projeto de monografia

Propaganda
0
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA
PRÓ-REITORIA DE ENSINO E GRADUAÇÃO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
DEPARTAMENTO DE DIREITO
DAURILÉIA VIEIRA GONZAGA SOUZA
ANÁLISE DA LEI N.º 10.304/2001 E DA SUA REGULAMENTAÇÃO
(DECRETO N.º 6.754/2009) E A QUESTÃO DA TITULARIDADE DO
DOMÍNIO DAS TERRAS NO ESTADO DE RORAIMA
Boa Vista/RR
2014
1
DAURILÉIA VIEIRA GONZAGA SOUZA
ANÁLISE DA LEI N.º 10.304/2001 E DA SUA REGULAMENTAÇÃO
(DECRETO N.º 6.754/2009) E A QUESTÃO DA TITULARIDADE DO
DOMÍNIO DAS TERRAS NO ESTADO DE RORAIMA
Monografia apresentada como prérequisito para a conclusão do curso de
Bacharelado
em
Direito
da
Universidade Federal de Roraima
(UFRR).
Orientador: Profº. MSc. Edival Braga
Boa Vista/RR
2014
2
DAURILÉIA VIEIRA GONZAGA SOUZA
ANÁLISE DA LEI N.º 10.304/2001 E DA SUA REGULAMENTAÇÃO (DECRETO
N.º 6.754/2009) E A QUESTÃO DA TITULARIDADE DO DOMÍNIO DAS TERRAS
NO ESTADO DE RORAIMA
Monografia apresentada como pré-requisito para a conclusão do Curso de
Bacharelado em Direito da Universidade Federal de Roraima, defendida em XX de
janeiro de 2014 e avaliada pela seguinte banca examinadora:
__________________________________________________
Prof. MSc. EDIVAL BRAGA
Orientador / Departamento de Direito - UFRR
__________________________________________________
______________________________________________
Prof. Sérgio Pádua
Curso de Direito – UFRR
__________________________________________________
Prof. MSc. LIVIA DUTRA BARRETO
Departamento de Direito - UFRR
3
Dedico este trabalho à minha família,
meu maior patrimônio. A cada dia
aprendo
que
“Nenhum
sucesso
compensa o fracasso de uma família”.
4
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar ao meu Deus. Ao Senhor ofereço o meu cântico de
gratidão, porque Ele é bom e seu amor dura para sempre. Aprouve a Deus a
conquista de mais esta vitória. Sem Ele nada podemos fazer, porque nele vivemos,
nos movemos e existimos.
À minha mãe, Rosa sem espinhos, que com seu caráter exemplar, sábios
conselhos e orações me sustentam e é minha inspiração a prosseguir e alcançar
meus sonhos.
Ao meu esposo Adriano, pela paciência e compreensão. Você é tudo o que
um dia eu pedi para Deus. Mesmo nos momentos em que eu não merecia, você
continuou me amando e apoiando.
Aos meus filhos Athus Gabriel, Abner Samuel e Adriel Judah, bênçãos na
minha vida. Vocês são os melhores presentes de Deus.
Aos meus colegas de trabalho, em especial ao Marcio Farkas, sempre
disponível e colaborativo. Sua ajuda foi essencial.
Aos meus colegas de curso, ao meu orientador e a todos, que de alguma
forma contribuíram na concretização desse trabalho, a minha sincera gratidão.
5
“Sem
essa institucionalização material, o
Estado de Roraima não passará de um
Estado
“virtual”.
Ninguém,
de
sã
consciência e comprometido com o
presente e o futuro do Estado e da
sociedade de Roraima, pode se opor a
essa
institucionalização”.
(BARRETO,
2013)
6
RESUMO
O Estado de Roraima possui uma complexa situação fundiária e institucional com
relação ao domínio de suas terras. Isso porque o Estado não possui ingerência
sobre extensa e considerável parte das terras da sua superfície geográfica,
simplesmente porque as glebas ainda estão matriculadas em nome da União. Essa
indefinição fundiária é uma situação que se arrasta há muito tempo, dado que até o
ano de 2013, passados mais de 25 anos da criação do Estado e dispondo de leis
suficientes que disciplinam a transferência de domínio dessas terras, não se
conseguiu efetivar a transferência de todas as glebas pertencentes à União ao
Estado de Roraima. Dessa forma, o presente trabalho tem como objeto a análise da
Lei n.º 10.304/2001, que “transfere ao domínio do Estado de Roraima terras
pertencentes à União”, bem como das questões relacionadas à institucionalização
da base territorial do Estado. É urgente que a União e o Estado encontrem
mecanismos que possibilitem a plena transferência da titularidade das terras,
realizando-a de modo célere, correto, transparente e atendendo ao que dispõe a
legislação, colocando-se um ponto final nos impasses e controvérsias em torno
desse processo.
Palavras Chave: Lei nº 10.304/2001; Transferência de terras; Questão fundiária.
7
ABSTRACT
The State of Roraima has a complex land situation and institutional regarding the
ownership of its land. The State has no interference on the extensive and
considerable part of the land of their geographic area, because the plots are still
registered in the Union's name. The vagueness of this land is a situation that has
been dragging for a long time, given that by the year 2013, after more than 25 years
of creation of the State and having enough laws governing the domain transfer these
lands not managed to accomplish the transfer of all plots belonging to the Union to
the State of Roraima. Thus, the present work has the purpose of analysing the law
10.304/2001 that "transfers to the domain of the State of Roraima land belonging to
the Union" as well as the issues related to the institutionalization of territorial basis of
the state. It is urgent for the Union and the State find mechanisms to enable the full
transfer of ownership of land, performing the transfer swiftly, correctly and
transparently, following the correct legislation and placing an end to the deadlock and
controversies surrounding this process.
Keywords: Law 10.304/2001; Transfer of land; Land issues.
8
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10
2. OBJETIVOS .......................................................................................................... 12
2.1. Objetivos específicos....................................................................................... 12
3. METODOLOGIA ................................................................................................... 13
4. O CONTEXTO DA QUESTÂO DA DOMINIALIDADE DAS TERRAS EM
RORAIMA ................................................................................................................. 15
5. DIREITO FUNDIÁRIO NO BRASIL ...................................................................... 17
5.1. Processo de aproveitamento e doação das terras no Brasil ...................................................... 17
5.2. A “Lei de Terras”......................................................................................................................... 18
5.3. O Direito à Regularização Fundiária ........................................................................................... 20
5.4. Regularização Fundiária na Amazônia ....................................................................................... 21
6. BREVE HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO TERRITORIAL DO ESTADO DE
RORAIMA ................................................................................................................. 23
6.1. Primeiro período: do início da colonização até a criação do munícipio de Boa Vista ............... 23
6.2. Segundo período: da criação do Município de Boa Vista até criação do Território Federal do
Rio Branco (1890-1943)..................................................................................................................... 25
6.3. Terceiro período – da criação do Território Federal do Rio Branco até a criação do Estado
(1943 a 1988) .................................................................................................................................... 26
6.4. Quarto período: da criação do Estado de Roraima até os dias atuais ....................................... 29
7. A TITULARIDADE DAS TERRAS E O DIREITO DE PROPRIEDADE ................ 31
8. OS BENS PÚBLICOS E A QUESTÃO FUNDIÁRIA ............................................ 34
8.1. Bens da União............................................................................................................................. 34
8.2. Bens do Estado ........................................................................................................................... 36
8.3. Terras devolutas ......................................................................................................................... 37
8.4. Propriedade das terras devolutas .............................................................................................. 39
9. SITUAÇÃO FUNDIÁRIA DO ESTADO DE RORAIMA ......................................... 41
9.1. Roraima é titular das terras desde a criação do Estado em 1988 .............................................. 41
9.2. Roraima é titular das terras a partir da edição da Lei nº 10.304/2001 ...................................... 46
9.3. Roraima será titular das terras somente após o cumprimento do Decreto 6.754/2009 .......... 50
9
10. RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS: UNIÃO E ESTADO DE RORAIMA .. 53
10.1. A questão do federalismo ........................................................................................................ 54
10.2. Conflito no Pacto Federativo.................................................................................................... 56
10.3. Competência para legislar sobre Política Fundiária ................................................................. 58
10.4. Necessidade de cooperação entre a União e o Estado de Roraima ........................................ 62
11. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 64
12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 65
10
1. INTRODUÇÃO
O Estado de Roraima possui uma complexa situação fundiária e institucional
com relação ao domínio de suas terras, vista de maneira isolada ou vista
comparativamente a outros Estados que compõem a República Federativa do Brasil.
Para um Estado que tem o menor PIB (Produto Interno Bruto) do país e
considerando que o desenvolvimento econômico e social só será plenamente
possível quando se puder exercer o direito pleno sobre o seu próprio território, a
indefinição de titularidade do domínio de suas terras torna-se um problema colossal.
O Estado não possui ingerência sobre extensa e considerável parte das terras
da sua superfície geográfica, simplesmente porque as mesmas ainda estão
matriculadas em nome da União, dado que até o ano de 2013, passados mais de 25
anos da criação do Estado e contando com leis suficientes que disciplinam a
transferência do domínio dessas terras, não se conseguiu efetivar a transferência de
todas as glebas pertencentes à União ao Estado de Roraima.
A transferência de terras permitirá mais segurança para investimentos no
Estado, direcionando as políticas públicas mais adequadas a cada região, pois afinal
há uma grande insegurança jurídica no que se refere às questões fundiárias em
Roraima.
Essa indefinição fundiária é uma situação que se arrasta há muito tempo. É
urgente que a União e o Estado encontrem mecanismos que possibilitem a
transferência da titularidade das terras, realizando-a de modo célere, correto,
transparente e atendendo ao que dispõe a legislação, colocando-se um ponto final
nos impasses e discussões em torno desse processo.
Não obstante a Lei nº 10.304/2001, com a nova redação dada pela Lei nº
11.949/2009, dispor sobre a transferência ao domínio dos Estados de Roraima e do
Amapá das terras pertencente à União, ressaltamos que nesta pesquisa nos
ateremos somente à situação jurídico-fundiária do Estado de Roraima.
Dessa forma, o presente trabalho tem como objeto o estudo da Lei n.º
10.304/01, que regula a transferência de terras pertencentes à União ao domínio do
11
Estado de Roraima. Para uma análise completa do assunto, faremos abordagens
históricas, que justificaram a necessidade de edição da referida Lei, bem como dos
atos técnicos e administrativos que serão necessários à efetiva transferência das
terras ao Estado de Roraima.
Nosso esforço foi no sentido de buscar dirimir algumas questões obscuras
existentes em torno da Lei n.º 10.304/2001, mas ciente, das dificuldades, pois o
tema não possui obras editadas, por tratar-se de assunto recente, e por haver uma
grande complexidade de entendimentos em relação ao momento em que se
materializou a dominialidade das terras no Estado de Roraima.
No atual contexto histórico-político, em que o Estado discute seu Zoneamento
Ecológico Econômico, sendo este uma das exigências impostas pelo Decreto nº
6.754/2009 (que regulamenta a Lei nº 10.304/2001) para que de fato o Estado tenha
a titularidade de suas terras, o presente estudo revela-se de extrema relevância,
seja para aqueles que pretendem conhecer preliminarmente o complexo processo
de transferência das glebas ao Estado ou para aqueles que têm interesse na
temática.
Não temos a pretensão de esgotar todo o assunto nem produzir um
compêndio sobre a legislação, doutrina e jurisprudência aplicável ao caso, mas de
forma humilde, contribuir para o esclarecimento e quiçá até apontar caminhos que
auxiliem na solução dos entraves que ora tem se erguidos em desfavor da tão
sonhada regularização fundiária do nosso Estado, que logicamente começa pela
definição da dominialidade das terras públicas.
Espera-se, com isso, dar uma modesta contribuição para o estudo das
questões relativas à transferência de terras da União ao Estado de Roraima, no
intrincado e discutido processo de regularização fundiária.
12
2. OBJETIVOS
Analisar a Lei nº 10.304/2001, que dispôs sobre o repasse de terras da União
ao domínio do Estado de Roraima e em que momento histórico as terras federais
foram/serão efetivamente transferidas, assegurando a institucionalização da base
territorial do Estado e a incorporação das referidas terras ao patrimônio imobiliário
do Estado.
2.1. Objetivos específicos

Realizar estudos sobre a legislação aplicável à destinação das terras da União
em Roraima;

Examinar historicamente os entraves jurídicos e administrativos para o efetivo
repasse das terras da União ao Estado de Roraima;

Avaliar as possíveis medidas legais e administrativas necessárias à destinação
das terras.
13
3. METODOLOGIA
Partindo do artigo 14 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,
passando pelo art. 15 da LC 41/81, tendo como objeto a Lei n.º 10.304/2001 e sua
regulamentação através do Decreto 6.754/2009, a presente investigação teve como
foco o estudo normativo-jurídico da referida Lei, que dispôs sobre a transferência ao
domínio do Estado de Roraima de terras pertencentes à União, de modo a dotar-lhe
de uma feição de dever-ser.
Para tanto, apresentamos os dispositivos legais que se projetam sobre o
complexo processo de transferência da titularidade das terras no Estado de
Roraima, bem como realizamos uma revisão da doutrina e jurisprudência que
mantem alguma relação com a temática.
Fizemos
um
levantamento
das
principais
hipóteses
a
respeito
do
entendimento sobre em que momento histórico houve a transferência de terras ao
novel Estado de Roraima: se no momento de sua criação, com a CF/1988; se com a
edição da Lei nº 10.304/2001 ou se somente após o cumprimento de todas as
condicionantes impostas pelo Decreto nº 6.754/2009.
Detivemo-nos na análise das hipóteses suscitadas, apresentando os diversos
argumentos, posições e interpretações doutrinárias e exegéticas, que tem
atravancado o processo de transferência efetiva do domínio das terras ao Estado.
A fim de instrumentalizar a pesquisa, utilizamos também a técnica da
investigação empírica, participando (como ouvinte) de eventos que tiveram como
foco o debate sobre a regularização fundiária, que obrigatoriamente depende do
adequado atendimento e aplicação da Lei nº 10.304/2001. Nesse sentido,
participamos dos seguintes eventos:

I Conferencia Nacional de Desenvolvimento Regional;

Reuniões do Grupo Executivo Estadual, que discute a questão fundiária do
Estado;

6ª Consulta Pública para a proposta de Zoneamento Ecológico-Econômico do
Estado de Roraima (ZEE/RR).
14

III Encontro do Parlamento Amazônico, pautado na questão fundiária, distribuição
e titulação de terras.
Além disso, realizamos entrevistas e coletamos contribuições de gestores de
instituições estaduais e federais que tem relação e/ou interesse na regularização
fundiária do Estado.
Finalmente, propusemos nossa opinião abalizada, cuja construção dependeu
não somente da legislação, mas de todo um suporte doutrinário e opinativo para se
sustentar.
15
4. O CONTEXTO DA QUESTÂO DA DOMINIALIDADE DAS TERRAS EM
RORAIMA
Ao se proceder a uma análise das raízes históricas do direito fundiário no
Brasil, constata-se que o problema fundiário brasileiro é complexo desde a sua
origem. A Lei nº. 601, de 1850 - conhecida como Lei de terras - representou um
esforço de regularização do processo de ocupação do solo no Brasil. A doutrina, de
um modo geral, entende essa Lei como uma tentativa bem intencionada, mas
infrutífera, de solução aos problemas do quadro de ocupação da terra.
Segundo UNGER (2008) de todos os problemas da Amazônia, que são
vários, o maior é o da regularização fundiária. Existe um caos fundiário que resulta
em males enormes, suscitando a violência, consagrando a grilagem e tornando o
saque mais proveitoso do que a preservação e a produção, pois ninguém vai investir
em preservação ou em produzir se não confia na continuidade de seu controle sobre
a terra.
No novel Estado de Roraima não é diferente. Desde a criação do Estado, em
1988, as terras pertencentes à União ainda não foram, em sua plenitude,
repassadas ao governo estadual, fato que traz uma série de complicações do ponto
de vista territorial, politico, econômico e social.
O problema fundiário é tão grave que a transferência da titularidade das terras
da União para o Estado se transformou em bandeira política. A negociação entre os
dois entes - União e Estado - é antiga, mas ainda hoje permanece emaranhada nas
teias da burocracia.
Em razão da indefinição da titularidade do domínio das referidas terras,
verifica-se a existência de um conflito territorial entre a União e o Estado de
Roraima. Tal conflito tem sido objeto de diversas ações judiciais tanto na Justiça
Federal, a exemplo da Ação Civil Pública nº 4653-70.2012.4.01.4200; quanto no
próprio Supremo Tribunal Federal. Podemos citar a Ação Civil Originaria (ACO) nº
596/2003; ACO nº 653/2004; ACO nº 705/2004; ACO nº 768/2005; ACO nº 943/2012
e mais recentemente, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5006/2013.
É nítida a relevância da matéria, que supõe iminente ruptura do equilíbrio
federativo, pondo em risco tanto o pacto federativo quanto a autonomia do Estado
16
ante a titularidade do domínio das terras, opondo os interesses da União aos do
Estado de Roraima sobre extensa área do território estadual, sobre a qual
concorrem diferentes projetos federais e estaduais de ocupação. A controvérsia
instaurada nos autos dos processos citados caracteriza conflito de interesses que
afeta a harmonia federativa.
Os interesses públicos em conflito são condicionalmente relevantes. A União
prima pela defesa do seu patrimônio imobiliário e de sua competência exclusiva de
legislar sobre determinadas matérias e o Estado de Roraima demanda sua
institucionalização material como ente da Federação.
O que se extrai da decisão proferida na Ação Civil Pública nº 465370.2012.4.01.4200, é que essa institucionalização não está concluída pela
incompreensão, desde a leitura do Art. 14 do ADCT, passando por uma leitura
imperfeita da Lei n.º 10.304/01, culminando numa leitura incompleta do Decreto n.º
6.754/09. Dessa decisão, destacamos o seguinte trecho:
Sem essa institucionalização material, o Estado de Roraima não passará de
um Estado “virtual”, sendo tratado ainda como mera autarquia da União,
sujeito à serviência do poder público central ou dos mandatários do
momento.
É de inquestionável premência, proporcionar ao Estado de Roraima maior
ordenamento e controle da ocupação territorial e maior capacidade de promoção do
seu próprio progresso. Para alcançar esse objetivo, não há outro caminho a não ser
o de definir e regularizar a titularidade de suas terras.
Por sua vez, a transferência do domínio das terras, obrigatoriamente tem que
atender ao que está disposto na legislação, fundamentalmente observando-se as
condições impostas pela Lei n.º 10.304/2001 (regulamentada pelo Decreto nº
6.754/2009), marco legal que transfere ao domínio do Estado de Roraima as terras
pertencentes à União.
Desse modo, é de fundamental relevância compreender o arcabouço jurídiconormativo relacionado à questão da transferência do domínio das terras da União ao
Estado de Roraima, bem como os entraves políticos, jurídicos e administrativos que
tem constituindo-se em óbice à continuidade do processo de transferência.
17
5. DIREITO FUNDIÁRIO NO BRASIL
Desde quando os portugueses tomaram e apossaram-se das terras
brasileiras em nome da Coroa, deu-se início a um “processo de ocupação e
apropriação fundiária que cinco séculos seguintes não bastariam para pacificar-se e
completar-se em sua plenitude” (ASSUNÇÃO, 2008).
Conforme ensinamento de ASSUNÇAO (2008) no intuito defensivo de posse
contra incursões estrangeiras, bem como para explorar suas riquezas, a Coroa
portuguesa dividiu a terra descoberta em quinze capitanias hereditárias, as quais
eram transmitidas por Carta de Doação, entregue a partir de 1532, constituindo-se
tais cartas os primeiros títulos de direito real em terra brasileira e a primeira
delegação de poderes.
Os capitães-donatários, titulares dessas capitanias poderiam outorgar a posse
de imensas glebas de terras, constituindo-se estas em sesmarias1, em face à crise
no abastecimento de gêneros alimentícios. Segundo CASSETTARI (2012) o
sesmeiro tinha por obrigação aproveitar a terra em prazo determinado e pagar os
tributos à Coroa, sob pena de cair em comisso e perder seu direito de posse.
No intuito de esclarecer a origem do direito fundiário no Brasil, destacamos o
seguinte trecho:
[...] em terras brasileiras o reconhecimento dos direitos de propriedade
imóvel sempre esteve vinculado a um ato formal e solene, e comportava o
cumprimento da obrigação de fazer (registrar a carta de data e cultivar a
terra), e de prestação pecuniária (pagar o dízimo); e a terra se destinava à
produção de riquezas e ao cumprimento de função social. (ASSUNÇÃO,
2008, p. 18)
5.1. Processo de aproveitamento e doação das terras no Brasil
Conforme preceitua DINIZ (2005) a história territorial do Brasil tem início em
Portugal, onde encontramos as origens do nosso regime de terras. Foram as normas
1
SESMARIA é um instituto jurídico português que normatizava a distribuição de terras destinadas à
produção. O citado sistema surge em Portugal durante o século XIV, quando uma crise agrícola
atinge o país. Quando a conquista do território brasileiro se efetiva, a partir de 1530, o estado
português decide utilizar o sistema sesmarial na Colônia, com algumas adaptações. (CASSETTARI,
2012)
18
jurídicas do Reino que orientaram a distribuição da terra aos colonos, distribuídas
principalmente entre fidalgos da pequena nobreza, homens de negócios,
funcionários burocratas e militares.
Como aponta IMPARATO e SAULE JUNIOR (2007) durante toda a época
colonial, as terras brasileiras eram legalmente ocupadas a partir de concessões
feitas pela Coroa Portuguesa. Aquelas concessões – capitanias, sesmarias e forais
– davam basicamente direito ao uso da terra. A passagem a seguir esclarece ainda
mais esta questão:
Durante os três séculos de vida colonial brasileira muitas dessas
concessões foram outorgadas a fidalgos portugueses, em especial as
sesmarias. A concessão da sesmaria outorgava o direito ao uso da terra.
Todavia implicava uma série de responsabilidades e obrigações ao
beneficiado, ao contrário do beneficiado das capitanias e forais, que não
tinham obrigação de recolher tributos. (IMPARATO e SAULE JUNIOR,
2007, p. 104).
O regime sesmarial no Brasil prevaleceu até a edição da Resolução nº. 76 de
17 de julho de 1822, que “Manda suspender a concessão de sesmarias futuras até a
convocação da Assembleia Geral Constituinte”.
As concessões das sesmarias eram feitas determinando o uso efetivo da
gleba de terra concedida. Dessa forma, chegamos a Independência, em 1822, com
grande parte do território nacional dividido em sesmarias outorgadas, mas não
necessária e efetivamente ocupadas (IMPARATO e SAULE JUNIOR, 2007).
Para resolver essa situação, o governo imperial publicou, em 1850, a Lei nº
601, conhecida como Lei de Terras (regulamentada por Decreto de 1854) que trouxe
a possibilidade de serem regularizadas as sesmarias e legalizadas as posses sem
titulação. As glebas de terra não regularizadas ou não legalizadas seriam
consideradas devolutas, ou seja, seriam devolvidas ao domínio do poder central.
Ao cabo dessas considerações históricas, destacamos a conclusão do prof.
BENEDITO FERREIRA MARQUES (2012):
Pode-se avaliar que o emprego do instituto das sesmarias, no Brasil, foi
maléfico e benéfico a um só tempo. Maléfico porque, mercê das distorções
havidas, gerou vícios no sistema fundiário até os dias de hoje, que
reclamam reformulação consistente e séria. Benéfico porque, a despeito de
os sesmeiros não cumprirem todas as obrigações assumidas, permitiu a
colonização e o povoamento do interior do país, que se consolidou com
dimensões continentais.
5.2. A “Lei de Terras”
19
Nosso primeiro código de terras foi editado vinte e oito anos depois do fim do
regime sesmarial. A Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, aprovada durante o
reinado do imperador Dom Pedro II, mantem seus efeitos reflexos até os dias atuais
e, pode ajudar a compreender melhor a questão fundiária no Brasil contemporâneo.
A referida lei possibilitou o registro paroquial, primeiro cadastro imobiliário do
país. Abaixo, IMPARATO e SAULE JUNIOR (2007) apresentam as inovações
trazidas pela Lei de Terras:
Além de introduzir o registro paroquial, possibilitar a regularização das
sesmarias e legalização das posses e criar a figura das terras devolutas, a
lei de Terras agregou valor econômico à propriedade imobiliária.
(IMPARATO e SAULE JUNIOR, 2007, p. 105).
Não obstante a Lei de Terras ser considerada até os nossos dias um marco
regulatório do direito de propriedade pública no Brasil (dado que este diploma não
consta como revogado), não produziu os efeitos desejados.
Com a Proclamação da República, em 1889, as antigas províncias foram
elevadas a categoria de Estados e passamos a ter o modelo político de Federação.
Os Estados ficaram com as terras devolutas situadas em seus respectivos territórios,
(excetuando-se aquelas que pela Constituição de 1891 pertenciam ao governo
central) e ganharam maior autonomia, podendo legislar sobre seus bens e
administrá-los.
Segundo MENDES e DALCOL (2009)2 “basicamente, todas as questões
fundiárias eram regulamentadas nas formalidades do regime sesmarial, desde o
início da ocupação do Brasil pelos portugueses até 1850, quando surgiu a Lei nº.
601, ou seja, por um período muito longo ficou sem regulamentação a questão da
propriedade rural no Brasil.”
Nesse sentido assinala MARQUES (2012):
[...] Mas se o propósito da coroa foi acabar com um mal, foi mais nocivo ao
Brasil, deixando-o órfão de qualquer legislação sobre terras, num período
bastante longo, de calculadamente 28 anos, pois somente em 18.9.1850,
quando o país já vivia sob o regime imperial, foi editada a primeira lei sobre
terras, a Lei nº. 601, considerada um marco histórico no contexto legislativo
agrário brasileiro [...].
Conforme ASSUNÇÃO (2008) foram, portanto três séculos e meio (trezentos
e cinquenta anos) de regime sesmarial, em que toda a terra era propriedade estatal,
da coroa portuguesa, contra um século e três quartos de século (cento e setenta e
2
MENDES, Rodrigo Mendes; DALCOL, Júlio César. Lei n.º 10.267: Georreferenciamento e sua
aplicação prática. Revista Científica da FAJAR, v.1, n.8, p. 6-43, jan./jun., 2009.
20
cinco anos), nesta data, do regime que poderíamos denominar “de propriedade
pública e privada”, no qual coexistem a propriedade pública e a propriedade
particular.
Percebe-se, que a dificuldade de regularização fundiária no Brasil é um
problema crônico, com raízes históricas, começando pela forma de colonização
portuguesa, cujo objetivo era o de ocupar seus domínios sem investimento de capital
na Colônia, passando pela Proclamação da República, que foi “negligente na
organização das vendas das terras devolutas e nunca se soube o que havia sido
demarcado, o que havia sido vendido ou cedido”
3
até chegar aos nossos dias, nos
quais todo o aparato jurídico-normativo parece ser insuficiente diante dos entraves
políticos, técnicos e administrativos para sanar o imbróglio da indefinição fundiária
no país.
5.3. O Direito à Regularização Fundiária
Nossa Carta Magna é uma constituição do Estado Social, que reconhece
direitos fundamentais e fornece meios jurisdicionais para sua garantia. Alguns
desses direitos estão expressos no art. 6º da CF, dos quais destacamos o direito à
moradia:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho,
a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição.
Para PRESTES4 (2011) “a regularização fundiária é uma expressão deste
direito social à moradia, sendo, portanto, um direito que para ser concretizado,
necessita
da
atividade
do
Estado,
constituindo-se
como
política
pública
permanente”.
O conceito de regularização fundiária está previsto no artigo 46 da Lei Federal
nº 11.977/2009, que estabelece:
A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas,
urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de
assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a
garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções
sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
3
4
IMPARATO & SAULE JR. Regularização Fundiária de Terras da União. (2007, p. 105)
PRESTES, Vanesca Buzelato. Regularização Fundiária: como implementar. CEAF: RS, 2011
21
Segundo a SPU (Secretaria do Patrimônio da União) a regularização fundiária
é um direito dos cidadãos e comunidades, que promove sua função socioambiental.
É também ação estratégica para o fomento ao desenvolvimento local, apoiando a
consolidação de serviços públicos e atividades econômicas.
Não se pode negar que o Governo Federal tem envidado esforços para
atuação em regularização fundiária no país. Prova disso, é que especialmente nas
ultimas décadas, houve a edição de leis específicas para a regularização fundiária,
tais como a Lei nº 9.636/1998, Lei nº 10.257/2001, Lei nº 11.952/2009 e Lei n°
11.977/20095. Além de todo o aparato jurídico, tem se investido vultosos recursos
públicos em programas de regularização fundiária e formaram-se convênios com os
governos locais para tornar mais célere o processo.
Porém, a realidade mostra que o avanço nos aspectos operacionais tem sido
tímido. Dentre vários gargalos, é necessário dotar Estados e Municípios de
condições técnicas e até tecnológicas para realizar todos os procedimentos
relacionados à regularização fundiária.
É certo que, o enfrentamento da questão fundiária exige engajamento dos
entes federativos e da sociedade e, sobretudo, atuação multidisciplinar e
interinstitucional, de modo que possibilite o surgimento de estratégias e soluções,
tendo como fio condutor o cumprimento dos direitos sociais, propagado pela nossa
Constituição Federal.
5.4. Regularização Fundiária na Amazônia
Na Amazônia, apesar da vasta literatura disponível sobre o assunto, ainda
existe um grande déficit de conhecimento do panorama fundiário da região.
Em virtude de suas dimensões geográficas e do seu modelo de ocupação, a
necessidade da regularização fundiária é bem mais evidente e urgente nessa região,
principalmente por causa dos conflitos e violência gerados em função da ocupação
da terra.
5
Lei nº 9.636/1998 - Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens
imóveis de domínio da União; Lei nº 10.257/2001 - Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição
Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana; Lei nº 11.952/2009 - Dispõe sobre a
regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito
da Amazônia Legal; Lei n° 11.977/2009 Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida e a
regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas.
22
Para BRITO e BARRETO (2011) a indefinição de direitos fundiários na
Amazônia é reconhecidamente um grave entrave para o avanço de políticas de
desenvolvimento sustentável na região.
Conforme MANSOS NETO (s.d), questões contingenciais decorrentes das
políticas públicas para a Amazônia e do afluxo migratório para a região, a ocupação
desordenada do território, o desconhecimento mesmo que parcial da situação
fundiária, a omissão estatal em regular o acesso à terra e aos recursos naturais,
contribuíram com a instauração de uma cultura de tomar posse de terras ditas
“abandonadas”.
A fim de implementar uma estratégia de regularização fundiária para a região
e, ao mesmo tempo, diminuir os entraves burocráticos do processo, o Governo
Federal promulgou, em 2009, a Lei nº 11.952 com o objetivo de promover a
regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da
União, no âmbito da Amazônia Legal (art. 1º).
Vejamos o que diz MANSOS NETO (s.d) a esse respeito:
O Governo Federal, pela primeira vez na história legislativa, reconheceu
oficialmente que a Amazônia tem forma toda peculiar e plural de realidade
fundiária, que a diferencia de qualquer outra região do Brasil, e que,
portanto, necessita de forma especial de intervenção estatal no território
amazônida, daí por que a medida tem simbolismo importante no contexto
histórico e jurídico ao distinguir e determinar tratamento específico para a
questão fundiária distinta das outras, situação que possui amparo
constitucional, porque constitui objetivo fundamental da República e
concomitantemente é fundamento da ordem econômica brasileira, qual seja:
a redução das desigualdades sociais e regionais.
Para implementar a Lei nº 11.952/2009, o Governo Federal
lançou em
seguida o programa Terra Legal sob atribuição do Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA). A expectativa do Governo era o de regularizar, até 2012, as terras da
União em 400 municípios ocupados antes de 1º de dezembro de 2004.
Apesar de o Programa Terra Legal não conseguir alcançar essa ambiciosa
meta, não podemos olvidar que a Amazônia Legal passa por um dos maiores
processos de regularização fundiária das últimas décadas e que o Programa tem
como principal mérito dar apoio aos governos estaduais nos processos de
regularização fundiária em terras públicas estaduais.
23
6. BREVE HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO TERRITORIAL DO ESTADO DE
RORAIMA
O histórico de ocupação territorial do atual Estado de Roraima apresenta, no
seu conjunto, um complexo quadro fundiário. O que se viu durante todo o processo
de ocupação do Estado, desde o início da colonização do Vale do Rio Branco, foi
uma certa desordem, que estendeu seus reflexos até os dias atuais.
A formação do território do Estado de Roraima pode ser dividida basicamente
em quatro períodos: o primeiro, que vai desde o início da colonização do Vale do Rio
Branco até a criação do Município de Boa Vista, em 1890; o segundo, da criação do
Município até criação do Território Federal do Rio Branco, em 1943; o terceiro, que
vai de 1943 até a criação do Estado, em 1988; e o quarto, que vai de 1988 até os
dias atuais.
6.1. Primeiro período: do início da colonização até a criação do munícipio de
Boa Vista
De acordo com Menck (2008), a colonização portuguesa da região do Rio
Negro teve início em pleno período da União Ibérica, mais especificamente em 1639,
quando Pedro Teixeira, depois de tê-los explorado, tomou posse dos rios Amazonas
e Negro em nome da Coroa de Portugal. Nesse mesmo período, o explorador
descobriu o Rio Branco, dando início às incursões pela região.
A região do Rio Branco também era alvo de cobiça de espanhóis e
holandeses, o que aumentou a preocupação dos portugueses em consolidar sua
presença na região. Segundo Freitas (1996), os espanhóis, vindos do Orenoco,
entre 1771 e 1773, invadiram o território português do Rio Branco, estabelecendo-se
no Rio Uraricoera. Todavia, foram derrotados por portugueses e brasileiros no Rio
Tacutu. Diante de tal cobiça, a ocupação da região tornou-se ponto de honra para os
portugueses após a expulsão dos espanhóis.
Entre 1775 e 1776, atendendo-se uma demanda do Governo Colonial, foi
realizada construção do Forte São Joaquim, que consolidou a presença portuguesa
na região. Segundo Freitas (1996), a edificação do Forte São Joaquim
24
desempenhou papel importante, uma vez que ali estava o representante do Governo
da Província de São José do Rio Negro, maior autoridade desta vasta região.
Inicialmente, a ocupação portuguesa na região tinha a defesa do território
como maior justificativa, mas pouco tempo depois passou a haver a exploração
econômica da região, que se deu, sobretudo, com a introdução da pecuária nos
campos naturais existentes.
No que se refere à questão fundiária da região, Vieira (2007) destaca a
questão da Lei de Terras de 1850:
A Lei de Terras de 1850 institucionaliza no Brasil o regime da grande
propriedade privada, restringindo o acesso a terra e ampliando o contingente
de despossuídos. De acordo com a Lei, as terras indígenas foram
enquadradas em dois tipos: as derivadas do indigenato, ou seja, as
reconhecidas como dos índios por direito originário, livres da necessidade de
legitimação; e as terras reservadas à colonização dos indígenas, consideradas
devolutas, inalienáveis e destinadas ao usufruto desses povos.
As oligarquias interpretaram a lei de 1850 de acordo com seus
interesses, sendo que aos poucos os poderes locais passaram a vender as
terras das aldeias extintas, como também a usá-las para fundação de vilas,
povoações ou mesmo logradouro público. Isso se deu principalmente depois
da criação do Ministério da Agricultura, em 1860, e da passagem da política
indigenista para aquele órgão. Depois disso, dezenas de aldeias foram
extintas formalmente. Já em 1887, as terras das aldeias extintas tornaram-se
domínio das antigas províncias, e na República as Câmaras Municipais
passaram a ter poder de decisão sobre elas, facilitando aos fazendeiros da
região a regularização das terras que haviam ocupado.
Segundo a Lei Nº 601, de 18 de setembro de 1850, em seu Art. 3º são terras
devolutas:
§ 1º - As que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional,
provincial, ou municipal.
§ 2º - As que não se acharem no domínio particular por qualquer titulo
legitimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do
Governo Geral ou Provincial, não incursas em comisso por falta do
cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura.
§ 3º - As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras concessões
do Governo, que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por
esta Lei.
§ 4º - As que não se acharem ocupadas por posses, que, apesar de não se
fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta Lei.
Muitos fazendeiros, na época, estabeleceram-se sobre as chamadas terras
devolutas, o que acarretou problemas, em períodos posteriores, para a
regularização das mesmas.
25
6.2. Segundo período: da criação do Município de Boa Vista até criação do
Território Federal do Rio Branco (1890-1943)
Ainda dentro do contexto histórico da ocupação da região, o ano de 1890
representou um marco, com a criação do município de Boa Vista do Rio Branco,
pelo Governador do Estado do Amazonas, Augusto Ximeno de Villeroy, no dia 09 de
julho. Podemos definir este como o segundo período de ocupação territorial de
Roraima.
Figura 01: Configuração do atual Estado de Roraima antes da criação do Território Federal.
Fonte: Oliveira, 2007.
Nesse período, conforme Freitas (1996), as condições adversas ocasionadas
pelas secas, na região Nordeste do Brasil, trouxeram muitos nordestinos para a
região do Vale do Rio Branco. Nesse período, a pecuária continuava sendo a
principal atividade econômica e as fazendas de gado continuavam a se expandir.
26
Vale lembrar que boa parte do gado aqui produzido era exportada para Manaus em
troca de gêneros de primeira necessidade.
6.3. Terceiro período – da criação do Território Federal do Rio Branco até a
criação do Estado (1943 a 1988)
Em 1943, iniciou-se uma nova era, com a criação do Território Federal do Rio
Branco, que mais tarde, em 1962, viria a ser chamado de Território Federal de
Roraima.
Figura 02: Território Federal do Rio Branco. Fonte: Oliveira, 2007.
O Território Federal do Rio Branco foi criado pelo Decreto-Lei 5.812, de 13 de
Setembro de 1943, tendo sido desmembrado do Estado do Amazonas, com o intuito
de garantir a ocupação e a soberania das zonas de fronteiras.
27
O Artigo 2º do Decreto-Lei 5.812/1943 destaca que passam para o domínio da
União os bens que, pertencendo aos Estados ou Municípios na forma da
Constituição e das leis em vigor, se acham situados nos Territórios delimitados no
artigo precedente6. Por força desse artigo, todos os bens até então pertencentes ao
Município de Boa Vista, inclusive os bens imóveis, com a criação do Território
Federal do Rio Branco, agora faziam parte do domínio da União.
Figura 03: Território Federal de Roraima, antes das emancipações de 1982. Fonte: Oliveira, 2007.
Segundo Freitas (1996), com a criação do Território Federal, essa região
passou a ter um tratamento melhor, uma vez que seus problemas eram ligados
diretamente à União Federal. O governador nomeado era Delegado do Presidente
6
O Artigo precedente a que refere o Art. 2º do Decreto-Lei Nº 5.812, de 13 de Setembro de 1943, no
caso o Art. 1º, destaca os novos Territórios Federais criados, conforme se segue: Art. 1º São criados,
com partes desmembradas dos Estados do Pará, do Amazonas, de Mato Grosso, do Paraná e de
Santa Catarina, os Territórios Federais do Amapá, do Rio Branco, do Guaporé, de Ponta Porã e do
Iguassú.
28
da República. Assim, os assuntos pertinentes ao Rio Branco deixaram de passar
pelo Palácio Rio Negro, em Manaus, e foram para o Palácio do Catete, no Rio de
Janeiro.
Todavia, o desmembramento do Estado do Amazonas, a criação do Território
Federal do Rio Branco/Roraima, a fragmentação da malha municipal e outros
processos territoriais importantes, não colocaram um fim ao problema fundiário na
região.
Figura 04: Território Federal de Roraima após as emancipações de 1982. Fonte: Oliveira, 2007.
Nesse cenário, Vieira (2007), diz que um fato que constatava o grave
problema fundiário da região, vinha do então Ministério do Interior (1975-1979).
Nesse período, esse Ministério realizou um estudo para elaborar o segundo Plano
29
de Ação do Governo para o então Território Federal de Roraima, como forma de
concretizar a vinda de imigrantes para o Estado com o objetivo de ocupar os “vazios
da Amazônia”, além de definir uma estratégia agropecuária.
Foi através desse estudo que se constatou, depois de todo o levantamento
efetuado, que a situação fundiária dos proprietários de terra em Roraima era
totalmente indefinida. Nesse período havia somente 1.193 imóveis rurais
cadastrados pelo Sistema Nacional de Cadastro Rural, apenas 172 possuíam títulos
definitivos de propriedades.
O Território recebia cada vez mais imigrantes, que se instalavam
principalmente nas zonas rurais, que como vemos não tinham, e muitas não têm até
hoje, uma situação fundiária definida.
Os incentivos governamentais concedidos na segunda metade do século XX
favoreceram de forma significativa a ocupação do Estado de Roraima. Em
decorrência dos projetos de assentamento que são crescentes nessa região, um
grande número de imigrantes de todas as partes do país se dirigiu ao atual Estado
de Roraima no intuito de serem, ao menos inicialmente, inseridos nas atividades
agrícolas (SILVA; LACERDA; DINIZ, 2012).
6.4. Quarto período: da criação do Estado de Roraima até os dias atuais
O quarto período que convém ser destacado na história de ocupação
Territorial do Estado de Roraima se inicia em 1988, quando ocorreu a criação do
Estado.
A criação do Estado do Roraima deu-se com a promulgação da Constituição
de 1988, nos termos do art. 14, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias:
Art. 14. Os Territórios Federais de Roraima e do Amapá são transformados
em Estados Federados, mantidos seus atuais limites geográficos.
(...)
§ 2º - Aplicam-se à transformação e instalação dos Estados de Roraima e
Amapá as normas e os critérios seguidos na criação do Estado de
Rondônia, respeitado o disposto na Constituição e neste Ato.
30
É a partir da análise e interpretação do artigo supracitado que se inicia toda
uma discussão política e jurídica sobre qual o momento histórico em que as terras
passaram ao domínio do Estado de Roraima.
Todavia, a questão da dominialidade das terras ainda é um problema
complexo. Hoje, decorridos mais de 25 anos de sua criação, boa parte das terras do
Estado ainda pertencem à União, vez que ainda estão estagnados os processos de
transferência das glebas.
Figura 05: Configuração atual do Estado de Roraima após a criação de novos municípios em 1995.
Fonte: ITERAIMA.
Ao longo de toda a história do Estado, questões de ordens diversas
impediram que a regularização fundiária do Estado fosse completamente efetivada,
por meio de uma solução definitiva, o que daria ao Estado um maior grau de
autonomia sobre o seu próprio território.
31
Dentro desse contexto, nos ateremos a uma abordagem que analise a
situação fundiária do Estado de Roraima, desde sua criação até a atualidade.
7. A TITULARIDADE DAS TERRAS E O DIREITO DE PROPRIEDADE
Todos os bens estão sujeitos ao direito de propriedade do referido bem. Não
é diferente com os bens imóveis. Há que se saber a que pessoa jurídica de direito
público interno (União ou Estado) pertence a dominialidade das terras que compõem
a base territorial do Estado de Roraima.
Segundo IMPARATO E SAULE JR. (2007) “a teoria sobre o direito de
propriedade, como um modo de imputação de uma coisa a um sujeito, partiu da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que a concebeu como
um direito natural. Aquela declaração limitava o exercício da propriedade às
possibilidades dos demais indivíduos não-proprietários exercerem os seus direitos”.
O direito de propriedade tem fundamento na Constituição Federal que o
garante (art. 5º, inciso XII), determinando a seguir que essa propriedade deve
cumprir sua função social (art. 5º, inciso XIII).
JOSE AFONSO DA SILVA registra a importância da inscrição da propriedade
e a sua função social como princípios da ordem econômica. Neste diapasão,
“... ela não mais poderá ser considerada puro direito individual,
relativizando-se seu conceito e significado, especialmente porque os
princípios da ordem econômica são preordenados à vista da realização de
seu fim: assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social. Se é assim, então a propriedade que, ademais, tem que a tender sua
função social, fica vinculada à consecução daquele princípio”.
Nota-se que houve uma nítida evolução do direito de propriedade, superando
sua concepção como direito natural e passando a ser um direito atual. A
Constituição de 1988 tratou-o como um instituto ligado ao Direito Público, porque
deve cumprir sua função social.
Essa função social da propriedade, inclusa no rol dos direitos e garantias
fundamentais da República consagrada no seu artigo 5º, incisos XXII e XXIII
(verbis), estende-se também à propriedade pública.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
32
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
O princípio da função social da propriedade deve alcançar também a
propriedade pública. Para IMPARATO & SAULO JR (2007) toda e qualquer
propriedade deve cumprir sua função social, independente de se tratar de
propriedade privada ou propriedade pública, o que, no limite, significa cumprir os
preceitos da Constituição.
Vale ressaltar também que, conforme preceitua o Art. 3º da nossa Carta
Magna, constituem objetivos fundamentais da República a construção de uma
sociedade livre, justa e solidária; com garantia do desenvolvimento nacional;
erradicação da pobreza e da marginalização e redução das desigualdades sociais e
regionais; promovendo o bem de todos, sem preconceitos e quaisquer outras formas
de discriminação.
Abaixo, os autores apresentam em detalhes tal reflexão:
Esse objetivo maior da República deve ser cumprido no exercício do direito
de propriedade de qualquer natureza, seja o titular sujeito de direito privado
ou de direito público. Até porque, como afirmamos, o conceito de
propriedade atravessa, hoje, as antigas divisões entre Direito Público e
Direito Privado. Assim, toda e qualquer legislação infraconstitucional deverá
assegurar os mecanismos, por meio de normas e instrumentos jurídicos,
que, inspirados nos objetivos fixados pela Constituição, determinem o
cumprimento da função social da propriedade.
EROS ROBERTO GRAU, citado por PEREIRA (2010) salienta que somente
se pode cogitar da função social da propriedade quando se trate de propriedade
privada, porquanto a alusão à função social da propriedade estatal qualitativamente
nada inova, visto ser ela dinamizada no exercício de uma função pública.
Conforme DI PIETRO (2006) o princípio da função social da propriedade
pública não está consagrado com tanta clareza na Constituição. Ele não é definido
senão por meio de diretrizes a serem observadas pelo poder público.
A propriedade pública já tem uma finalidade pública que lhe é inerente e que
pode e deve ser ampliada para melhor atender ao interesse público, em especial os
objetivos constitucionais voltados para o pleno desenvolvimento das funções sociais
da cidade e à garantia do bem estar dos seus habitantes (DI PIETRO, 2006).
33
Diz a autora supracitada:
Com efeito, não há porque excluir os bens dominicais da incidência das
normas constitucionais que asseguram a função social da propriedade, quer
para os submeter, na área urbana, as limitações impostas pelo Plano
Diretor, quer para enquadra-los, na zona rural, aos planos de reforma
7
agrária.
O que o Estado de Roraima reivindica é justamente a propriedade de fato e
de direito das terras que compõem o seu patrimônio imobiliário, pois conforme a
Constituição de 1988, pertenceriam ao Estado de Roraima as terras herdadas do exterritório. Porém, como o Governo Federal só editou uma lei de repasse dessas
terras em 2001 (Lei nº 10.304), que só veio a ser regulamentada em 2009 pelo
Decreto 6.754, até o momento atual, infelizmente, o que temos é um quadro de
indefinição fundiária.
Solucionar a questão fundiária (transferência das terras para o domínio do
Estado) é condição imprescindível para cumprir a função social da propriedade e
possibilitar uma nova dinâmica à economia do Estado.
7
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Função Social da Propriedade Pública. Revista Eletrônica de
Direito do Estado. Numero 6 – abril/maio/junho/2006. Salvador/BA
34
8. OS BENS PÚBLICOS E A QUESTÃO FUNDIÁRIA
A doutrina jurídica define ou conceitua bem público sob a ótica da ordem
constitucional e legal vigente. Desse modo, bens públicos são aqueles assim
estabelecidos
pela
Constituição,
disciplinados
pelo
Direito
Civil
e
Direito
Administrativo.
O artigo 98 do Código Civil diz que são públicos os bens do domínio nacional
pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são
particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.
Segundo
CASSETTARI
(2012)
são
terras
públicas
todas
aquelas
pertencentes ao poder público, ou seja, são bens públicos determinados ou
determináveis que integram o patrimônio público, incluindo-se aí as terras devolutas.
Assim, as terras devolutas são espécies de terras públicas lato sensu.
Em se tratando de imóveis, estes nunca serão res nullius, pois pelo artigo
1.276 do Código Civil, o imóvel urbano abandonado “poderá ser arrecadado, como
bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade do Município ou à do Distrito
Federal, se se achar nas respectivas circunscrições” e o imóvel rural abandonado
“poderá ser arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade
da União, onde quer que ele se localize”.
Em todos os Estados da Federação, além do patrimônio estatal, existem
espaços territoriais e bens da União, de Municípios e de particulares. A criação do
Estado não afasta nem impossibilita a existência de bens de outros entes da
Federação.
8.1. Bens da União
O conceito genérico de bens da União engloba tanto os bens imateriais, como
os direitos dos cidadãos, tanto os materiais, como as coisas. No presente trabalho,
consideraremos apenas os bens materiais e imóveis.
35
Os bens são historicamente divididos entre privados e públicos. Segundo
IMPARATO e SAULE JUNIOR8 (2007) essa divisão histórica que, no Brasil, pode ser
traçada desde a Lei de Terras, é uma divisão por exclusão. Ou seja, são bens
públicos os bens imóveis que não forem legitimamente atribuídos a pessoas
jurídicas ou físicas de Direito Privado. O vocábulo público designa o sujeito de direito
titular do bem, ou seja, o Estado, isto é, o Poder Público.
O art. 20 da CF/88 diz quais são os bens pertencentes à União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das
fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à
preservação ambiental, definidas em lei;
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu
domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros
países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem
como os terrenos marginais e as praias fluviais;
IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as
praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as
que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao
serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;
V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica
exclusiva;
VI - o mar territorial;
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;
VIII - os potenciais de energia hidráulica;
IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;
X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e préhistóricos;
XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.
Dos que importam a este estudo, dizem os incisos II a XI do artigo
supracitado. Todos estes bens foram excluídos da transferência de terras da União
ao Estado de Roraima, de que trata a Lei 10.304/2001, in verbis:
Art. 2º. São excluídas da transferência de que trata esta Lei:
I – as áreas relacionadas nos incisos II a XI do art. 20 da Constituição
Federal.
Percebe-se que o legislador ordinário preocupou-se em excluir da aludida
transferência de terras os bens constitucionalmente pertencentes à União. Para a
exclusão dessas áreas, determina ainda o Decreto 6.754/2009, que, entre outros
requisitos, deverá ser feito o prévio georeferenciamento:
8
Regularização Fundiária Sustentável - conceitos e diretrizes. Raquel Rolnik. (et al.). Brasília:
Ministério das Cidades, 2007.
36
Art. 1º - Ficam transferidas gratuitamente ao Estado de Roraima as terras
públicas federais situadas em seu território que estejam arrecadadas e
o
matriculadas em nome da União, em cumprimento ao disposto no art. 1 da
o
Lei n 10.304, de 5 de novembro de 2001.
o
§ 1 A transferência de que trata o caput será feita considerando:
o
IV - o seu prévio georreferenciamento, conforme determina o § 4 do art.
o
176 da Lei n 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a expensas da respectiva
unidade da Federação;
8.2. Bens do Estado
A definição do que se caracteriza como bens dos Estados da Federação, é
destacado no Artigo 26 da Constituição Federal:
Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:
I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em
depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras
da União;
II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio,
excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros;
III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;
IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União. (grifo nosso)
Dessa forma, em harmonia com o texto da Carta Magna de 1988, as terras
devolutas, não compreendidas entre as da União, a saber, as registradas no art. 20,
II ("as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental,
definidas em lei"), PERTENCEM OU SÃO INCLUÍDAS ENTRE OS BENS DO
ESTADO-MEMBRO, EM QUE SE SITUAM.
A dominialidade do Estado federado, no que pertine a terras devolutas, é
constatada, de ver-se, por exclusão: as que não pertencerem à União, nos termos
do art. 20, II, da CF/88, pertencem aos Estados.
Pelo entendimento literal do art. 4º da Lei Estadual Nº 738/20099, temos que
são terras públicas do domínio do Estado de Roraima, aquelas:
I - devolutas transferidas aos Estados-Membros pela Constituição Federal
de 24 de fevereiro de 1891 e aquelas não compreendidas entre as da
União.
II - que pertenciam ao Território Federal de Roraima, bem como as
efetivamente utilizadas pela então Administração do Território Federal de
Roraima, arrecadadas ou não em nome da União, transferidas ao Estado de
Roraima, por força do disposto no § 2º, do artigo 14, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, da Constituição Federal de 1988; e na Lei
Complementar Federal nº. 41, de 22 de dezembro de 1981, exceto as
9
Trata-se da Lei Estadual N° 738 de 10 de setembro de 2009 que “Dispõe sobre a Política Fundiária
Rural do Estado de Roraima, revoga a Lei nº 197, de 8 de abril de 1998, e dá outras providências”.
37
excluídas, nos termos do artigo 2º da Lei nº. 10.304, de 05 de novembro de
2001, e suas alterações; Medida Provisória nº. 454, de 28 de janeiro de
2009 (convertida na Lei nº. 11.949, de 17 de junho de 2009); no Decreto
Federal nº 6.754, de 28 de janeiro de 2009.
III - ilhas fluviais e lacustres, situadas em seu território, não pertencentes à
União;
IV - que tenham sido incorporadas ao seu patrimônio, em virtude de lei ou
desapropriação e que não se encontram, por título legítimo, sob domínio de
terceiros; e
V - de domínio particular, concedidas pelo Estado, cujos títulos tenham sido
ou sejam cancelados pelo Poder Público Estadual.
O referido diploma legal dispõe no seu art. 5º que são terras devolutas
estaduais, aquelas:
I - transferidas ao domínio do Estado, por força do art. 64 da Constituição
Federal de 1891;
II - transferidas ao Estado e ainda não arrecadadas, nos termos do § 2º, do
artigo 14, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da
Constituição Federal de 1988, Lei Complementar Federal nº. 41, de 22 de
dezembro de 1981; exceto as excluídas, nos termos do artigo 2º da Lei nº
10.304, de 05 de novembro de 2001, com suas alterações; na Medida
Provisória nº. 454, de 28 de janeiro de 2009 (convertida na Lei nº. 11.949,
de 17 de junho de 2009); e no Decreto Federal nº. 6.754, de 28 de janeiro
de 2009.
III - que não forem indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações
e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação
ambiental, definidas em lei federal, na forma do artigo 26, IV, da CF/88;
IV - que não se incorporarem ao domínio privado ou dos Municípios, em
virtude de alienação, concessão ou reconhecimento pela União ou pelo
Estado, por força de legislações federais ou estaduais específicas.
8.3. Terras devolutas
A noção de terras devolutas é objeto de divergências. O nosso primeiro
código de terras, Lei nº 601/1850, definiu terra devoluta por critério de exclusão:
Art. 3º São terras devolutas:
§ 1º As que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional,
provincial, ou municipal.
§ 2º As que não se acharem no domínio particular por qualquer titulo
legitimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do
Governo Geral ou Provincial, não incursas em comisso por falta do
cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura.
§ 3º As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras concessões do
Governo, que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta
Lei.
§ 4º As que não se acharem ocupadas por posses, que, apesar de não se
fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta Lei.
38
Mais recentemente, ao dispor sobre os bens imóveis da União, o Decreto-lei
nº. 9.760, de 05.09.1946, deu o seguinte conceito de terras devolutas:
Art. 5º - São terras devolutas, na faixa de fronteiras, nos Territórios Federais
e no Distrito Federal, as terras que, não sendo próprias nem aplicadas a
algum uso público federal, estadual, territorial ou municipal, não se
incorporaram ao domínio privado.
Vigente, ainda hoje, prevista na CF/88: art. 20, II (bens da União); art. 26, IV
(bens estaduais); art. 188, §§ 1° e 2° (destinação de terras públicas e devolutas); art.
225, § 5° (indisponibilidade).
LUIS DE LIMA STEFANINI10 entende "as terras devolutas como sendo
aquelas espécies de terras públicas (sentido lato) não integradas ao patrimônio
particular, nem formalmente arrecadadas ao patrimônio público, que se acham
indiscriminadas no rol dos bens públicos por devir histórico-político".
As terras devolutas são áreas que não passaram do patrimônio público para o
particular de forma legítima, pois no Brasil vigora o princípio da posse histórica das
terras,
que
presume
que
a
propriedade
imobiliária
tem
origem
pública.
(CASSETTARI, 2012)
Historicamente, as terras devolutas pertencem aos Estados, como elemento
definidor do federalismo brasileiro. A Constituição de 1891, no seu artigo 64, expôs
dessa forma:
Art. 64 - Pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos
seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção do território
que for indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações,
construções militares e estradas de ferro federais. (grifo nosso)
Quanto à inserção expressa das terras devolutas entre os bens de domínio
público dos Estados, os textos constitucionais, assim procederam, mediante a
fórmula genérica que as identifica como aquelas resultantes da exclusão das terras
devolutas
que,
por
se
considerarem
indispensáveis
à
segurança
e
ao
desenvolvimento nacionais, foram incorporadas ao domínio da União.
Na expressão de PEREIRA (2010):
Passaram os Estados-membros, de uma forma genérica, a ser titulares das
terras devolutas situadas em seu território, ressalvada a daquelas que, à
época da promulgação da primeira Constituição Republicana, já tivesse
10
STEFANINI, Luis de Lima. A Propriedade no Direito Agrário. Ed. Revista dos Tribunais, 1978, SP.
39
aquele caráter de indispensabilidade para o interesse público nacional, bem
como as que o vissem a adquirir por força de fato ou ato declaratório
emanado da União Federal.
A Constituição de 1988 segue essa compreensão ao conferir ao domínio da
União as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental,
definidas em lei (art. 20, II da CF). E ao domínio do Estado, as terras devolutas não
compreendidas entre as da União (art. 26, IV da CF).
Conforme ASSUNÇÃO (2008) os Municípios e os Territórios não foram
contemplados com terras devolutas. Todavia, os Municípios podem exercer domínio
de terras devolutas que lhes forem transmitidas pelos Estados.
8.4. Propriedade das terras devolutas
Conforme PEREIRA (2010) “as terras devolutas no período do Brasil Colônia,
pertenciam à Metrópole. Com a independência, passaram ao domínio da Coroa
Imperial. Após proclamada a República em 1889, a Constituição de1891 transferiulhes o domínio para os Estados Federados, mantendo, porém, alguns trechos no
domínio federal”.
Face à Constituição de 1988, pertencem à União as terras devolutas
elencadas no art. 20, II da CF. As demais terras devolutas existentes no território
nacional já foram trespassadas aos Estados, sendo destes, portanto, a sua
titularidade.
As terras devolutas são bens não afetados a uma finalidade ou serviço
público específico, fazem parte dos bens patrimoniais dos entes federativos,
especialmente, os Estados-membros que são titulares das terras devolutas, que não
pertencem à União, conforme a norma do artigo 20, inciso II, da Constituição da
República.
No que se refere à titularidade das terras devolutas, vejamos o que diz
DIRLEY DA CUNHA JUNIOR (2011)11:
Quanto à comprovação, na prática, da existência de terras devolutas,
parece ter hoje se pacificado, na doutrina e jurisprudência, que não são
todas aquelas em que não há inscrição imobiliária a favor de particular. A
União precisa, além de provar que não há o registro, provar que a terra lhe
pertence, não estando entre as terras devolutas do Estado. A concepção de
11
CUNHA JUNIOR, Dirley da. Terras Devolutas nas Constituições Republicanas. Disponível em:
http://www.juridicohightech.com.br.
40
que o que não estiver expressamente registrado a favor de alguém, nas
áreas enunciadas, pertence à União, está definitivamente afastada,
prevalecendo a dupla necessidade de comprovação, a saber: a) inexistência
de registro; b) propriedade da União.
No plano jurídico, porém, a titularidade das terras devolutas não é
comprovada mediante documento cartorial. O titulo é a própria norma constitucional
(art. 20, II e art. 26, IV da CF) e as infraconstitucionais que outorgam ao Estado esta
especial condição. A CF ainda estabeleceu critérios de destinação conforme o artigo
188, indo mais além ao tratar sobrea sua indisponibilidade no art. 225, § 5º.
Em se tratando de processo de discriminação das terras devolutas, “aquele
destinado a assegurar a discriminação e delimitação das terras devolutas da União e
dos estados-membros, além de separá-las das terras particulares e de outras terras
públicas”12, a matéria está completamente redigida pela Lei nº 6.383/1976.
Conforme DIRLEY DA CUNHA JUNIOR “o propósito da lei em tela é permitir
que o Estado por meio de um processo próprio, especial, denominado processo
discriminatório, identifique as terras devolutas, encontre-as, localize-as, separe-as
das demais categorias de terras, ou seja, das particulares ou próprias, pertencentes
aos entes privados ou mesmo públicos”.
A destinação das terras apuradas como devolutas somente se pode fazer
mediante as previsões legais, especialmente mediante os processos de legitimidade
e regularização fundiárias.
Como era de se esperar, a Lei nº. 10.304/2001 excluiu da transferência de
domínio ao Estado, os bens imóveis constitucionalmente pertencentes à União, ou
seja, as áreas relacionadas nos incisos II a XI do art. 20 da Constituição Federal.
A primeira questão relevante surge com o inciso II do art. 20 da CF, pois não
há lei que defina quais são as terras devolutas indispensáveis à defesa das
fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de
comunicação e à preservação ambiental. Conforme preceitua IMPARATO e SAULE
Jr. (2007) não existe presunção legal para definir os limites das terras devolutas,
pois
elas
precisam
ser
extremadas
das
terras
particulares,
por
ações
discriminatórias.
Mesmo as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, é conceito
que carece de precisão especialmente no que se refere à extensão de tais terras,
12
ALMEIDA, R. M. Sesmarias e terras devolutas. Brasília a. 40 n. 158 abr./jun. 2003.
41
que só pode ser obtida através do legislador ordinário. Essa é a orientação do
Supremo Tribunal Federal, ou seja, somente a lei pode objetivar o conceito do
constituinte para definir os parâmetros de faixa de fronteira e zona de fronteira. O
que se percebe é que se tratam de conceitos distintos, sendo que a faixa de fronteira
abrange a zona de fronteira.
9. SITUAÇÃO FUNDIÁRIA DO ESTADO DE RORAIMA
Para melhor entendermos a situação fundiária do Estado de Roraima,
passaremos ao exame histórico dos principais entraves jurídicos e administrativos
que tem se tornado óbice ao efetivo repasse das terras da União ao Estado.
Dessa forma passaremos a análise de algumas hipóteses relativas ao ato
legislativo e ao momento em que as terras federais foram/serão efetivamente
transferidas ao Estado, acompanhado dos respectivos entendimentos doutrinário e
jurisprudencial. São elas:
a. Roraima é titular das terras desde a criação do Estado em 1988
O Estado de Roraima é o verdadeiro proprietário das terras, tendo o seu
domínio desde a criação do Estado, nos termos do artigo 14 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias c/c o art. 15 da Lei Complementar 41/1981.
b. Roraima é titular das terras a partir da edição da Lei nº 10.304/2001
A transferência das terras para o Estado de Roraima teria se efetuado com a
edição Lei n.º 10.304/2001, revestida de eficácia desde o início de sua vigência e
com única finalidade de regularizar a posse já exercida pelo Estado.
c. Roraima será titular das terras somente após o cumprimento do Decreto
6.754/2009
Somente após o atendimento de todas as exigências contidas no Decreto
6.754/2009, dentre as quais o destaque das áreas que serão mantidas em nome da
União e o georreferenciamento, as terras serão de fato transferidas ao Estado de
Roraima.
9.1. Roraima é titular das terras desde a criação do Estado em 1988
42
Passaremos a considerar a hipótese de que o Estado de Roraima é o
proprietário das terras do seu território, desde sua criação, ocorrida com a
promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos do artigo 14 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias c/c o art. 15 da Lei Complementar 41/81.
Ao constituir o Estado Federado de Roraima (até então, mera autarquia
territorial da União), a Constituição Brasileira de 1988, no art. 14, §§ 1º e 2º do Ato
de suas Disposições Transitórias, estabeleceu que:
Art. 14. Os Territórios Federais de Roraima e do Amapá são transformados
em Estados Federados, mantidos seus atuais limites geográficos.
§ 1º - A instalação dos Estados dar-se-á com a posse dos governadores
eleitos em 1990.
§ 2º - Aplicam-se à transformação e instalação dos Estados de Roraima e
Amapá as normas e critérios seguidos na criação do Estado de Rondônia,
respeitado o disposto na Constituição e neste Ato.
A própria Constituição que transformou o Território Federal de Roraima em
Estado membro da Federação brasileira, determinou a aplicação ao novo Estado
das normas da LC 41/81 que criou o Estado de Rondônia. No que se refere ao
patrimônio, dispõe o art. 15 da referida lei que:
Art. 15 - Ficam transferidos ao Estado de Rondônia o domínio, a posse e a
administração dos seguintes bens móveis e imóveis:
I - os que atualmente pertencem ao Território Federal de Rondônia;
Il - os efetivamente utilizados pela Administração do Território Federal de
Rondônia;
Ill - rendas, direitos e obrigações decorrentes dos bens especificados nos
incisos I e II, bem como os relativos aos convênios, contratos e ajustes
firmados pela União, no interesse do Território Federal de Rondônia.
Para alguns autores a criação do Estado pela própria Carta Magna, por si só,
já teria o condão de transferir o patrimônio pertencente ao Território ao novo Estado
Federado, por força do § 2º do art. 14 do ADCT combinado com o artigo 15 da LC
41/81.
Pela análise do inciso I do art. 15 da LC 41/81 depreende-se que todos os
bens do domínio terrestre compreendidos no espaço geográfico do Território Federal
de Rondônia passaram para o Estado quando de sua criação. Se isso é válido para
o Estado de Rondônia, também o é para o Estado de Roraima, obedecendo ao
princípio da simetria e em atendimento ao dispositivo constitucional que ordena a
aplicação aos Estados criados pela CF/88 (Amapá e Roraima) das normas e critérios
seguidos na criação daquele Estado. Dentre esses bens imóveis estão
43
compreendidas as terras devolutas que, excetuando-se aquelas que pertencem a
União (nos termos do art. 20, II da CF), passaram a pertencer ao novo Estado as
demais terras devolutas, pelo que dispõe o artigo 26, IV (in verbis):
Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:
(...)
IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União.
Conforme LOBO (2009)13 “quer por força do artigo 14 do ADCT combinado
com o art. 15, I, da LC 41/81, quer por força desse dispositivo constitucional, as
terras devolutas do antigo território passaram ao novo Estado, no mesmo momento
de sua criação.” Ressalvadas, logicamente, aquelas terras devolutas que são
juridicamente inclusas como bens da União (art. 20, II da CF/1988).
Ainda para essa autora, não haveria necessidade de qualquer outra
providência legal – a não ser atos burocráticos e registrais diligenciados pelo próprio
Estado – para que os referidos bens, pertencentes ao antigo território, passassem
ao domínio da nova unidade federada.
Por esse entendimento, foi transferido ao Estado de Roraima, no mesmo
passo, a porção geográfica do território nacional outrora pertencente à autarquia
política extinta mediante transformação, com todos os bens que a integravam.
Em outras palavras, as glebas matriculadas em nome da União Federal
passaram a integrar o patrimônio do Estado de Roraima, desde sua criação, nos
termos do art. 14, § 2º, do Ato das Disposições Transitórias da Constituição
Federal de 1988, e da Lei Complementar n. 41/1981, que criou o Estado de
Rondônia.
Esse também foi o entendimento do Estado de Roraima, conforme
contestação oferecida na AMS 1364 RR14, julgada em 2006 pelo TRF da 1ª região:
13
LOBO, Ellen Regina. Roraima, a questão fundiária e a evolução de seu desenvolvimento. Boa
Vista: Editora da UFRR, 2009.
14
Trata-se de MS 1999.42.00.001364-9/RR, no qual o Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária – INCRA, impetrou a presente ação constitucional, com pedido de liminar, visando: o bloqueio
por parte da 2ª Autoridade- Impetrada, Oficial do Cartório de Imóveis de Caracaraí-RR das matrículas
das glebas situadas no Estado de Roraima; vedando-se, também, novos registros ou averbações
oriundas de processo de arrecadação sumária; bem como a abstenção da 1ª autoridade-impetrada,
presidente do Instituto de Terras do Estado de Roraima – ITERAIMA da pretensão de titulação ou
novos registros nas matrículas das glebas indicadas.
44
(...) No mérito, ratifica a contestação, argumentando que a pretensão do
INCRA esbarra em ato soberano, de natureza constitucional originária, que
transferiu os bens discutidos, da União Federal ao novel Estado de
Roraima. Assevera que tais bens foram trespassados ao domínio do Estado
de Roraima, ora Apelante, por força do disposto no art. 14, §2º, do
ADCT/88, c/c art. 15, incisos I e II, da Lei complementar nº 41/81, para que
a mesma base física do ex-Território Federal de Roraima se transformasse
na base física do novo Estado Federado.
45
Figura 06: Divisão do Estado de Roraima em Glebas. Fonte: Governo de Roraima.
Nesse diapasão, temos ainda a ACO 943 RR, julgada em 2012, cujo trecho
transcrevemos abaixo:
46
(...) As glebas relacionadas pelo impetrante na petição inicial pertencem ao
Estado de Roraima, por força do disposto no art. 14, § 2º, do ADCT, c/c
art. 15, I e II, da LC n. 41/81. Para tanto, ressalta que os bens imóveis
pertencentes e/ou utilizados pela administração do extinto Território Federal
de Roraima estavam registrados em nome da União, consoante o
determinado pelo Decreto-lei n. 5.812/43, quando houve a promulgação
da Constituição Federal de 1988, momento no qual tais bens foram lhe
transferidos para que compusessem a sua base física. Ressalte-se,
também, que as terras devolutas pertencentes à União somente seriam
aquelas que se amoldam ao previsto pelo art. 20, II, razão por que as
glebas discutidas seriam terras devolutas do estado de Roraima, consoante
o disposto pelo art. 26, IV, da Constituição Federal de 1988. A aquisição do
domínio dos imóveis, nos termos dos dispositivos constitucionais, é ato
jurídico perfeito que tornou, portanto, desnecessário ato de transferência
formal de domínio da União ao Estado de Roraima. (STF - ACO: 943 RR,
Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 13/11/2012, Data
de Publicação: DJe-228 DIVULG 20/11/2012 PUBLIC 21/11/2012)
Porém, o entendimento do STF nesse mesmo julgado (ACO 943 RR) é que
“na verdade, a transformação do ex-Território Federal de Roraima em Estado
Federado não teve o condão de transferir para este os imóveis à época pertencentes
à União Federal”.
9.2. Roraima é titular das terras a partir da edição da Lei nº 10.304/2001
Como já dito anteriormente, houve interpretações no sentido de que foram
transferidas para o Estado as terras que pertenciam ao ex-Território Federal de Roraima,
tendo amparo constitucional nos termos do § 2º do artigo 14 do ADCT c/c os incisos I e
II do art. 15 da LC 41/1981.
Por outro lado, esse não foi o entendimento dos nossos legisladores. Como
não houve a transferência automática das terras da União ao Estado de Roraima
quando de sua criação, iniciou-se uma série de tentativas para regularizar as terras
estaduais, que culminou com a edição da Lei n.º 10.304/2001 (transcrita abaixo),
cuja epígrafe traz como finalidade transferir ao domínio dos Estados de Roraima e
do Amapá15 terras pertencentes à União.
15
A redação original da Lei 10.304/01 tratava apenas da transferência de terras da União ao Estado
de Roraima. Nova redação foi dada por meio da Lei 11.949/09, que incluiu também nesse processo
de transferência o Estado do Amapá. Assim, a Lei 10.304 passou a ter seguinte ementa: “Transfere
47
o
Art. 1 As terras pertencentes à União compreendidas nos Estados de
Roraima e do Amapá passam ao domínio desses Estados, mantidos os
seus atuais limites e confrontações, nos termos do art. 14 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias. (Redação dada pela Lei nº 11.949,
de 2009)
o
Art. 2 São excluídas da transferência de que trata esta Lei: (Redação
dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
I – as áreas relacionadas nos incisos II a XI do art. 20 da Constituição
Federal; (Redação dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
II – as terras destinadas ou em processo de destinação pela União a
projetos de assentamento; (Redação dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
III – as áreas de unidades de conservação já instituídas pela União e
aquelas em processo de instituição, conforme regulamento; (Redação dada
pela Lei nº 11.949, de 2009)
IV – as áreas afetadas, de modo expresso ou tácito, a uso público comum
ou especial; (Redação dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
V – as áreas destinadas a uso especial do Ministério da Defesa; e (Redação
dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
VI – as áreas objeto de títulos expedidos pela União que não tenham sido
extintos por descumprimento de cláusula resolutória. (Redação dada pela
Lei nº 11.949, de 2009)
o
Art. 3 As terras transferidas ao domínio dos Estados de Roraima e do
Amapá deverão ser preferencialmente utilizadas em atividades agrícolas
diversificadas, de conservação ambiental e desenvolvimento sustentável, de
assentamento, de colonização e de regularização fundiária, podendo ser
o
adotado o regime de concessão de uso previsto no Decreto-Lei n 271, de
28 de fevereiro de 1967. (Redação dada pela Lei nº 11.949, de 2009)
o
§ 1 A aquisição ou o arrendamento de lotes por estrangeiros obedecerá os
limites, condições e restrições estabelecidos na legislação federal.
o
§ 2 (VETADO)
o
Art. 4 O Poder Executivo regulamentará esta Lei. (Redação dada pela Lei
nº 11.949, de 2009)
o
Art. 5 (VETADO)
A Lei n.º 10.304/2001, antes da nova redação dada pela Lei nº 11.9149/2009,
previa sua regulamentação no prazo de 180 (cento e oitenta dias). Para o TRF da 1ª
Região em decisão proferida no Agravo de Instrumento 2006.01.00.033037-3/RR “o
que depende de regulamentação são as exceções previstas no art. 2º e não a regra
geral prevista no artigo 1º da referida lei, pelo qual as terras pertencentes à União
passam ao domínio do Estado de Roraima.”
Coadunando com o entendimento de que enquanto não sobreviesse decreto
regulamentador restringindo seu espectro, mediante a definição de exceções nos moldes do
artigo 2º, a norma do artigo 1º teria eficácia plena, o Estado de Roraima providenciou junto
ao Cartório de Registro de Imóveis local a transferência do domínio, com a alteração das
matrículas, de algumas glebas pertencentes à União. Esse ato resultou no MS
ao domínio dos Estados de Roraima e do Amapá terras pertencentes à União e dá outras
providências”.
48
1999.42.00.001364-9/RR, impetrado pelo INCRA, que ao final obteve, em caráter
definitivo, a decretação da nulidade e cancelamento de todos os atos, registros ou
averbações efetuados em nome do Estado de Roraima nas matrículas das glebas
elencadas.
Porém, em decorrência do conflito de interesses entre o INCRA e o Estado de
Roraima, a competência foi declinada ao STF:
PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DO STF. CONFLITO ENTRE O
INCRA E O ESTADO DE RORAIMA ACERCA DE DOMÍNIO DE TERRAS
PERTENCENTES À UNIÃO. 1. Como a questão que se pretende discutir no
mandado de segurança é se as terras devolutas da União Federal podiam
ter sido transferidas para o Estado de Roraima, como o foram, por meio do
ITERAIMA, antes de ter sido publicado o decreto federal que regulamentará
a Lei nº 10.304/01, é inegável que a competência para julgar a causa é do
Supremo Tribunal Federal, a teor do disposto no art. 102, I, f, da CF/88,
tendo em vista o evidente o conflito entre o Estado de Roraima e a própria
União, cujos interesses, no caso, são defendidos pelo INCRA. 2. Declinação
da competência para o excelso Supremo Tribunal Federal. (TRF-1 - AMS:
1364 RR 1999.42.00.001364-9, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL
SELENE MARIA DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 31/05/2006, QUINTA
TURMA, Data de Publicação: 29/06/2006 DJ p.70)
Em mais de uma oportunidade o Supremo Tribunal Federal entendeu que a
transformação do ex-Território Federal de Roraima em Estado Federado não o
autorizou a levar a efeito a transcrição das terras matriculadas em nome da União e,
como consequência, considerou ilegal e açodada a transferência, in continenti, das
glebas de titularidade da União ao Estado de Roraima, ex vi das Ações Civis
Originárias n.º 653, 768 e 943:
Eis a ementa do julgado na ACO 653:
MANDADO DE SEGURANÇA. GLEBAS PERTENCENTES À UNIÃO.
REGISTRO EM NOME DO ESTADO DE RORAIMA. LEI 10.304/2001.
AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO. 1. Dispondo a Lei 10.304/2001
estarem excluídas, da transferência ao Estado de Roraima, as terras
relacionadas nos incisos II, III, IV, VIII, IX e X do art. 20 da Constituição
Federal, e havendo expressa previsão de regulamentação no prazo de 180
dias, tem-se por antijurídico o precipitado registro das glebas em nome do
Estado-membro, antes mesmo de esgotado o referido prazo, e sem a
necessária e prévia identificação daquelas que serão mantidas em nome da
União. 2. Segurança concedida. (ACO 653, Relatora: Min. ELLEN GRACIE,
Tribunal Pleno, julgado em 18/11/2004, DJ 04-02-2005)
No julgamento da ACO 768, a Min. Ellen Gracie registrou em seu voto “colho
a manifestação do Ministério Público Federal, em parecer da lavra do
Subprocurador-Geral da República Dr. Flávio Giron, verbis:
(...) a transferência efetuada pelo Estado de Roraima, através do
ITERAIMA, deu-se em confronto com a Lei 10.304/01, visto que não ocorreu
49
a necessária e prévia delimitação das áreas destinadas ao domínio
exclusivo da União Federal. Houve precipitação do Estado de Roraima, uma
vez que o mesmo não aguardou o decurso do lapso temporal até que a
União estabelecesse quais as áreas que não poderiam ser objeto de
transferência.
(...) Todas as terras transferidas encontravam-se registradas em nome da
União Federal, em obediência às formalidades legais aplicáveis. Com a
transferência precipitada, o Estado de Roraima simplesmente não delimitou
quais as áreas de interesse da União, e quais as que apresentavam outros
fins de necessidade ou utilidade pública, e nem poderia fazê-lo, posto se
tratar de competência da própria esfera federal.
(...) Nesse caso, tantas e tão graves são as conseqüências, que se
apresenta indispensável a prévia regulamentação para, somente após,
serem transferidas as terras. Ademais, a iniciativa precipitada do Estado de
Roraima, termina, por fim, por violar o próprio artigo 20 do texto
constitucional, que estabelece os bens pertencentes à União. Portanto,
somente com a regulamentação da Lei 10.304/01, a ser efetuada pelo
Poder Executivo, se pode falar em transferência ao Estado de Roraima de
terras pertencentes à União Federal”.
Segundo o voto da Min. Ellen Gracie proferido nos autos da ACO 768 RR
(2005) “a expressa previsão de regulamentação no prazo de 180 dias é suficiente a
afastar a exegese pretendida pelos impetrados16 de que é imediata a eficácia da
norma (...). Assim, tenho por antijurídica a açodada iniciativa de registrar, em nome
do Estado de Roraima, na forma em que realizada, as glebas indicadas na inicial”.
Conforme decisão do STF no julgamento da ACO 774 RR/2005, tratando-se
da transferência das terras, “tantas e tão graves são as consequências, que se
apresenta indispensável a prévia regulamentação para, somente após, serem
transferidas as terras. Ademais, a iniciativa precipitada do Estado de Roraima,
termina, por fim, por violar o próprio artigo 20 do texto constitucional, que estabelece
os bens pertencentes à União. Portanto, somente com a regulamentação da
Lei 10.304/01, a ser efetuada pelo Poder Executivo, se pode falar em transferência
ao Estado de Roraima de terras pertencentes à União Federal”.
Passaram-se 8 (oito) anos para que a Lei 10.304/2001 fosse regulamentada,
com a edição do Decreto 6.754/2009. Não obstante termos uma lei que transfere ao
domínio do Estado de Roraima as terras pertencentes à União, e termos o seu
respectivo decreto regulamentador, a situação fundiária do Estado parece que a
cada dia torna-se mais complexa e indefinida, com solução indeterminada e sujeita a
desdobramentos políticos.
16
Trata-se de oposição ajuizada pelo Estado de Roraima na ação reivindicatória proposta pelo
Instituto Nacional de Colonização de Reforma Agrária (INCRA) contra Arilo Cláudio Dias (autos nº
2000.42.00.000539-6 - 1ª Vara Federal/RR)
50
9.3. Roraima será titular das terras somente após o cumprimento do Decreto
6.754/2009
Por quais motivos, passados mais de 25 anos da criação do Estado de
Roraima, o Estado ainda não detém o domínio da totalidade das terras que
compõem o seu próprio espaço político-geográfico? Quais são as barreiras que
precisam ser vencidas para que de fato o Estado tenha o domínio pleno de suas
terras?
Para buscarmos respostas a essas perguntas, precisamos analisar o Decreto
nº 6.754, de 28 de janeiro de 2009, que “Regulamenta a Lei n o 10.304, de 5 de
novembro de 2001, que dispõe sobre a transferência ao domínio do Estado de
Roraima de terras pertencentes à União, e dá outras providências.”:
o
Art 1 Ficam transferidas gratuitamente ao Estado de Roraima as terras
públicas federais situadas em seu território que estejam arrecadadas e
o
matriculadas em nome da União, em cumprimento ao disposto no art. 1 da
o
Lei n 10.304, de 5 de novembro de 2001.
o
§ 1 A transferência de que trata o caput será feita considerando:
I - a exclusão das áreas:
a) relacionadas nos incisos II a XI do art. 20 da Constituição;
b) destinadas ou em processo de destinação, pela União, a projetos de
assentamento;
c) de unidades de conservação já instituídas pela União;
d) das seguintes unidades de conservação em processo de instituição:
Reserva Extrativista Baixo Rio Branco Jauaperi, Florestal Nacional Jauaperi,
Unidade de Conservação Lavrados, ampliações do Parque Nacional Viruá e
da Estação Ecológica Maracá e as áreas destinadas à redefinição dos
limites da Reserva Florestal Parima e da Floresta Nacional Pirandirá;
e) afetadas, de modo expresso ou tácito, a uso público comum ou especial;
f) destinadas a uso especial do Ministério da Defesa; e
g) objeto de títulos expedidos pela União que não tenham sido extintos por
descumprimento de cláusula resolutória;
II - a preservação ambiental e uso sustentável da terra, em observância à
o
o
Lei n 9.985, de 18 de julho de 2000, e, no que couber, à Lei n 11.284, de 2
de março de 2006, sob pena de reversão automática ao patrimônio público
da União;
III - a observação dos requisitos impostos pela legislação referente às terras
localizadas na faixa de fronteira e sua aquisição por estrangeiros;
o
IV - o seu prévio georreferenciamento, conforme determina o § 4 do art.
o
176 da Lei n 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a expensas da respectiva
unidade da Federação; e
V - a priorização dos processos de regularização fundiária em tramitação no
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA.
o
§ 2 A instituição das unidades de conservação a que se refere a alínea “d”
o
do inciso I do § 1 será feita pela União após consulta ao Estado.
o
§ 3 A efetivação do registro em cartório da transferência de que trata o
caput será feita por glebas, logo após estas serem identificadas e
georreferenciadas, bem como destacadas as áreas excluídas.
o
Art. 2 As terras transferidas ao domínio do Estado de Roraima deverão ser
preferencialmente utilizadas em atividades de conservação ambiental e
desenvolvimento sustentável, de assentamento, colonização e de
51
regularização fundiária, podendo ser adotado o regime de concessão de
o
uso previsto no Decreto-Lei n 271, de 28 de fevereiro de 1967.
o
Art. 3 Os títulos estaduais de domínio destacados de área recebida por
força deste Decreto deverão ser previamente inseridos no Sistema Nacional
de Cadastro Rural - SNCR e conter o número de inscrição do Certificado de
o
Cadastro de Imóvel Rural - CCIR, nos termos da Lei n 10.267, de 28 de
agosto de 2001, seus regulamentos e normas complementares.
o
Art. 4 Poderão ser firmados termos de cooperação técnica e convênios, ou
outros instrumentos congêneres, entre a União e o Estado de Roraima, por
meio de seus respectivos órgãos de terras, com a finalidade de efetivar as
diligências necessárias à identificação e georreferenciamento das terras
o
transferidas, a fim de possibilitar o registro em cartório referido no § 3 do
o
art. 1 .
Parágrafo único. Os instrumentos a serem celebrados poderão, ainda,
prever a titulação conjunta, pelos órgãos de terras da União e do Estado de
Roraima, de ocupações que possam ser legitimadas e cujo processo de
regularização fundiária tenha sido iniciado pela União até a data da
publicação deste Decreto ou posteriormente pelo Estado de Roraima.
o
Art. 5 Para fins de registro no Cartório de Registro de Imóveis, o INCRA,
por meio de sua Superintendência Regional no Estado de Roraima,
observadas as disposições deste Decreto, expedirá termo de doação que
conterá o perímetro georreferenciado do imóvel, consideradas ainda as
o
o
condições do § 1 do art. 1 .
o
Art. 6 Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. (Brasília, 28
de janeiro de 2009; 188º da Independência e 121º da República).
Mesmo uma análise perfunctória do referido Decreto revela o modus operandi
da transferência de terras em questão. Dispõe o mencionado diploma legal estarem
excluídas da transferência todas as áreas pertencentes à União, tais como: os bens
da União (art. 20 da CF); as unidades de conservação federais instituídas ou em
processo de instituição; as áreas destinadas ou em processo de destinação a
projetos de assentamento; as áreas afetadas a uso comum ou especial ou à defesa
nacional. Todas essas áreas estão elencadas no elencadas no inciso I do § 1º do
art. 1º do Decreto.
Além da exclusão das áreas supracitadas, o Decreto nº 6.754/2009 traz ainda
outras condicionantes a serem consideradas, como a preservação ambiental e uso
sustentável da terra; a observação da legislação referente às terras localizadas na
faixa de fronteira e sua aquisição por estrangeiros; o prévio georreferenciamento
das áreas e a priorização dos processos de regularização fundiária em tramitação
Em suma, o Decreto nº 6.754/2009 diz quais terras não podem ser
transferidas e o que deve ser observado no processo, ou seja, visa definir a
operacionalidade do processo, como deve ocorrer a transferência.
Já vimos que a transformação do ex-Território Federal de Roraima em Estado
Federado não teve o condão de transferir para este os imóveis à época pertencentes
52
à União Federal. Em outras palavras, o Território Federal de Roraima não era titular
das glebas discutidas quando foi transformado em estado-membro.
As glebas foram arrecadadas pelo INCRA em nome da União. Vejamos o
texto extraído da ACO 943:
(...) os registros anteriores da propriedade dos imóveis foram feitas pela
União, representada pelo INCRA. Além disso, coube ao INCRA aferir a
extensão dos domínios da União e analisar extrajudicialmente o pleito para
que as terras em disputa fossem concedidas, a título gratuito, ao Estado de
Roraima.
Como as terras públicas federais situadas no território estadual foram
arrecadadas e matriculadas em nome da União, inobstante o artigo 1º do Decreto
6.754/2009 utilizar a expressão “ficam transferidas”, claro está que só haverá a
transferência plena das terras para o Estado, quando este ente federativo cumprir
integralmente todas as exigências impostas naquele diploma legal.
Até o final de 2013 o Estado de Roraima não conseguiu cumprir todas as
condicionantes do aludido Decreto, pelos mais variados fatores, tais como:
interpretações jurídicas diversas e até controversas dos seus artigos, falta de
recursos financeiros e de pessoal técnico disponível para gerar as peças técnicas e
documentos necessários, indefinição quanto a forma de georreferenciamento que
precisa ser realizado (se lote a lote ou georreferenciamento simplificado e “por
atacado”). E como se não bastasse essa celeuma técnico-burocrática, ainda há
ações e decisões judiciais no sentido de suspender o processo de titulação de
terras, por inconsistências técnicas e até mesmo descumprimento de normas legais.
Conforme o documento do Governo de Roraima – Plano de Desenvolvimento
Sustentável do Estado de Roraima/Plano Plurianual 2012-2015 (RORAIMA, 2011):
Essa inversão de domínio de terras, traduz-se em grande volume de
atividades a ser empreendido, a tarefa a ser cumprida, se desdobra em
diferentes frentes de trabalho relativas à adoção de procedimentos técnicos,
administrativos, jurídicos e ambientais concernentes ao Processo como um
todo: levantamento e identificação de perímetros de glebas; discriminatória
administrativa das áreas com perímetros definidos; efetivação de registros
cartorários de incorporação dessas áreas ao estoque de terras estadual e
parcelamento do solo com averbação de respectivas áreas de reserva legal
para fins de transferência de domínio aos beneficiários dos Programas e
Projetos de Regularização Fundiária no âmbito estadual.
O desafio de fazer implantar um processo fundiário em sua maior
concepção, sob o ponto de vista de que os atos deverão ser técnica e
juridicamente incontestáveis, remete à consciência de que somente
disponibilizando recursos próprios e buscando parcerias nas esferas de
Governo é que viabilizaremos a execução da complexa demanda de tarefas
a serem cumpridas na implantação de Projetos de Regularização Fundiária
com responsabilidade ambiental e que possa se refletir na valorização
53
social e na sustentabilidade do desenvolvimento rural capaz de elevar o
poder econômico do Estado de Roraima.
O desafio subjacente para o Estado reside na necessidade imperativa de
superarmos toda essa “complexa demanda de tarefas a serem cumpridas”, resultado
das condicionantes e exigências impostas pela Lei n.º 10.304/2001 e pelo Decreto
6.754/2009, tendo em vista assegurar a transferência de fato e de direito do
patrimônio fundiário que “já era constitucionalmente nosso”, para efeitos de realizar
registros de incorporação ao seu patrimônio imobiliário.
É exatamente isso o que IMPARATO & SAULE JR. (2007) descrevem no
trecho abaixo:
Somente a partir da demarcação é possível regularizar a ocupação dos
“imóveis presumidamente da União”. Uma vez discriminadas essas terras
ou outros bens imóveis dominiais, o agente público federal, estadual ou
municipal poderá locá-los, aforá-los ou cedê-los gratuitamente para seu uso,
se considerar relevante a ocupação que está sendo dada ao imóvel.
Diante do exposto, parece que não há mais o que se discutir. O Estado de
Roraima foi criado pela Constituição de 1988, as terras matriculadas em nome da
União (por conta do Território Federal de Roraima), não passaram automaticamente
ao domínio do Estado. Em decorrência disso, foi editada uma lei específica de
transferência de terras, a Lei nº 10.304/2001, que não foi regulamentada no tempo
previsto no seu texto original. O Estado de Roraima, na ânsia de resolver a questão
fundiária, começou a realizar a transferência de terras, o que ocasionou várias
demandas judiciais que determinaram o cancelamento dos registros concedidos
precipitadamente pelo Estado. Por fim, a Lei nº 10.304/2001 foi regulamentada pelo
Decreto nº 6.754/2009, que em seu bojo trouxe uma série de requisitos e
condicionantes para a destinação das terras.
A atual situação fundiária do Estado nos demonstra que as terras em questão
só passarão ao patrimônio imobiliário estadual, após cumpridas todas as exigências
dispostas no Decreto nº 6.754/2009, o que exige cooperação efetiva entre União e
Estado.
10. RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS: UNIÃO E ESTADO DE RORAIMA
Considerando a existência de um conflito territorial entre a União e o Estado
de Roraima, precisamos analisar a questão da harmonia federativa, especialmente
no que diz respeito ao federalismo cooperativo, ao pacto federativo e a competência
legislativa.
54
10.1. A questão do federalismo
O Brasil é uma República Federativa, na dicção expressa do art. 1º da
Constituição de 1988:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)
Tal preceito federativo é complementado pelo art. 18, no qual se explicita que
a organização político-administrativa do nosso País compreende a União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos em que
estabelecido no texto constitucional.
Na lição de LUIS ROBERTO BARROSO (2006, p.141 e 142) Federação
traduz a forma de Estado, o modo como se reparte o poder político no âmbito do
território, e tem por pressuposto a descentralização política. O autor reforça
afirmando que do federalismo clássico17 resulta “a existência de duas ordens
jurídicas: a federal, titularizada pela União, e a federada (ou estadual), na qual cada
estado-membro exerce sua autonomia, isto é sua capacidade de auto-organização,
autogoverno e autoadministração nos limites definidos na Constituição.
Nesse sentido, leciona CASTRO18 (2010, p. 21) que “a autonomia pressupõe
aptidão para se governar livremente, poder de fazer as leis e a capacidade para se
determinar órgãos de representação. A noção de autonomia é noção de limites”.
Porém a motivação que levou à formação da federação brasileira, segundo
ABRUCIO e COSTA (1998) citado por VASCONCELOS (2013) foi o sentimento da
autonomia dos Estados.
Como bem destaca VASCONCELOS (2013) “o sentimento da autonomia, no
entanto, não levou em consideração as diferenças regionais, de forma que a
implantação da Federação ocorreu de forma simétrica, sem adotar assimetrias como
forma de garantir a igualdade material entre os entes federados”. Nesse sentido,
observa OLIVEIRA (2012, p. 156):
Desde o início, a Federação brasileira não figurou como estrutura apta a
propiciar o desenvolvimento do país como um todo, tampouco conseguiu o
regime federativo atender às unidades autônomas de modo igualitário, de
17
Para BARROSO (2006) no caso brasileiro reconhece-se ainda um terceiro nível de poder,
representado pelos Municípios, igualmente investidos de autonomia pela Carta de 1988 (arts. 18, 29
e 30)
18
CASTRO, José Nilo de. Direito Municipal Positivo. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010
55
modo a propiciar todas as regiões os cuidados precisos para assegurar à
diversidade sempre marcante. A premissa de que as partes do Estado
federal gozavam de idênticos níveis de desenvolvimento foi
equivocadamente adotada e, assim, a todas foram distribuídas a mesma
parcela de poder, de competência e de tributos. Não se computou, sob
nenhum quadrante, os desníveis relativos à população, ao território e à
riqueza de cada componente que iria integrar a estrutura federal.
Quanto ao modo de separação de competências entre os entes que compõe
a federação, temos duas espécies de federalismo: o federalismo cooperativo e o
federalismo dual19.
De acordo com PAULO E ALEXANDRINO (2010) “o federalismo cooperativo
é caracterizado por uma divisão não rígida de competências entre a entidade central
e os demais entes federados. É o caso, por exemplo, da Federação brasileira.
Conforme COELHO (2013)20 “a ideia generosa do federalismo cooperativo
esconde um federalismo autoritário e uma hipertrofia inegável da união. O nosso
federalismo está em crise. Há uma crise axiológica do significado de federação,
cooperação, convivência de estados irmãos.”
Por diversas vezes na história da nossa Federação, constatamos um
“federalismo puramente nominal e semântico”, na expressão de RAUL MACHADO
HORTA, citado por PEREIRA21 (2010). O autor continua afirmando que
“praticamente foi sepultada a autonomia constitucional estadual, na qual se
assentam as Constituições dos Estados-Membros, que por meio delas se
completam, de acordo com a “verdadeira doutrina que explica a natureza do Estadomembro” no federalismo”.
Segundo a opinião do Min. OSWALDO TRIGUEIRO, citado por PEREIRA
(2010) há um processo de enfraquecimento do federalismo brasileiro, com a
federação profundamente combalida, não sendo mais que uma sombra do regime
sonhado pelos federalistas clássicos.
Essa crise do federalismo cria um clima de instabilidade e desconfiança entre
os entes federativos. No caso de Roraima, põe-se em jogo a sua autonomia e a sua
19
Segundo PAULO E ALEXANDRINO (2010) o federalismo dual é identificado por uma rígida
separação de competências entre a entidade central (União) e os demais entes federados, como é o
caso dos Estados Unidos.
20
Sacha Calmon Navarro Coelho, membro da Academia Brasileira de Direito Tributário, na palestra
acerca do "Federalismo fiscal cooperativo e o papel do Senado na fixação de alíquotas
interestaduais" no XIII Congresso Brasileiro de Direito do Estado – maio/2013 – BA. Disponível em:
http://www.direitodoestado.com.br/noticias.
21
PEREIRA, José Edgard Penna Amorim. Perfis Constitucionais das Terras Devolutas.
56
liberdade, seja no sentido de gerir seu próprio território ou de instituir o marco
normativo da regularização fundiária de suas terras.
De acordo com BRAGA22, “fatores reais de poder, especialmente agentes
políticos da União, de algum modo, tentam impedir a viabilização política e o
desenvolvimento econômico-social deste Estado”.
10.2. Conflito no Pacto Federativo
Em termos institucionais, o Federalismo origina-se de um pacto, que “redunda
na criação de um novo ente, o governo Federal, e na confecção de um contrato
fiador desta união, a Constituição” (ABRUCIO, 2001 apud VASCONCELOS, 2013).
Assim, concebe-se o federalismo como pacto, cujas questões institucionais se
encontram em uma matriz que reflete o quadro de competências de cada ente
federado e as relações intergovernamentais são as linhas nervais do sistema.
O federalismo como pacto busca sua justificação no próprio texto
constitucional. LIJPHART citado por VASCONCELOS (2013) ressalta essa ideia:
A existência de uma Constituição escrita deriva logicamente do princípio
essencial do federalismo, a divisão do poder, tem que ser especificada, pois
tanto o governo central como os regionais precisam de uma firme garantia
de que os poderes que lhes forem atribuídos não lhes podem ser retirados.
Há que se destacar que somente a formação do pacto, com a inclusão dos
princípios federativos no texto constitucional não são suficientes. É importante
também fortalecer a autonomia dos entes federados e sua interdependência.
Para VASCONCELOS (2013) “a autonomia é limitada pela própria
Constituição, por meio das competências outorgadas a cada ente federado, o que
impede a avocação de poder pelo governo central. A interdependência, por sua vez,
é decorrente das constantes negociações praticadas entre os entes federados,
sobretudo em matérias cuja competência é comum a todos os entes”. Vejamos o
que diz ABRUCIO (2001) citado por VASCONCELOS (2013):
A interdependência, por sua vez, reflete a necessidade de reforçar os laços
federativos, a fim de evitar que eles se afrouxem ou tornem-se um meio de
instituir jogos de cabo de guerra. (grifo nosso)
22
Procurador Imobiliário do Estado em matéria veiculada na Folha de Boa Vista no dia 02/10/2013
57
Dessa forma, a existência simultânea de autonomia e de interdependência
entre os entes federados, além de garantir a não centralização do poder, evitaria a
instituição desses “jogos de cabo de guerra”.
ELAZAR (1993) citado por VASCONCELOS (2013) conclui que “qualquer
sistema federal, para ser bem sucedido, deve desenvolver um equilíbrio adequado
entre a cooperação e a competição, e entre o governo central e seus componentes”.
Uma vez que o Território Federal de Roraima foi criado em 1943, pelo
Decreto Lei nº 5.812 e transformado em Estado com a promulgação da Constituição
Federal em 1988, precisamos rever como as Constituições anteriores à nossa atual
Carta Magna, mais precisamente as Constituições de 1937, de 1967 e de 1969
tratavam o território e sua relação com o poder central – a União – pois essa relação
reflete-se até nos nossos dias.
A Constituição de 1937 trouxe no seu art. 4º a previsão de criação de
Territórios Federais em razão de interesse da defesa nacional, com atuação direta
da União.
Os artigos 3 e 4 da CF/1937 estabeleciam que os Territórios Federais eram
entidades constitutivas do Estado Federal e eram administrados pela União. Desse
modo, não havia autonomia política nos Territórios Federais, apenas administração
da União. Isto significava centralização política e administrativa, na qual o Território
ficava vinculado diretamente à União.
O Decreto-lei nº 411/1969 (08/01/1969), que dispôs sobre a administração
dos territórios federais, conceitua como território as “unidades administrativas
descentralizadas da Administração Federal, com autonomia administrativa e
financeira, equiparados para os efeitos legais, aos órgãos de administração indireta”
(art. 3º).
Vale lembrar que até o ano de 1988, vigorava a Constituição de 1969.
Segundo PAULO & ALEXANDRINO (2010) na vigência da Constituição de 1969, os
Territórios Federais eram considerados entes federativos. De fato, dispunha a
pretérita constituição Federal que a República Federativa do Brasil era constituída
pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
Vejamos o que dispunha o art. 1º da CF/1969:
Art 1º - O Brasil é uma República Federativa, constituída sob o regime
representativo, pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e
dos Territórios.
58
Não obstante os Territórios Federais serem identificados como entidades da
federação, sua organização político-administrativa apoiava-se no modelo e no
contexto histórico, político e cultural do poder central.
A Constituição Federal de 1988 suprimiu os Territórios Federais como entes
federativos e outorgou essa qualidade aos Municípios.
Podemos inferir das constituições anteriores que o Território Federal de
Roraima integrou a estrutura federativa brasileira durante 45 anos, desde sua
criação em 1943 até sua estadualização em 1988. E que com a ascensão do
Território à categoria de Estado, a União deveria estimular e possibilitar seu
desenvolvimento econômico, social, político e administrativo.
No entanto, especialmente no que se refere à transferência de titularidade do
domínio das terras, o que há é um conflito de interesses entre União e Estado,
quando deveria haver cooperação entre esses entes, atuando conjuntamente no
processo
de
regularização
fundiária
estadual,
condição
precípua
ao
desenvolvimento social, econômico e ambiental do Estado.
Do pacto federativo, deprende-se que os entes que constituem o Estado
Federal são todos autônomos, conforme se infere do art. 1º c/c o art. 18 e iguais
conforme o princípio da isonomia estabelecido no art. 19, III, todos da nossa Carta
Magna.
Mas o que se percebe, na prática, é que a União ainda mantém uma
ingerência forte sobre os ex-territórios, especialmente sobre Roraima. A polêmica
que surge é se: nesse processo de transferência de terras para o Estado, o
problema não seria de ordem meramente política, por meio de uma exagerada
intervenção da União sobre o referido Estado?
Por sua vez, a falta de domínio de suas terras constrange o Estado a uma
estagnação
econômica,
inviabilizando
qualquer
forma
de
planejamento
e
implantação de programas de ocupação e crescimento econômico ambientalmente
sustentável e acesso a políticas públicas que estão à disposição, mas que esbarram
na ausência de uma definição da titularidade dessas terras públicas.
10.3. Competência para legislar sobre Política Fundiária
59
A propósito da repartição de competências federativas, SILVA 23 (1990)
informa que:
“... A Constituição de 1988 estruturou um sistema que combina
competências exclusivas, privativas e principiológicas com competências
comuns e concorrentes, buscando reconstruir o sistema federativo segundo
critérios de equilíbrios ditados pela experiência histórica.”
Importa destacar no sistema de distribuição de competências entre a União
Federal e os Estados-membros, contidos na atual Constituição, aquelas que
interessam ao tema sob estudo.
Como estamos tratando da titularidade do domínio das terras e regularização
fundiária no Estado de Roraima, precisamos trazer à discussão sobre a competência
para legislar sobre politica fundiária.
A Constituição do Estado de Roraima, aprovada em 1991, nos seus artigos
123 a 129, deu ao Estado a competência para legislar sobre politica fundiária e
agrícola. No seu art. 129 afirma a constituição estadual que o Estado promoveria
sua política fundiária através da criação de um Instituto de Terras, constituído na
forma da Lei.
Assim, em 1992, através da Lei nº 030 foi criado o Instituto de Terras e
Colonização de Roraima (ITERAIMA), com a “finalidade de executar a política
fundiária do Estado, investido de poderes de representação para promover a
discriminação, arrecadação e regularização das terras públicas e devolutas do
Estado ou aquelas transferidas da União, por força da lei, ou incorporadas por
qualquer meio legal ao Patrimônio Estadual, bem como a normatização de áreas
urbanas e rurais, de domínio e posse do Estado (art. 4º).”
A questão da propriedade pública é também objeto do Direito Administrativo.
Ora, os bens imóveis são bens públicos, matéria administrativa por excelência.
Conforme lição de MANSOS NETO (s.d):
[...] as regras jurídicas aplicáveis às concessões de terras dos Estados têm
natureza de direito administrativo, porque se inserem no poder de gestão
própria de bens públicos estaduais, se assim não fosse faleceria
competência legislativa e administrativa ao Estado para expedir atos
administrativos de concessão de terras (títulos de terras) e se estaria diante
de monumental inconstitucionalidade formal e material.
Em consonância com o equilíbrio do sistema federalista no aspecto da
autogestão territorial do Estado–Membro, este tem competência para legislar sobre
23
SILVA, Jose Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.
60
a politica fundiária. Assim sendo, as terras transferidas por meio da Lei nº
10.304/2001, na condição de plenamente incorporadas ao patrimônio imobiliário
estadual, sujeitam-se ao regime jurídico administrativo de gestão de bens públicos.
Nesse sentido, o Estado de Roraima editou a Lei nº 738, de 10 de setembro
de 2009 que dispõe sobre a Política Fundiária Rural do Estado de Roraima. Vale
lembrar que essa lei foi editada após a autorização da doação de mais de 6 milhões
de hectares de terras públicas da União ao Estado de Roraima por meio da Lei
Federal nº 10.304/2001 (com nova redação dada pela Lei nº 11.949/2009).
Ratificamos que somente após a publicação da Lei nº 10.304/2001 que dispôs
sobre a transferência ao domínio do Estado de Roraima de terras pertencentes à
União e do Decreto 6.754/2009, que regulamentou a Lei nº 10.304/2001, o Estado
editou a Lei nº 738/2009, dispondo sobre sua política fundiária rural.
Dispõe o artigo 1º da Lei nº 738/200924:
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a política fundiária rural do Estado de Roraima,
promovendo medidas que permitam a utilização racional e econômica das
terras públicas rurais, assegurando a todos os que nelas habitam e
trabalham a oportunidade de acesso à propriedade, a fim de atender aos
princípios da justiça social, do desenvolvimento agropecuário e da função
social da propriedade. (Original sem grifo)
O Procurador-Geral da República (PGR) ajuizou no STF a ADI 5006 com
pedido de medida cautelar, pedindo a suspensão da eficácia da Lei 738/2009, que
dispõe sobre a política fundiária rural e, ao final, solicita a procedência do pedido a
fim de que seja declarada a inconstitucionalidade da norma roraimense.
Segue a Ementa da ADI 5006:
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida
cautelar, ajuizada pelo Procurador-Geral da República em face da Lei 738,
de 10 de setembro de 2009, do Estado de Roraima, que dispõe sobre a
política fundiária rural estadual. Sustenta, em síntese, a autora: “3. A Lei
roraimense 738/2009 foi editada após a autorização da doação de mais de
6 milhões de hectares de terras públicas da União ao Estado de Roraima
por meio da Lei federal 11.949/2009, em decorrência da disputa política
relacionada à demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. 4.
Ocorre que o diploma estadual impugnado, ao estabelecer normas
24
O Projeto de Lei s/nº de 17 de outubro de 2013, publicado no DOE de 21/10/2013, alterou vários
artigos da Lei nº 738/2009. O artigo 1º passou a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1º. Esta Lei dispõe sobre política de regularização fundiária rural das ocupações incidentes em
terras de domínio do Estado de Roraima, situadas em seu território, mediante alienação, doação e
concessão de direito real de uso de imóveis, promovendo medidas que permitam a utilização racional
e econômica das terras públicas rurais, assegurando a todos os que nelas habitam e trabalham a
oportunidade de acesso à propriedade, a fim de atender aos princípios da justiça social, do
desenvolvimento agropecuário e da função social da propriedade.
61
destinadas à gerência das terras doadas, legislou sobre política fundiária
rural, disciplinando institutos de direito agrário, tais como: função social da
terra rural (art. 2º);terras públicas e devolutas (arts. 4º e 5º); processo
discriminatório de terras (arts. 6º a 10); destinação das terras públicas rurais
(arts. 14 a 22); regularização fundiária (arts. 23 a 48, 67 a 69, e 71); valor da
terra nua (arts. 49 a 54); e demarcação e georreferenciamento (arts. 55 a
59). 5. Tais artigos importam em usurpação da competência privativa da
União para legislar sobre direito agrário e normas gerais de licitação, bem
como violam os arts. 37, XXVII, e 188 da Constituição da República. Esse
vício acaba por contaminar os demais artigos da lei, que com aqueles
guardam relação dependência, razão por que sua inconstitucionalidade
deve ser declarada por arrastamento.” Em razão da relevância da matéria,
entendo que deva ser aplicado o procedimento abreviado do art. 12 da Lei
nº 9.868/99, a fim de que a decisão seja tomada em caráter definitivo.
Solicitem-se informações aos requeridos. Após, abra-se vista,
sucessivamente, no prazo de cinco dias, ao Advogado-Geral da União e ao
Procurador-Geral da República. Publique-se. Brasília, 2 de agosto de 2013.
Rel. Min Dias Toffoli (STF - ADI: 5006 RR , Relator: Min. DIAS TOFFOLI,
Data de Julgamento: 02/08/2013, Data de Publicação: DJe-152 DIVULG
06/08/2013 PUBLIC 07/08/2013)
Segundo PEREIRA (2010) quando do exercício de sua competência
legislativa para tratar da alienação e concessão das terras de sua propriedade,
legitimada pelos poderes reservados ínsitos à sua autonomia constitucional, devem
os Estados cuidar para não invadir a órbita privativa da União Federal.
Em artigo25 publicado sobre a questão da titulação de terras na Lei Estadual
nº 7.289/2009, MANSOS NETO, Procurador do Estado do Pará afirma que:
Assim, o poder de livre conformação do legislador estadual pode e deve
criar hipóteses específicas ou modelos legais peculiares de gestão de bens
públicos, desde que não haja violação da Constituição Federal e Estadual,
adaptando-os para a realidade paraense, em razão da inexistência de
similitude com a realidade em outros entes federados, tal poder encontra-se
amparado na autonomia legislativa e administrativa do Estado do Pará.
Outrossim, nada impede que em paralelo à atuação do Governo Federal na
reforma agrária na Amazônia, o Estado do Pará atue pro-ativamente na
equalização da questão fundiária, uma vez que a política de reforma agrária
vigente é deficiente e precária para resolver problemas de ordenação da
ocupação do território paraense, motivo que ocasiona sérios transtornos
para o Governo do Estado perante a opinião pública.
Para MANSOS NETO, o Estado somente é titular de terras em decorrência
das regras de direito administrativo e constitucional que atribuem à gestão dos bens
públicos dentro do poder de auto legislação e autonomia dos entes federados; assim
como decorrente do poder constituinte derivado que adjudicam ao Estado Membro o
poder de legislar sobre direito administrativo (bens públicos).
25
MANSOS NETO, Flávio Luiz Rabelo. A regularização fundiária na Amazônia Legal: fundamentos do
direito de preferência na Lei Estadual nº 7.289/2009 e na lei Federal nº 11.952/2009. Disponível em:
http://www.pge.pa.gov.br/
62
Por analogia e na esteira do entendimento de MANSOS NETO (s.d),
concordamos que o Estado de Roraima “possui livre conformação legislativa para
delinear a gestão dos bens públicos que integram seu patrimônio, indicando qual é o
procedimento administrativo adequado à realidade regional que melhor convém ao
interesse da sociedade” roraimense.
10.4. Necessidade de cooperação entre a União e o Estado de Roraima
Se no âmbito do pacto federativo, que se encontra envolvido no manto da
rigidez constitucional, a interpretação do federalismo brasileiro é problemática, a
questão torna-se ainda mais conflituosa quando analisada sob o enfoque das
relações intergovernamentais. Isso porque os laços federativos brasileiros são
frágeis, sobretudo em razão dos interesses políticos que balizaram a formação da
federação e sobre ela exercem relevante poder.
A todos os entes federados compete, em comum, a prática de atos que, entre
outros visem à conservação do patrimônio público, à proteção das paisagens
naturais notáveis, dos sítios arqueológicos e do meio ambiente; à preservação das
florestas, da fauna e da flora; ao fomento da produção agropecuária, à organização
do abastecimento alimentar e ao combate das causas da pobreza e dos fatores de
marginalização,
mediante
a
promoção
da
integração
social
dos
setores
desfavorecidos (art. 23, incisos I, III, VI, VII, VIII e X da Constituição Federal).
Destacamos apenas alguns incisos do art. 23 da nossa Carta Magna, porque
estes guardam relação direta com a questão das terras públicas e dizem respeito a
importância da definição plena da titularidade do domínio das terras no Estado de
Roraima. Porém essa transferência de domínio entre os entes públicos (União e
Estado) só será possível se houver uma cooperação politica, técnica e
administrativa, visando o bem maior, que é o interesse social pelo efetivo
desenvolvimento sócio, econômico e ambientalmente sustentável do nosso Estado.
Essa cooperação entre as diversas entidades federativas, por meio das
instituições federais e estaduais deve se concretizar segundo as normas fixadas na
legislação pertinente, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bemestar, inicialmente em âmbito local, mas produzindo efeitos em âmbito nacional, sob
a ótica de um federalismo sadio e próspero. Veja-se o paragrafo único do art. 23 da
Constituição:
63
Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação
entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em
vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito
nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
Segundo VASCONCELOS (2013) para que haja equilíbrio do sistema federal,
com garantia da igualdade entre os entes federados, é imprescindível a “aplicação
dos princípios constitucionais e das diretrizes federativas consolidadas no pacto
celebrado entre os atores envolvidos. Deve-se, ademais, garantir o equilíbrio de
cooperação e competição, necessário para potencializar os aspectos inerentes ao
federalismo, sobretudo a acomodação da diversidade na unidade, com a
preservação de autonomia e a igualdade entre os entes federados”.
Coadunando com o entendimento do autor supracitado, reforçamos que para
o alcance do equilíbrio federativo, não pode haver sobreposição de interesses de um
ente sobre o outro (União sobre Estado de Roraima) e sim cooperação. Somente o
respeito à autonomia e à isonomia garante a independência no exercício das
atribuições que competem a cada um dos entes e a possibilidade das relações
intergovernamentais serem executadas em condição de igualdade.
Aqueles envolvidos nesse processo desenvolvem trocas mútuas, as quais
criam, também, novas estruturas e novos processos. Essas relações são
orientadas pelas políticas públicas e centradas na solução de problemas
decorrentes de sua implementação. A partir dessa abordagem, conflitos
entre níveis de governo não são vistos simplesmente como uma disputa
entre eles, mas como uma das várias formas possíveis de articulação entre
essas esferas e da convivência entre estruturas (esferas governamentais) e
processos (formulação e implementação de políticas públicas).
64
11. CONCLUSÃO
Pouco se tem escrito sobre a Lei n.º 10.304/2001, que dispõe sobre a
transferência ao domínio do Estado de Roraima de terras pertencentes à União.
A institucionalização da base territorial do Estado de Roraima, que deverá
compor seu patrimônio imobiliário, não está concluída pela incompreensão, desde a
leitura do Art. 14 do ADCT, passando por uma leitura imperfeita da Lei n.º 10.304/01,
culminando numa leitura incompleta do Decreto n.º 6.754/09. É fato que todo o
regramento já está totalmente posto.
Como foi exposto, a legislação em questão – Lei nº 10.304/2001 e sua
aplicação - é objeto de inúmeros questionamentos, resultando em demandas
judiciais por conta de um entendimento divergente dos dispositivos da lei, seja entre
os operadores do direito e até entre os gestores públicos e técnicos que estão
incumbidos de realizar todos os atos técnicos e administrativos necessários à efetiva
transferência de terras ao Estado de Roraima.
Objetivamente, esse processo de transferência não pode ser paralisado, sob
pena de nunca ser concluído. Isso significa, por consequência, a necessidade de se
equacionar adequadamente o imbróglio da indefinição de titularidade de suas terras,
que perdura quase que secularmente em relação aos direitos de propriedade e a
consequente impossibilidade de se promover a regularização fundiária, tanto rural
quanto urbana, condição indispensável para que o Estado finalmente consiga
alavancar sua economia e proporcionar crescimento social e regional.
Assim, o Estado de Roraima deverá cumprir todas as exigências impostas
pelo
Decreto
6.754/2009,
dentre
os
quais
concluir
o
processo
de
georreferenciamento das áreas destacadas de propriedade da União, com a
certificação pelo INCRA dos respectivos destaques, por glebas e, posteriormente,
prosseguir no processo de titulação das glebas georreferenciadas e certificadas.
Coadunamos com o entendimento de que ninguém, de sã consciência e
comprometido com o presente e o futuro do Estado e da sociedade de Roraima
pode se opor à sua institucionalização material e autonomia político-fundiária como
ente da Federação.
65
12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANTES, Emerson Clayton. Regulação fundiária e direito de propriedade na
Amazônia Legal: Um estudo de caso do estado de Roraima (1988-2008). Porto
Alegre, 2009. Dissertação de Mestrado. Mestrado Interinstitucional em Economia,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) / Universidade Federal de
Roraima (UFRR), com ênfase em Desenvolvimento e Integração Econômica.
Disponível
em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/18848/000729335.pdf?sequence=
1>. Acesso em: 06 de janeiro de 2013.
ASSUNÇÃO, Lutero Xavier. Direito Fundiário Brasileiro. Bauru, SP: EDIPRO,
2008.
BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002. Tomo I.
BRASIL. Decreto-Lei nº 5.812, de 13 de setembro de 1943. Cria os Territórios
Federais do Amapá, do Rio Branco, do Guaporé, de Ponta Porã e do Iguassú.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/19371946/Del5812.htm>. Acesso em: 18 dez. 2013.
BRASIL. Decreto nº 6.754 de 28 de janeiro de 2009. Regulamenta a Lei n° 10.304,
de 5 de novembro de 2001, que dispõe sobre a transferência ao domínio do Estado
de Roraima de terras pertencentes à união, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6754.htm>.
Acesso em: 07 nov. 2013.
BRASIL.
Lei
nº
601,
de
18
de
Setembro
de
1850.
Dispõe
sobre
as
terras
devolutas
do
Império.
Disponível
em:<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L0601-1850.htm>. Acesso em: 18 dez.
2013.
BRASIL. Lei n.º 10.304 de 05 de outubro de 2001. Transfere ao domínio dos
Estados de Roraima e do Amapá terras pertencentes à União e dá outras
providências.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10304.htm>. Acesso em: 29
nov. 2013.
BRASIL. Lei n.º 11.949 de 17 de junho de 2009. Dá nova redação à Lei no 10.304,
de 5 de novembro de 2001, que transfere ao domínio dos Estados de Roraima e do
Amapá as terras pertencentes à União e dá outras providências. Disponível
66
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11949.htm>.
Acesso em: 12 nov. 2013.
CASSETARI, Christiano. Direito Agrário. São Paulo: Atlas, 2012.
FREITAS, Aimberê. Geografia e História de Roraima. 4 ed. Editora Grafima:
Manaus/AM, 1996.
LOBO, Ellen Regina. Roraima, a questão fundiária e a evolução de seu
desenvolvimento. Boa Vista: Editora da UFRR, 2009.
MARQUES, Benedito Ferreira. Direito Agrário Brasileiro. 10. ed. rev. e ampl. São
Paulo: Atlas, 2012.
MELO, Marcelo Augusto Santana de. Breves anotações sobre o Registro de
Imóveis. Jus Navigandi, Teresina-PI, ano 9, nº. 429,
2004. Disponível
em: <http://jus.com.br/artigos/5669>. Acesso em: 17 dez. 2013
MENCK, José Theodoro Mascarenhas. Ocupação Territorial de Roraima.
Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira
da Câmara dos Deputados (ASLEGIS). Caderno ASLEGIS 34 - A Cidade. 2008 (p.
133-151).
Disponível
em:
<
http://www.aslegis.org.br/aslegisoriginal/images/stories/cadernos/2008/Caderno34/0
8revista34_ocupacaoterritorialderoraimap133-151.pdf>. Acesso em: 17 dez. 2013.
MENDES, Rodrigo Mendes; DALCOL, Júlio César. Lei N.º 10.267:
Georreferenciamento e sua aplicação prática. Revista Científica da Faculdade
Jaguariaíva/PR – FAJAR, Jaguariaíva, v.1, n. 8, Jan./Jun. 2009. Disponível em:
<http://www.fajar.edu.br/site/images/stories/file/REVISTA8.pdf>. Acesso em 22 nov.
2013.
OLIVEIRA, Rafael Silva. Atlas do Estado de Roraima. Editora da UFRR: Boa
Vista/RR, 2007.
OLIVEIRA, Ricardo Victalino de. Federalismo Assimétrico Brasileiro. Belo
Horizonte: Arraes, 2012.
PAULO, Vicente; alexandrino, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 5.
Ed. rev. e atualizada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010.
67
PEREIRA, Jose Edgar Penna Amorim. Perfis Constitucionais das Terras
Devolutas. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.
RORAIMA. Governo do Estado. Plano de Desenvolvimento Sustentável de
Roraima - Plano Plurianual 2012-2015. Secretaria de Estado do Planejamento e
Desenvolvimento. Boa Vista, 2012.
SILVA, Romerito Valeriano da; LACERDA, Elisângela Gonçalves; DINIZ, Alexandre
Magno Alves. Migrações Internas e Seus Impactos no Estado de Roraima. VI
Encontro Nacional da Anppas, 18 a 21 de setembro de 2012. Belém/PA – Brasil.
Disponível em: < http://www.anppas.org.br/encontro6/anais/ARQUIVOS/GT18-782474.pdf>. Acesso em: 18 de dez. 2013.
UNGER, Mangabeira. Regularização fundiária é o maior problema na Amazônia, diz
Mangabeira. Blog Quarto Poder, 22 de setembro de 2008. Entrevista concedida à
Agência Brasil. Disponível em: <http://www.blogquartopoder.com.br/search?updatedmax=2008-09-22T08:15:00-07:00&max-results=20&reversepaginate=true&start=60&by-date=false>. Acesso em: 07 out. 2013.
VASCONCELOS, Luis André de Araújo. Federalismo Cooperativo e Proteção
Ambiental na Constituição De 1988. Belo Horizonte, 2013. Dissertação de
Mestrado. Escola Superior Dom Helder Câmara. Programa de Pós-Graduação em
Direito. Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: <
http://www.domhelder.edu.br/uploads/DissertaoLuisAndre.pdf>. Acesso em: 06 jan.
2013.
VIEIRA, Jaci Guilherme. Missionários, Fazendeiros e Índios de Roraima: A
disputa pela terra – 1777 a 1980. Editora da UFRR: Boa Vista/RR, 2007.
Download