A FRAGMENTAÇÃO DO ESPAÇO AGRÍCOLA NAS NOVAS

Propaganda
A FRAGMENTAÇÃO DO ESPAÇO AGRÍCOLA NAS NOVAS
REGIONALIZAÇÕES DO BRASIL CONTEMPORÂNEO: O CASO DO
MATOPIBA
FRAGMENTATION OF AGRICULTURAL SPACE IN NEW
REGIONALIZATIONS THE CONTEMPORARY BRAZIL: MATOPIBA CASE
Willian Guedes Martins Defensor Menezes
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Programa de Pós-Graduação em Geografia (POSGEO)
Grupo de pesquisa Produção do Espaço Urbano (PEU)
[email protected]
RESUMO
Este estudo tem como propósito analisar a produção de fragmentações territoriais em novas
regiões do agronegócio brasileiro, como a região do Matopiba. Esta é uma das principais
características da nova compartimentação do espaço agrícola brasileiro, que cria Regiões
Produtivas do Agronegócio (RPAs) e fragmentações. Nas últimas décadas do século XX,
concomitante a modernização e reestruturação produtiva do espaço agrícola do Brasil, há uma
produção de desigualdades, a qual se apresenta nos territórios como processos de fragmentação.
A metodologia deste estudo estabelece temas norteadores, que respondem pela definição das
variáveis do estudo e que nortearão a produção de indicadores dos processos de fragmentação.
São eles: reestruturação produtiva da agropecuária, uso do território e a relação entre divisão
territorial do trabalho e formação da região. Busca-se contribuir com os debates sobre a
urbanização difusa, regionalização e difusão do agronegócio no espaço agrícola do Brasil.
Palavras-chave: fragmentação territorial, agricultura científica globalizada, regiões produtivas
do agronegócio (RPAs).
ABSTRACT
This study aims to analyze the production of territorial fragmentations in new regions of the
brazilian agribusiness, as the region Matopiba. A process that appears as one of the features of
the new partitioning of the brazilian agricultural space. In the last decades of the twentieth
century, in parallel to production modernization and restructuring of Brazil's agricultural space,
there is a production of inequalities, which is presented in the territories as fragmentation
processes. The methodology of this study establishes guiding themes, which account for the
definition of the variables and that will guide the production of indicators of fragmentation
processes. They are restructuring of agricultural production, land use and the relationship
between territorial division of labor and training in the region. The aim is to contribute to the
debates on urbanization, regionalization and dissemination of agribusiness in agricultural areas
of Brazil.
Key words: territorial fragmentation, global scientific agriculture, agribusiness production
regions (RPAs).
INTRODUÇÃO
A globalização atinge inúmeras dimensões da vida social, dentre elas a atividade
agrícola. A modernização da agricultura, ocorrida na segunda metade do século XX,
está diretamente associada com as dinâmicas da globalização, que por sua vez é
impulsionada pelo desenvolvimento do capitalismo.
A globalização acaba por ser um processo dinamizador da reorganização dos
territórios e da sociedade, gerando múltiplos debates sobre sua natureza, seus
significados, suas implicações e sua periodização. Para Santos (2008, p. 45), “a
globalização constitui o estágio supremo da internacionalização, à amplificação em
‘sistema-mundo’ de todos os lugares e de todos os indivíduos, embora em graus
diversos”. Harvey (2009, p. 88) entende “o processo de globalização como um processo
de produção de desenvolvimento temporal e geográfico desigual”.
O período atual é promotor de uma integração do mundo concomitante a
produção de desigualdades. A globalização é, portanto, baseada e produtora de
conflitos. “Com tais desígnios, o que globaliza falsifica, corrompe, desequilibra,
destrói”, afirma Santos (2008, p. 33). Ao mesmo tempo, o território apresenta-se tanto
de uma forma integrada, própria da globalização, como também no caráter
fragmentário, visto a diferenciação do uso (PEREIRA, 2006). Assim, a produção de
fragmentações em função da globalização é uma característica do atual período, ao
passo que consiste na geração de desigualdades. É o que escreve Souza (2002, p. 21):
“os processos de globalização e fragmentação implicam territórios diversos que se
constituem [...] em geografias da desigualdade”.
A agricultura moderna, cientifizada e mundializada é “um exemplo dessa
tendência e um dado essencial ao entendimento do que no país constituem a
compartimentação e a fragmentação atuais do território”. (SANTOS, 2003, p. 80). E o
domínio dos cerrados no Brasil Central constitui como um dos espaços mais
característico da expansão do agronegócio no país.
A análise das condições atuais permite afirmar o contrário daqueles que
imaginam o fim da região com o avanço da globalização. O que se vê é a permanência
da região como algo concreto, enquanto prática espacial resultante e necessária do modo
de produção, sobretudo no atual período. As regionalizações em cursos estão assentadas
na nova compartimentação do território. No entanto, é uma compartimentação que se
dá, agora, sobre a formação de fragmentação. O novo recorte regional, ele próprio,
corresponde a um “compartimento geográfico caracterizado pela especialização
produtiva (rural e urbana) ‘obediente’ a parâmetros externos (em geral internacionais)
de qualidade e de custos” (CASTILLO, p. 336-337, 2011). São processos que por um
lado articulam as escalas locais e regionais a economia global através de lógicas
verticais. Por outro lado, as horizontalidades, ainda que hegemonizadas pela lógica
vertical, “são extremamente difundidas, como evidenciado pela expansão das atividades
econômicas, pelo aumento da população e do mercado de trabalho, pela chegada dos
novos agentes econômicos [...] etc.” (ELIAS, p. 155, 2011). É uma nova
compartimentação do território nacional baseada no uso corporativo do território, numa
articulação em rede, complementar, hierárquica e excludente, por isso a nova
compartimentação está acompanhada por alienação e fragmentações territoriais.
O QUE É FRAGMENTAÇÃO TERRITORIAL
A compartimentação dos territórios é um processo tão antigo quanto a formação
das primeiras civilizações. Cada um dos inúmeros povos foi imprimindo suas marcas e
características nas porções do espaço que ocupava, originando as regiões, cada uma ao
molde do seu respectivo povo. A compartimentação e a regionalização podem ser assim
entendidas. São processos dinâmicos, agregando e alterando características com o
transcorrer da história.
Vamos dá um grande salto na história e chegar no século XX para mostrar que
este é um período de grandes mudanças, em que as regiões se configuram a partir de
novas bases, principalmente no após-guerra, com a culminação da globalização. As
antigas solidariedades orgânicas cedem lugar às solidariedades organizacionais1. A nova
coerência funcional das regiões no atual período da globalização se faz intermediada por
lógicas externas à própria região, não mais somente e diretamente via comunidade e seu
entorno. Mudanças essas que impõem as especializações territoriais, constituída em
função da nova divisão do trabalho. Mas as novas regionalizações são cada vez mais
efêmeras, podendo assumir novos contornos a partir de novas mudanças
sociais/econômicas. Isso é possível num mundo caracterizado pela aceleração
1
Na caracterização atual das regiões, longe estamos daquela solidariedade orgânica que era o próprio
cerne da definição do fenômeno regional. O que temos hoje são solidariedades organizacionais. As
regiões existem porque sobre elas se impõem arranjos organizacionais, criadores de uma coesão
organizacional baseada em racionalidades de origens distantes, mas que se tornam um dos fundamentos
da sua existência e definição. (SANTOS, 2006, p. 285).
contemporânea (SANTOS, 2008), que refaz novas regiões num curto espaço de tempo,
situação nunca antes vivida pela humanidade.
O território brasileiro é subjugado ao ritmo da economia internacional,
metamorfoseando-se em uma complexa compartimentação de regiões especializadas e
colocando-as com relações diretas com os agentes hegemônicos mundiais. A nova
organização visa atender aos interesses desses agentes e a desconsiderar as necessidades
locais/regionais. Daí a ideia de alienações territoriais, conforme expôs Santos (2003), na
qual o Brasil agrícola apresenta-se como um dos exemplos mais característico, onde se
formou um mosaico de regiões, cada uma se especializa em determinados produtos e
serviços, com destaque para a produção de commodities. Portanto, nossa ideia de
fragmentação do território é tomada de Santos (2003) e Santos & Silveira (2005), assim
como a ideia de alienação do território.
No período da globalização, os processos de compartimentação, fragmentação e
regionalização são concomitantes. Assim, a ideia de região não deixa de existir, mas
ganha novo formato, mesmo que a chamem de outro nome.
Fragmentação e alienação são novos processos que recaem sobre os territórios. A
fragmentação é uma característica da atual compartimentação do espaço geográfico, assim a
fragmentação pode ser entendida como a assimetria na evolução das diversas partes de um
processo de compartimentação dos territórios e a dificuldade ou mesmo a impossibilidade de
regulação, tanto interna quanto externa, revelando um cotidiano em que há parâmetros
exógenos, sem referência ao meio. Os fragmentos resultantes desse processo articulam-se
externamente segundo lógicas duplamente estranhas. Desse modo, produz-se uma verdadeira
alienação territorial à qual consistem no funcionamento sob “um regime obediente a
preocupações subordinadas a lógicas distantes, externas em relação à área da ação que escapam
a regulações locais ou nacionais, embora arrastando comportamentos locais, regionais,
nacionais em todos os domínios da vida, influenciando o comportamento da moeda, do crédito,
do gasto público e do emprego, incidindo sobre o funcionamento da economia regional e
urbana, por intermédio de suas relações determinantes sobre o comércio, a indústria, os
transportes e os serviços. Paralelamente, alteram-se os comportamentos políticos e
administrativos e o conteúdo da informação. A agricultura científica globalizada, tal como a
assistimos se desenvolver em países como o Brasil, constitui um exemplo dessa tendência e um
dado essencial ao entendimento do que no país constituem a compartimentação, a fragmentação
e alienações atuais do território. (Adaptado de SANTOS 2003).
O processo de fragmentação acontece de diversas formas. No entanto, podemos
reuni-lo em duas: a primeira se expressando no plano inter-regional e uma segunda no
plano intra-regional. Ou seja, no primeiro as novas regiões do agronegócio são
fragmentos se analisado o país como um todo, já na segunda a fragmentação ocorre no
interior de cada uma destas regiões. Voltaremos a esta discussão no tópico A
manifestação da fragmentação no território.
O “comando” destas regiões é estabelecido de forma globalizada, articulado por
interesses exógenos ao lugar e da região, exercido pela política, ou seja, a política da
economia global, que é a política das grandes empresas. Por outro lado, é necessário um
controle técnico da produção em si, que frequentemente é exercido a partir das cidades,
de uma forma hierarquizada, mas com diferenciações/especializações; assumindo o
comando técnico a cidade (ou as cidades) mais bem equipada(s), ou aquela(s)
induzida(s) a este serviço, daí a ideia de cidade do agronegócio (ELIAS, 2006). É uma
questão complexa para a cidade, mas necessária a seu comando técnico diante do campo
modernizado e sua posição privilegiada em relação às demais cidades, que passam a
ocupar hierarquias inferiores na rede urbana regional.
Portanto, a formação das cidades do agronegócio é uma forma-conteúdo exigida
pelo campo moderno, tendo como objetivo o atendimento de suas necessidades. A
própria ideia de cidade do campo de Santos (2009) que é fruto da agricultura científica
globalizada também apresenta outras consequências e problemáticas à rede urbana
regional. Em Menezes (2014), apresentamos a formação de municípios fragmentados
pelas ações e objetos hegemônicos ligados ao agronegócio, dentre eles a força exercida
pelas cidades do agronegócio na região. Ou seja, essa problemática é um exemplo da
própria manifestação da fragmentação e alienação do território.
Este é o caso do oeste do estado da Bahia, onde há municípios de grandes
extensões territoriais que possuem uma elevada produção agrícola (são os casos de
Formosa do Rio Preto, São Desidério e Correntina, por exemplo). Estes se deparam com
a força regional de cidades como Luís Eduardo Magalhães e Barreiras, que abrigam as
sedes dos agentes globais e que por conseguinte contribuem através de suas ações em
processos de alienações e fragmentações nos territórios daqueles municípios. São
processos que aumentam as desigualdades no interior dos municípios e na região como
um todo, deiando mais complexa a rede urbana regional. Os territórios daqueles
municípios passam a abrigar novas verticalidades2 que agora coexistem com atividades
2
As verticalidades são vetores de uma racionalidade superior e do discurso pragmático dos setores
hegemônicos, criando um cotidiano obediente e disciplinado. As horizontalidades são tanto o lugar da
finalidade imposta de fora, de longe e de cima, quando o da contrafinalidade, localmente gerada. Elas são
orgânicas já existentes. A fragmentação pode em alguns casos caminhar para processos
de emancipações e conflitos sobre limites, fato que também é observado nessa porção
do estado da Bahia.
UMA
METODOLOGIA
PARA
O
ESTUDO
DA
FRAGMENTAÇÃO
TERRITORIAL
A metodologia é um ponto crucial para uma pesquisa científica, através dela
obtemos a resposta de como fazer a pesquisa. Acreditamos que a metodologia deva estar
apoiada no nosso entendimento do que seja o espaço geográfico, construindo assim uma
proposta que una a teoria com a prática. De maneira que a teoria possa ser construída
inspirada no lugar e que a realidade possa ser operacionalizada a partir do teórico. Neste
tópico há um primeiro exercício de buscar uma metodologia para o estuda da
fragmentação territorial.
Tendo em vista estes pressupostos, os objetivos e a hipótese levantada foram
possíveis projetar, a piori, temas norteadores. Como sugere o próprio nome, são temas
que nortearão a definição das variáveis do estudo e indicadores dos processos de
fragmentação e alienação do território. Consideramos temas norteadores: reestruturação
produtiva da agropecuária, uso do território e a relação entre divisão territorial do
trabalho e formação da região. Com a reestruturação produtiva da agropecuária
pretende-se tratar da expansão da agricultura científica, da globalização da produção e
do consumo, dos circuitos espaciais produtivos agrícolas, círculos de cooperação. Já
com o uso do território pretende buscar considerar o uso corporativo do território; ações
dos agentes hegemônicos, como as firmas multinacionais Bunge e Cargill; ações dos
produtores, do Estado (esferas federal, estadual e municipal); das associações; dos
sindicatos; dos agricultores tradicionais e das empresas do circuito superior do
agronegócio. Por fim, com a divisão territorial do território e a região pretende-se tratar
da evolução do conceito de região, das verticalidades e horizontalidades, das
solidariedades orgânicas e organizacionais, da cidade do agronegócio e municípios
produtores.
o teatro de um cotidiano conforme, mas não obrigatoriamente conformista e, simultaneamente, o lugar da
cegueira e da descoberta, da complacência e da revolta. (SANTOS, 2006, p. 286). As verticalidades estão
ligadas aos fluxos hegemônicos. Elas têm o território como recurso e, por isso, organiza-o em rede.
A partir destes temas norteadores e seus respectivos conceitos e noções buscará
a elaboração daquilo que chamamos de indicadores, capazes de respaldar o estudo da
fragmentação do território. No tema reestruturação produtiva da agropecuária buscar o
que é produzido na agricultura, para quem, para que e para onde; Indicar os movimentos
pendulares. Com relação ao uso do território, mapear a aplicação do crédito rural; a ação
dos agentes; mapear a implantação de novos fixos, como sistemas rodoviário,
ferroviário e de hidrovias. Já com a relação à divisão territorial do trabalho e a região
procurará identificar os locais onde é destinado ao plantio, processamento e escoamento
da produção, identificar onde é realizado o consumo produtivo do circuito superior do
agronegócio e consumo consuntivo da população.
Próxima etapa constituirá na análise destes conceitos, noções e indicadores com
intuito de analisar se há fragmentação do território. Se sim, qual seria esse universo?
Com isso, apontar quais são as formas de fragmentação, e como elas se dão enquanto
processos e suas consequências no território.
O corpo teórico não pode ser uma mera reunião de conceitos e categorias. Mas
sim, um edifício teórico coerente que funcione como um corpo sistêmico, pois é assim
que se apresenta a realidade, é necessário coerência entre suas partes e capacidade de
operacionalização da teoria diante da realidade, através de seus conceitos e categorias.
Na geografia, a teoria dos circuitos espaciais de produção e círculos de cooperação de
Santos (2008b), Santos e Silveira (2005) caminha nessa direção, e será um importante
instrumento para entender a reestruturação produtiva da agropecuária e a divisão
territorial do trabalho.
Para compreender as dinâmicas recentes no Brasil agrícola e do processo de
urbanização atentamos para os estudos de Santos (2003, 2006 e 2009), Santos &
Silveira (2005), Castillo (2011) e Elias (2003, 2006, 2011). Os trabalhos de Milton
Santos constituem um rico conjunto de conceitos e categorias da teoria espacial que
funcionam como sistema.
Os estudos de Elias e Castillo contribuem para a compreensão das novas
dinâmicas do espaço agrícola brasileiro, como os conceitos de Região Competitiva e de
Logística (CASTILLO, 2011) e Regiões Produtivas Agrícolas – RPAs (ELIAS, 2011).
Estes conceitos podem ser novas conceituações para as novas regiões do agronegócio
que também são arranjos territoriais do agronegócio. As dinâmicas do lugar, a serem
analisadas durante a pesquisa, principalmente na relação com o mundo da globalização,
constituem o guia desta proposta metodológica, portanto, certamente haverá mudanças
com o decorrer da pesquisa.
Os temas norteadores guiarão a pesquisa em três grandes etapas. A primeira
consiste no que chamamos de planejamento. A segunda etapa é a execução, marcada
principalmente pela obtenção dos dados in loco, no campo, em alguns pontos do
Cerrado brasileiro. Por fim, a terceira, e última, será a análise direta sobre os objetivos
da pesquisa e sistematização final do trabalho. A primeira etapa consiste numa pesquisa
indireta através de uma revisão bibliográfica que aborde, principalmente, o povoamento,
a introdução, desenvolvimento e consequências de uma agricultura moderna nos
cerrados brasileiros. Para alcançar tais objetivos, serão prioridades as pesquisas em
teses, dissertações, livros, jornais e artigos sobre estas temáticas.
A segunda etapa consiste na pesquisa direta com aplicação de entrevistas
qualitativas junto aos seguintes grupos: agricultores; empresários, trabalhadores e
gestores de empresas do agronegócio; políticos e gestores das diferentes esfera do
estado; representante de associações, sindicatos e entidades que mantêm relações com a
agricultura. Os roteiros das entrevistas serão construídos de maneira específica para
cada um destes grupos. Serão entrevistas e aplicações de questionários com o propósito
de identificar e compreender os circuitos espaciais de produção e círculos de cooperação
delimitados na pesquisa.
Outras fontes de dados e análises serão consultadas, objetivando o cruzamento
de informações, a exemplo: publicações do IBGE, como Produção Agrícola Municipal,
REGIC e informações disponibilizada diretamente no site do IBGE; publicações em
jornais e revistas; publicações de associações e entidades ligadas a agricultura.
POR QUE ESTUDAR A FRAGMENTAÇÃO TERRITORIAL NO ESPAÇO
AGRÍCOLA DO BRASIL?
Estas transformações implicam em uma reorganização do território nacional,
com impactos profundos na natureza. Ab’Saber (2005, p. 116-117) alerta para a
necessidade de se pensar a evolução recente do Brasil Central, a fim de ser “útil ao
conhecimento científico e, quiçá, ao esforço de preservação dos fluxos vivos da
natureza regional”. O autor conclui afirmando na “necessidade de um zoneamento
regional do domínio dos cerrados dirigido para uma política pública de indução ao
equilíbrio entre o uso do espaço e a defesa integrada da natureza”. Certamente, estudos
como o apresentado nesse artigo caminham na direção das ideias de Ab’Saber (2005).
Ocorrida ao longo das últimas décadas do século XX, a modernização do espaço
agrícola brasileiro é objeto de diversos estudos nas ciências humanas e naturais. Há na
geografia uma vasta publicação sobre o tema. No entanto, a compreensão da formação
de especializações produtivas no Brasil Central dominado pelo agronegócio é uma
abordagem extremamente oportuna, longe de estar esgotada, pelo contrário, é uma
análise que se faz necessária.
A fragmentação em paralelo a expansão do meio técnico-científicoinformacional no espaço agrícola é uma temática que carece de estudos aprofundados
pela geografia, um dos exemplos deste enfoque está em trabalhos como o de Menezes
(2014). Castro (2013, p. 34) explica que, diferentemente das formas de divisão do
território ou da sociedade, a fragmentação é “um problema até recentemente pouco
tratado em profundidade pela geografia”. Para Santos (2003, p. 80), a agricultura
científica globalizada “constitui um exemplo dessa tendência e um dado essencial ao
entendimento do que no país constituem a compartimentação e a fragmentação atuais do
território”. Nas palavras do autor “a compartimentação atual distingue-se daquela do
passado e frequentemente se dá como fragmentação” (2003, p. 81).
Apesar da importância da temática para o entendimento da realidade, poucos
foram os trabalhos que priorizaram a fragmentação em espaços de agricultura moderna.
Diante do exposto, cabe acreditar que a presente proposta de estudo possui
cientificidade, atendendo àqueles quatro requisitos do que fala Eco (2010)3 e,
consequentemente, tem relevância tanto acadêmica quanto social.
A MANIFESTAÇÃO DA FRAGMENTAÇÃO NO TERRITÓRIO
No plano horizontal, consideramos a fragmentação em duas formas. A primeira
abrange a escala nacional, e assim podemos considerar cada especialização produtiva,
que neste trabalho pode ser uma Região Produtiva Agrícola - RPAs (ELIAS, 2015),
como um fragmento. Assim, o mosaico de especializações produtivas o qual se
(1) “O estudo debruça-se sobre um objeto reconhecível e definido de tal maneira que seja reconhecível
igualmente pelos outros [...] (2) O estudo deve dizer do objeto algo que ainda não foi dito ou rever sob
uma óptica diferente o que já se disse [...] (3) O estudo deve ser útil aos demais [...] (4) O estudo deve
fornecer elementos para a verificação e a contestação das hipóteses apresentadas e, portanto, para uma
continuidade pública” (ECO, 2010 p. 21-23).
3
transformou o território nacional é também uma fragmentação inter-regional. Cada
especializações regional produtiva é um recorte espacial que tem dificuldade de se
relacionar organicamente com seu entorno. Isso porque suas relações estão
estabelecidas numa sinergia organizacional, exógena e prioritariamente controladas por
agentes distantes.
A segunda forma refere-se a uma fragmentação intra-regional. A vocação global
da agricultura científica somada a nova hierarquia da RPA conduz a fragmentação e
alienação internas a cada região, evolvendo tanto o campo como a cidade. Como
exemplo, apresentemos uma análise do município de uma região em formação. No caso,
o município de Formosa do Rio Preto, na região do MATOPIBA4. Aqui foram
identificadas manifestações de fragmentação intra-regional, principalmente no
município em questão, a saber: Produção agrícola alienada; Fragmentação do
município; Articulações/desarticulação dos sistemas de ações; Sistemas de objetos e a
fragmentação
do
território;
Fragmentação
dos
territórios
geraizeiros
e
Compartimentação e fragmentação do território. Ver em Menezes (2014), como se
processou cada uma destas manifestações da fragmentação em Formosa do Rio Preto.
O Brasil agrícola contemporâneo pode ser caracterizado, de um lado, por um
intenso processo de compartimentação, que formou um mosaico de especializações
produtivas pelo território nacional, dominado pelos agentes hegemônicos e baseada
numa agricultura científica globalizada. Por outro lado, e de forma articulada com o
primeiro, a compartimentação se deu sob a forma de fragmentação territorial, sendo em
essência um processo de produção de desigualdades.
São diversas as RPAs que se formam pelo território nacional. Uma delas vai se
constituindo nos cerrados do oeste da Bahia, sul do Maranhão e sul do Piauí e partes do
estado do Tocantins. É uma região em formação, conforme é apontada por diversos
autores, associações e o próprio Estado brasileiro. As denominações são diversas:
MATOPIBA (EMBRAPA, 2014), MAPITOBA, Cerrados do Centro-Norte do Brasil
(ALVES, 2015), cerrados nordestino-tocantinenses (HAESBAERT, 2015).
4
Palavra formada pelas iniciais dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. E refere-se a uma
região em formação sobre cerrados do oeste da Bahia, sul do Maranhão e sul do Piauí e partes do estado
do Tocantins, onde há uma expansão do agronegócio, principalmente soja, algodão e milho. Este termo
passou a ser utilizado pelo Governo Federal, órgãos como EMBRAPA e entidades diversas como a
Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (AIBA) para referir a região.
Mas essa regionalização que origina o MATOPIBA se apresenta diferentemente
as regionalizações de outrora. As ações hegemônicas que atuam são de origem distante
e atentem interesses externos a da região.
CONCLUSÃO
Este estudo está em sua fase inicial de uma proposta que pretende compreender
dinâmicas atuais, e assim contribuir na análise de uma das características mais marcante
do processo de compartimentação e modernização do espaço agrícola do Brasil: a
fragmentação. Sua compreensão avançará com o desdobramento da pesquisa,
principalmente com o trabalho de campo. Contudo, os resultados já alcançados
demonstram a importância do estudo. Apesar da fragmentação atingir todo o espaço
agrícola brasileiro, formando diferentes especializações produtivas, nosso propósito é
concentrar a análise na região em formação denominada de MATOPIBA. Este caso
possui suas características próprias com processos inerente a região. Contudo, com os
estudos já realizados é possível identificar que a lógica da fragmentação territorial,
ocasionada pela compartimentação contemporânea do Brasil, é a mesma para o
território nacional. Apesar de adquirir especificidades em cada lugar pelo país afora.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
AB’SÁBER, Aziz Nacib. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades
paisagísticas. 3ª ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2005.
ALVES, Vicente Eudes Lemos (Org.). Modernização e regionalização nos cerrados
do Centro-Norte do Brasil: Oeste da Bahia, Sul do Maranhão e do Piauí e Leste de
Tocantins. Rio de Janeiro: consequência Editora, 2015
CASTILLO, Ricardo A. Agricultura Globalizada e Logística nos cerrados brasileiros.
In: SILVEIRA, Márcio Rogério Silveira (Org.). Circulação, transportes e logística.
Outras Expressões, São Paulo, 2011.
CASTRO, Iná Elias de. Território do Estado: divisão ou fragmentação? Argumentos
para um debate necessário. In: FONSECA, Antonio Angelo Martins da; PERTILE,
Noeli; CALDAS, Alcides dos Santos; BRITO, Cristovão (Orgs.) Estado, Território e a
Dinâmica das Fronteiras: reflexões e novos desafios. Salvador: JM Gráfica e Editora
ltda, 2013.
ECO, Humberto. Como se faz uma tese. 23ª ed. São Paulo: Perspectiva. 2010.
EMPRESA Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Grupo Inteligência
Territorial estratégica (GITE). Nota técnica 1: Proposta de delimitação territorial do
MATOPIBA.
Campinas
–
SP,
Maio
–
2014.
Disponível
https://www.embrapa.br/gite/publicacoes/NT1_DelimitacaoMatopiba.pdf>.
em:
<
Acessado
em 24 de abr. de 2014.
ELIAS, Denise. Reestruturação produtiva da agropecuária e novas regionalizações no
Brasil. In: ALVES, Vicente Eudes Lemos (Org.). Modernização e regionalização nos
cerrados do Centro-Norte do Brasil: Oeste da Bahia, Sul do Maranhão e do Piauí e
Leste de Tocantins. Rio de Janeiro: consequência Editora, 2015.
______. Agronegócio e novas regionalizações no Brasil. R.B. Estudos Urbanos e
Regionais
V.
13,
Nº
2,
nov.
2011.
Disponível
em:
http://www.anpur.org.br/revista/rbeur/index.php/rbeur/article/viewFile/400/376
Acessado em: 16/03/2013.
______. Ensaios sobre os Espaços Agrícolas de Exclusão. NERA – Revista do Núcleo
de Estudos, Pesquisa e Projetos de Reforma Agrária - UNESP, Presidente Prudente,
Ano 9, nº. 8, p. 29-51, Jan.-jun./2006.
______. Globalização e Agricultura: A Região de Ribeirão Preto – SP. São Paulo:
Edusp, 2003.
Haesbaert, Rogério. Introdução. In: ALVES, Vicente Eudes Lemos (Org.).
Modernização e regionalização nos cerrados do Centro-Norte do Brasil: Oeste da
Bahia, Sul do Maranhão e do Piauí e Leste de Tocantins. Rio de Janeiro: consequência
Editora, 2015.
HARVEY, David. Espaços de Esperança. 3ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2009.
MENEZES,
Willian
Guedes
Martins
Defensor
Menezes.
Globalização
e
fragmentação: a agricultura científica em Formosa do Rio Preto – Bahia. 2014. 193 f.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal da Bahia (POSGEO). Salvador, 2014.
PEREIRA, Mirlei Fachini Vicente. O território sob o “Efeito Modernizador”: a face
perversa do desenvolvimento. Interações. Revista Internacional de Desenvolvimento
Local. Vol. 8, Nº 13, p. 63-69, set. 2006. Campo Grande, MS.
SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. 5ª ed. 2ª reimpressão, São Paulo: Edusp,
2009.
______. A natureza do espaço: espaço e tempo - razão e emoção. 3 ed. São Paulo:
Hucitec, 2006.
______.
Técnica,
Espaço,
Tempo:
globalização
e
meio
técnico-científico-
informacional. 5ª ed. São Paulo: Edusp, 2008.
______. Metamorfoses do espaço habitado. 6ª ed. São Paulo: Edusp, 2008b.
______. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal.
10ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.
SANTOS, Milton & SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início
do século XXI. 7. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record, 2005.
SOUZA, Maria Adélia A. Geografia da desigualdade: globalização e fragmentação. In:
SANTOS, Milton; SOUZA, Maria Adélia A.; SILVEIRA, Maria Laura (Orgs.).
Território: globalização e fragmentação. 5ª ed., São Paulo: Hucitec, ANPUR, 2002.
Download