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EIXO TEMÁTICO 6: RELAÇÕES ENTRE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS, BIOLOGIAS E CULTURAS
MODALIDADE: PÔSTER – PO.01
ASTRONOMIA GUARANI MBYA: EDUCAÇÃO E SABERES TRADICIONAIS
Fernanda Amigo P. da Silva (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ)
Ana Paula da Silva (Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ)
Lana Cláudia de Souza Fonseca (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ)
Resumo
O objetivo do trabalho é apresentar como os conhecimentos astronômicos dos Guarani Mbya
do Rio de Janeiro são transmitidos, além de estabelecer relações entre o ensino tradicional e
as bases da transferência de conhecimentos Guarani. A terra Sapukai -Angra dos Reis- é um
território Guarani Mbya no Rio de Janeiro e possui uma escola bilíngue com professores
índios. Após análise da cultura Guarani, concluiu-se que não há como comparar o ensino
tradicional com o ensino Guarani. Enquanto no primeiro, os conhecimentos são basicamente
passados nas escolas, os indígenas mantém as tradições seculares, baseadas na oralidade e na
religiosidade. Contudo, apesar de os conceitos serem diferentes entre si, a interculturalidade
proporcionaria uma grande ampliação de conhecimentos para ambos os povos.
Palavras-chave: Guarani Mbya, conhecimentos astronômicos, saberes tradicionais.
1. Introdução
Este trabalho é fruto de uma monografia de conclusão do curso de Licenciatura em
Ciências Biológicas e objetiva apresentar como os conhecimentos astronômicos dos Guarani Mbya
do Rio de Janeiro são transmitidos, além de discutir como os conhecimentos tradicionais podem
dialogar com os conhecimentos Guarani.
Com o advento da Lei 11645/2008 que orienta “incluir no currículo oficial da rede de
ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena””,
percebemos que os cursos de Formação de Professores ainda não estão preparados para o
trabalho com esta temática. Um dos resultados dessa lacuna é a ausência nos currículos
escolares de uma discussão sobre a temática indígena, o que dificulta, no caso das Ciências
Biológicas, a abordagem de diversos conteúdos que poderiam se integrar com outros
conhecimentos gerais, ampliando a leitura de mundo dos alunos.
Neste trabalho buscamos apresentar o povo Guarani, em especial a terra Sapukai,
localizada em Angra dos Reis (RJ), destacando como os indígenas constroem conhecimentos
sobre Astronomia, em contraponto ao sistema educacional não indígena. Os conteúdos
relativos à Astronomia são, geralmente, tratados no sexto ano do Ensino Fundamental,
enquanto os Guarani estudam a Astronomia, não como uma matéria escolar, e sim, como um
conhecimento de vida, que é adquirido em tempo determinado e local sagrado, ou seja, a
astronomia, assim como outros assuntos de suma importância para a sobrevivência dos
Guarani, são temas ensinados nos locais religiosos do território indígena.
Os povos indígenas apresentam particularidades em seus costumes, crenças e línguas,
além de sua relação com o meio ambiente e o país em que habitam. Segundo o censo
realizado pelo IBGE em 2010, no Brasil existem hoje 896,9 mil indígenas, equivalendo a
0,47% da população brasileira, distribuídos entre áreas rurais e urbanas em todas as regiões.
Foram identificadas 505 terras indígenas correspondendo a um total de 12,5% do território
brasileiro, sendo expressiva a concentração na Amazônia Legal. A investigação sobre os
povos indígenas apontou a existência de 305 etnias e 274 línguas.
Os Guarani encontram-se presentes ao longo da América Latina, distribuídos entre
Paraguai, Argentina, Bolívia, Brasil e Uruguai. Essa organização é fruto de migrações
independente de delimitação política de estados ou de nações na busca da “Terra sem males”.
Esta questão cosmológica receberá um tópico mais aprofundado ao longo do texto.
No Brasil, a população Guarani atual é de aproximadamente 60 mil índios, vivendo em
mais de 100 municípios, localizados em nove estados brasileiros: Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Paraná, Tocantins, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro. Os Guarani
estão subdivididos em três grupos linguísticos: Mbya, Kaiowá e Ñandeva.
1.1. Guarani Mbya no Sul fluminense
No Rio de Janeiro existem atualmente seis territórios guaranis, dos quais cinco estão
localizados na região Sul Fluminense – Arandu Mirim, Itaxĩ, Guyraytapu, Jahape no
município de Paraty, Sapukai em Angra dos Reis, e Itarypu, em Camboinhas, no município de
Niterói (SILVA, 2011: 4).
A chegada ao Rio de Janeiro foi proporcionada pelo deslocamento de uma população
vinda da região sul do Brasil, Argentina e Paraguai, dando origem a três tekoa (terra) na
região fluminense (PISSOLATO, 2007: 44). Um grupo vindo do vale do Rio Paraná seguiu
em direção ao litoral fluminense, passando a habitar uma área cortada pelo rio Paraty-Mirim,
no alto da Serra da Bocaina. Com a abertura da estrada Rio-Santos, em 1972, foi descoberto
este território, denominado Sapukai, situado a 25 km da cidade de Angra dos Reis (RJ).
A tekoa Sapukai está localizada na serra da Bocaína, cercada pelo verde da Mata
Atlântica, bastante conservada. Conforme relata o professor Karaí Mirim, em Sapukai há uma
população atual de 480 indígenas. Grande parte do bem estar do grupo depende diretamente
das relações estabelecidas com ciclos e processos ecológicos. Estes, vivenciados desde
tempos imemoriáveis, orientam a vida cotidiana e ritual, em uma interação saudável e
equilibrada entre indivíduos e o cosmo (SILVA, 2011: 4).
1.2. Nhandereko: saberes, arte, tradição
A valorização e preservação do conhecimento tradicional tem o intuito de manter sua
cultura e fortalecimento da história do povo em seu território tradicional. As danças rituais, as
rezas na Opy (Casa de reza), o batismo do milho dentre outros, são práticas culturais que
colaboram para a afirmação da identidade étnica (TEAO, 2007: 39). Elementos como a
autodenominação, a língua, a organização social, a cosmologia, a economia e a
territorialização são considerados particularidades culturais deste grupo.
Os Guarani possuem uma ampla observação dos fenômenos e do cosmos, tornando-os
exímios conhecedores do ambiente em que se inserem, principalmente da Mata Atlântica. As
fases da lua guiam além de seu calendário, cerimônias, plantio, colheita, entre outros
(VIEIRA, 2006: 95). Para eles, “Nhanderu1 está presente em tudo o que está posto no mundo.
Por isso é necessário saber respeitar e se apropriar das coisas da natureza sem destruí-la. A
relação que têm com a terra, com a natureza, é de um profundo respeito” (VIEIRA, 2006: 95).
Para desenvolver o nhandereko (modo de ser guarani), é preciso encontrar a “Terra sem
males” (TEAO, 2007: 54). Inicialmente é necessária uma busca por tekoa (lugares onde
existam condições apropriadas ao nhandereko e consequente formação de seus territórios),
onde são considerados quesitos como a proximidade à região de Mata Atlântica, ao mar e a
leste. Entretanto, a Terra sem Males não é apenas um ambiente adequado, para alcançá-la
deve haver subordinação às normas de vida em sociedade, como não ingerir bebidas
1
Para os Guarani, Nhanderu ete é o criador.
alcoólicas, respeitar os mais velhos e os caciques, não se casar com os brancos, pedir
permissão aos espíritos para caçar e pescar, entre outros (TEAO, 2007:54).
Os Guarani são muito religiosos, sendo possível observar suas crenças em tudo que
realizam: “eles acreditam que estão rodeados pelos espíritos que habitam os animais, as
pedras, as matas, o ar que respiram, a água que saciam sua sede, enfim, sua vida.” (VIEIRA,
2006 :91). A Opy é a maior e mais resistente construção da tekoa, sendo um espaço sagrado
para esse grupo, onde eles rezam, cantam e dançam em homenagem ao seu criador,
Nhanderu: “A opy – casa de reza – é a raiz de tudo e a escola só é mais um galho” (Cacique
Verá Mirim).
Os rituais Guarani têm como característica o fortalecimento da educação religiosa
individual e coletivamente, sendo abordadas durante sua prática narrativas tradicionais, que
“explicam a organização social, a ciência, a história, a cosmologia, as relações com a
natureza, enfim, os conhecimentos acumulados historicamente desse povo” (VIEIRA, 2006:
97).
A arte Guarani Mbya consiste em uma fonte de subsistência, sem esquecer as
tradições. Para confecção do artesanato são usados vários tipos de bambu, palha, raiz e cipó e
uma grande variedade de desenhos geométricos, que transmitem mensagens relacionadas à
mitologia e cosmologia guarani.
Os Guarani são “um povo tradicionalmente agricultor”2, com um grande acúmulo de
saberes populares sobre propriedades medicinais das plantas. A identidade coletiva Guarani
Mbya é composta por laços de parentesco juntamente com sua língua, se fazendo presente não
só dentro do grupo, mas também em famílias viventes fora da comunidade. A cultura se
constitui em um “bem herdado” das gerações anteriores, seus antepassados, e se expressa
especialmente nos rituais da Opy. A cultura é o “modo de ser” expresso em três elementos:
educação, linguagem e economia, presentes nas atividades da comunidade (ROSA, 2009: 52).
A língua Guarani é falada por diferentes grupos/povos indígenas, tendo variações na
pronúncia e nas sílabas tônicas, sobretudo no vocabulário. A língua, além de possuir seu
grande papel na “educação das crianças, na divulgação de conhecimentos e na comunicação
inter e entra aldeias”3, é o mais forte elemento da identidade guarani, sendo fundamental para
expressar a maneira de pensar do povo guarani. A oralidade é uma tradição dentre eles, sendo
2
3
In: IPHAN, CNFPC, UERJ. Mano‟ĩ rapé - O Caminho do Conhecimento. Rio de Janeiro: 2009.
In: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani-mbya/1290
uma de suas grandes forças. A escrita guarani passou a ser introduzida com maior realce em
1997, com a criação de NEIs4, que gerou a implantação de escolas bilíngue indígenas.
A educação tradicional Guarani possui uma ligação profunda com a natureza, a vida
espiritual dos rituais na casa de reza e a transmissão oral dos conhecimentos intergeracionais.
Diferente dos não indígenas, em que a educação tradicional ocorre apenas na escola, na
educação tradicional guarani o aprendizado é cotidiano e nunca cessa. Não há segmentação de
locais ou formas de aprendizado, a todo o momento se aprende algo novo, não sendo o âmbito
escolar fundamental para o aprendizado. Os conhecimentos tradicionais guarani são passados
através da oralidade através das gerações e, desta forma, a instituição escolar passa a ter um
papel secundário dentro das comunidades indígenas.
2. Saberes astronômicos Guarani
O que denominamos universo é muito diferente para os Guarani, não apenas conceitual,
mas culturalmente também. Freire (2009) diz que o processo de tradução é bastante
problemático entre línguas da mesma família linguística com afinidades tipológicas, históricas
e culturais, como o português e o espanhol, e mais complexo ainda no caso de línguas
indígenas. Procuramos, então, estabelecer uma análise de saberes tradicionais dos Guarani
ligados ao que chamamos astronomia, como por exemplo os conhecimentos sobre as estrelas,
astros, suas influências na vida e cotidiano, na cosmovisão Guarani.
Para desenvolver essa pesquisa, realizamos entrevistas, totalizando uma média de 8 horas,
com o professor da escola de Sapukai Karaí Mirim. Além de professor e uma liderança na
discussão das diretrizes Curriculares na Educação Indígena, Karaí Mirim é o primeiro
indígena do Rio de Janeiro com diploma do ensino superior. Ele graduou-se pelo curso de
Licenciatura e Educação no Campo na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro em
setembro de 2013.
Como toda sociedade, os Guarani também observam o céu e suas vidas e cotidiano são
influenciadas por fenômenos celestes, como a pesca, a caça, o plantio, a colheita. Em 1614, o
missionário capuchinho francês Claude d’Abbeville chamava a atenção para a importância
dos fenômenos celestes na vida dos Tupinambá. Segundo ele, eles “atribuem à Lua o fluxo e
o refluxo do mar e distinguem muito bem as duas marés cheias que se verificam na lua cheia
e na lua nova ou poucos dias depois” (AFONSO, 2009).
4
Núcleo de Educação Indígena, vinculados às Secretarias Estaduais de Educação e ao MEC
Galileu Galilei (1564-1642), em 1632, dezoito anos após, traz as primeiras explicações
sobre o fenômeno das marés, ao qual ele atribuiu aos movimentos de translação e rotação da
terra. Isaac Newton (1643-1727) aperfeiçoou a ideia de Galilei em 1687, ao demonstrar que a
atração gravitacional do sol e da lua sobre a superfície da Terra causa as marés. Este é um
exemplo, entre muitos outros, da sofisticação dos saberes tradicionais indígenas (AFONSO,
2010: 1).
Para entendermos os conhecimentos astronômicos guaranis, devemos inicialmente
compreender o conceito de “arandu” e “nhambojera”. Para os Guarani, arandu é o
conhecimento imaterial, aprendido com os avós, pais, tios. Já nhambojera é a materialização
do saber, por exemplo, quando uma mulher transforma seu conhecimento em um cesto. Todo
conhecimento Guarani está associado ao arandu e ao nhambojera. Os conhecimentos
astronômicos são nhambojera. Estes são repassados através das narrativas tradicionais, por
meio de narradores tradicionais. Para esse grupo indígena, há uma forte ligação entre o céu e a
terra, pois tudo que existe no céu, existe na terra também. Seus saberes estão entrelaçados em
todos os segmentos da vida, cultural, política e social, não havendo segmentação, diferente da
cultura juruá (não indígena).
A seguir, serão discutidos alguns saberes astronômicos dos Guarani Mbya de Sapukai.
Jaxy – O menino lua
Para os Guarani Mbya, sua história se passa em uma tekoa muito grande, em que muitas
mulheres queixavam-se de um homem que mexia com elas durante a noite. Uma jovem,
sabendo da história, sentiu medo que este homem entrasse em sua casa e mexesse com ela;
preparou uma tintura (yxy), de difícil remoção, que os Guarani utilizam em pinturas corporais,
para caso ele entrasse em sua casa, ela pudesse pinta-lo. Certa noite, ele entrou em sua casa e,
ao mexer com ela, a jovem passou a tintura no rosto do homem, que saiu correndo. No dia
seguinte, todos se reuniram e à medida que foram chegando, o jovem muito bonito surgiu
com a cara pintada. Esse era o menino lua (jaxy).
Jaxy está associado principalmente às mulheres guarani, como dentre outros aspectos, à
menstruação. Quando uma menina menstrua pela primeira vez, diz-se que a lua mexeu com
ela. O tempo é contado a partir do ciclo da lua e não em meses. Quando uma mulher fica
grávida, ela conta o período de gestação em quantidade de luas: um mês, uma lua; dois,
corresponde a duas luas e assim até o nascimento da criança.
Entre as luas nova (jaxy ray) e crescente (jaxy mitã) recomenda-se não plantar
algumas espécies vegetais, como a mandioca, a batata doce e a melancia, pois, conforme
Karaí Mirim, “A lua nova é quando a lua está pequena, e caso as plantações ocorram nesta
época, às plantas ficam pequenas também.”. Nesta época há maior reprodução de insetos, não
sendo recomendado o corte de taquara ou construções de casas. Entre as luas minguante (jaxy
inhaepytú) e cheia (ovaguaxu), são realizadas as plantações, sendo a melhor época para
construir casas, pois a taquara está ótima para o corte e não é afetada por pragas.
Rituais da lua
A astronomia rege grande parte das atividades indígenas, sendo a biodiversidade
intimamente associada a estações do ano e fases lunares. O batismo de crianças (ritual onde
elas recebem um nome guarani) e o plantio do milho dependem do calendário lunar. Seu
plantio ocorre entre julho e agosto, podendo variar. Primeiro, é necessário esperar a lua
minguante e quando está próximo do plantio, o guyra kokue (pássaro da roça – urutal) tem
que cantar.
As pessoas que irão plantar devem preparar as sementes antes de plantá-las, devendo
ser levadas para Opy, batizadas e no dia seguinte devem ser plantadas. Se não tem lugar para
plantar, não se batiza as sementes. Esse ritual é para a colheita ser farta. Atualmente, o
batismo de sementes acontece junto com o batismo das crianças. As sementes são batizadas
junto com as meninas e, no caso dos meninos, geralmente colocam-se folhas de erva mate.
Tapi’i rape – A constelação da anta
A constelação da Anta do Norte fica na região do céu limitada pelas constelações
ocidentais Cygnus (Cisne) e Cassiopeia (Cassiopéia). Ela é formada utilizando, também,
estrelas da constelação Lacerta (Lagarta), Cepheus (Cefeu) e Andromeda (Andrômeda).
(AFONSO, 2004).
O caminho da anta é uma das constelações mais valorizadas pelos Guarani. Karaí
Mirim contou que é o guyra nhandu (que significada pássaro-aranha) quem anda pelo
caminho da anta, por não ter outro caminho. A constelação da anta – tapi’i rape, na língua
guarani – é bastante conhecida por diferentes grupos indígenas, habitantes do Brasil.
(AFONSO, 2004:8) Na segunda quinzena de setembro, a anta surge ao anoitecer, no lado
Leste, indicando uma estação de transição entre o frio e o calor para os índios da região sul do
Brasil. Já para os povos indígenas do norte, significa seca e chuva.
Tuya’i – A constelação do Homem Velho
Na segunda quinzena de dezembro, quando o Homem Velho surge totalmente ao
anoitecer, no lado Leste, indica o início do verão para os índios do sul do Brasil e o início da
estação chuvosa para os índios do norte do Brasil (AFONSO Apud LIMA, 2005: 13).
Conforme o pesquisador Afonso (2004: 7) o mito relacionado a esta constelação é assim
narrado pelos índios:
“Conta o mito que essa constelação representa um homem cuja esposa estava interessada em
seu irmão. Para ficar com o cunhado, a esposa matou o marido, cortando-lhe a perna. Os
deuses ficaram com pena do marido e o transformaram em uma constelação”.
A constelação do Homem Velho é formada pelas constelações ocidentais Taurus e
Orion. A cabeça do Homem Velho é formada pelas estrelas do aglomerado estelar Hyades em
cuja direção se encontra a Tauri (Aldebaran), a estrela mais brilhante da constelação Taurus.
O aglomerado estelar das Plêiades se encontra na forma de um penacho amarrado acima da
cabeça do Homem Velho (AFONSO Apud LIMA, 2005: 13).
3. ............................................................................................................. Transmissão
de saberes
Os povos indígenas são sociedades orais, portanto seus conhecimentos são
fundamentalmente transmitidos através da fala, das narrativas. Segundo Karaí Mirim, os
saberes são transmitidos de acordo com a faixa etária. Os conhecimentos astronômicos são
passados dentro da Opy e apenas para jovens e adultos, sendo inviável a pesquisa desses
saberes na escola diferenciada.
Quem narra às kaxo (histórias) é o kaxomombe’uá, (pessoa que se interessa pelas histórias
e as conta durante a noite), enquanto todos estão reunidos. Para ser um contador basta apenas
gostar de contar histórias. Ele é muito importante, pois os mais velhos muitas vezes não
narram essas histórias. Então, é preciso o narrador lhe perguntar para depois transmitir.
Ainda em entrevista, Karaí Mirim fala sobre a existência de vários tipos de histórias,
como por exemplo, as de criação do mundo, contadas em fases da vida da pessoa. Existem
histórias apropriadas para cada fase da vida. As narradas na Opy são voltadas para os adultos,
que levam para seus filhos. As crianças ouvem de seus pais e conhecendo um pouco das
histórias.
4. Considerações finais
Ao final desse trabalho, fica claro que os Guarani possuem, como os demais povos,
conhecimentos acerca do que denominamos astronomia, e suas observações evidenciam
fatores, como a dinâmica das marés, o sistema de preparo das roças, plantio e colheita de
produtos agrícolas, frutos. No entanto, é importante destacar que esses saberes ainda são
pouco discutidos por nós e permanecem desconhecidos por certos setores da academia e da
maioria dos brasileiros.
A aceitação da cultura e conhecimentos indígenas e seus métodos de passagem
proporcionaria melhor qualidade de vida à cultura não indígena, podendo, entre outras coisas,
cooperar na formação de professores de ciências. A ciência trans e interdisciplinar influencia
positivamente para uma visão científica mais ampla e completa, evitando a segmentação de
conhecimento o que possibilita um melhor entendimento de mundo.
Para os indígenas tudo se conecta, diferente do que acorre na cultura não indígena. A
influência dos astros é cotidiana e interfere em todas as ações. As ricas memórias e o processo
de transmissão perduram até hoje, mesmo com as pressões sofridas por esses grupos. A
interculturalidade na ciência propicia um conhecimento mais amplo dos acontecimentos. Ao
realizar um diálogo entre as diversas áreas de conhecimentos da cultura não indígena e
disseminar este tipo de correlação dentro da escola, os alunos terão uma amplitude de
conhecimento interligado.
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