E2 ET 11. DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

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DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM: argumentos e teorias acerca de um mesmo problema.
Leandro Alves de Souza1
Resumo: Este trabalho tem por objetivo discorrer acerca das dificuldades de aprendizagem
encontradas nos alunos pertencentes às escolas públicas ou privadas, seja do Ensino
Fundamental ou Médio, sob a ótica de três distintos especialistas da área educacional, a saber:
Clenice Griffo, Leonore M. T. Derville e Marcus Vinícius da Cunha. Buscaremos analisar como
esta abordagem é apresentada e discutida pelos mesmos, bem como dialogar e expor as idéias na
medida em que estas forem se contrapondo. Perceberemos, também, como cada profissional ao
abordar um mesmo tema vai, concomitantemente, de e ao encontro, um do outro, nos
argumentos apresentados, através de teorias, pesquisas e estudos desenvolvidos ao longo de suas
dissertações. Porém, como perceberemos também, todos independente da abordagem escolhida,
visa encontrar meios que possibilitem entendermos as dificuldades de aprendizagem, bem como
apresentar alternativas que possam amenizar os problemas, destacando, fundamentalmente, a
atuação dos principais personagens envolvidos, a saber: escolas, professores e alunos.
Palavras-chave: Aprendizagem; Educação; Ensino; Escolas; Didática.
Ao analisarmos as propostas apresentadas pelos autores acima mencionados é possível
discorrermos sobre o tema em questão, isto é, as dificuldades de aprendizagem, sob os mais
diversos aspectos. Na perspectiva de Griffo, o relevante tema é abordado em diversas teorias,
enfoques e formas principalmente levando-se em conta a linguagem escrita, a partir do momento
em que esta passa a ser a razão encontrada para se explicar as dificuldades de aprendizagem
apresentadas por alunos das distintas modalidades de ensino.
A autora discute as dificuldades de aprendizagem dos alunos, apresentando teses
referentes ao fracasso escolar no processo de alfabetização, especificamente, no Brasil, dentre
elas, a de que tal fracasso não se restringe à todas as classes sociais, mas, em grande parte, aos
alunos oriundos das camadas menos abastadas da sociedade brasileira.
Sobre a hipótese de que a carência cultural e lingüística destes alunos são,
concomitantemente, sinônimos de um precário desenvolvimento intelectual e, por fim, a teoria
de que o comprometimento e dificuldade do aprendizado estão intrinsecamente relacionados a
1
Mestrando em Educação Tecnológica pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Bacharel e
Licenciado em História pelo Centro Universitário Newton Paiva.
causas médicas - muito embora estas vertentes não possuam embasamentos empíricos - Griffo
nos apresenta uma abordagem crítica acerca destas dificuldades que, indubitavelmente,
comprometem o processo de aprendizagem e, como veremos, fundamenta-se em estudos
desenvolvidos por diferentes profissionais, das mais diversas áreas, a saber: psicologia,
pedagogia, reeducação pedagógica e sócio-linguística.
O estudo Dificuldades de Aprendizagem (1970-1990): Análise Quantitativa da Produção
Acadêmica e Cientifica pertencente ao projeto Alfabetização no Brasil, 1950-1990: Análise
Integrativa de Estudos Empíricos e Teóricos constituído a partir do levantamento e
categorização do conhecimento sobre a alfabetização existente no Brasil dos anos cinqüenta foi
desenvolvido no início da década de noventa pela Faculdade de Educação da UFMG Universidade Federal de Minas Gerais e confirmou que grande parte dos estudiosos que, de certa
forma, discorreram sobre o tema, atribuem aos alunos e ao meio ao qual pertencem, as possíveis
causas que justificam seu fracasso na escola, ou seja, desta forma podemos concluir
erroneamente e precipitadamente que a idéia do fracasso escolar é de responsabilidade exclusiva
dos alunos, visto que a escola, seu projeto pedagógico, e o professor, com sua didática, se
eximem desta responsabilidade.
Decorrente da narrativa da autora, algumas teorias tentam, ao seu modo, explicar e
apresentar argumentos na tentativa de compreender e buscar razões que possam justificar as
dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos diante das metodologias presentes nas
escolas. Definem-se, então, quatro abordagens teóricas: Concepção Organicista; Concepção
Instrumental ou Cognitivista; Concepção dos Transtornos Afetivos da Personalidade; e
Concepção do Handicap Sócio-cultural.
A concepção organicista, de acordo com Griffo é a que classifica o aluno como disléxico
ou, muitas vezes, como deficiente mental, atribuindo-lhe um certo distúrbio psicomotor sendo
este, um distúrbio de aprendizagem, relacionado com o fracasso escolar, bem como à fatores
neurológicos ou de caráter hereditário. Neste momento, o que se percebe na concepção
apresentada pela autora é o fato de que os problemas de aprendizagem são provenientes de
enfermidades infantis, ocasionadas muitas vezes, por dificuldades no parto ou nos nascimentos
prematuros. Desta forma, pode-se dizer que a concepção organicista, no que se refere ao
processo de aprendizagem, tanto da leitura quanto da escrita, é na verdade a ação conjunta
envolvendo as habilidades psicomotoras.
Contudo, é sabido que o aluno classificado ou denominado como lento, apresentando
dificuldades de memorização, pouca habilidade ao se expressar nas diversas e distintas situações
do cotidiano ou especificamente na escola, seja em seminários, palestras, atividades coletivas ou
apresentações de trabalhos em grupo, aproxima-se da teoria instrumental ou cognitivista, visto
que suas dificuldades de aprendizagem e de assimilação do conteúdo ministrado é deficiente no
que se refere a fatores psicológicos como: percepção, memória, pensamento e linguagem.
Para alguns teóricos, o fracasso escolar é decorrente de uma, duas ou até mesmo mais
perturbações psicológicas relacionadas a tais fatores. Desta forma, como nos relata a autora,
imprecisões de caráter perceptivo como a audição, visão, fatores motores, ou transtornos de
linguagem corroboram com o comprometimento do processo de aprendizagem.
Em relação aos transtornos afetivos da personalidade, terceira abordagem apresentada
pela autora, pode-se dizer que esta se aplica aos alunos que, tantas vezes, apresentam alguns
desvios de conduta decorrentes de possíveis conflitos e agressões familiares, afastando-se dos
aspectos físicos e outros mencionados nas duas primeiras abordagens teóricas.
Por fim, a última teoria a ser apresentada, a concepção do handicap sócio-cultural,
surgida a partir dos anos sessenta, diz que os alunos que apresentam dificuldades no processo de
aprendizagem são, de certo modo, carentes de intelectualidade pelo fato de pertencerem, em sua
maioria, às classes pobres e marginalizadas da sociedade. Estas, vistas como geradoras de alunos
problemáticos, ou seja, atribui-se aos aspectos sócio-culturais as dificuldades de aprendizagem
dos alunos.
Ao discorrermos acerca dos argumentos apresentados por L. Derville podemos perceber
que a autora, ao argumentar sobre as dificuldades de aprendizagem, recorre à psicologia na
tentativa de encontrar meios que possibilitem facilitar a prática do ensino e da aprendizagem.
Derville, em sua obra, enfatiza a importância de haver entre o professor e o aluno uma troca
mútua de conhecimento como forma de facilitar o processo de aprendizagem.
Aproxima-se, portanto, da abordagem piagetiana ao afirmar que o conhecimento é
resultado da interação entre as partes envolvidas, ou seja, mestres, docentes e alunos, afastandose da abordagem gestaltista que afirma que o conhecimento é fruto apenas da ação do sujeito,
bem como da abordagem behaviorista quando esta afirma ser o conhecimento oriundo da ação
do objeto.
Há na obra de Derville métodos a serem adotados pelas escolas e pelos professores que,
de certa forma, tendem a facilitar o processo de aprendizagem dos alunos. Um deles está
relacionando ao fato de se trabalhar o conteúdo didático passo a passo sendo este método
facilitador do processo de aprendizagem e despertador do interesse do aluno pela disciplina em
questão:
Se queremos que nossos alunos desenvolvam atitudes simpáticas ao que ensinamos,
devemos inicialmente ter o cuidado de tornar o trabalho fácil nos primeiros
momentos, a fim de que eles associem ao êxito suas primeiras tentativas de aprender a
matéria (DERVILLE, 1969, p. 29).
Cabe, portanto, ao professor, desenvolver métodos que busquem prender a atenção de
seus alunos. Os docentes devem promover junto a seus alunos, relações de cordialidade, afeição,
simpatia, dentre outras habilidades, de modo que estes não tenham seu processo de
aprendizagem comprometido pelos simples fato de não se sentirem motivados ou interessados
pela matéria, seja esta qual for, justamente por não se sentirem estimulados com tal atividade.
Freire e Shor corroboram com a importância desta interação entre professores e alunos,
bem como sobre as conseqüências decorrentes da ausência desta aproximação tão necessária
para se facilitar o processo de aprendizagem:
(...) a questão da linguagem, isto é, o idioma com o qual o professor fala para seus
alunos...as diferenças entre sua linguagem e a linguagem dos alunos... seriam um
obstáculo ao diálogo. (...) o abismo entre a linguagem de alunos...e a de seu professor
é grande.(FREIRE & SHOR, 1987, p. 171).
Acerca das dificuldades de aprendizagem, a autora não descarta a hipótese de que a falta
de prática em relação àquilo que aprendemos, interfere no processo de aprendizagem, ou seja, há
na argumentação de Derville aquilo que chama de ausência de Transferência de Conhecimento.
O emprego do termo em questão dá-se quando se adquire determinado conhecimento ou
habilidade em determinado assunto. Estes são aplicados em outros assuntos e situações diversas.
Por exemplo, um aluno que tenha aulas de matemática, geografia, história, filosofia, educação
artística ou qualquer outra disciplina, mas, que em momento algum seja informado ou despertado
para a importância de se aplicar o conteúdo visto no seu dia-a-dia, evidentemente, não
concentrará suas atenções ao que lhe tentam ensinar. Para ele, o conteúdo será considerado inútil
ou, até mesmo, visto como uma grande perda de tempo.
Neste caso, novamente cabe ao professor, na visão da autora, a função de incentivar e
orientar seu aluno a aplicar este conhecimento adquirido nas atividades do cotidiano. Derville,
em sua obra, exemplifica:
Quando lhe perguntaram por que não gostava de geografia, um menino respondeu:
“Porque não me serve de nada. A geografia é útil a turistas, mas eu não sou turista,
e acho que é perda de tempo estudá-la. (...) O valor do aprendizado de uma matéria
depende não apenas do conhecimento que adquirimos, mas do uso que fazemos
desse conhecimento. Para que nos beneficiemos dos assuntos que aprendemos é
preciso aplicar corretamente nosso conhecimento. (DERVILLE, 1969, p. 75).
Apontando métodos considerados por ela eficientes para se obter êxito no processo de
aprendizagem, Derville levanta relevantes sugestões tais como: possibilitar aos alunos,
resolverem problemas propostos pelos professores adequando-se à sua maturidade, bem como
sua própria experiência de vida; permitir que os alunos formem conceitos e conclusões próprias
acerca de determinado assunto; evitar que haja excesso no conteúdo exposto pelo professor, visto
que tamanha quantidade de informações, num único momento, ao invés de despertar o interesse
do aluno, evidentemente, surtirá efeito contrário, ou seja, o levará ao desinteresse e,
concomitantemente, à preguiça.
Porém, na narrativa da autora, faz-se presente a tese de que em alguns casos, os alunos
podem apresentar problemas que, de certa forma, retardam e prejudicam seu aprendizado, tais
como: alunos portadores de determinada doença grave, que por razões de sua enfermidade, pode
faltar muitas vezes de aula e, quando do seu retorno, sente-se desmotivada, por não estar no
mesmo ritmo de sua turma; alunos portadores de alguma deficiência física, principalmente, na
visão da autora, deficiências relacionadas à audição, à visão e à fala, sendo esta última
deficiência não considerada fator real de atraso, mas de certo modo, contribui para tal
principalmente se associada a fatores de caráter emocional envolvendo os alunos.
Exemplificando, Derville diz:
A criança míope sentirá dificuldade em enxergar o que está escrito no quadro-negro;
(...) Terão dificuldade de ler ou fazer trabalhos delicados, e por isso costumam ter dor
de cabeça ou cansaço. (...) As crianças de má audição perdem muita informação (...) e
costumam ser muito vagarosas no aprendizado (...) A criança com defeito na fala
encontra dificuldade em exprimir-se e fazer-se entendida. Isso (...) não constitui
necessariamente fator de atraso. (...) Em casos como esses, o atraso da criança
costuma depender (...) dos distúrbios emocionais, do que da dificuldade de falar.
(DERVILLE, 1969, p. 151).
Contudo, podemos perceber na fala da autora, que embora muitas vezes caiba ao
professor encontrar meios que favoreçam e possibilitem o desenvolvimento do processo de
aprendizagem, em casos específicos cabe ao aluno corroborar com tal processo, mas,
indubitavelmente, a responsabilidade para êxito e progresso desta tarefa esta na metodologia
adotada pelas escolas e pelos professores.
O terceiro autor a ser discutido, Marcus Vinícius da Cunha, aborda as dificuldades, a
exemplo de Derville, a partir de elementos da psicologia e da psicanálise. Para este autor o
professor deve, primeiramente, ser orientado psicanaliticamente, no sentido de obter subsídios
que favoreçam suas observações acerca das atitudes apresentadas por seus alunos, bem como
suas próprias ações neste contexto.
O mestre que age desta forma, na visão do autor, está bem mais gabaritado para ministrar
uma boa aula, no sentido de favorecer o processo de aprendizagem. Cabe ao professor, que
adotar este método, possibilitar a seus alunos a oportunidade de se expressarem melhor dentro da
sala de aula, bem como possibilitar a interação do grupo e, de certo modo, contribuir para que
não somente o aprendizado da disciplina em questão seja desenvolvido, mas, também, o
desenvolvimento humano do aluno como pessoa. Cunha exemplifica:
Ao mostrar que os fenômenos da sala de aula são muito mais humanos do que
técnicos, o paradigma psicanalítico abre um caminho diferente e frutífero para os
professores, o caminho da vivencia humanizadora, da compreensão do outro, da busca
de outras relações com o indivíduo consigo mesmo e com os que o cercam. Menos
ênfase no método mais preocupação com a pessoa. (CUNHA, 2003, p. 18).
Ainda discorrendo sobre a metodologia adotada pelos professores no processo de
aprendizagem, o autor admite que os docentes, de forma geral, adotam o método do
comportamentalismo, ou seja, o conhecimento é estabelecido naquilo que determinado ambiente
fornece, principalmente através do desenvolvimento dos estímulos.
Neste contexto, cabe ao professor, na narrativa do autor, apenas reforçar o conhecimento
adquirido pelo aluno sem, necessariamente, este último, ter tido uma interferência externa, por
parte do professor. Por exemplo, o aluno estudaria sozinho determinado conteúdo didático,
praticamente no seu próprio ritmo de aprendizagem e, posteriormente, receberia da escola apenas
estímulos reforçadores para a fixação do conteúdo estudado.
Contudo, Cunha explicita suas idéias acerca do processo de aprendizagem, aproximandose da psicologia no sentido de buscar em determinados experimentos, uma alternativa que, de
certa forma, garanta êxito no desenvolvimento intelectual dos alunos, mas, principalmente,
enfatizando e propondo mudanças na metodologia desenvolvida pelas instituições de ensino,
cujo objeto principal do processo de aprendizagem, ou seja, os alunos, possam se preocupar
menos com conceitos técnicos e específicos de cada disciplina e se aproximarem, por fim, dos
meios que venham possibilitar e garantir uma formação menos específica e mais abrangente.
Assim, percebemos após discorrermos sobre o tema em questão, as dificuldades de
aprendizagem enfrentadas pelos alunos de forma geral, sob a ótica de três especialistas distintos,
que buscam analisar como esta abordagem pode ser ampla e complexa sob os mais variados
aspectos.
Apresentam-na, de modo a expor suas idéias e convicções mesmo que para isso seja
necessário ir de encontro ao argumento um do outro. Porém, é de suma importância ressaltar que
todos, independente da maneira como lidam com o tema, seja pelas contribuições dispensadas,
conselhos e sugestões, contribuem, fornecendo elementos, com o intuito de promover e facilitar
o processo de aprendizagem e amenizar, assim, as dificuldades que porventura possam surgir.
Contudo, embora não tenha sido incluída nesta discussão, a psicóloga Sara Paín, dispensa
sua relevante contribuição acerca do tema discutido até então, ora corroborando com os autores
propostos, ora apresentando argumentos próprios:
Consideramos perturbações na aprendizagem aquelas que atentam contra a
normalidade deste processo, qualquer que seja o nível cognitivo do sujeito. Desta
forma, embora seja freqüente uma criança de baixo nível intelectual apresentar
dificuldades para aprender, apenas consideramos problemas de aprendizagem aqueles
que não dependam daquele déficit. Isto quer dizer que os problemas de aprendizagem
são aqueles que se superpõem ao baixo nível intelectual, não permitindo ao sujeito
aproveitar as suas possibilidades. (PAIN, 1992, p. 13)
Enfim, reforça-se neste, a idéia de que cada qual ao seu modo procura encontrar
alternativas que busquem facilitar o complexo e amplo processo de aprendizagem.
Referências Bibliográficas:
CUNHA, Marcus Vinícius. Psicologia da Educação. Rio de Janeiro: DP&A
Editora, 2003.
DERVILLE, Leonore M. T. Psicologia Prática no Ensino. São Paulo: IBRASA
Editora, 1969.
FREIRE, Paulo & SHOR, Ira. Medo e Ousadia: o Cotidiano do Professor. Rio de
Janeiro: Editora Paz e Terra, 1987.
GRIFFO, Clenice. Dificuldades de Aprendizagem na Alfabetização do Aprendiz:
Perspectivas do Aprendiz. Cadernos do Professor, Belo Horizonte, n.1, 1996.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto
Alegre: ARTMED Editora S.A, 1992.
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