18 Fenologia da fava-d’anta (Dimorphandra mollis Benth.) no norte de Minas Gerais, Brasil CALDEIRA JÚNIOR, C.F.*; SANTOS, A.M.; QUEIROZ, J.M.R.; DE PAULA, T.O.M.; MARTINS, E.R. Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Agrárias da UFMG, C.P. 135, Montes Claros-MG, 39.404-006. * [email protected]. RESUMO: A fava-d’anta, espécie nativa do cerrado brasileiro, possui grande importância para a indústria farmacêutica, pela produção de vários princípios ativos, principalmente o bioflavonóide rutina. O objetivo deste estudo foi determinar o comportamento fenológico da fava-d’anta no Norte de Minas Gerais, correlacionando as fenofases com variáveis climáticas. O estudo foi realizado em três populações no município de Montes Claros - MG, sendo avaliadas dez árvores em cada população. Verificou-se que a fava-d’anta apresenta alta sincronia das fenofases entre os indivíduos estudados; as fenofases encontram-se associadas aos eventos climáticos, estando correlacionadas com fenômenos como a precipitação, fotoperíodo, temperatura e outros. A fenofase queda de folhas é sucedida pelo brotamento, que ocorre juntamente com a floração e antecede o período chuvoso. A frutificação ocorre durante o período das chuvas, os frutos encontram-se maduros na transição das estações chuvosa para seca e a dispersão ocorre durante a seca. A melhor época de colheita dos frutos para a indústria é durante os meses de abril a maio, quando encontram-se no ponto de colheita. Palavras-chave: plantas medicinais, extrativismo, manejo ABSTRACT: “Fava-d’anta” (Dimorphandra mollis Benth.) phenology in the north of Minas Gerais State, Brazil. Dimorphandra mollis Benth., a species native to Cerrado, presents a great importance for the pharmaceutical industry as a source of several active principles, mainly the bioflavonoid rutin. The aim of this study was to evaluate the phenological behavior of “fava-d’anta” in the north of Minas Gerais State, Brazil, correlating phenophases with climatic variables. Three populations from Montes Claros County (Minas Gerais State) were studied, and ten trees each were analyzed. “Fava-d’anta” individuals presented high phenophase synchrony. Phenophases are associated with climatic events and are correlated with phenomena such as precipitation, photoperiod, and temperature. Leaf-fall phenophase is followed by sprouting, which is concomitant to flowering and precedes the rainy period, when fruiting occurs. Fruits are ripe during rainy-dry season transition, and dispersion occurs in the dry period. The best harvesting time concerning fruits for industry is between April and May, when fruits are ready for harvest. Key words: medicinal plants, extractivism, management INTRODUÇÃO Com a expansão da fronteira agrícola nas regiões de cerrado, muitas espécies arbóreas encontram-se ameaçadas, entre elas, a fava-d’anta (Dimorphandra mollis Benth.), uma espécie nativa do Brasil, pertencente à família Fabaceae, encontrada em regiões de cerrado nos estados do Pará, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, São Paulo e Mato Grosso do Sul (Silva, 1999). A espécie tem grande importância para a indústria farmacêutica, na produção de princípios ativos constituídos por compostos fenólicos, taninos e rutina (Sousa et al., 1991). O fruto do faveiro é importante fonte de rutina, tendo a proporção de 8 g para 100 g de pericarpo. A rutina tem importância terapêutica em virtude de determinar a normalização da resistência e permeabilidade das paredes dos vasos capilares. Esta substância é normalmente explorada por extrativismo, sendo este um dos fatores que mais contribuem para Recebido para publicação em 07/02/2007 Aceito para publicação em 04/08/2008 Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 19 o elevado risco de erosão genética, conforme observação de Souza & Martins (2004). No entanto, à semelhança de outras espécies silvestres, a fava-d’anta não pode ser ainda cultivada comercialmente, sendo o manejo sustentável da planta em seu ambiente natural uma alternativa para a sua produção. Esse tipo de exploração também promove a conservação de outras espécies na natureza, desde que esta seja realizada com base em estudos amplos, tais como: biologia reprodutiva, ecologia das espécies, demografia, ciclo fenológico, dentre outros. A fenologia estuda a ocorrência de eventos biológicos periódicos e as suas causas, em relação a fatores bióticos e abióticos, e a inter-relação entre fases caracterizadas por esses eventos numa mesma e em diferentes espécies (Lieth, 1974). Mediante estudos fenológicos, associados às observações climatológicas, é possível prever a época de reprodução, deciduidade e ciclo de crescimento vegetativo, parâmetros que podem ser utilizados no manejo adequado da flora (Ribeiro & Castro, 1986). De acordo com Fournier (1974), estudos que visem a compreensão da dinâmica das comunidades vegetais e seu funcionamento como indicadores das respostas das plantas às condições climáticas e edáficas são ferramentas para o manejo florestal, podendo ser utilizados como suporte para o desenvolvimento de estratégias conservacionistas da flora e fauna regionais. Para Dias (1995), a fenologia também fornece bases para o entendimento dos papéis que os fatores ambientais exercem nas plantas através da regulação fitohormonal, inibindo ou desencadeando fenofases específicas. Segundo Alencar (1994), além das características intrínsecas da espécie, as variações climáticas também podem influenciar a fenologia regulando a intensidade, a época, a duração e a periodicidade dos eventos fenológicos; no entanto, ainda são poucos os estudos que avaliam os efeitos do clima na época de ocorrência das fenofases. Diante disso, o objetivo deste estudo foi determinar o comportamento fenológico da fava-d’anta no Norte de Minas Gerais, correlacionando as fenofases com as variáveis climáticas. Espera-se com estas informações fornecer subsídios para o estabelecimento de recomendações para um manejo adequado desta importante leguminosa. MATERIAL E MÉTODO O estudo foi conduzido no período de junho/ 2003 a maio/2005, no município de Montes Claros, Estado de Minas Gerais, Brasil, em três localidades (Vilage do Lago, Lagoinha e Área Experimental de Formação Agroecológica). A região está incluída na transição dos domínios do Cerrado e da Caatinga, apresentando características fitofisionômicas de Cerrado Ralo (Vilage do Lago), Cerrado Denso (Lagoinha) e Cerrado Típico (AEFA - Área Experimental de Formação Agroecológica) (Ribeiro & Walter, 1998). O clima da região, de acordo com a classificação de Köpen, é o Aw, típico do semi-árido, com estações bem definidas, onde a temperatura média anual é de cerca de 23ºC e a precipitação média é de aproximadamente 1.000 mm ano-1, com chuvas concentradas nos meses de novembro a janeiro. Os dados climáticos para o período de maio/ 2003 a maio/2005 foram obtidos junto ao 5o DISME/ INMET (Distrito de Meteorologia/Instituto Nacional de Meteorologia - Estação Climatológica de Montes Claros/MG). Para coleta dos dados fenológicos utilizouse o método das transecções, (Bencke & Morellato, 2002a), com indivíduos marcados ao acaso, limitando a inclusão de indivíduos na amostra pela circunferência à altura do peito (CAP > 10 cm) (Bencke & Morellato, 2002b), sendo que, em cada localidade, foram avaliadas dez plantas. Na avaliação dos indivíduos selecionados adotou-se o método sugerido por Fournier (1974). Os indivíduos foram observados mensalmente, avaliando-se as seguintes fenofases: 1- queda de folhas: registrada sempre que as folhas (foliólulos) das árvores caíam com facilidade ao ventar, quando havia muitas folhas, da própria árvore, caídas sob a copa ou quando se observava a presença de espaços vazios atípicos na copa da planta; 2- brotamento: tendo início a partir do aparecimento de pequenas folhas com coloração avermelhada, sendo finalizada quando as plantas apresentavam mesofilo desenvolvido com coloração verde claro; 3- folhas novas: considerada a partir do final do brotamento até as folhas atingirem tamanho e cor (verde escura) características das folhas maduras; 4- folhas maduras: folhas completamente desenvolvidas e com coloração verde escura; 5- floração: quando do surgimento dos botões florais e antese até a queda de todas as flores; 6- frutos novos: início com a presença de pequenos frutos, pouco desenvolvidos e de coloração ainda verde claro, sendo finalizada quando estes apresentavam-se desenvolvidos, com coloração verde escura; 7- frutos maduros: quando os frutos apresentavam as primeiras manchas amareladas até adquirir coloração marrom e estarem secos; 8dispersão: início quando os frutos estavam secos e em queda da planta, havendo frutos espalhadas ao redor da copa até a completa queda dos frutos da árvore. Para relacionar os fatores abióticos (precipitação, temperatura, umidade relativa, radiância e fotoperíodo) com as fenofases (queda de folhas, brotação, folhas novas, folhas maduras, floração, frutos novos, frutos maduros e dispersão) utilizou-se Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 20 a correlação de Spearman (rs) que é recomendada para dados que não apresentam distribuição normal (Zar, 1999). Para verificar a sincronia das diferentes fenofases dentro e entre populações foi utilizado o Índice de Sincronia (Z) adaptado de Augspurger (1983), que foi definido como: onde, Xi = sincronia do indivíduo i com seus co-específicos; n = número de indivíduos na população. Calculou-se Xi através da seguinte expressão: onde, e j = número de registros nos quais ambos os indivíduos i e j estão na mesma fase, j = i fi = número de registros nos quais o indivíduo i está na fenofase considerada. Quando Z = 1 ocorre a sincronia é perfeita, isto é, todos os indivíduos da população apresentamse simultaneamente na mesma fase fenológica. Quando Z = 0 não ocorre nenhuma sincronia entre os indivíduos da população. Calculou-se o percentual de atividade das fenofases através do número de indivíduos que estavam na fenofase determinada em relação à amostra de todas as populações. Conforme dados obtidos junto ao 5o DISME/ INMET, durante o período de observações fenológicas a temperatura máxima foi 37,8ºC, ocorrendo nos meses de setembro e outubro; enquanto a mínima foi registrada no mês de julho, com valor de 8,5ºC. A temperatura média do período foi de 23ºC. A precipitação foi concentrada nos meses de dezembro a março, totalizando o equivalente a 84% do total anual (Tabela 1). RESULTADO A fenofase queda de folhas apresentou-se altamente sincronizada dentro e entre as populações avaliadas (Tabela 2), com valores que variaram entre 0,92 (menor valor) e 0,97 (maior valor). Percebe-se que o padrão de desfolhamento da fava-d’anta não variou durante o período de avaliação, concentrando maior percentual de atividade nos meses de julho e TABELA 1. Dados meteorológicos do período de estudos no município de Montes Claros, MG. Fonte: 5o DISME/INMET. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 21 agosto (Tabela 3), período de maior déficit hídrico, e menor temperatura do ar (Figura 1A). Ocorre, simultaneamente, a dispersão dos frutos e sementes da planta (Figura 1B). A queda de folhas apresentou correlação negativa com a média da temperatura mínima registrada (rs=-0,83; p<0,05), com a precipitação (rs=-0,81; P<0,05), com a umidade relativa (rs=-0,46; p<0,05) e com o fotoperíodo (rs=-0,75; p<0,05). Ao mesmo tempo apresentou correlação positiva com a irradiância (rs=0,49; p<0,05). Quanto às outras fenofases, correlacionou-se negativamente com folhas (rs=-0,59; p<0,05) e frutos novos (rs=-0,74; p<0,05) e positivamente com a dispersão (rs=0,42; p<0,05). TABELA 2. Sincronia das Fenofases em Dimorphandra mollis Benth. em três populações no Norte de Minas Gerais. Percentual de atividade baseado em dados mensais no período de maio de 2003 a abril de 2005. VIL - Vilage do Lago AEFA - Área de Experimentação e Formação Agroecológica LAG - Lagoinha TABELA 3. Percentual de atividade das fenofases da Dimorphandra mollis Benth. na região norte do Estado Minas Gerais durante o período de maio/2003 a abril/2005. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 22 Queda de folhas Precipitação (mm) Percentual de atividade de Queda de folhas (%) Precipitação Dispersão Percentual de atividade de Dispersão (%) Percentual de atividade de Queda de folhas (%) Queda de folhas FIGURA 1. Percentual de atividade da fenofase queda de folhas com relação à precipitação (A) e à dispersão (B). Os pontos representam a média das três populações estudadas. A fenofase brotamento ocorreu com maior intensidade nos meses de agosto e setembro, sucedendo o período de desfolha (Tabela 2) e apresentando elevada sincronia dentro e entre as populações. Apesar de não estar correlacionada significativamente com a precipitação, a brotação ocorreu sempre em períodos de estresse hídrico, antecedendo o início da precipitação, a partir de outubro de 2003 e novembro de 2004 (Tabela 1 e Tabela 3), ou seja, um mês após o pico de maior percentual de atividade desta fenofase. Além disto, houve uma correlação significativa somente com a temperatura máxima (rs=0,50; p<0,05) e com a umidade relativa (rs=-0,43; p<0,05), indicando que o aumento na temperatura, concomitante com uma maior amplitude térmica (Tabela 1), podem influenciar positivamente a ocorrência desta fenofase. Verificou-se que a brotação possui correlação positiva com a floração (rs=0,45; p<0,05) e negativa com frutos novos (rs=-0,53; p<0,05), folhas (rs=-0,59; p<0,05) e frutos maduros (rs=-0,39; p<0,05). Após a emissão dos brotos, a fenofase de folhas novas teve pico de atividade, alcançando percentuais de até 94,0% e 99,0% nos meses de outubro e novembro, respectivamente (Tabela 3), no entanto, para o ano de 2003, esta fenofase alongouse com atividade elevada até o mês de dezembro. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 23 Floração Precipitação Fotoperíodo Floração Fotoperíodo Percentual de atividade de Floração (%) Precipitação (mm) Percentual de atividade (%) Brotação FIGURA 2. Percentual de atividade das fenofases floração e brotação com relação à precipitação (A) e da floração com o fotoperíodo (B). Os pontos representam a média das três populações estudadas. Produção de folhas novas estiveram correlacionadas com o aumento da temperatura máxima (rs=0,59; p<0,05), com a precipitação (rs=0,36; p<0,05) e com o fotoperíodo (rs=0,68; p<0,05), estando, portanto, associada ao início do período de chuvas e ao aumento do fotoperíodo na região. Produção de folhas novas foi sucedida pelas folhas maduras, que se apresentou com maior percentual de atividade de dezembro a junho, chegando a alcançar percentuais iguais a 100% (Tabela 3). Esta fenofase esteve correlacionada positivamente com a precipitação (rs=0,36; p<0,05) e umidade relativa do ar (rs=0,74; p<0,05); no entanto, apresentou correlação negativa com a temperatura máxima (rs=-0,62; p<0,05) e irradiância (rs=-0,48; p<0,05). Durante este período a temperatura máxima esteve em queda, aumentando a partir de julho, quando esta fenofase teve queda no percentual de atividade. Todavia, é neste período que ocorre a maior intensidade pluviométrica, principalmente entre janeiro e março, possibilitando maior expansão foliar, sendo este período sucedido pelo amadurecimento dos frutos. As fenofases brotamento e floração estiveram correlacionadas positivamente entre si, com ocorrência em agosto/setembro e setembro/ novembro, respectivamente, não sendo influenciadas por fatores como a precipitação (Figura 2A), apesar de acontecerem em períodos anteriores a ela. A floração ocorreu de setembro a novembro, com pico no mês de outubro, alcançando percentual de atividade igual a 70,0% como média para as três populações estudadas (Tabela 3). Para a população localizada na AEFA o percentual alcançado foi o mais alto, esta população teve floração mais sincronizada que a localizada no Vilage, a qual apresentou um percentual mais baixo dentre as populações observadas. A fenofase floração correlacionou-se positivamente com a temperatura máxima (rs=0,82; Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 24 Floração Precipitação Fotoperíodo Floração Fotoperíodo Percentual de atividade de Floração (%) Precipitação (mm) Percentual de Atividades (%) Brotação FIGURA 3. Percentual de atividade e interação existente entre as fenofases frutos maduros e dispersão com precipitação (A) e fotoperíodo (B). Os pontos representam a média das três populações estudadas. p<0,05), com a radiância (rs=0,40; p<0,05) e fotoperíodo (rs=0,43; p<0,05); estando também correlacionada, negativamente, com a umidade relativa do ar (rs=-0,58; p<0,05). Verificou-se que, com o aumento do fotoperíodo, a floração foi desencadeada (Figura 2B), pois, nos meses de maior atividade desta fenofase, a temperatura, o fotoperíodo e a irradiância apresentam-se em elevação, onde no mês de setembro a média da temperatura máxima maior do ano (Tabela 1). A presença de frutos novos foi constatada a partir de novembro até março (Tabela 2), ocorre maior percentual de atividade desta fenofase em janeiro, quando alcançou o valor de 80,0% em 2004. Quanto à sincronia de frutificação, as populações apresentaram sincronia mediana tanto dentro, como entre as populações (Tabela 2). Observou-se correlação positiva desta fenofase com a temperatura mínima (rs=0,71; p<0,05), precipitação (rs=0,78; p<0,05), umidade relativa (rs=0,69; p<0,05) e fotoperíodo (rs=0,61; p<0,05); enquanto que, para a radiância, a correlação foi negativa (rs=-0,48; p<0,05). Este período é marcado por menor oscilação térmica, quando a média da temperatura mínima é a mais alta durante o ano, a umidade relativa do ar, concomitante com a precipitação, encontra-se em alta, a radiância Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 25 está em queda e o fotoperíodo em elevação. A fenofase de frutos maduros foi marcada pela baixa sincronia dentro das populações e entre as populações (Tabela 2). O percentual de atividade observado foi mais alto de maio e junho (Tabela 3). Esta fenofase é marcada pelo início da queda na temperatura, havendo, portanto, correlação negativa com a temperatura máxima (-0,41; p<0,05). Além disto, percebe-se queda no fotoperíodo indicando o início da estação seca e da dispersão dos frutos e sementes. Apesar da fenofase de frutos maduros apresentar-se não sincronizada, a dispersão foi marcada pela sincronia tanto dentro, quanto entre as populações (Tabela 2). O seu percentual de atividade variou durante o período de observação, tendo maior atividade em maio de 2003, julho de 2004 e março de 2005 (Tabela 3). Esta fenofase apresentou correlação negativa com a precipitação (-0,43; p<0,05) e o fotoperíodo (-0,57; p<0,05), conforme observado nas Figuras 3A e 3B, indicando que a maturação dos frutos e posterior dispersão das sementes podem ser Dispersão Precipitação Precipitação (mm) Percentual de atividade (%) Frutos maduros Dispersão Fotoperíodo Fotoperíodo Percentual de atividade (%) Frutos maduros FIGURA 4. (A) Bienalidade de dispersão de frutos por fava-d’anta conforme percentual de atividade desta fenofase e, (B) Ponto de colheita dos frutos de fava-d’anta conforme período de maturação. Os pontos representam a média das três populações estudadas. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 26 favorecidas pelo período seco que se aproxima. Percebeu-se, durante o início do período de estudos (maio/03) que a fava-d’anta teve alto percentual de atividade para a dispersão dos frutos que, no entanto, no ano posterior foi muito baixo, aumentando novamente em 2005 (Figura 4A). Conforme Figura 4B, os frutos de fava-d’anta apresentam-se em transição entre novos e maduros durante os meses de abril e maio. DISCUSSÃO De modo geral, os resultados observados nesse estudo indicam que a fava-d’anta apresenta uma sincronia fenológica com as variáveis climáticas, onde os fatores abióticos tais como a intensidade da radiação solar, o comprimento do dia e a alternância entre períodos secos e úmidos foram determinantes no desencadeamento das fenofases. Segundo Monasterio & Sarmiento (1976), este comportamento é esperado para muitas espécies vegetais. Os eventos de senescência e queda foliar provavelmente encontram-se relacionados com o início da estação seca, quando ocorre um aumento da evapotranspiração, induzindo a maior retirada de nutrientes do solo pelas raízes. Morellato (1992) afirma que, ao término dessa estação, com o ar muito seco e a diminuição da quantidade de água no solo, a absorção de nutrientes é dificultada e a maioria das espécies perde suas folhas, diminuindo a evapotranspiração. Deste modo, a perda de folhas no período seco constitui um fator de economia hídrica para as plantas, e os baixos índices de umidade estimulam a abscisão foliar (Borchert et al., 2002). A fava-d’anta apresentou padrão fenológico similar aos citados, havendo alto percentual de atividade e sincronia desta fenofase neste período nas populações estudadas. Observou-se que o maior percentual de atividade foi obtido no mês de julho de 2004, quando a temperatura média foi a menor no período de avaliação, e a umidade no solo foi provavelmente baixa devido ao período de baixa precipitação, que tanto antecede quando sucede este mês. Este resultado está de acordo com os autores Ribeiro & Walter (1998), que mostraram acontecer no Cerrado Sentido Restrito a caducifolia no período seco (maio a agosto). Como a floração coincidiu com o início das chuvas, ainda esparsas e de baixa intensidade na região, encerrando quando a precipitação aumentou, esta fenofase pode ser caracterizada como retardada, pois deslocou a reprodução para o final da estação seca. Este comportamento é semelhante ao de plantas anuais, as quais acumulam recursos durante o crescimento e posteriormente os deslocam para a reprodução (Rathcke & Lacey, 1985). Segundo estes autores, este atraso em plantas perenes poderia permitir o ajustamento do esforço reprodutivo em função dos recursos acumulados na estação de crescimento anterior, evitando que os riscos de condições adversas de crescimento inviabilizem o investimento já iniciado no período de floração e frutificação. Os resultados de floração estiveram de acordo com o relatado por Morellato (1992), onde o aumento da temperatura, da precipitação e do comprimento do dia pode influenciar as espécies que têm pico de floração no período de transição entre as estações seca e úmida. Para Jackson (1978), o pico de floração na época de transição permite que haja pico de frutificação na estação úmida, favorecendo a germinação e o estabelecimento das plântulas. Além disto, esse comportamento provavelmente encontrase associado à maior proteção aos órgãos reprodutivos e aumento da eficiência dos polinizadores, uma vez que chuvas intensas, que se concentram nos meses de dezembro a fevereiro, podem danificar as peças florais e dificultar a ação dos polinizadores, afetando a produção de sementes pelas plantas (Jackson, 1978; Pedroni et al., 2002). Segundo Ferri (1977), em áreas de Cerrado, onde existe uma estação seca e uma estação chuvosa bem definida é comum ocorrer floração durante a seca e a abertura dos frutos coincidirem com as primeiras chuvas, como no caso das plantas do gênero Dalbergia, Stryphnodendron, Qualea, Kielmeyera e Dimorphandra (Barros & Caldas, 1980). Entretanto, neste trabalho, a D. mollis apresentouse com frutos maduros e dispersão no período seco de 2003 (até julho); em 2004 estes eventos ocorreram logo após o término das chuvas, com a dispersão durante período seco, enquanto em 2005 a dispersão ocorreu no final do período chuvoso. Este fenômeno, segundo NG (1966), pode ser advindo de modificações nas condições ambientais, alterando padrões reprodutivos esperados, pois espécies sucessionais tardias, por exemplo, podem florescer ou frutificar precocemente se ocorrerem em locais perturbados. Assim, estes eventos fenológicos parecem estar mais associados a fatores intrínsecos da planta ou a outros fatores ambientais mais reversíveis, como o fotoperíodo (Almeida & Alves, 2000), o qual apresentou correlação negativa tanto com a presença de frutos maduros quanto com a dispersão. Este comportamento fenológico, segundo Fagundes & Gonçalves (2005), tem amplos efeitos na comunidade de polinizadores e herbívoros, resultando em associações íntimas entre os herbívoros e seus hospedeiros. A frutificação da fava-d’anta estende-se por um longo período e encontra-se fortemente relacionada aos fatores ambientais, apresentando alta correlação com a precipitação. Felfili et al. (1999) afirmam que em ambientes marcados pela sazonalidade climática, Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.18-28, 2008. 27 a frutificação no período anterior as chuvas permite a dispersão das sementes no período seco e a germinação e o estabelecimento das plântulas no início da estação úmida. Apesar de a frutificação da fava-d’anta ocorrer durante o período chuvoso, a maturação dos frutos e, conseqüentemente, a dispersão das sementes, dá-se durante o período das secas (Figura 3A). Além disso, segundo Chaves & Usberti (2003), as sementes de fava-d’anta apresentam uma relação inversa entre o grau de umidade e a longevidade, possuindo, estas sementes, comportamento ortodoxo em relação ao armazenamento; esta dormência faz com que as sementes possam germinar no início da estação chuvosa seguinte, como sugerido por Garwood (1983) em estudos nas florestas da Costa Rica. Os valores elevados de variação anual no percentual da dispersão dos frutos podem indicar que a fava-d’anta tem uma tendência à bienalidade na produção de frutos; sendo este comportamento comprovado por Caldeira Júnior et al. (2006), que também observaram bienalidade na produção de frutos nesta espécie em cinco populações no norte do Estado Minas Gerais. Rena et al. (1998) relatam a ocorrência de depauperamento do cafeeiro quando a cultura apresentou frutificação acima da capacidade de suporte da planta, o que levou à morte de raízes, seca de ponteiros e bienalidade de produção. A determinação do ponto de colheita dos frutos segundo o teor de flavonóides é muito importante, haja vista serem estes os princípios ativos explorados comercialmente. Macedo et al. (2004) afirmam que os frutos de fava-d’anta apresentam maior teor de flavonóides totais quando colhidos com a coloração verde-escura. Esta coloração é produzida quando o fruto encontra-se totalmente desenvolvido, passando, logo em seguida, para a fase de maturação; ou seja, o ponto ideal de coleta dos frutos para a indústria encontra-se pouco antes da fenofase frutos maduros; estando, este período, compreendido entre os meses de abril e maio, pois a partir desta época é reduzido o percentual de atividade para frutos novos e verificase o início ou aparecimento de frutos maduros. CONCLUSÃO O comportamento fenológico da fava-d’anta encontra-se fortemente atrelado às condições climáticas, o que pode estar associado às limitações impostas pelo clima do semi-árido. A alta sincronia populacional é uma característica que facilita ao manejo da espécie. Durante os meses de abril e maio, seus frutos estão no período de coleta desejado para a indústria farmacêutica e; esta espécie mostra tendência ao comportamento de bienalidade de produção de frutos. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ALENCAR, J.C. Fenologia de cinco espécies arbóreas tropicais de Sapotaceae, correlacionada a variáveis climáticas na Reserva Ducke, Manaus, AM. Acta Amazônica, v.24, n.3/4, p.161-82, 1994. ALMEIDA, E.M.; ALVES, M.A.S. Fenologia de Psychotria nuda e P. brasiliensis (Rubiaceae) em uma área de floresta atlântica no sudeste do Brasil. Acta Botanica Brasilica, v.14, n.3, p.335-46, 2000. AUGSPURGER, C.K. Phenology, flowering synchrony and fruit set of six neotropical shrubs. 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