A Educação Ambiental como instrumento de prevenção e controle da dengue: o caso de Bom Jesus do Itabapoana – RJ CARIME RODRIGUES SALIM CARLA DE SOUZA MATOS Artigo apresentado ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Educação Ambiental do Instituto Federal Fluminense para obtenção do título de Especialista em Educação Ambiental. Aprovado em 28/09/2012. Comissão Examinadora: D. Sc. Vera Lúcia Marques da Silva D. Sc. Luiz de Pinedo Quinto Junior Orientador: M. Sc. Hélio Gomes Filho 2012 1 A Educação Ambiental como instrumento de prevenção e controle da dengue: o caso de Bom Jesus do Itabapoana – RJ Hélio Gomes Filho1 Carime Rodrigues Salim2 Carla de Souza Matos3 Resumo Tendo em vista os numerosos casos de dengue que o estado do Rio de Janeiro tem registrado nos últimos anos e em especial a situação caótica vivenciada durante o verão do ano de 2011 pelo município de Bom Jesus do Itabapoana no noroeste do estado, esse trabalho visa contribuir para o entendimento da necessidade de uma intervenção educativa junto à população local a fim de prevenir futuros surtos da doença. Busca, sobretudo, repensar alguns questionamentos: A Educação Ambiental tem sido efetiva no enfrentamento da dengue em cidades endêmicas? De onde vem o abismo entre o conhecimento ao qual a população tem acesso mas que simplesmente não coloca em prática? Até que ponto a Educação Ambiental pode modificar comportamentos que contribuam efetivamente para a redução da dengue através da responsabilização de cada família na manutenção de seu ambiente doméstico livre de potenciais criadouros do vetor? Palavras-chave: Dengue. Educação ambiental. Bom Jesus do Itabapoana. Abstract Given the number of dengue cases that the state of Rio de Janeiro has registered in recent years and especially the chaotic situation experienced during the summer of 2011 the municipality of Bom Jesus do Itabapoana in the northwestern state, this work aims to contribute to understand the need for an educational intervention with the local population in order to prevent future outbreaks. Especially seeks to rethink some questions: Environmental education has been effective in fighting dengue in endemic? Where does the gulf between the knowledge to which the public has access but simply do not put into practice? The extent to which environmental education can modify behaviors that contribute effectively to the reduction of dengue through the accountability of each family in the maintenance of your home environment free of potential vector breeding sites? Key words: Dengue. Environmental education. Bom Jesus do Itabapoana. 1- Mestre em Planejamento Regional e Gestão da Cidade e Professor do Curso de Especialização em Educação Ambiental – IFF 2- 3: Alunas do Curso de Especialização em Educação Ambiental – IFF 2 1. Introdução Nos últimos 25 verões cariocas e da região noroeste fluminense, no interior do estado do Rio de Janeiro, a história tem sido a mesma, basta iniciar o período de chuvas e calor que os veículos de comunicação voltam a apresentar em sua pauta os assustadores números da dengue. Nos quatro primeiros meses de 2011, como mostra o gráfico a seguir, não foi diferente. Gráfico 1: Casos notificados de Dengue por mês no Estado do Rio de Janeiro nos anos de 2009, 2010 e 2011 Fonte: CIEVS-RJ, 2011, p. 1 Com base nos últimos dados divulgados pelo Sistema Nacional de Agravos e Notificações (SINAN) de 2011 e 2012 para o mesmo período, isto é, de janeiro a abril, fica claro que, apesar de ligeira queda, a situação do estado do Rio de Janeiro ainda é a mais preocupante quando comparada ao cenário nacional. 3 Tabela 1: Casos e incidência de Dengue no período de janeiro a abril de 2011 e 2012 nos estados brasileiros. Fonte: SINAN, 2012, on line Os conhecidos transtornos causados pela dengue, entretanto, não são responsabilidades exclusivas do poder público ou dos sistemas de saúde, mas da sociedade como um todo. Isso porque a recorrência dos casos de dengue ano após ano pode ser provocada pelo próprio homem no ambiente urbano. É justamente nesse sentido que a importância do binômio Educação Ambiental e cidadania se destaca. Segundo Amaral (2008, p. 208), a educação é condição básica para o desenvolvimento de qualquer nação. Para tanto, há que se investir em educação. Ainda segundo ele, o desenvolvimento sustentado guarda intrínseca correlação com a Educação Ambiental. Esta por sua vez, é fundamental na garantia da qualidade do ambiente como patrimônio da coletividade. A Lei 9.795, de 27 de abril de 1999, institui a Política Nacional de Educação Ambiental, e traz em seu art. 1º o conceito de Educação Ambiental: Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL, 1999, on line). 4 Dessa forma, para garantir sua efetividade, a Educação Ambiental deve dirigirse a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade, cujos comportamentos cotidianos têm influência decisiva na preservação do meio ambiente (BRASIL, 1981, on line). Em todo o Brasil, entretanto, um dos pontos chave, e mais difíceis de obter êxito, nos programas de controle de vetores, é justamente relativo ao papel das comunidades na eliminação dos criadouros domésticos. Observa-se que no ambiente doméstico os criadouros são, em geral, descartáveis (como exemplo os pneus velhos e latas), criadouros solucionáveis (tendo as caixas d’água destampadas e calhas entupidas como exemplos) e até mesmo os criadouros evitáveis (como os vasos de plantas com água) (BRASSOLATTI & ANDRADE 2002, p. 244). O diagrama abaixo mostra os possíveis tipos de criadouros naturais e artificiais do mosquito vetor da dengue. Figura 1: Tipos de criadouros de Aedes aegypti. Fonte: LEMOS, et al., 2010, p. 159 Essa discrepância nos remete a alguns questionamentos: - A Educação Ambiental é efetiva na prevenção e no controle da dengue em cidades endêmicas? 5 - De onde vem o abismo entre as práticas educativas e a efetividade no combate a dengue? -Até que ponto a Educação Ambiental pode modificar comportamentos que contribuam efetivamente para a redução da dengue? Esses questionamentos somados à difícil realidade vivenciada na cidade de Bom Jesus do Itabapoana – RJ nos primeiros meses do ano de 2011, em relação aos numerosos casos de dengue, influenciaram a escolha do tema desse trabalho. Com uma matéria intitulada: “BOM JESUS É A PRIMEIRA CIDADE COM EPIDEMIA DE DENGUE” o jornal O Globo publicou: O pequeno município de Bom Jesus do Itabapoana, no Noroeste fluminense, é a primeira cidade do estado a enfrentar uma epidemia de dengue este ano. Com 33.655 habitantes, a cidade registrou, de janeiro até agora, 1.095 casos, o que corresponde a 3,25% da população. Esse índice é 80 vezes maior que o da capital, que registra 0.04% de incidência - 2.918 casos em aproximadamente 6,2 milhões de habitantes. O único hospital da cidade, o São Vicente de Paulo, sofre com o aumento da demanda. A unidade recebe cerca de 60 pacientes com suspeita de dengue por dia. (O Globo, 23/02/ 2011, on line) Quase um mês depois, no dia 24 de março de 2011 o jornal O Globo publicou uma matéria em que a secretaria de saúde do estado do Rio de Janeiro já reconhecia surto de dengue em sete municípios do estado: Bom Jesus do Itabapoana, Santo Antônio de Pádua, Cantagalo, Magé, Mangaratiba, Guapimirim e Seropédica. No município de Bom Jesus, a taxa de incidência foi a mais alta do estado (O Globo, 24/03/ 2011, on line). Mapa 2: Cidades do Estado do Rio de Janeiro com surtos de dengue já reconhecidos. Fonte: Jornal O Globo, 24/03/2011, on line Esses dados apontam para a necessidade de uma intervenção educativa junto à população local a fim de promover mudanças de atitudes em conjunto com o poder público e sociedade civil organizada. 6 Deve-se ressaltar ainda que, independentemente da situação em que os municípios se encontrem, as ações de controle do vetor devem ser mantidas durante todo o ano para propiciar o imediato enfrentamento de uma situação de epidemia1. É nesse sentido que a Educação Ambiental se destaca, pois seus resultados não são pontuais e momentâneos, resultando num maior envolvimento e participação social na conservação ambiental e da manutenção dessas condições por longo prazo (RAMOS & CORREIA, 2010, p.2627). Sob essa ótica, o Programa Nacional de Controle da Dengue (PNCD) apoia o desenvolvimento de ações educativas para a mudança de comportamento e adoção de práticas para a manutenção do ambiente domiciliar preservado da infestação por Aedes aegypti, o inseto vetor da dengue. Sendo assim, a relevância do presente estudo está em analisar a efetividade do processo educativo ambiental na prevenção e controle da dengue no município de Bom Jesus do Itabapoana, procurando repensar que os transtornos causados pela doença não são responsabilidades exclusivas do poder público ou dos sistemas de saúde, mas da sociedade como um todo. O objetivo desse trabalho é contribuir para o entendimento da importância de ações educativas no combate à dengue que proporcionem aos cidadãos conhecimentos, habilidades e atitudes capazes de prevenir futuros surtos da doença, considerada um grave problema de saúde pública crescente ao longo dos anos. A metodologia utilizada baseou-se em uma pesquisa exploratória e descritiva, buscando fundamentar o objeto em estudo, por meio de levantamento bibliográfico e documental, com consulta a livros, impressos, documentos eletrônicos, sites e outros. Diante do descrito fica exposta a necessidade de um estímulo à participação ativa da população no controle da dengue podendo ser uma medida efetiva de vigilância do vetor. 2. Aspectos importantes sobre a Dengue No século 21 o Brasil se tornou o país com o maior número de casos de dengue relatados passando a ocupar, entre 2000 e 2005, o primeiro lugar no ranking 1 Epidemia é caracterizada pela incidência, em curto período de tempo, de grande número de casos de uma doença. Diferindo-se de Endemia que é caracterizada por uma doença de incidência constante que habitualmente se manifesta em uma determinada região. 7 internacional com mais de 3 milhões de casos notificados (TEIXEIRA et al., 2009, p. 7). O primeiro relato da dengue no Brasil data de 1923 em Niterói-RJ e o primeiro surto epidêmico documentado ocorreu em 1981 em Boa Vista-RR envolvendo os tipos virais que circulavam na América do Sul e Central na ocasião. Foi com a intensa epidemia de 1986 no Rio de Janeiro e a disseminação para regiões vizinhas, porém, que as ações de vigilância e controle dos vetores da dengue tornaram-se objeto de preocupação para a sociedade e, em especial, para as autoridades de saúde (OSANAI et al., 1983 apud DONALÍSIO & GLASSER, 2002, p. 260). 2.1. Características físicas do Brasil e do ambiente urbano que favorecem a proliferação do mosquito transmissor da dengue. Tendo em vista sua localização geográfica, o Brasil é tido como um país tropical. Privilegiado por sua dimensão territorial é cortado pela linha do Equador ao Norte e pelo Trópico de Capricórnio ao Sul. Essa tropicalidade, segundo Lemos e seus colaboradores (2010, p.158), confere enorme diversidade climática que, se por um lado é vantajosa por proporcionar rica biodiversidade, por outro, constitui-se como condição climática favorável a proliferação de vetores de inúmeras doenças como a dengue, por exemplo. Como agravante, o mosquito transmissor da dengue encontrou no mundo moderno condições favoráveis a uma rápida expansão. Isso porque ao surgimento de grandes aglomerados urbanos, muitas vezes com inadequadas condições de abastecimento de água e de limpeza urbana, soma-se a intensa utilização de materiais não-biodegradáveis, como recipientes descartáveis de plástico e vidro; e as alterações climáticas provocadas pelo aquecimento global na opinião de alguns cientistas, que influem no regime e duração das chuvas (BRASIL, 2002, p.3, on line). Essas condições socioambientais contribuem sobremaneira para que o processo endêmico-epidêmico acabe sendo inevitável no território brasileiro. Nas Américas, o Aedes aegypti é o único transmissor do vírus da dengue com importância epidemiológica. Essa espécie de mosquito é originária da África subsaariana, onde se domesticou e se adaptou ao ambiente urbano. Suas larvas foram encontradas em depósitos artificiais. Esse processo adaptativo também vem 8 contribuindo para sua rápida difusão espacial e o seu explosivo crescimento nas áreas urbanas (BARRETO & TEIXEIRA, 2008, p.55). Portanto, de acordo com Marzochi (1994 apud ROSA et al., 2010, p. 1), o homem, o vírus e as condições políticas são os elementos que vão determinar a estrutura do estabelecimento da cadeia de transmissão da doença. O problema é que as políticas públicas voltadas para a prevenção e o controle do vetor não incluem a participação efetiva da população, por isso fracassam e os resultados são as epidemias anuais de dengue (OLIVEIRA, 2006, p.49). 2.2. Características Epidemiológicas da dengue A palavra “dengue” é de origem espanhola e significa “melindre”, “manha” que, por sua vez, refere-se à maneira ou estado em que a pessoa se encontra. É uma arbovirose2 típica de regiões tropicais e subtropicais (Brasil, 1997, p. 9, on line). O principal vetor do vírus da dengue no Brasil é o Aedes aegypti. Caracteriza-se por ser uma doença febril aguda, de etiologia viral que persiste na natureza mediante o ciclo homem - Aedes aegypti (mosquito vetor) - homem (LEMOS et al., 2010, p.158). Sua transmissão ocorre quando a fêmea do mosquito infecta-se com o vírus da dengue ao alimentar-se do sangue de um indivíduo infectado que se encontra no período de viremia 3. Após o período de incubação extrínseco (com duração de 7 a 10 dias), caracterizado pelo período que vai desde a ingestão do sangue infectado até o momento em que é capaz de transmitir o vírus pela sua replicação nas glândulas salivares, o mosquito permanece infectante até a sua morte. Quando um mosquito infectante injeta o vírus da dengue no hospedeiro sadio, durante o repasto sanguíneo, a dengue finalmente, após um período de 4 a 6 dias, se manifesta podendo apresentar-se de maneira variável, desde a forma assintomática até quadros graves. Em função da inflamação dos vasos sanguíneos causada pela instalação dos vírus no tecido que os envolve – o endotélio – há um consumo exagerado de plaquetas que acaba por comprometer o fluxo de sangue provocando as hemorragias. Como consequência, esses distúrbios da coagulação podem 2 3 Arbovirose é uma virose transmitida por artrópodes como os mosquitos por exemplo. Viremia caracteriza-se como sendo o período infeccioso da doença. 9 causar desde manchas na pele até extravasamento de sangue pelas mucosas do nariz e gengiva, por exemplo, levando o paciente a choque e até mesmo a óbito. Uma vez infectada, a pessoa passa a transmitir o vírus para outros mosquitos um dia antes de apresentar os primeiros sintomas até o desaparecimento da febre (normalmente no 5º ou 6º dia – período de viremia), reiniciando o ciclo. O mosquito adulto vive, em média, de 30 a 35 dias, e o seu ovo pode resistir a até 450 dias em ambientes secos. Com o acúmulo da água da chuva, o ovo torna-se ativo, podendo se transformar em larva, posteriormente em pupa e atingir a fase adulta cerca de 2 ou 3 dias depois. A duração dos sintomas varia usualmente de 3 a 7 dias e o período infeccioso dura apenas alguns dias, variando de 3 a 7 dias. Posteriormente, o indivíduo desenvolve imunidade específica de longa duração. Existem quatro sorotipos conhecidos de dengue: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. Como apresentam baixa imunidade cruzada, ocorrem as chamadas “infecções secundárias” após a primeira infecção por um determinado sorotipo. Indivíduos infectados com um sorotipo de dengue são suscetíveis à infecção por outro sorotipo seis meses após a primeira exposição. Não há evidência, entretanto, de que possa ocorrer uma reinfecção pelo mesmo sorotipo (YANG, 2003, p. 387). Atualmente as medidas de controle da doença têm por objetivo eliminar os mosquitos vetores em suas diferentes fases, porém a falta de uma vacina eficaz, a morbidade do agente infeccioso e a alta competência vetorial do Ae. aegypti, tornam a prevenção da dengue uma tarefa delicada (BARRETO & TEIXEIRA, 2008, p. 62). Todos esses aspectos relacionados ao problema dengue reforçam a necessidade de organização e estruturação dos programas de controle da doença com um enfoque de gestão integrada em seus diversos componentes de interesse. 2.3. A Educação Ambiental formal e não formal e suas contribuições no controle da dengue. Por muito tempo a Educação Ambiental foi trabalhada apenas como um conteúdo inserido nos currículos escolares. Atualmente, porém, não se admite mais que ela seja unicamente formal. É necessário que a Educação Ambiental alcance os espaços da vida cotidiana de todos os cidadãos. 10 A Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em seu inciso VI no Artigo 225, a necessidade de “promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino...” (BRASIL, 1988, on line). Já a Lei 9.795, de 27 de abril de 1999 representa um avanço, pois traz em seu art. 2º que: “A educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal” (BRASIL, 1999, on line). Se a Educação Ambiental deve ser levada às crianças como uma estratégia consistente de formação básica para a cidadania e para a vida, da mesma forma ela deve ser levada aos adultos. Assim, as ações de Educação Ambiental devem ser dirigidas para a escola e ao mesmo tempo para a população como um todo extrapolando o campo da formalidade. No que tange à Educação Ambiental para a saúde, mais especificamente no controle do vetor da dengue, Oliveira (2006, p.30) esclarece que a recomendação dos órgãos do governo é que se faça uma ampla divulgação por meio das mídias mais tradicionais (TV, rádio, jornais e revistas), que são canais capazes de formar opinião. É necessário promover, exaustivamente, a Educação em Saúde, até que a comunidade adquira conhecimentos e consciência do problema, para que possa participar efetivamente da eliminação dos criadouros potenciais do mosquito. A população deve ser informada sobre a doença (modo de transmissão, quadro clínico, tratamento, etc.), sobre o vetor (seus hábitos, criadouros domiciliares e naturais) e sobre medidas de prevenção e controle. Devem ser utilizados os meios de comunicação de massa pelo seu grande alcance e penetração social. Para fortalecer a consciência individual e coletiva, deverão ser desenvolvidas estratégias de alcance nacional, para sensibilizar os formadores de opinião, para a importância da comunicação/educação no combate à dengue; sensibilizar o público em geral sobre a necessidade de uma parceria governo/sociedade, com vistas ao controle da dengue no país; enfatizar a responsabilidade do governo em cada nível e da sociedade como um todo, por meio de suas instituições, organizações e representações. (BRASIL, 2002, p. 216, on line). Essa estratégia, todavia, não tem se demonstrado muito efetiva. A divulgação realizada pelos meios de comunicação de massa é feita de uma maneira muito rápida, onde as informações são apenas repassadas, mas não há uma sensibilização, ocorrendo um abismo entre aquele que informa e aquele que recebe a informação (OLIVEIRA, 2006, p.30). 11 Sobre esta questão Toledo-Romani e colaboradores (2006 apud OLIVEIRA, 2006, p. 30), afirmam que a distribuição massiva de materiais impressos e campanhas de rádio e televisão para disseminar informações sobre a dengue não são suficientes, principalmente quando a população é procurada somente em casos de epidemias. Segundo dados disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde de Bom Jesus do Itabapoana, a partir de novembro de 2010 houve um aumento gradativo do número de casos de dengue no município sendo que, em dezembro do mesmo ano e janeiro de 2011, houve uma intensificação das ações de informação, educação e comunicação, de vigilância epidemiológica e de controle de vetores, o que reafirma a citação anterior. Gráfico 2: Evolução mensal dos casos notificados/confirmados de Dengue no período de setembro de 2010 a junho de 2011. Fonte: Dados fornecidos pela secretaria municipal de saúde de Bom Jesus do Itabapoana – RJ em setembro de 2011. Portanto, para garantir a sua efetividade, o trabalho de Educação Ambiental na prevenção à dengue, tanto no aspecto formal como não formal, deve realizar-se de maneira mais comprometida com a comunidade, por longo prazo, podendo evitar assim muitos transtornos. Entende-se ainda que seja urgente uma atuação maior do poder público no campo da Educação Ambiental proporcionando um efeito multiplicador que possa repercutir na sociedade. Para isso torna-se necessário a formulação e implementação de políticas públicas que integrem essa perspectiva no trabalho de controle do vetor da dengue. 12 2.4. Políticas de controle e prevenção da Dengue em Bom Jesus do Itabapoana O Brasil possui várias políticas de controle e prevenção da dengue. Entre elas se destaca o Programa Nacional de Controle da Dengue do Governo Federal (PNCD) cujos principais trabalhos são: elaboração de programas permanentes; desenvolvimento de campanhas de informação e mobilização das pessoas; fortalecimento da vigilância epidemiológica e entomológica para ampliar a capacidade de predição e de detecção precoce de surtos da doença; melhoria da qualidade do trabalho de campo de combate ao vetor; integração das ações de controle da dengue na atenção básica; utilização de instrumentos legais que facilitem o trabalho do poder público na eliminação de criadouros em imóveis comerciais, casas abandonadas, entre outros; atuação multissetorial por meio do fomento à destinação adequada de resíduos sólidos e a utilização de recursos seguros para armazenagem de água; desenvolvimento de instrumentos mais efetivos de acompanhamento e supervisão das ações desenvolvidas pelo Ministério da Saúde, estados e municípios. Outra política, de âmbito permanente é o Levantamento Rápido do Índice de Infestação por Aedes aegypti (LIRAa) que tem por objetivos identificar os criadouros predominantes e a situação de infestação do município e permitir o direcionamento das ações de controle para as áreas mais críticas. O LIRAa é organizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelo Ministério da Saúde (LIRAa 2008). Seus resultados são transformados em ações adicionais às cidades que estão em situação de alerta ou risco. Nos anos de 2009 e 2010 o Índice de Infestação Predial (IIP), que representa a quantidade de imóveis onde se encontram as larvas do mosquito da dengue, do município de Bom Jesus do Itabapoana, foi classificado pelo LIRAa como de baixo e médio risco, embora alguns extratos tenham sido classificados com alto risco. Para a realização do trabalho os agentes de saúde do município selecionam uma em cada duas casas, onde são feitas coletas de larvas do mosquito e o diagnóstico entomológico é feito na Secretaria Municipal de Saúde. Segundo dados disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde o IIP do município de Bom Jesus do Itabapoana era bastante elevado no início do ano de 2000 e foi sendo reduzido muito lentamente até 2004. Esse percentual voltou a aumentar em 2006 e 2008, quando atingiu 3,97% para o Aedes aegypti com estabilização em níveis considerados preocupantes até o momento. 13 Gráfico 3: Série histórica do Indicie de Infestação Predial em Bom Jesus do Itabapoana de 2000 a 2008. Fonte: Dados fornecidos pela secretaria municipal de saúde de Bom Jesus do Itabapoana – RJ em setembro de 2011. O primeiro surto de dengue em Bom Jesus do Itabapoana ocorreu em 2000/2001 a partir de então a doença passou a ocorrer de forma endêmica, intercalando-se com a manifestação de epidemia, em especial nos anos de 2007/2008 e 2010/2011. Gráfico 4: Série histórica de casos e incidência de dengue em Bom Jesus do Itabapoana de 2000 a 2010. Fonte: Dados fornecidos pela secretaria municipal de saúde de Bom Jesus do Itabapoana – RJ em setembro de 2011. Cruzando os dados apresentados nos gráficos 3 e 4 é possível perceber que apesar da intensidade de infestação em 2001 ter sido visivelmente mais significativa que em 2007, os casos de dengue, para os mesmos períodos, seguem números inversos. A discordância desses dados levanta algumas hipóteses: ou trata-se de um caso de subnotificação sistemática dos reais casos de dengue ou a população de mosquitos vetores para o período, apesar de alta, não se encontrava parasitada pelos vírus justamente devido ao baixo número de pessoas infectadas possivelmente capazes de contaminar os vetores. 14 Ainda de acordo com a Secretaria de Estado da Saúde e Defesa Civil os vírus que circularam no município foram os sorotipos DEN-1, DEN-2. A Secretaria Municipal de Saúde acredita que também ocorreu a circulação do sorotipo DEN-3 apenas não tendo sido detectada pela Vigilância Epidemiológica na ocasião. Mapa 2: Circulação viral – ano 2011 Fonte: CIEVS-RJ, 2011, p. 4 Neste cenário epidemiológico, torna-se imperioso que o conjunto de ações e políticas que vêm sendo implementadas, além de outras a serem executadas, sejam intensificadas, permitindo um melhor enfrentamento do problema e a redução do impacto da dengue em Bom Jesus do Itabapoana. 2.5. Ações de Educação Ambiental como instrumento de controle da dengue em Bom Jesus do Itabapoana 15 No dia 31/10/2011, em matéria intitulada: “DENGUE: NITERÓI CONFIRMA ONZE CASOS DE VÍRUS 4, QUE PODE CAUSAR EPIDEMIA” o Jornal O Globo publicou: A Secretaria Estadual de Saúde confirmou que onze casos de dengue tipo 4 foram registrados no município em 2011. O número representa um alerta para as vigilâncias epidemiológicas municipal e estadual. - A chegada do novo vírus é preocupante. Como a população ainda não teve contato com o tipo 4, ninguém tem anticorpos, estão todos suscetíveis à doença - avaliou Alberto Chebabo, infectologista da UFRJ. (O Globo, 31/10/ 2011, on line) No III Congresso do Conselho dos Secretários Municipais de Saúde do Estado do Rio de Janeiro (COSEMS-RJ), ocorrido em junho de 2011, foi divulgada uma nota técnica que discute os indícios dessa grande epidemia de dengue que ameaça o estado. De acordo com o consultor de Vigilância em Saúde do COSEMS-RJ, Francisco de Faria, a análise de séries históricas tem demonstrado que quando há introdução de um tipo de vírus sem circulação recente no Estado, no verão subsequente acontece uma grande epidemia por esse vírus (COSEMS-RJ, 2011, p. 10). As maiores epidemias do Rio de Janeiro aconteceram após a reintrodução de um novo tipo de vírus, ou seja, sem circulação prévia, explica Faria. Foi o que aconteceu em 2008 com a epidemia pelo sorotipo DEN-2 e em 2001 com a epidemia pelo DEN-3. O cenário de transmissão epidêmica desses vírus se evidenciou no ano posterior à sua identificação/introdução. Em Niterói, no verão de 2011, foram isoladas duas amostras do sorotipo DEN-4, com transmissão caracterizada como autóctone, ou seja, quando a infecção ocorre dentro do território nacional, sugerindo o mesmo cenário que aconteceu em Nova Iguaçu em 2001 com a identificação/introdução do sorotipo DEN-3, que precedeu à epidemia de 2002. Esses dados indicam grande vulnerabilidade do Estado do Rio à ocorrência de epidemia pelo tipo DEN-4. Todavia, em relação à susceptibilidade de toda uma população ser infectada por esse vírus muita coisa não pode ser feita, pois ainda não existe vacina disponível, restando apenas o controle dos vetores a única alternativa existente para evitar a doença. Dessa forma, ações de Educação Ambiental assumem extrema relevância como instrumento de prevenção e controle da dengue. Em Bom Jesus do Itabapoana já vem sendo realizado, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, um trabalho com ações preventivas visando atenuar o impacto 16 dessa provável epidemia de dengue que ameaça assolar o Estado. Isso está sendo feito através da distribuição de panfletos explicativos sobre a doença e informativos como o do COSEMS-RJ para toda a população. Também têm sido feitas divulgações sonoras nas rádios locais e carros de som, bem como campanhas educativas com alunos da rede municipal de ensino. As visitas dos agentes de endemias nas casas acontecem periodicamente, porém o controle do vetor da dengue vai além das ações desses agentes e do uso de inseticidas. Há muitos fatores determinantes para a rápida disseminação do vírus e dispersão do vetor da dengue que escapam do controle do setor de saúde, demandando macro políticas. Nesse aspecto há responsabilidade da saúde municipal e da população evitando-se a ocorrência de possíveis transtornos. Todas essas estratégias não se restringem ao planejamento detalhado dos recursos necessários para o enfrentamento de epidemias pelas vigilâncias e assistências, mas também em provocar ações legais e políticas dos poderes legislativos e executivos municipais. Para a presidente do COSEMS-RJ, Maria Juraci Andrade Dutra, a criação de comitês municipais de enfrentamento da dengue, ou equivalentes, através de atos legais e com o comando do Executivo Municipal é uma forma de mobilização política e social que se espera produza bons resultados (COSEMS-RJ, 2011, p. 10). Essa expectativa, entretanto, não se realizará caso a mobilização se efetive quando a epidemia já estiver instalada, como mostra o ocorrido durante o início de 2011 em Bom Jesus do Itabapoana. Sendo assim, a Educação Ambiental se configura como um trabalho de longo prazo, como maneira de garantir ações de prevenção efetivas, uma vez que resultados no controle da dengue só são alcançados quando acontecem de forma multissetorial, contínua e integrada. A Secretaria Estadual de Saúde divulgou o relatório dos casos de dengue de 2011 onde dos 92 municípios do Estado do Rio de Janeiro, apenas 21 estariam preparados para enfrentar uma possível epidemia de dengue em 2012. Ainda de acordo com o relatório, Bom Jesus do Itabapoana teria sido um dos municípios que cumpriram a meta de prevenção no estado. Segundo dados da 41ª semana epidemiológica de 2011, referente ao período de dois de janeiro a 15 de outubro, foram notificados 161.315 casos de dengue no estado. No período foram registrados 133 óbitos, sendo um em Bom Jesus do Itabapoana. A Secretaria Estadual de Educação colocou toda sua estrutura à disposição da Secretaria Estadual de Saúde – SES para prevenir uma possível epidemia de dengue. A 17 campanha “10 Minutos Contra a Dengue” foi idealizada e implementada pela SES e foi o tom do alerta aos municípios e a população para evitar uma epidemia. O objetivo da campanha foi estimular a população a investir 10 minutos da semana eliminando possíveis criadouros em suas casas, já que o ambiente doméstico concentra 80% dos focos. A iniciativa foi inspirada em uma das estratégias adotadas pelo governo de Cingapura para controlar o mosquito, conseguindo interromper a epidemia que o país enfrentava entre 2004 e 2005, como explicou o superintendente de Vigilância Epidemiológica e Ambiental, Alexandre Chieppe (Secretaria Estadual de Saúde -RJ, 24/10/2011, on line). O superintendente disse ainda que neste país do leste asiático, os agentes de endemia não eliminam focos do mosquito Aedes aegypti, eles fazem apenas uma vistoria para verificar a existência de criadouros nas residências e orientam seus moradores na forma de eliminá-los. Chieppe conclui que não adianta pensar que os agentes, os mata-mosquitos, são os únicos responsáveis por combater os focos da dengue. O objetivo é mostrar para a população que a melhor pessoa para cuidar da sua casa é o próprio morador. O exemplo de controle dos casos de dengue nesse país serviu como base para que os especialistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) desenvolvessem o conceito das ações de combate ao mosquito transmissor. Entre várias ações a secretaria de educação criou uma brigada de alunos em cada uma das 1.457 escolas estaduais para simbolizar a participação do setor educacional na luta contra o mosquito Aedes aegypti. A ideia foi apresentada oficialmente pelo secretário de educação Wilson Risolia, dia 19/10/2011 no Rio de Janeiro, durante solenidade em que o secretário de saúde, Sérgio Côrtes, lançou a campanha 10 Minutos Contra a Dengue na rede estadual de ensino. A secretaria ainda vai distribuir folders, mídia impressa e cartazes nas escolas para difundir a campanha nas próprias unidades e nas comunidades onde se situam, bem como incentivar o surgimento de formas próprias de combater a dengue (Secretaria Estadual de Saúde-RJ, 19/10/2011, on line). Segundo o secretário de saúde, a ideia de envolver o setor de educação na campanha levou em conta exatamente este potencial de multiplicação. O objetivo é mobilizar alunos da rede de ensino pública e particular, para que eles atuem como multiplicadores de medidas simples e rotineiras de combate aos focos do mosquito. A iniciativa pretende disseminar noções de cidadania que promovam mudanças de hábitos e culturas a médio e longo prazo. A educação em saúde deve orientar o comportamento preventivo, promovendo a participação de toda a comunidade escolar, entre gestores, professores, estudantes e familiares. 18 Há sempre espaço para a intervenção pedagógica e preventiva nos problemas de saúde com perfis epidemiológicos. (Secretaria Estadual de Saúde-RJ, 19/10/2011, on line) Figura 2: Divulgação da Campanha: “10 Minutos Contra a Dengue” em Bom Jesus do Itabapoana Fonte: Jornal “A Voz do Povo” N° 2798 de 30/09/2011 A prefeitura de Bom Jesus do Itabapoana representada pela prefeita, juntamente com o secretário de saúde, a coordenadora do departamento de infraestrutura e a coordenadora do núcleo de saúde coletiva participaram do lançamento extraoficial no mês de setembro da campanha “10 Minutos Contra a Dengue”, durante o seminário “Rio Contra a Dengue – 2011/2012”. A secretaria municipal de saúde já buscou parcerias com as demais secretarias e entidades afins desenvolvendo ações de capacitação com profissionais de saúde visando práticas efetivas de combate à dengue. Caso a epidemia pelo DEN-4 não ocorra, essas ações não acarretarão nenhum prejuízo, muito pelo contrário, fortalecerão a Educação Ambiental como instrumento mobilizador permanente da sociedade. 3. Os limites da Educação e a incapacidade da Ação 3.1. A dengue não é um problema de solução única. O Brasil é um dos países que apresenta os “macrofatores” determinantes para a proliferação do Aedes aegypti e a transmissão da dengue como: clima apropriado, concentração de grandes aglomerados urbanos, o crescente trânsito de pessoas entre as regiões do país (que funcionam como uma forma de introdução de novos sorotipos 19 virais) e as inúmeras deficiências no abastecimento de água e no descarte adequado do lixo. Tudo isso contribui para que o combate ao mosquito vetor seja o principal elo passível de intervenção na batalha contra a dengue, pois até o momento não existe vacina eficaz nem tratamento específico (BRASIL, 2008, p.1). A solução para a prevenção e o controle da dengue, portanto, deve envolver ações multissetoriais, contínuas e permanentes. Requer a adoção de políticas integradas entre diversos setores e não apenas a saúde. As políticas de combate à dengue devem mobilizar o mundo acadêmico, os demais níveis de ensino, os órgãos públicos responsáveis e, sobretudo, a população para a formulação de estratégias inovadoras e eficazes de combate ao vetor, adaptadas à nossa realidade. A Educação Ambiental não tem se mostrado totalmente efetiva na prevenção e no controle da dengue em cidades endêmicas. Foi ressaltado que essa ação se restringe, na maioria das vezes, a uma distribuição de panfletos e campanhas de rádio objetivando disseminar informações sobre a dengue, mas não são suficientes, sobretudo quando a população só é procurada em casos de epidemias. É preciso organizar e estruturar os programas de controle da dengue sob um enfoque primordial de gestão integrada entre seus diversos componentes de interesse. Elaborar um projeto tecnicamente sólido, capaz de incluir amplo suporte social, e que exija ações coordenadas de várias esferas de governo em forte articulação com a sociedade civil. Igualmente importante é também a elaboração de programas de Educação Ambiental, ou seja, um conjunto de ações permanentes e ininterruptas, uma vez que não existe qualquer evidência técnica de erradicação do mosquito Aedes aegypti em curto prazo. Diante de um quadro tão preocupante de dengue no Estado do Rio de Janeiro e que vem ameaçando a cidade de Bom Jesus do Itabapoana, é fundamental a construção de uma sólida aliança entre todos os setores para além de qualquer divergência, pois o inimigo é comum e tem demonstrado a cada ano mais competência na sua luta pela sobrevivência. 3.2. Agimos segundo o que sabemos? Os resultados de vários trabalhos têm mostrado que os conhecimentos relacionados ao ciclo de vida do vetor da dengue são bastante claros para a população. Cavalcante e seus colaboradores (2007, p. 4) verificaram um bom nível de 20 conhecimento referente às características da doença e do vetor. Também concluíram que a maioria da população amostral (69,4%) acredita que os serviços públicos e os próprios cidadãos seriam os principais agentes responsáveis pela prevenção da doença. Entretanto, esses conhecimentos e responsabilidades não se traduzem em atitudes e práticas preventivas adequadas contra a transmissão da dengue. É por isso que muito se questiona sobre a efetividade dessas ações empreendidas. Afinal, apesar dos esforços, ainda ocorrem epidemias e óbitos por dengue como fora explicitado neste trabalho que teve como foco o surto ocorrido em Bom Jesus do Itabapoana. É nesse sentido que cabe aludir ao que FONSECA (2005) denomina de autoengano. Qual seja, detemos uma vasta quantidade de conhecimentos capazes de modificar o quadro existente, contudo não conseguimos transformar esse arcabouço num conjunto de ações efetivas de prevenção de novos surtos, sempre adiando a real mudança de comportamento. O que Giannetti chama de autoengano é uma espécie de estado letárgico em que sabemos o que fazer, mas nunca nos responsabilizamos pela ação. Somos capazes de identificar o erro alheio com absoluta precisão, porém nos mostramos absolutamente impotentes em mudar comportamentos nossos. Mesmo os mais fáceis de serem mudados. Há sempre uma dose considerável de indulgência quando julgamos a nossa responsabilidade. Esse abismo entre o conhecimento coletivo e as atitudes aponta para a necessidade de uma efetiva mobilização das pessoas, de forma a estimular a maior responsabilização de cada família na manutenção de seu ambiente doméstico livre de potenciais criadouros do vetor. Bem como fortalecer a vigilância epidemiológica, para ampliar a capacidade de detecção precoce de surtos da doença. A Educação Ambiental como instrumento de prevenção e controle da dengue permite justamente essa tomada de consciência diária. Sobre essa temática Hélio Gomes diz que: Educação Ambiental é, em última análise, uma tomada de consciência diária e geral. Não há saída segura se continuarmos operando com conceitos fragmentados e práticas esporádicas de concepção rasa. A mudança de comportamento tem que ser em todos os campos e a busca de soluções precisa ir fundo nas questões o tempo todo. Não há mais como protelar, a decisão é agora. Queremos, de fato, mudar ou continuaremos nos enganando? (GOMES FILHO, 2008, p. 19) A dengue é uma doença que exige a implementação de macro políticas, nesse sentido há a responsabilização da saúde municipal e de toda a comunidade numa forma 21 de prevenção de possíveis transtornos. É necessário assim que a Educação Ambiental seja capaz de abastecer o cidadão, nas variadas esferas de poder, com informações capazes de transformar conhecimentos em atitudes. Sem isso os programas de prevenção e controle da dengue fracassam e os resultados são as epidemias anuais. 3.3. As estratégias adotadas na prevenção e controle da dengue são realmente efetivas? A dengue é hoje objeto da maior campanha de saúde pública do Brasil. Levando em conta as condições socioambientais do país, fica claro porque este é um dos maiores desafios da Educação Ambiental e também porque a participação da comunidade é a melhor estratégia. A campanha “10 Minutos Contra a Dengue” do governo do Rio de Janeiro veio fazer frente às práticas efetivas de combate a doença e foi aderida em Bom Jesus do Itabapoana. Através de ações planejadas visando mudanças de comportamento e adoção de práticas efetivas para a manutenção do ambiente domiciliar preservado da infestação por Aedes aegypti, a Educação Ambiental é uma importante aliada dos programas de controle do vetor da dengue. Em todo o Brasil, são inúmeras as intervenções educativas voltadas para a prevenção e controle da dengue. Entretanto, nada tem sido feito em relação à avaliação desses processos educativos. Uma avaliação que busque identificar o grau de efetividade do conjunto de medidas, ou seja, as falhas ou as dificuldades dessas intervenções. A formulação de um conjunto de indicadores que permitissem a monitoração das políticas. Isso porque a educação deve ter como objetivo uma eliminação mensurável de criadouros dos mosquitos vetores no ambiente doméstico, pelo cidadão, e não simplesmente o acréscimo de conhecimento como ressalta Brassolatti & Andrade (2002, p.244) Assim, o parâmetro de avaliação desses trabalhos deve ser entomológico, e não estritamente educacional. Os trabalhos educativos convencionais nessa área apresentam como principal deficiência o fato de terem sido definidos como um nível de conhecimento ideal que uma vez adquiridos pela população implicará em instantânea mudança de hábitos, sem sequer apresentar a avaliação dos resultados reais. Será com base, por exemplo, no resultado da avaliação das intervenções educativas implementadas pela campanha “10 Minutos Contra a Dengue” nas regiões 22 endêmicas, no caso particular de Bom Jesus do Itabapoana, que as autoridades terão condições de verificar a efetividade das estratégias adotadas. Esse é o primeiro passo no sentido de corrigir a incoerência existente no fato da população não colocar em prática os conhecimentos que adquire. É indiscutível a necessidade de se avaliar a efetividade das intervenções educativas que serão implementadas na prevenção da dengue em regiões endêmicas . Somente a partir da adoção de estratégias que se mostraram comprovadamente efetivas que a Educação Ambiental contribuirá para a efetiva mudança de comportamento da sociedade. 4. Considerações finais Frente aos constantes desafios impostos pelas atividades de prevenção e controle da dengue no Brasil e no município de Bom Jesus do Itabapoana – RJ, é fundamental que o governo, em estreita cooperação com a sociedade, priorize a adoção de políticas multissetoriais e integradas, de combate ao vetor da dengue. Políticas capazes de incluir amplo suporte social através de programas permanentes e ininterruptos. Afinal é bom recordar que não existe uma solução única, fácil, nem de baixo custo, para esse problema complexo de saúde pública. Esforços representativos devem ser feitos no sentido de planejar ações educativas efetivas de mobilização de cada família na manutenção de seu ambiente doméstico livre de potenciais criadouros do vetor. Isso poderia contribuir para minimizar o abismo entre o conhecimento que a população adquire e sua prática diária. Haja vista que na ausência de uma vacina eficaz, o controle da transmissão do vírus da dengue depende, basicamente, do esforço conjunto da sociedade como um todo no combate ao mosquito. O presente estudo se propôs a analisar a efetividade do processo educativo ambiental na prevenção e controle da dengue no município de Bom Jesus do Itabapoana a fim de repensar que os transtornos causados pela doença não são de responsabilidade exclusiva do poder público ou dos sistemas de saúde, mas de toda a sociedade. A Educação Ambiental em saúde se configura como uma importante ferramenta mobilizadora permanente atuando nesse sentido. 23 5. Referências AMARAL,W. A educação ambiental e a consciência da solidariedade ambiental. Revista Internacional de Direito e Cidadania, n. 2. 2008. p. 207-216. BARRETO, M.L.; TEIXEIRA, M.G. Dengue no Brasil: situação epidemiológica e contribuições para uma agenda de pesquisa. Estudos Avançados, vol. 22, n.64. 2008. BRASIL. LEI 6.938, de 31 de agosto de 1981. 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