RPCV (2004) 99 (549) 53-58 REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS VETERINÁRIAS Ramos colaterais do arco aórtico e suas principais ramificações em chinchila (Chinchilla lanigera) Collaterals branches of the aortic arch and its main rami in chinchila (Chinchilla lanigera) Ana Cristina Pacheco de Araújo1*, João César Dias Oliveira1 e Rui Campos1,2 1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Programa de Pós-graduação em Ciências Veterinárias. Av. Bento Gonçalves, 9090, Porto Alegre, RS, Brasil, CEP: 91540-000. 2 Departamento de Ciências Morfológicas, Instituto de Ciências Básicas da Saúde. Resumo: Este trabalho objetivou sistematizar e descrever os ramos colaterais do arco aórtico e suas subdivisões colaterais principais na chinchila. Foram utilizados 30 animais, com o sistema arterial preenchido com látex 603. Do arco aórtico originaram-se em seqüência, em 93,3% das peças, o tronco braquiocefálico e a artéria subclávia esquerda, enquanto em 6,7% das amostras o arco emitiu o tronco braquiocefálico, a artéria carótida comum esquerda e a artéria subclávia esquerda. As artérias carótidas comuns, direita e esquerda, dividiram-se em seus ramos terminais as artérias carótidas externa e interna. A artéria carótida interna terminou-se em 100% à direita e 93,3% à esquerda, próximo ao forame lácero. A artéria subclávia, à direita, geralmente emitiu como ramos colaterais seqüenciais as artérias vertebral, escapular dorsal, tronco comum torácica interna-vertebral torácica e tronco comum cervical superficialprofunda, enquanto, à esquerda, geralmente, o tronco comum torácica interna-vertebral torácica foi o primeiro ramo colateral da artéria subclávia. Palavras-chave: artéria aorta, roedores, vascularização Summary: This study aimed to systematize and describe the collaterals branches of the aortic arch and its main branches in chinchila. The arterial system of thirty animals was filled with latex 603. In 93.3% of the samples, the aortic arch gave off the bracheocephalic trunk and left subclavian artery. In 6.7% of the cases, from the aortic arch were originated the bracheocephalic trunk, left common carotid artery and left subclavian artery. The right and left common carotids arteries bifurcated in its terminal branches: the external and internal carotids arteries. The internal carotid artery was finished near the lacerum foramen, on the right in 100% and on the left in 93.3% of the cases. The collateral branches of the right subclavian artery were, usually, the vertebral artery, the dorsal scapular artery, the common trunk of the internal thoracic and thoracic vertebral arteries and finally the common trunk of the cervical superficial and cervical deep arteries. However, on the left, the subclavian artery gave rise the common trunk of the internal thoracic and thoracic vertebral arteries as its first collateral branch. Key words: aorta artery, rodents, vascularization * Correspondente: e-mail [email protected] Introdução Nos últimos anos a chinchila vem tomando importância como animal de laboratório, e como poucos relatos foram encontrados na literatura, tornou-se necessário melhor descrever a sua anatomia. Existem alguns estudos sobre os ramos colaterais do arco aórtico em espécies domésticas como no gato e no cão, realizados por Filho e Borelli (1970), Goshal (1981) e Evans (1993) e em coelho, por Albuquerque et al. (1987). Sinzinger e Hohenecker (1972) estudaram o arco aórtico em alguns roedores de laboratório. Já espécies selvagens como o gambá, foram estudados por Souza et al. (1982) e Reckziegel et al. (2003); como o tatu, por Souza et al. (1996) e como a paca, por Oliveira et al. (2001). Porém sobre chinchila não foram encontrados registros. A proposta desse trabalho foi descrever os ramos colaterais do arco aórtico e seus principais ramos colaterais na chinchila, estabelecendo um modelo padrão e suas principais variações nessa espécie. Material e métodos Para a realização desse trabalho foram utilizados 30 espécimes de Chinchilla lanigera, provenientes de criatórios dos municípios de Viamão e Santa Maria no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, sendo 19 fêmeas e 11 machos adultos. Foram administrados aos animais 5000 UI de heparina (Heparin – Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP, BR) e transcorridos 30 minutos, foram eutanasiados com overdose de tiopental sódico 2,5% (Thionembutal - Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP, BR), ambos pela via intraperitoneal. Logo após, foi feita a abertura da caixa torácica, com secção do ápice cardíaco e canulação da artéria subclávia esquerda e tronco braquiocefálico, pela 53 Araújo, A.C. et al. artéria aorta, através do ventrículo esquerdo. O sistema arterial foi lavado com solução salina a 0,9% resfriada, sendo realizado a seguir o preenchimento dos vasos com látex 603 (Cola 603 – Bertoncini Ltda, São Paulo, SP, BR), corado com pigmento vermelho (Suvinil Corante – BASF S.A. São Bernardo do Campo, SP, BR). As peças permaneceram submersas em água corrente por 60 minutos para polimerização do látex, sendo feita em seguida, a secção da coluna vertebral na altura das primeiras vértebras lombares, rebatimento total da pele e a abertura de uma janela óssea na abóbada craniana. As preparações foram fixadas em formaldeído a 20% por, no mínimo, sete dias, com posterior dissecção e observação das artérias do espaço mediastínico cranial e pescoço. O encéfalo foi retirado para observação dos vasos que promoviam a irrigação do cérebro. Desenhos esquemáticos, de todas as peças, foram elaborados com auxílio de uma lupa, para confecção dos resultados. Alguns exemplares foram fotografados para documentação e os vasos nominados de acordo com a Nomina Anatômica Veterinária (1994), sendo que algumas denominações foram feitas pelos autores, com base nos territórios de suprimento sanguíneo do cão. Resultados O arco aórtico da chinchila apresentou-se com uma curvatura à esquerda, em todas as peças, e emitiu como seus ramos colaterais em seqüência, o tronco braquiocefálico e a artéria subclávia esquerda em 93,3% das peças (Figuras 1 e 3A). Em 6,7% das amostras a seqüência dos ramos encontrados foi um tronco braquiocefálico, a artéria carótida comum esquerda e a artéria subclávia esquerda (Figuras 2 e 3B). O tronco braquiocefálico emitiu em 93,3% das preparações uma artéria carótida comum esquerda, milí- RPCV (2004) 99 (549) 53-58 metros depois, uma artéria carótida comum direita, continuando-se para à direita como artéria subclávia direita. Já em 6,7% dos casos o tronco braquiocefálico emitiu, alguns milímetros depois de sua origem, a artéria carótida comum direita, continuando-se como artéria subclávia direita. As artérias carótidas comuns direita e esquerda ascenderam o pescoço, acompanhando a traquéia, lateralmente, alcançando a base do crânio dividindo-se, na altura da alça do nervo hipoglosso, em artéria carótida interna e artéria carótida externa. A última dirigiu-se para a face distribuindo-se, enquanto a artéria carótida interna emitiu a artéria occipital, contornando medialmente a grande bolha timpânica, terminando-se próximo à entrada do forame lácero, em 100% dos casos à direita e 93,3% à esquerda. Em 6,7% dos achados à esquerda, ela penetrou, caudalmente, no forame lácero indo participar da irrigação encefálica. Nestes dois casos a referida artéria não fez o percurso habitual de uma artéria carótida interna, progredindo rostralmente até alcançar a hipófise, ramificando-se. Em uma dessas peças a artéria carótida interna esquerda formou a artéria basilar, rostralmente, com seus ramos terminais e colaterais e lançou, caudalmente, a artéria espinhal ventral que, nitidamente, diminuía de calibre em direção a medula espinhal. Na outra preparação, a artéria carótida interna esquerda atingiu a base da medula oblonga, exatamente na mesma posição que no caso anterior, a alguns milímetros caudal à ponte, entretanto, ela se anastomosou à artéria basilar, que era bem desenvolvida, no local de origem da artéria cerebelar caudal esquerda, sendo essa última ramo da própria artéria carótida interna. A artéria subclávia emitiu como ramos colaterais principais as artérias: vertebral, escapular dorsal, tronco comum torácica interna-vertebral torácica e tronco comum cervical superficial-profunda (Figura 3). A artéria vertebral, a partir de sua origem, projetouse dorsocranialmente incorporando-se ao canal transFigura 1 – Vista ventral do tórax e pescoço abertos, retirados esôfago e traquéia, para ressaltar o modelo padrão do arco aórtico da chinchila: a - coração; b - arco aórtico; c - tronco braquiocefálico; d - artéria carótida comum esquerda; e - artéria carótida comum direita; f - artéria subclávia direita; g - artéria subclávia esquerda; h - artéria axilar direita; i - artéria axilar esquerda; j - tronco comum torácica interna vertebral torácica direita; k - artéria torácica interna direita; l - artéria vertebral torácica direita; m - artéria escapular dorsal direita; n - tronco comum torácica interna vertebral torácica esquerda; o - artéria torácica interna esquerda; p - artéria vertebral torácica esquerda; q - tronco comum cervical superficial-profunda direita; r - artéria cervical profunda direita; s - artéria cervical superficial direita; t - tronco comum cervical superficial-profunda esquerda; u - artéria cervical profunda esquerda; v - artéria cervical superficial esquerda; x - artéria vertebral esquerda. Barra = 5 mm. 54 Araújo, A.C. et al. RPCV (2004) 99 (549) 53-58 Figura 2 – Vista ventral do espaço mediastínico cranial aberto, retirados esôfago e traquéia para salientar a variação da origem dos ramos do arco aórtico da chinchila: a - arco aórtico; b - tronco braquiocefálico; c artéria carótida comum esquerda; d - artéria carótida comum direita; e - artéria subclávia direita; f - artéria subclávia esquerda; g - artéria axilar direita; h - artéria axilar esquerda. Barra = 2,5 mm. versal a partir do forame transverso da sexta vértebra cervical. Após ultrapassar o forame transverso do atlas atingiu a fossa atlantal penetrando rostralmente no forame alar e vertebral lateral para o interior do canal vertebral, indo anastomosar-se com sua homóloga contralateral, na face ventral da medula oblonga, formando a artéria basilar que foi responsável pela irrigação encefálica em 96,7% dos casos. Já em 3,3% das peças, a artéria vertebral de ambos os antímeros era um fino ramículo que se uniu à artéria espinhal ventral formada a partir de uma única artéria carótida interna esquerda desenvolvida, não cooperando na irrigação encefálica. A artéria escapular dorsal (Figuras 1 e 3) projetouse dorsalmente, indo irrigar a musculatura profunda da goteira vertebral na região escapular dorsal. O tronco comum torácica interna-vertebral torácica originou como ramo colateral, de menor calibre, a artéria vertebral torácica, que se lançou caudodorsalmente, emitindo as artérias intercostais dorsais da primeira à sexta. Em sua continuação, o ramo mais calibroso, a artéria torácica interna, projetou-se ventrocaudalmente alcançando o músculo transverso torácico emitindo todas as artérias intercostais ventrais, continuando-se para a parede abdominal como artéria epigástrica cranial. O tronco comum cervical superficial-profunda (Figuras 1 e 3) lançou-se cranialmente sendo seu ramo mais calibroso a artéria cervical superficial que percorreu na face lateral superficial do pescoço, irrigando a musculatura extrínseca do membro torácico na região. Seu ramo colateral, de menor calibre, a artéria cervical profunda ramificou-se um pouco mais profundamente no pescoço irrigando também a musculatura dorsal do tórax. A artéria subclávia direita emitiu em seqüência, de medial para lateral, como ramos colaterais principais, as artérias: vertebral, escapular dorsal, tronco comum torácica interna-vertebral torácica e tronco comum cervical superficial-profunda (Figura 3). A artéria vertebral direita apresentou-se como o primeiro ramo em 90% das peças, como segundo ramo em 6,7% e como terceiro ramo em 3,3% das preparações. A artéria escapular dorsal apresentou-se como segundo ramo colateral da artéria subclávia direita em 50% das peças. Em 23,3% das preparações ela foi emitida como terceiro ramo, em 23,3% dos casos ela era ramo colateral da artéria vertebral e em 3,3% foi ramo colateral da artéria torácica interna juntamente com a artéria vertebral torácica. O tronco comum torácica interna-vertebral torácica apresentou-se como terceiro ramo colateral da artéria subclávia direita em 46,7% das preparações. Já em 36,7% mostrou-se como segundo ramo, enquanto que em 10% das peças foi o primeiro ramo. Em 6,6% dos casos, onde não ocorreu a formação de um tronco comum, a artéria torácica interna foi o quarto ramo e a artéria vertebral torácica foi o segundo ramo. O tronco comum cervical superficial-profunda apresentou-se como quarto ramo colateral da artéria subclávia direita em 50% dos achados, sendo o terceiro ramo em 26,7% e como quinto ramo em 3,3% das peças. Nos restantes 20% das observações onde não houve formação de tronco, em 6,7% das amostras a artéria cervical superficial apresentou-se como o quarto ramo, enquanto em 13,3% ela apresentou-se como quinto ramo. Já a artéria cervical profunda foi ramo colateral da artéria escapular dorsal em 6,7% dos casos e mostrou-se como quarto ramo em 13,3% das amostras. A artéria subclávia esquerda foi originada do arco aórtico a poucos milímetros do tronco braquicefálico, projetando-se lateralmente à esquerda até ultrapassar cranialmente a primeira costela (Figuras 1 e 3). Emitiu em seqüência de medial para lateral, normalmente, as artérias: tronco comum torácica interna-vertebral torácica, vertebral, escapular dorsal e o tronco comum cervical superficial-profunda (Figura 3). O tronco comum torácica interna-vertebral torácica 55 Araújo, A.C. et al. RPCV (2004) 99 (549) 53-58 Figura 3 – Desenho esquemático em vista ventral do coração e arco aórtico da chinchila, evidenciando (A) o modelo padrão e (B) a variação dos ramos do arco aórtico: a - arco aórtico; b - tronco braquiocefálico; c - artéria carótida comum esquerda; d - artéria carótida comum direita; e - artéria subclávia direita; f - artéria subclávia esquerda; g - artéria axilar direita; h - artéria axilar esquerda; i - artéria vertebral; j - artéria escapular dorsal; k - tronco comum torácica interna-vertebral torácica; l - artéria torácica interna; m - artéria vertebral torácica; n - tronco comum cervical superficial-profunda; o - artéria cervical profunda; p - artéria cervical superficial; VD - ventrículo direito; VE - ventrículo esquerdo. apresentou-se como primeiro ramo colateral da artéria subclávia esquerda em 76,7% das peças. Já em 23,3% não houve a formação de tronco comum, sendo que em todos esses achados o primeiro ramo foi a artéria vertebral torácica e o segundo ramo a artéria torácica interna. A artéria vertebral esquerda apresentou-se como segundo ramo colateral da artéria subclávia em 63,3% dos achados, já em 30% ela foi o terceiro ramo, enquanto em 6,7% ela foi o quarto ramo colateral. A artéria escapular dorsal esquerda foi emitida, em 46,7% das peças, como terceiro ramo colateral da artéria subclávia esquerda, já em 13,3% apresentou-se como segundo ramo, e em outros 13,3% foi o quarto ramo colateral. Entretanto em 26,7% das amostras a artéria escapular dorsal não era ramo colateral da artéria subclávia esquerda e sim da artéria vertebral esquerda. O tronco comum cervical superficial-profunda originou-se como o quarto ramo colateral da artéria subclávia esquerda em 50% das peças, já em 23,3% foi o terceiro ramo, enquanto em 10% foi o quinto ramo colateral. Entretanto em 16,7% das amostras não ocorreu a formação de tronco comum das artérias cervical superficial-profunda, sendo que dentre essas peças a artéria cervical superficial foi o quinto ramo colateral em 10%, quarto ramo em 3,3% e o sexto ramo colateral em 3,3%. Nestes mesmos achados a artéria cervical profunda mostrou-se isolada, não sendo ramo colateral da artéria subclávia esquerda e sim da artéria escapular dorsal em 10% dos espécimes, enquanto que em 6,7% ela foi ramo colateral da artéria subclávia esquerda, sendo em uma peça o quarto ramo, e noutra o quinto ramo colateral. Discussão Como não foram encontradas citações sobre o arco aórtico e seus ramos colaterais na chinchila, utilizou56 se como referência para discussão trabalhos de alguns autores que o estudaram em outras espécies animais. Segundo Filho e Borelli (1970), estudando 240 gatos (Felis catus domestica) do arco aórtico emergiu, em 165 animais, a partir da artéria braquiocefálica, a artéria carótida comum esquerda e em seguida um tronco comum das artérias carótida comum direita e subclávia direita. Já da crossa da aorta emergiu a artéria subclávia esquerda, sendo que este padrão foi coincidente com o encontrado na maioria dos casos em chinchila. Essa disposição apareceu como uma variação no gambá (Didelphis aurita) em apenas um espécime, segundo Souza et al. (1982) utilizando 26 animais. Já Albuquerque et al. (1987), utilizando 40 coelhos (Oryctolagus cuniculus), encontraram essa disposição em 35 animais, e o restante de seus exemplares tiveram a formação de um tronco bicarotídeo. O padrão de ramificação encontrada na chinchila também foi evidenciado nos oito exemplares de paca (Agouti paca) estudados por Oliveira et al. (2001) e em cinco de 28 gambás (Didelphis albiventris) pesquisados por Reckziegel et al. (2003). A presença de tronco bicarotídeo também foi relatada por Filho e Borelli (1970) em 75 de 240 gatos, por Souza et al. (1982) em 25 de 26 gambás (Didelphis aurita) e por Albuquerque et al. (1987) em cinco de 40 coelhos estudados, bem como por Reckziegel et al. (2003) em 15 gambás (Didelphis albiventris) de 28 animais, sendo 11 a partir do tronco braquiocefálico e quatro diretamente do arco aórtico. A formação de um tronco bicarotídeo não foi encontrada em nenhuma de nossas preparações. Para Goshal (1981), em cães, do arco aórtico surge um tronco braquiocefálico, que na maioria das vezes, emite uma artéria carótida comum esquerda, uma artéria carótida comum direita e a artéria subclávia direita, e como segundo ramo a artéria subclávia esquerda. Essa ramificação do tronco braquiocefálico foi coincidente com a encontrada na maioria de nossos Araújo, A.C. et al. casos. Esse autor cita ainda que poderiam ocorrer, como variações, a formação de uma trifurcação do tronco ou a formação de um tronco bicarotídeo. Nenhuma dessas formações foi observada nas chinchilas estudadas. De acordo com Evans (1993), o suprimento sangüíneo para a cabeça, pescoço e membros torácicos origina-se da artéria aorta através de dois grandes vasos emitidos pelo arco aórtico, o tronco braquiocefálico e a artéria subclávia esquerda. O tronco braquiocefálico é a primeira grande artéria do arco aórtico, sendo a artéria carótida comum esquerda seu primeiro ramo colateral. O tronco termina-se nas artérias carótida comum direita e subclávia direita. Apenas em quatro espécimes de 123 cães examinados, as artérias carótidas comum direita e esquerda originaram-se por um tronco comum. A artéria subclávia esquerda originou-se do arco aórtico como segundo ramo colateral, a qual se continuou no bordo cranial da primeira costela como artéria axilar. Segundo Souza et al. (1982), em gambá (Didelphis aurita), Albuquerque et al. (1987), em coelho e Oliveira et al. (2001), em paca, a artéria subclávia esquerda era o primeiro ramo do arco aórtico. Esta citação contradiz todos os livros clássicos de anatomia onde o primeiro ramo é o tronco braquiocefálico. Nossos resultados concordam com Reckziegel et al. (2003) em relação à seqüência dos ramos do arco aórtico, ou seja, a artéria subclávia esquerda foi o segundo ou terceiro ramo originado deste. Do arco aórtico, em 20 espécimes de rato, segundo Sinzinger e Hohenecker (1971), surge como primeiro ramo a artéria anônima (tronco braquiocefálico), que se divide em artéria subclávia direita e artéria carótida comum direita. O arco também emitiu, em seqüência, separadamente, as artérias carótida comum esquerda e subclávia esquerda. Estes resultados são coincidentes com as variações encontradas na chinchila. Esta mesma disposição foi encontrada no tatu peba (Euphractus sexcinctus) nos sete espécimes utilizados por Souza et al. (1996), assim como em apenas um caso dentre 28 gambás (Didelphis albiventris) por Reckziegel et al. (2003). Como a revisão bibliográfica não aportou referências relativas aos ramos terminais das artérias carótidas comuns e dos ramos colaterais das artérias subclávias, utilizou-se a literatura clássica em especial os relatos de Goshal (1981) e Evans (1993) que descreveram as ramificações das artérias subclávias no cão, espécie cujo arco aórtico emite ramos colaterais semelhantes à chinchila. No cão, para Goshal (1981) e Evans (1993), a artéria carótida comum ascende o pescoço dividindose em artérias carótidas interna e externa próximo à base do crânio. A artéria carótida externa ramifica e distribui-se na face, como na chinchila, enquanto a artéria carótida interna penetra no crânio cooperando na irrigação encefálica. Na chinchila em apenas dois RPCV (2004) 99 (549) 53-58 casos, à esquerda, a artéria carótida interna chegou a participar da irrigação encefálica. Os autores que pesquisaram os ramos colaterais do arco aórtico em várias espécies animais, não aprofundaram seus estudos com relação à ramificação das artérias subclávias. Sinzinger e Hohenecker (1971) estudando em 20 espécimes de ratinhos albinos citam como ramos seqüenciais da artéria subclávia as artérias: torácica interna, intercostal suprema, cervical profunda e vertebral, sem especificar a percentagem de ocorrência. Já Oliveira et al. (2001) em paca, relataram como ramos das artérias subclávias em seu trajeto intratorácico, de cranial para lateral, as artérias: vertebral, tronco costocervical, cervical superficial, axilar e torácica interna. A ramificação por nós encontrada foi mais ampla, com a formação de troncos comuns e seqüência de emissão diferentes entre as artérias subclávias. Ressalte-se que na literatura clássica como em nossos resultados a artéria axilar é a continuação extratorácica da artéria subclávia. Mesmo no cão a seqüência de origem da ramificação colateral das artérias subclávias, citado por Goshal (1981) e Evans (1993) é diferente da encontrada na espécie por nós estudada. Para esses autores, as artérias subclávias emitem em seqüência: a artéria vertebral; tronco costocervical, sendo que desse originam-se as artérias: escapular dorsal, cervical profunda e vertebral torácica; a artéria torácica interna e a artéria cervical superficial; continuando-se como artéria axilar. Observando-se, na chinchila, os territórios de suprimento dos ramos colaterais das artérias subclávias, buscou-se estabelecer uma correspondência entre estes e os territórios de suprimento descritos no cão, por Goshal (1981) e Evans (1993), para a denominação destes vasos. Entretanto esses ramos colaterais surgiram com algumas diferenças no local de origem, com formação de troncos ou como ramificação de um ramo colateral. Para Goshal (1981) e Evans (1993) a artéria vertebral é o primeiro ramo da artéria subclávia que ascende o pescoço pelo canal transverso, emitindo três ramos: um para a musculatura dorsal da goteira, outro que, juntamente com sua homóloga contralateral, forma a artéria espinhal ventral e, um terceiro que penetra no atlas, unindo-se com a do lado oposto formando a artéria basilar. Em nossos resultados a artéria vertebral foi o primeiro ramo da artéria subclávia direita e o segundo da esquerda. Entretanto, a artéria vertebral da chinchila formou a artéria basilar que foi a responsável por toda a irrigação encefálica na maioria dos achados. Segundo Goshal (1981) e Evans (1993) a artéria escapular dorsal é um ramo colateral do tronco costocervical e distribuiu-se no músculo serrátil ventral, já na chinchila apresentou a mesma área territorial, porém foi o segundo ramo colateral da artéria subclávia direita e o terceiro da subclávia esquerda. 57 Araújo, A.C. et al. Na chinchila as artérias torácica interna e vertebral torácica formaram um tronco, enquanto que no cão, para Goshal (1981) e Evans (1993), a primeira é ramo direto da artéria subclávia e divide-se nas artérias musculofrênica e epigástrica cranial e, a segunda é ramo do tronco costocervical, estendendo-se até o terceiro ou quarto espaço intercostal dorsalmente; sendo que na chinchila essa artéria estende-se até o sexto espaço intercostal dorsal. No cão para Goshal (1981) e Evans (1993), a artéria cervical superficial é um ramo colateral da artéria subclávia e a artéria cervical profunda origina-se do tronco costocervical. Para esses autores, no cão, a artéria cervical superficial ramifica-se e irriga a musculatura superficial do pescoço e extrínseca do membro torácico, e a artéria cervical profunda dirigese para a musculatura profunda do pescoço e dorsal do tórax. Na chinchila os territórios são coincidentes, porém normalmente formavam um tronco comum cervical superficial-profunda. Com base nos resultados obtidos podemos concluir que o padrão de ramos colaterais do arco aórtico na chinchila é, em seqüência, o tronco braquiocefálico e a artéria subclávia esquerda, enquanto que a variação encontrada é o tronco braquiocefálico, a artéria carótida comum esquerda e a artéria subclávia esquerda. E que os ramos colaterais das artérias subclávias supriram territórios semelhantes ao do cão, entretanto em alguns casos constituíram troncos comuns diversos. A artéria carótida interna normalmente não coopera na irrigação encefálica, enquanto que as artérias vertebrais quase sempre suprem todo o encéfalo. 58 RPCV (2004) 99 (549) 53-58 Bibliografia Albuquerque, J.F.G., Fonseca, M.A.G., Carregal, R.D., Souza, W.M., Bastos, C.M.C. (1987). Contribuição ao estudo dos colaterais calibrosos do arco aórtico no coelho (Oryctolagus cuniculus, Linnaeus, 1758). Ars Veterinária, 3 (1), 01-04. Evans, H.E. (1993). The heart and arteries. In: Miller’s anatomy of the dog, 3ª edição. W.B. Saundres company (Filadelfia), 626-634. Filho, F.F. e Borelli, V. (1970). Contribuição ao estudo dos colaterais calibrosos do arco aórtico no gato. Revista da Faculdade de Medicina Veterinária de São Paulo, 8 (2), 385-388. Goshal, N.G. (1981). Coração e artérias do carnívoro. In: Anatomia dos animais domésticos. vol. II. 5ª edição. Interamericana (Rio de Janeiro), 1500- 1513. International commitee on veterinary Gross anatomical nomenclature. 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