Trabalho de Pesquisa Trabalho científico aprovado em primeiro lugar no Congresso Medvep de Especialidades Veterinárias 2011, realizado de 27 a 30 de Julho de 2011, no ExpoUnimed, Curitiba - PR. Aspectos clínicos, epidemiológicos, hematológicos e sorológicos de animais diagnosticados com Ehrlichia canis no Hospital Veterinário de UberabaMG Clinical, epidemiological, haematological and sorological aspects of animals diagnosed with Ehrlichia canis in Veterinary Hospital of Uberaba-MG Paula Boeira Bassi – Med. Vet, Residente em Diagnóstico Laboratorial–Hospital Veterinário de Uberaba UNIUBE/FAZU/ABCZ. E-MAIL: paulabassi_vet@ hotmail.com Thais Kunikawa Moreira – Med. Vet, Residente em Diagnóstico Laboratorial – Hospital Veterinário de Uberaba UNIUBE/FAZU/ABCZ Camila Cristina da Silva – MedVet Hospital Veterinário de Uberaba UNIUBE/FAZU/ABCZ Eustáquio Resende Bittar – Dr. Prof Universidade de Uberaba UNIUBE/FAZU/ABCZ Joely Ferreira Figueiredo Bittar – Dra. Profa. Universidade de Uberaba UNIUBE/FAZU/ABCZ Bassi PB, Moreira TK, Silva CC, Bittar ER, Bittar JFF. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação; 2011; 9(31); 678-680. Resumo Objetivando traçar o perfil clínico e laboratorial para o diagnóstico da erliquiose canina, realizou-se um estudo retrospectivo entre o período de janeiro/2004 a dezembro/2010, no qual, dos 3158 cães suspeitos, 183 (5,8%) foram diagnosticados positivos para E.canis, pelo esfregaço sanguíneo ou sorologia. Verificou-se maior ocorrência em fêmeas (53,6%), faixa etária de seis meses a cinco anos (83,1%) e cães de raça definida (73,8%). As principais alterações clínicas foram anorexia (77,5%), apatia (45,3%), alterações oftálmicas (31,1%), diarréia (24,6%), êmese (13,6%) hematemese (12,6%), dor abdominal (12,6%), abdômen distendido (9,8%), perda de peso (9,8%), dificuldade de locomoção (5,5%), sangramento nasal e bucal (9,3%) e petéquias (2,7%). As principais alterações no hemograma foram anemia arregenerativa (60,1%), leucopenia (50,8%), desvio à esquerda regenerativo (65%), linfopenia (53,5%), monocitopenia (55,7%) e trombocitopenia (80,9%). O estudo permitiu verificar que há uma grande suspeita clínica da doença na região, porém poucos casos são confirmados, sendo importante realizar esfregaço sanguíneo ou sorologia para a melhor aplicação de condutas terapêuticas e profiláticas. Palavras-chave: Hemoparasitoses; Erliquiose monocítica canina; Rickettisiose Abstract In order to trace the clinical and laboratory profile for diagnosis of canine ehrlichiosis, it was performed a retrospective study in period between january/2004 and december/2010, which 3158 suspected dogs, 183 (5.8%) were diagnosed as positive for E. canis by blood smear or serology. There was more frequency in females (53.6%), aged six months to five years (83.1%) and breed dogs (73.8%). The main clinical findings were anorexia (77.5%), apathy (45.3%), ophthalmologic abnormalities (31.1%), diarrhea (24.6%), emesis (13.6%), haematemesis (12.6 %), abdominal pain (12.6%), abdominal distension (9.8%), weight loss (9.8%), difficulty in locomotion (5.5%), bleeding nose and mouth (9.3%) and petechiae (2,7%). The main changes in blood count were non-regenerative anemia (60.1%), leukopenia (50.8%), regenerative left shift (65%), lymphopenia (53.5%), monocytopenia (55.7%) and thrombocytopenia (80.9%). The study allowed verify that there is a high clinical suspicion of this disease in the 678 Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2011;9(31); 678-680. Aspectos clínicos, epidemiológicos, hematológicos e sorológicos de animais diagnosticados com Ehrlichia canis no Hospital Veterinário de Uberaba-MG region, but few cases are confirmed, being important to perform blood smears or serology for the best application or therapeutic and prophylactic conducts. Keywords: Hemoparasitoses; Canine monocytic ehrlichiosis, Rickettsiosis Introdução A erliquiose monocítica canina é causada pela Ehrlichia canis pertencente à família Rickettsiaceae (1). São microrganismos intracelulares obrigatórios (2), que ocorrem por todo o território brasileiro (3). É transmitida principalmente pelo carrapato Rhipicephalus sanguine use também por transfusões sanguíneas (1).Clinicamente, a erliquiose manifesta-se de forma aguda, subclínica ou crônica (4,5).Na fase aguda, os sinais começam a aparecer após o período de incubação,quando há multiplicação da rickettsia dentro de leucócitos (média 2-4 semanas). Na fase subclínica observa-se alterações como trombocitopenia e anemia. A fase crônica é dificilmente diagnosticada, sendo geralmente mais grave quando na ocorrência de outras doenças (5).O diagnóstico presuntivo é baseado nos sinais clínicos e achados laboratoriais (6) e o definitivo pela visualização de mórulas em leucócitos no esfregaço sanguíneo, sorologia ou pela reação da polimerase em cadeia (PCR(1, 2).Considerando a casuística em alterações clínicas sugestivas de rickettisiose em Uberaba-MG, foi realizado um estudo retrospectivo com o objetivo de traçar o perfil clínico e laboratorial para seu diagnóstico. Material e Métodos No presente estudo, foi feito levantamento de 3158 animais com suspeita de erliquiose, atendidos pelo Hospital Veterinário de Uberaba, no período de janeiro/2004 a dezembro/2010. Dentre os animais que foram diagnosticados como positivos por esfregaço de ponta de orelha, esfregaço de sangue venoso ou sorologia (Immuno Comb Kit – Biogal®), foi feita uma análise junto a sua ficha clínica considerando alguns aspectos como idade, raça, sexo, características clínicas (anamnese, histórico, temperatura retal, palpação de linfonodos e avaliação das mucosas) e alterações hematológicas. Resultados e Discussão Entre os 3158 cães suspeitos para E. canis, 183 foram diagnosticados como positivos. Destes,173 (94,5%) foram por esfregaço sanguíneo pela observação de mórulas intraleucocitária, o que sugere fase aguda da doença, sendo sua detecção mais eficiente no esfregaço de sangue periférico (7). Apenas 10 (5,5%) foram positivos através da detecção de Ig G anti-E.canis. O exame sorológico, em alguns casos, foi solicitado após o resultado negativo do esfregaço sanguíneo, o que sugere fase subclínica ou crônica da doença. A baixa solicitação dos exames sorológicos se deve às condutas dos médicos veterinários em tratar seus pacientes embasados no histórico e em algumas alterações nos exames laboratoriais que sugerem E. canis, como trombocitopenia e não por exames laboratoriais. Dos 183 cães positivos avaliados, 98 (53,6%) eram fêmeas e esta ocorrência foi significativamente mais alta se comparada a outros estudos (2, 3, 8).A maior frequência foi observada em animais entre seis meses a cinco anos 152 (83,1%) e animais de raças conhecidas135 (73,8%),o que está de acordo com a literatura nacional (2, 3, 8). Durante a anamnese as principais queixas foram anorexia 142 (77,5%), apatia 83 (45,3%), alterações oftálmicas 57 (31,1%),diarréia 45 (24,6%), êmese 25 (13,6%), hematemese 23 (12,6%), dor abdominal 23 (12,6%), abdômen distendido 18 (9,8%), perda de peso 18 (9,8%), dificuldade de locomoção 10 (5,5%), sangramento nasal e bucal 17 (9,3%) e petéquias 5 (2,7%). A erliquiose é uma doença multissistêmica, apresentando sinais clínicos não específicos (3,4,5) e também podem ocorrer algumas alterações oculares como opacidade corneana e uveíte (8) e distúrbios hemorrágicos como epistaxe, petéquias e/ ou hematemese como conseqüência direta da trombocitopenia (9). Algumas alterações como dificuldade de locomoção, abdômen distendido sugestivo de edema ou esplenomegalia, são aspectos característicos de fase crônica da doença (3,6,8). No exame físico, 93 (50,8%) animais foram avaliados com mucosas hipocoradas. As mucosas pálidas são estatisticamente significativas por se tratar de uma doença que pode levar a supressão da medula óssea e outras alterações como alguns distúrbios hemorrágicos que ocorrem secundariamente à trombocitopenia, agravando mais o quadro da doença (4,5,10).Os linfonodos de 56 (30,6%) animais estavam reativos e com aumento de volume.Isso ocorre na fase aguda da doença quando há multiplicação dentro das células mononucleares circulantes, também presentes nos linfonodos (5,6).Foi observado também 134 (73,2%) animais com temperatura acima de 39,4oC. O aumento da temperatura retal é característica da doença em fase aguda, pois há tentativa de isolamento e destruição do agente pelo organismo e por este motivo, a E. canis tem como meio de defesa permanecer em microcapilares e vasos periféricos (6, 8). Nas avaliações hematológicas foi possível observar que 110 (60,1%) animais estavam com anemia arregenerativa, sendo uma alteração comumente achada em cães com erliquiose(2,3, 7, 8). Em relação ao leucograma, a maior alteração encontrada foi leucopenia (50,8%). Também se observou um decréscimo Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2011;9(31); 678-680. 679 Aspectos clínicos, epidemiológicos, hematológicos e sorológicos de animais diagnosticados com Ehrlichia canis no Hospital Veterinário de Uberaba-MG nos valores absolutos dos leucócitos, o que pode sugerir supressão medular ou aumento da destruição destas células durante a doença (2,6,8). Na contagem diferencial,as principais alterações observadas foram: desvio a esquerda regenerativo 119 (65,0%), linfopenia 98 (53,5%) e monocitopenia 102 (55,7%). Estas alterações são frequentemente encontradas na erliquiose, variando de acordo com a fase da doença (1,2,3,8). A eosinopenia não ocorreu de forma significativa (5,5%), discordando de alguns estudos (2,3,8). Outro dado significativo encontrado foi a trombocitopenia em 148 (80,8%) cães, sendo uma alteração citada em muitos trabalhos na literatura que indicam a principal alteração hematológica para o diagnóstico presuntivo da doença em áreas endêmicas(2, 3, 9). nóstico para a fase aguda da doença. Referências 1. Rikihisa Y; Ewing SA; et al. Analyses of Ehrlichia canis and a canine granulocitic Ehrlichia infection. Journal of Clinical Microbiology. 1991. v. 30, p.143-148. 2. Dagone AS; Morais HS; et al. Ehrlichiosis in anemic, thrombocytopenic, or tickinfested dogs from a Hospital population in South Brazil. Veterinay Parasitology 2002. v.117, p.285-290. 3. Moreira SM; Bastos CV; Araújo RB; Santos M; Passos LM. Estudo retrospectivo (1998 a 2001) da erliquiose canina em Belo Horizonte, Brasil. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia 2003. v.25, n.2, p.141-147. 4. WOODY BJ; HOSKINS JD. Ehrlichial diseases of dogs. Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice 1991 v.21, p.75-98. 5. Breitscherdt EB. Riquettsioses. In: Ettinger SJ, Feldman EC. Tratado de medicina interna veterinária. Doenças do cão e do gato.5a.Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. p.422-429. 6. Varela AS. Tick-borne Ehrlichia e and Rickettsiae of dogs. In: Bowman DD. Companion and exotic animal parasitology. 2003. [capturado em 10 maio 2011]. Disponível: http://www.ivis.org/advances/Parasit_Bowman/varela/ chapter_frm.asp?LA=1 7. Waner, T; Harrus, S. Canine monocytic ehrlichiosis - an overview. In: Recent advances in canine infectious diseases. [periódico online]. Ithaca: L.E. Carmichael(Ed). 2000 v.54 (4). [capturado em 10 maio 2011]. Disponível em: http://www.ivis.org/advances/Infect_Dis_Carmichael/waner/ivis.pdf 8. Borin S; Crivelenti LZ;Ferreira FA. Aspectos epidemiológicos, clínicos e hematológicos de 251 cães portadores de mórula de Ehrlichia spp. naturalmente infectados. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia. 2009v.61, n.3, p.566-571. 9. Boudreaux MK. Adquired platelet dysfunction. In: Feldman BV, et al. Schalm´s veterinary hematology. 5 ed. Philadelphia: Lippincott Willians & Wilkins, 2000. p.496-500. Conclusão O Estudo realizado permitiu verificar e concluir que: - A baixa casuística observada no HVU se deve ao tratamento dos animais somente pelos sinais clínicos e/ ou hematológicos apresentados. - As alterações clínicas e hematológicas observadas nos cães infectados por E. canis são bastante inespecíficas,independente de raça, sexo e faixa etária. - O esfregaço sanguíneo é um importante exame diag- 680 Recebido para publicação em: 15/06/2011. Enviado para análise em: 15/06/2011. Aceito para publicação em: 11/07/2011. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2011;9(31); 678-680.