessoas é inevitável nos questionarmos sobre as reais contribuições da Geografia escolar na formação do cidadão. O conhecimento geográfico permite que o aluno conheça, analise e interprete o espaço geográfico em suas diferentes escalas. Também a consciência espacial é necessária para que ele compreenda o lugar onde vive e sua conexão com o global. Ao estudar as interações homem/natureza o aluno percebe-se como sujeito pertencente à sociedade, capaz de modificar e transformar o espaço. A importância do conhecimento geográfico para o desenvolvimento social, cultural e intelectual de crianças, jovens e adultos é reconhecida pelos documentos curriculares oficiais, tanto da nação, quanto do estado e do município. Callai (2003) afirma que a disciplina de Geografia deve fornecer aos alunos as condições necessárias para a leitura do mundo que os rodeia, instrumentalizando-os a reconhecer os mecanismos que geram as mudanças no espaço. Ressaltando a importância do ensino de Geografia nos dias atuais, Cavalcanti (1998, p.24) destaca o valor do desenvolvimento do raciocínio espacial por parte dos alunos; da disciplina possibilitar o desenvolvimento de “modos do pensamento geográfico”. Ela afirma ainda que O ensino de Geografia deve visar ao desenvolvimento da capacidade de apreensão da realidade do ponto de vista da sua espacialidade. Isso porque se tem a convicção de que a prática da cidadania, sobretudo nesta virada de século, requer uma consciência espacial. [...]. É evidente a preocupação com a formação da consciência sobre o espaço em que vivem os alunos e aqueles percebidos e concebidos em diferentes fases da vida, também com o estímulo ao desenvolvimento do olhar geográfico, como forma de compreender a produção e configuração do espaço. PROPOSTAS CURRICULARES DE GEOGRAFIA NO MUNICÍPIO DE RESERVA – PR Identificamos que, tanto a Rede Municipal de Ensino, quanto a Rede Estadual de ensino, 52 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2012. ISSN 2317-9759 do município de Reserva – PR utilizam os documentos curriculares organizados pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná – SEED. Nas séries iniciais do Ensino Fundamental de nove anos o documento base é denominado: Orientações Pedagógicas para os Anos Iniciais. No que se refere à Geografia, esse documento sugere o que deve ser assegurado aos alunos nesta disciplina, propondo objetivos gerais de ensino e outros direcionados à área. Apresenta, ainda, os conceitos básicos para que o professor estruture o seu plano de trabalho, que são: lugar, paisagem e território. Nas Orientações Curriculares (PARANÁ, 2010) detectamos um breve comentário voltado à cartografia, que propõe ao professor uma proposta de alfabetização cartográfica, porém, sem especificações. Para isso, sugere um particular envolvimento no que se refere à construção de legenda, orientação, proporção, escala, bem como o desenvolvimento da lateralidade. Por meio da entrevista com as coordenadoras pedagógicas responsáveis pelo ensino do município, constatamos que os professores que atuam nas séries iniciais no referido município, elaboram seus planos de trabalho tomando como referência as Orientações Curriculares do Estado. Os programas curriculares das escolas estaduais da cidade de Reserva – PR fundamentamse nas Diretrizes Curriculares da Educação Básica (PARANÁ, 2008), também, organizadas pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná. As DCEs apresentam como conceitos de referências para ensinar Geografia o lugar, a paisagem, o território, as redes, a região, a sociedade e a natureza. Esse documento orienta ainda que a abordagem dos fenômenos deve se dar em diferentes escalas espaciais: local, regional, nacional e mundial. Além disso, trabalha com conteúdos estruturantes, os quais direcionam a trabalho com as temáticas, sendo: dimensão Econômica do Espaço Geográfico, dimensão Política do Espaço Geográfico, dimensão Socioambiental do Espaço Geográfico e dimensão Demográfica e Cultural do Espaço Geográfico. Todos esses elementos foram constatados nos planos de trabalho dos professores. CONHECIMENTO GEOGRÁFICO DOS ALUNOS EGRESSOS DAS SÉRIES INICIAIS DO MUNICÍPIO DE RESERVA-PR Buscando responder às questões levantadas em nossa pesquisa (2011), realizamos entrevistas semiestruturadas com os professores de Geografia que atuam no 6º ano dos seguintes estabelecimentos de ensino: Colégio Estadual Gregório Szeremeta E.F. e M.; Colégio Est. Manoel Antonio Gomes E. F. e M. e Colégio Est. Professora Helena Ronkoski Fioravante – E. F. e M., ambos na cidade de Reserva – Pr Por meio das respostas dos professores e com base nos programas/propostas das escolas municipais analisados, tentamos identificar as possíveis continuidades ou rupturas existentes na transição curricular entre a fase I e fase II do Ensino Fundamental cursado pelos alunos do município de Reserva. De acordo com as considerações das DCEs de Geografia perguntamos aos professores quais noções/conceitos geográficos eles conseguem detectar nos alunos que ingressaram no 6º ano. As respostas foram semelhantes, os professores afirmam que os alunos chegam à referida série sabendo muito pouco dos conceitos da ciência geográfica, considerados fundamentais pelas DCEs. De acordo com eles os alunos apresentam uma noção do conceito de lugar, refletido no seu espaço de vivência. Citam também a paisagem, noções de leitura de mapas e de espaço, porém, todos afirmam que tais conhecimentos, noções e conceitos aparecem superficialmente nos alunos, mencionam também algumas noções de orientação (pontos cardeais1) como afirma um Professor (04). Foi unânime a consideração de que o ensino da Geografia no 6º ano deve iniciar “do zero”, pois, segundo os professores, os alunos chegam sem os conhecimentos prévios necessários para o entendimento e compreensão dos conceitos que aprenderão nessa série. Eles afirmam: “eles chegam 1 Expressão utilizada pelo professor 2 em entrevista concedida. 53 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2012. ISSN 2317-9759 com uma grande defasagem no que diz respeito à Geografia, pouca base na disciplina, alguns nem sabem o que é a Geografia. Os conhecimentos prévios são bem superficiais”. (Professor 01). Outro diz, “são poucos. Possuem algumas noções de lugar, espaço local, paisagem, porém muito superficialmente. Os professores têm que iniciar a Geografia com eles. (Professor 03) Eles citam ainda as dificuldades de orientação, localização e, segundo eles, alguns alunos não possuem inclusive noções de lateralidade. Todos falam da dificuldade que os alunos possuem no que diz respeito à cartografia. Eles afirmam: “Sem dúvida a Cartografia. Deveriam ter pelo menos alguma noção, mas a grande maioria não sabe ler um mapa sequer. Os alunos não possuem conhecimento local, do espaço de vivência” (Professor 05). “Vários, mas principalmente conhecimentos de cartografia. A maioria dos alunos não entende um mapa representado de forma simples, por exemplo.” (Professor 03). Convém, aqui, ressaltarmos a importância que a cartografia possui na formação do cidadão. Por meio do conhecimento cartográfico pode-se ler e interpretar o espaço que o rodeia e, consequentemente, lugares distantes. Esse conhecimento permitirá ao aluno a compreensão da complexidade e das conexões existentes no mundo atual. Em nossa entrevista solicitamos aos professores que avaliassem o ensino da Geografia nas séries iniciais do ensino fundamental. Eles afirmam que a disciplina de Geografia nesse nível de ensino é “superficial”, que os alunos não possuem noções básicas e não entendem a importância da mesma para a sua vida. Podemos constatar essas afirmações nas seguintes respostas: “Em relação à Geografia, deixa muito a desejar. Os alunos não compreendem a Geografia na vida deles e transmitem a idéia de que para ele a Geografia não é importante. É um ensino muito superficial.” (Professor 03) “Está longe de ser considerado razoável. Não prepara o aluno para as séries finais. Os alunos não compreendem a importância da Geografia para a sua vida, e seu conhecimento prévio é basicamente da Geografia Tradicional, descritiva.” (Professor 01) Para os professores entrevistados isso acontece devido a pouca importância que a disciplina de Geografia recebe dos professores das séries iniciais. Eles afirmam que as disciplinas de Português e Matemática são consideradas mais importantes e por isso são mais enfatizadas, deixando de lado disciplinas como a Geografia. Além disso, os conteúdos da Geografia são muitas vezes confundidos com os conteúdos da disciplina de ciências. Também perguntamos aos professores se os conhecimentos prévios dos alunos do 5º ano são considerados na elaboração do seu plano de trabalho. Todos responderam que sim, mesmo sendo poucos ou quase inexistentes. É a partir deles que os conceitos da Geografia são criados ou recriados e dessa forma constituem-se de extrema importância. Eles tomam como referência na elaboração de seu plano de trabalho docente, a curiosidade dos alunos sobre um determinado assunto, o interesse que eles possuem. Facilitando dessa forma a construção de conhecimentos. Contudo, os professores não conseguem avaliar a existência de conhecimentos prévios e identificá-los logo no início do ano letivo. Declaram que essa avaliação é feita no decorrer do 1º bimestre e é por meio das atividades propostas que eles detectam as dificuldades dos alunos e os conhecimentos que ainda não possuem. “Sim, pois é a partir deles que inicio meu trabalho. Porém, não detectamos esses conhecimentos prévios logo no início do ano. Eles vão surgindo por meio das atividades propostas no 1º bimestre e das dificuldades que eles apresentam. O 1º bimestre é quase todo pra isso” (Professor 03) “Não tenho como identificar no começo do ano esses conhecimentos, pois não sabemos o que o professor das séries iniciais trabalhou. O 1º bimestre é usado praticamente para constatar as possíveis dificuldades que o aluno possui só então o trabalho é iniciado.” (Professor 01) Concluímos que se os professores não reconhecem que os alunos egressos das séries iniciais apresentam aprendizado dos conceitos indicados pelas DCEs não se torna possível reconhecer sequências, nem mesmo rupturas no que se refere ao aprendizado geográfico. Também 54 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2012. ISSN 2317-9759 sobre os saberes cartográficos, criticam a ausência de compreensões nesse campo, ao mesmo tempo em que afirmam que esse conhecimento é difícil de ser ensinado aos alunos. Podemos considerar aqui o pouco conhecimento de Geografia dos professores, que em sua maioria, fizeram Pedagogia, Magistério e/ou Normal Superior. Esses cursos mantêm uma pequena carga horária destinada ao ensino de Geografia para esses professores. CONSIDERAÇÕES FINAIS Essa pesquisa revelou a real situação do ensino de Geografia no município de Reserva-Pr. Ao longo do nosso trabalho, pudemos confirmar o que suspeitávamos, a deficiência do ensino de Geografia como proposto nas DCEs (2008) do município. As análises nos permitem considerar que existem descontinuidades na transição dos alunos das séries iniciais para o 6º ano, ou mesmo a ausência de conhecimentos de Geografia, se considerado as noções e os conceitos expressos nas propostas curriculares. Os professores declaram ter que iniciar o ensino de Geografia “da estaca zero”, inclusive demonstrar a sua importância, relacionando-a com a vida dos alunos. As causas são várias e para identificá-las é necessário um estudo mais aprofundado da questão, porém, podemos citar como determinantes a falta de formação em Geografia dos professores que lecionam nas séries iniciais e também a falta de diálogo destes com os professores do 6º ano, em relação à seleção de conteúdos geográficos a serem desenvolvidos no decorrer da Educação Básica. REFERÊNCIAS CALLAI, H. C. Do Ensinar Geografia ao produzir o pensamento geográfico. In: REGO, N. et al. Um pouco do mundo cabe nas mãos; geografizando em educação o local e o global. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003. p. 57-74. CAVALCANTI, L. S. Geografia, escola e construção de conhecimentos. 3. ed. Campinas: Papirus, 1998. 192 p. PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Diretrizes curriculares da educação básica – Geografia. Curitiba, SEED, 2008. PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Ensino fundamental de nove anos: orientações pedagógicas para os anos iniciais. Curitiba, SEED, 2010. 55