Papel do receptor de adenosina A2A (A2AR) no - IBA (FMRP)

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO
PÓS-GRADUAÇÃO EM IMUNLOGIA BÁSICA E APLICADA
Papel do receptor de adenosina A2A (A2AR) no
controle da resposta inflamatória durante a
infecção experimental por Leishmania infantum
Mikhael Haruo Fernandes de Lima
Ribeirão Preto - SP
2015
MIKHAEL HARUO FERNANDES DE LIMA
Papel do receptor de adenosina A2A (A2AR) no controle
da resposta inflamatória durante a infecção
experimental por Leishmania infantum
Dissertação apresentada ao curso de
Pós-graduação em Imunologia Básica
e Aplicada da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo, para obtenção do grau de
Mestre
em
Ciências–
área
de
concentração: imunologia Básica e
Aplicada.
Orientação: Profª. Drª. Vanessa Carregaro Pereira
Ribeirão Preto – SP
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE
TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS
DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
FICHA CATALOGRÁFICA
Lima, Mikhael Haruo
Papel do receptor de adenosina A2A (A2AR) no controle da resposta
inflamatória durante a infecção experimental por Leishmania
infantum.
Ribeirão Preto, 2015. 91p.; Il.; 30cm
Dissertação de Mestrado, apresentada à Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto/USP. Área de concentração: Imunologia Básica e
Aplicada.
Orientador(a): Pereira, Vanessa Carregaro.
1.
Leishmaniose visceral. 2. Imuno-regulação. 3. Resposta Th1.
4. Recrutamento de neutrófilos.
Trabalho realizado no Laboratório de Imunoparasitologia, Departamento de Bioquímica e
Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, com auxílio
Financeiro da Capes/INCTV, CNPQ e FAPESP.
Mikhael Haruo Fernandes de Lima
Papel do receptor de adenosina A2A (A2AR) no controle da resposta
inflamatória durante a infecção experimental por Leishmania infantum
Dissertação apresentada ao curso de Pós-graduação em
Imunologia Básica e Aplicada da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, para obtenção
do grau de Mestre em Ciências – Área de concentração:
Imunologia Básica e Aplicada
Aprovada em: ___ / ___ / ___
Banca Examinadora
Profª. Drª. Vanessa Carregaro Pereira
FMRP – USP
Profª. Drª. Isabel Kinney Ferreira de Miranda Santos
FMRP – USP
Prof. Dr. Roque Pacheco de Almeida
UFS
Dedico este trabalho a minha mãe,
Joseliz Fernanda Fernandes,
por sempre me dar suporte nas
nas horas difíceis.
“Aqueles que se sentem satisfeitos
sentam-se e nada fazem.
Os insatisfeitos são os únicos
benfeitores do mundo.”
Walter S. Landor
AGRADECIMENTOS
É com muita satisfação que expresso aqui o mais profundo agradecimento a todos aqueles que
tornaram a realização deste trabalho possível.
Inicio os agradecimentos a minha mãe, que sempre primou pela minha educação. Muito obrigado,
Joseliz Fernanda Fernandes, por, além de me oferecer a oportunidade de estudar, sempre esteve
presente.
Gostaria de agradecer imensamente à profa. Dra. Vanessa Carregaro Pereira, por ter me
orientado ao longo do desenvolvimento deste trabalho, e ao prof. Dr. João Santana da Silva, por
ter compartilhado de seu laboratório e conhecimento. Sem dúvidas foi um período de intenso
aprendizado, tanto sob o ponto de vista acadêmico/profissional, quanto pessoal. Muito obrigado!
A realização deste trabalho não seria possível sem o apoio de todos os que compõem o
laboratório de Imunoparasitologia, Letícia Ferreira, Camila Oliveira, Luciana Benevides, Gabriela
Oliveira, Carla Lopes, Murilo Solano, Malena Martinez, Gretel Rodrigues, Rodrigo Almeida, Natália
Keteluti, Frederico Ribeiro, Pedro Sampaio, Ítala Silva, Gabriela Pessenda, Gaurav Gupta.
Em especial, ao “grupo da leishmania”: Gustavo Quirino, Jéssica Lobo, Lais Sacramento, Manuela
Sales e Marcela Davoli, os quais me ensinaram tudo o que eu sei hoje.
Agradeço aos técnicos de laboratório, Cristiane Milanezi, Denise Ferrari e Wander Ribeiro, e à
secretária Ana Cristine, que sempre se mostraram muito solícitos ao longo desta caminhada.
Nenhum caminho é longo demais quando um amigo nos acompanha. Muito obrigado por fazer
alegre a minha estadia em Ribeirão Preto, Maritza, Rafa, Ernna, Gabs, Diana, Mozt, Alice, Kalil,
Allynne, Pedrão, Douglinhas, Bradock, Panda, Nerri, Manuzinha, Marcelona, Camilinha e Letícia.
Agradeço a banca examinadora, profa. Dra. Isabel Kinney Ferreira de Miranda Santos e prof. Dr.
Roque Pacheco de Almeida pela disponibilidade concedida.
Evidentemente, sem o apoio financeiro este trabalho não teria sido realizado. Agradeço a
CAPES/INCT, CNPq, FAPESP e FAEPA pelo suporte.
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... 11
LISTA DE TABELAS .................................................................................................. 12
LISTA DE ABREVIATURAS ..................................................................................... 13
RESUMO ....................................................................................................................... 19
ABSTRACT ................................................................................................................... 20
1.
INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 22
1.1
Leishmanioses.............................................................................................................................. 22
1.2
Interação Parasito-Hospedeiro.................................................................................................... 25
1.3
Regulação da Resposta Imune por Adenosina ............................................................................ 29
2.
HIPÓTESE ............................................................................................................................. 37
3.
OBJETIVOS ........................................................................................................................... 39
3.1 Objetivo geral .................................................................................................................................... 39
3.2
4.
Objetivos específicos ................................................................................................................... 39
MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................... 41
4.2
Parasitos e infecção experimental............................................................................................... 41
4.3
Análise da carga parasitária dos animais infectados ................................................................... 41
4.4
Antígeno particulado de Leishmania infantum ........................................................................... 42
4.5
Imunohistoquímica de tecido hepático ....................................................................................... 42
4.6
Obtenção de células do baço....................................................................................................... 44
4.7
Fenotipagem do perfil leucocitário presente no baço ................................................................ 44
4.8
Cultura de células do baço para marcação intracelular .............................................................. 45
4.9
Cultura de células do baço de animais infectados com L. infantum ........................................... 46
4.10
Obtenção de leucócitos no tecido hepático ................................................................................ 47
4.11
Depleção de Neutrófilos e IFN-ɣ in vivo ...................................................................................... 47
4.12
Extração do RNA total e confecção de DNA complementar (cDNA) ........................................... 48
4.13
PCR em tempo real ...................................................................................................................... 49
4.14
Análise estatística dos resultados................................................................................................ 50
5. RESULTADOS ......................................................................................................................... 52
5.1 A2AR confere susceptibilidade a infecção por L. infantum em animais BALB/c................................. 52
5.2 Análise fenotípica do baço de animais WT e A2AR-/- infectados com L. infantum ............................. 52
5.3 A2AR participa da regulação de célulasTh1 durante a infecção por L. infantum ............................... 54
5.4 A2AR regula o infiltrado de neutrófilos no baço e no fígado ao longo da infecção por L. infantum.. 59
5.5 A2AR regula a expressão de moléculas relacionadas com a ativação e quimiotaxia de neutrófilos ao
longo da infecção por L. infantum no baço ............................................................................................. 62
5.6 O recrutamento e a ativação de neutrófilos para o baço de animais A2AR-/- é dependente de IFN-γ63
5.7 A2AR regula a expressão gênica de il10 durante a infecção por L. infantum ..................................... 65
5.
DISCUSSÃO .......................................................................................................................... 68
7. CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 82
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................... 84
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. A2AR confere susceptibilidade à infecção por L. infantum ...........................53
Figura 2. Fenotipagem de linfócitos no baço de animais WT e A 2AR-/- ao longo da
infecção por L. infantum...............................................................................................54
Figura 3. A2AR regula a produção de IFN-γ por células TCD4+ no baço durante
infecção por L. infantum...............................................................................................55
Figura 4. A2AR regula a resposta Th1 durante a infecção por L. infantum ..................57
Figura 5. A2AR regula o infiltrado de neutrófilos para o baço durante infecção por L.
infantum...................... .................................................................................................60
Figura 6. A2AR regula o infiltrado de neutrófilos para o fígado durante a sexta semana
infecção por L. infantum.................................................................................................. 61
Figura 7. A2AR regula a expressão de moléculas de superfície relacionadas com a
ativação e quimiotaxia de neutrófilos durante infecção por L. infantum no baço .........63
Figura 8. O infiltrado de neutrófilos para o baço e a sua ativação em animais A 2AR-/- é
dependente de IFN-γ ...................................................................................................65
Figura 9. A2AR regula a expressão de gênica de il10 em animais BALB/c durante a
infecção por L. infantum...............................................................................................66
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Sequência dos primers utilizados nas reações de PCR em tempo real.......... 50
LISTA DE ABREVIATURAS
A1R: receptor 1 de adenosina
A2AR-/-: deficiência genética do receptor 2A de adenosina
A2AR: receptor 2A de adenosina
A2BR: receptor 2B de adenosina
A3R: receptor 3 de adenosina
ACT: adenylate cyclase toxin
ADA: adenosina deaminase
ADO: adenosina
adora2a: gene que codifica o receptor 2A de adenosina
ADP: difosfato de adenosina
AMP: monofosfato de adenosina
APC: allophycocyanin
APCCy7: allophycocyanin- Cyanin 7
AR: artrite reumatoide
Arg1: gene de arginase 1
AST: aspartato transaminase
ATP: trifosfato de adenosina
BSA: albumina sérica bovina
B2m: gene que codifica beta-2 microglobulina
C/EBP: CCAAT/enhancer-binding protein beta
C/EBPδ: CCAAT/enhancer-binding protein delta
cAMP: AMP cíclico
CCR7: receptor tipo 7 de quimiocina C-C
CD11b: cluster de diferenciação molecular 11b
CD19: cluster de diferenciação molecular 19
CD25: cluster de diferenciação molecular 25
CD26: cluster de diferenciação molecular 26
CD3: cluster de diferenciação molecular 3
CD39: cluster de diferenciação molecular 39
CD4: cluster de diferenciação molecular 4
CD69: cluster de diferenciação molecular 69
CD73: cluster de diferenciação molecular 73
CD8: cluster de diferenciação molecular 8
cDNA: ácido desoxirribonucleico complementar
Células NK: células natural killier
CNTs: transportadores concentrativos de nucleosídeo
Con-A: concanavalina A
COX-2: ciclo-oxigenase 2
CREB: cAMP response element-binding protein
CSIF: fator inibidor da síntese de citocinas
CXCL1: chemokine (C-X-C motif) ligand 1
cxcl1: gene que codifica chemokine (C-X-C motif) ligand 1
CXCR2: receptor de quimiocina C-X-C tipo 2
DAB: diaminobenzidina
DCs: células dendríticas
DTH: hipersensibilidade tardia, ou tipo IV
ELISA: enzyme-linked immunosorbent assay
ENTPD1: ectonucleosídeo trifosfato difosfohidrolase 1
ENTs: transportadores equilibrativos de nucleosídeo
EROs: espécies reativas do oxigênio
FcRγ: receptor Fc gama
FITC: Fluorescein Isothiocyanate
FOXP3:forkhead box 3
FSC: forward scatter
Gapdh: gene que codifica gliceraldeido 3-fosfato desidrogenase
GM-CSF: Granulocyte-macrophage colony-stimulating factor
GPCR: receptore acoplado a proteína G
GTP: guanosina trifosfato
HIF-1α: fator induzido por hipóxia-1 alfa
i.v : intravenoso
ifng: gene de interferon gama
IFN-α: interferon- alfa
IFN-γ: intterferon gama
IgG: imunoglobulina G
IL-1: interleucina 1
il10: gene que codifica a interleucina 10
IL-10: interleucina 10
IL-10R: receptor de interleucina 10
IL-12: interleucina 12
IL-12p40: subunidade 40 da interleucina 12
IL-13: interleucina 13
IL-17: interleucina 17
IL-17R: receptor de interleucina 17
IL-1β: interleucina 1 beta
IL-2: interleucina 2
IL-23p19: subunidade 19 da interleucina 23
il4: gene que codifica a interleucina 4
IL-4:interleucina 4
IL-6: interleucina 6
IL-6: interleucina 6
IL-8: interleucina 8
iMFI: mediana integrada de intensidade de fluorescência
iNOS: óxido nítrico sintase induzível
KO: knockout
LV: leishmaniose visceral
Ly6G: antígeno de linfócito 6G
MAPK: proteína quinase ativada por mitógeno
MHC II: complexo principal de histocompatibilidade classe 2
MIP-1α: proteína inflamatória 1-alfa de macrófago
MIP-1β: proteína inflamatória 1-beta de macrófago
MIP-2: proteína inflamatória 2 de macrófago
MIP-2α: proteína inflamatória 2-alfa de macrófago
MIP-3α: proteína inflamatória 3-alfa de macrófago
mRNA: ácido ribonucleico mensageiro
Na+: íon sódio
NET: neutrophil extracelular traps
NF-κB: fator nuclear kappa B
NO: óxido nítrico
NOS2: óxido nítrico sintase 2
P1R: família 1 de receptores purinérgicos
P2R: família 2 de receptores purinérgicos
PBMC: células mononucleares do sangue periférico
PBS: tampão fosfato salino
PCR: reação em cadeia da polimerase
PE: Phycoerythrin
PECy7: phycoerythrin- cyanin 7
PERCP: peridinin chlorophyll protein
PGE2: prostaglandina E2
PKA: proteína quinase A, ou proteína quinase dependente de AMPc
PKC: proteína quinase C
PLC: fosfolipase C
PMA: acetato de formol miristato
qPCR: reação em cadeia da polimerase quantitativa
RNA: ácido ribonucléico
rpm: rotações por minuto
SLA: antígeno solúvel de L. infantum
SSC: side scatter
TGF-β: fator de crescimento e transformação beta
Th1: resposta de células T auxiliares tipo 1
Th17: resposta de células T auxiliares tipo 17
Th2: resposta de células T auxiliares tipo 2
TLR2-/-: deficiência genética do receptor tipo Toll 2
TLR2: Receptor tipo Toll 2
TNF: fator de necrose tumoral
TNF: fator de necrose tumoral
tnf: gene que codifica fator de necrose tumoral
Tregs: células T reguladoras
WT: wild type
α-IFN-γ: anticorpo monoclonal anti- interferon gama
α-Ly6G: anticorpo monoclonal anti- antígeno de linfócito 6G
RESUMO
A leishmaniose visceral (LV) é uma doença crônica e potencialmente fatal causada,
principalmente no Brasil, pelo protozoário Leishmania infantum. A resistência a LV está
relacionada com a elaboração de uma resposta imune celular eficiente, constituída
principalmente pela produção de IFN-γ e liberação de NO (óxido nítrico). Um mecanismo
importante envolvido na regulação da resposta imunológica ocorre pela ativação do
receptor A2AR pelo seu ligante, a adenosina, nucleosídeo encontrado em elevados níveis
extracelulares sob condições inflamatórias. A sinalização de A 2AR em células do sistema
imune culmina na repressão de genes pró-inflamatórios e na indução de genes antiinflamatórios. Evidências crescentes demonstram que diversos microrganismos, dentre
estes, parasitos do gênero Leishmania, são capazes de evadir da resposta imune do
hospedeiro, em decorrência do aumento dos níveis extracelulares de adenosina liberado
durante o processo inflamatório. No presente estudo, nosso objetivo foi determinar o
papel do receptor A2AR na regulação da resposta inflamatória induzida por L. infantum,
mecanismo esse supostamente envolvido na evasão do parasito. Nossos resultados
demonstram que camundongos BALB/c, altamente susceptíveis, tornam-se resistentes à
infecção por L. infantum na ausência de A2AR (A2AR-/-), ao apresentarem menos parasitos
no baço e fígado. A resistência nesses animais foi relacionada ao predomínio de uma
resposta Th1, caracterizada pelo aumento de células TCD4 + produtoras de IFN-γ e
expressão de iNOS nos órgãos-alvo da LV. Ainda, nós observamos intenso infiltrado
neutrofílico nos órgãos de animais A2AR-/- coincidentes com a expressão gênica
aumentada de cxcl1. Neutrófilos provenientes de animais A2AR-/- apresentaram um
fenótipo mais ativado, com aumento da expressão de CXCR2, CD39 e CD69 em sua
superfície celular. O intenso infiltrado neutrofílico e consequente ativação do
polimorfonuclear foram, em grande parte, mediados pelos níveis elevados de IFN-ɣ nos
órgãos-alvo. A neutralização de IFN-ɣ com anticorpo específico reduziu neutrófilos nos
órgãos-alvo bem como a expressão de moléculas relacionadas com a ativação e o
recrutamento dos polimorfonucleares para o baço. Como consequência, o tratamento
reverteu o fenótipo de resistência nos animais KOs, tornando-os susceptíveis a infecção
pelo parasito. É possível que a migração de neutrófilos mediada por células Th1 seja
regulada por IL-10, visto que a expressão do mRNA para essa citocina foi inibida ao longo
da infecção em animais A2AR-/-. Em conclusão, no presente trabalho demonstramos que a
via de sinalização mediada por A2AR regula negativamente a migração e ativação de
neutrófilos induzida por células Th1, propiciando, dessa forma, o estabelecimento da
infecção causada por L. infantum. Deste modo, nós esperamos que o emprego de
antagonistas de A2AR pode ser uma abordagem terapêutica promissora no tratamento de
LV.
Palavras-chave: Leishmaniose visceral, regulação da resposta imune, A2AR, Interferongama, recrutamento de neutrófilos, interleucina-10.
ABSTRACT
Visceral leishmaniasis (VL) is a chronic and potentially fatal disease caused, in Brazil by
the protozoan Leishmania infantum. The resistance to VL is related to development of an
effective cellular immune response, which consists specially for the production of IFN-γ
and release of NO (nitric oxide). An important regulatory mechanism of the immune
responses occurs through A2AR activation, which recognizes adenosine, a purine
nucleoside encountered in high amounts at extracellular milieu under inflammatory
conditions. A2AR signaling on immune cells induces the repression of pro-inflammatory
cytokines and promoting the anti-inflammatory mediators. Evidences show that several
microorganisms, among them, the parasites of Leishmania genus, are able to evade the
host immune response by increasing the extracellular levels of adenosine. In this study,
we aimed to determine the role of A2AR in the regulation of the inflammatory response
induced by L. infantum, mechanism supposedly involved into parasite evasion. Our results
demonstrated that BALB/c mice, a strain highly susceptible, become resistant to infection
by L. infantum in the absence of A2AR. A2AR-/- infected mice presented fewer parasites in
the spleen and liver. The resistance was related to the predominance of a Th1 pattern of
immune response, characterized by enhanced CD4+Tcells-producting IFN-γ cells and
iNOS expression in organs targeted by the LV. We also observed an intense neutrophilic
infiltrate in A2AR-/- coinciding with increased cxcl1 gene expression. Neutrophils from A2AR/- animals showed a more activated phenotype with increased expression of CXCR2, CD39
and CD69 on their cell surface. The neutrophil infiltration and its activation were mediated
by high levels of IFN-ɣ found into target organs. The neutralization of IFN-ɣ with specific
antibody reduced neutrophils and the expression of molecules related to activation and
recruitment of polymorphonuclear to the spleen as well. As consequence, it promoted
parasite growth. It is possible that the migration of neutrophils mediated by Th1 cells is
regulated by IL-10, since the expression of mRNA for this cytokine was inhibited in A2AR-/along the infection. In conclusion, the present study demonstrated that A2AR pathway
negatively regulates the migration and activation of neutrophils induced by Th1 cells,
allowing thus the establishment of the infection caused by L. infantum. Thus, we expect
that pharmacological strategies by using A2AR antagonists may be a promising therapeutic
approach in the treatment of VL.
Keywords: Visceral leishmaniasis, regulation of immune response, A2AR, Interferongama, neutrophil recruitment, interleukin-10.
Introdução
1. INTRODUÇÃO
1.1 Leishmanioses
Consideradas doenças tropicais negligenciadas (Hotez, Remme et al. 2004), as
leishmanioses são um grupo de doenças provocadas por protozoários intracelulares
obrigatórios
do
gênero
Leishmania
spp.
(Kinetoplastida,
Trypanosomatidae),
cuja
transmissão a humanos e outros vertebrados ocorre durante o repasto sanguíneo por
insetos
flebotomíneos
fêmeas
infectados
(Diptera,
Psychodidae)
(WHO,
2010).
Aproximadamente 21 espécies de Leishmania são capazes de infectar mamíferos e várias
destas causam leishmaniose em humanos, as quais podem ser transmitidas por
aproximadamente 30 espécies de insetos flebotomíneos (Herwaldt, 1999).
Durante o repasto sanguíneo, o inseto vetor inocula na pele do hospedeiro
vertebrado as formas infectantes do parasito, denominada promastigota metacíclica, que
apresentam formato alongado e alta motilidade no meio extracelular, capacidade que é
conferida por flagelo livre. Uma vez no tecido do hospedeiro vertebrado, estes são
reconhecidos e ingeridos por fagócitos mononucleares residentes e por recém recrutados.
Nos fagolisossomos destas células há a transição da forma infectante para a forma
replicativa do parasito, que apresentam formato ovóide, são imóveis por não possuírem
flagelo livre e são classificadas como amastigotas. Assim, são capazes de infectar outros
fagócitos localmente ou em tecidos distantes pelo rompimento da célula hospedeira após
sucessivas divisões binárias. O ciclo do parasito se reinicia com a ingestão de sangue com
fagócitos abrigando amastigotas, transição da forma amastigota para promastigota no trato
gastrintestinal do inseto vetor e posterior inoculação de promastigotas metacíclicas em
vertebrados (Murray, Berman et al. 2005; Bates 2007). Portanto, tais parasitos são
classificados como heteróxenos, ou digenéticos, uma vez que possuem dois estágios
22
básicos de vida completados em dois hospedeiros distintos: um extracelular, que é
encontrado no intestino do hospedeiro invertebrado e um estágio intracelular, que é abrigado
principalmente por macrófagos do hospedeiro vertebrado (Bates, 2007).
O desenvolvimento da leishmaniose depende principalmente da espécie de
Leishmania transmitida durante o repasto sanguíneo e da resposta imunológica do
hospedeiro vertebrado frente ao patógeno. Assim, esta doença pode se apresentar como
infecção
assintomática,
como
infecções
cutâneas
localizadas,
disseminadas
e
mucocutâneas, e até mesmo acometer órgãos internos, na qual há a disseminação não
controlada do parasito para o baço, fígado e medula óssea (Desjeux 2004; Murray, Berman
et al. 2005).
A leishmaniose cutânea localizada é frequentemente causada pelas espécies L.
(L.) major, L. (L.) tropica, L. (L.) amazonensis, L. (L.) mexicana, L. (V.) braziliensis, e
raramente pelas espécies L. (L.) donovani e L. (L.) infantum. A leishmaniose mucocutânea
está comumente relacionada com infecções provocadas por L. (V.) braziliensis, embora já se
tenha documentado a associação das espécies L. (V.) panamensis, L. (V.) guyanensis e L.
(L.) amazonensis com este espectro clínico. Já a leishmaniose visceral, seus principais
agentes etiológicos são L. (L.) donovani e L. (L.) infantum, sendo dificilmente promovida por
L. (L.) tropica e L. (L.) amazonensis (McCall, Zhang et al. 2013; Mansueto, Seidita et al.
2014).
A leishmaniose visceral (LV), ou calazar, é o espectro clínico mais grave dentre as
leishmanioses devido ao seu índice elevado de morbidade e mortalidade. Conforme
mencionado anteriormente, duas espécies de Leishmania estão intimamente relacionadas
com essa patologia: L. donovani, que é restrita a humanos (antroponose), acomete regiões
da África e do subcontinente indiano; e L. infantum, que possui como reservatórios principais
humanos, canídeos e marsupiais (zoonose) e está relacionada com a doença visceral na
23
região do mediterrâneo, regiões sudoeste e central da Ásia, oeste da África e na América do
Sul. Sua incidência é de aproximadamente 0.2 a 0.4 milhões de casos no mundo, causando
20,000 a 40,000 mortes por ano. Cerca de 90% de todos os casos de LV no mundo se
concentram em seis países: Índia, Etiópia, Bangladesh, Sudão, Sudão do Sul e Brasil (Alvar,
Vélez et al. 2012).
No Brasil, antigamente a LV acometia principalmente indivíduos de áreas rurais,
mas hoje encontra-se em extensiva ampliação para os grandes centros urbanos devido a
diversos fatores, tais como: modificações ambientais causadas por ações antrópicas, intenso
processo migratório, interação e mobilização de reservatórios silvestres e cães infectados
para áreas sem transmissão, e adaptação do vetor Lutzomiya longipalpis ao peridomicílio
(Arias, Monteiro et al. 1996; Werneck, Costa et al. 2002; Maia-Elkhoury, Alves et al. 2008;
Harhay, Olliaro et al. 2011; de Araújo, Pinheiro et al. 2013). De 1980 a 2005, foram
registrados 59,129 casos, os quais 82.5% pertenceram a região Nordeste. No entanto, entre
os anos de 1998 e 2005 houve um aumento de 39% dos casos de LV em outras regiões do
país que não incluíram a região Nordeste (Harhay, Olliaro et al. 2011). Atualmente, Minas
Gerais é o estado brasileiro com o maior número de casos (Karagiannis-Voules, Scholte et
al. 2013).
De acordo com a Secretaria de Vigilância em Saúde/MS (2009), a LV é
classificada clinicamente em três períodos: inicial, de estado e final. O período inicial é
caracterizado por febre com duração inferior a 4 semanas, palidez cutâneo-mucosa e
hepatoesplenomegalia. Em áreas endêmicas, uma pequena parcela de indivíduos,
geralmente crianças, pode apresentar quadro clínico discreto, com duração aproximada de
15 dias, que usualmente evolui para cura espontânea. A combinação de manifestações
clínicas e alterações laboratoriais, que melhor caracterizam esta fase, é febre,
hepatomegalia, hiperglobulinemia e velocidade de hemossedimentação alta. O período de
24
estado caracteriza-se por febre irregular, caquexia, palidez cutâneo-mucosa e progressão da
hepatoesplenomegalia. Este intervalo apresenta um quadro clínico arrastado, geralmente
com mais de 2 meses de evolução, na maioria das vezes associado ao comprometimento do
estado geral do indivíduo. Atribui-se ao período final, febre contínua e comprometimento
mais intenso do estado geral. Instala-se a desnutrição (cabelos quebradiços, cílios
alongados e pele seca) e edema dos membros inferiores, que pode evoluir para anasarca.
Outras manifestações importantes incluem hemorragias (epistaxe, gengivorragia e
petéquias), icterícia e ascite. Nesses pacientes, o óbito geralmente é acompanhado
infecções bacterianas e/ou sangramentos.
1.2 Interação Parasito-Hospedeiro
Embora a LV seja a segunda doença tropical com maior índice de mortalidade no
mundo (Alvar, Vélez et al. 2012), o número de pacientes assintomáticos prevalece sobre os
pacientes sintomáticos (Badaro, Jones et al. 1986; Badaró, Jones et al. 1986; Gardinassi,
Dotz et al. 2014). Este dado indica que grande parte dos indivíduos infectados por espécies
viscerais de Leishmania desenvolvem uma resposta imunológica efetiva, que culmina no
controle do desenvolvimento da doença (McCall, Zhang et al. 2013). Assim, torna-se
extremamente importante a compreensão dos mecanismos imunológicos envolvidos na
susceptibilidade e resistência a essa enfermidade.
Sendo um parasita intracelular obrigatório, no geral, a resposta imune gerada pelo
hospedeiro contra Leishmania é predominantemente mediada pela resposta imune celular. A
inoculação das formas infectantes dos parasitos induz o recrutamento localizado de
leucócitos (Peters, Egen et al. 2008; Thalhofer, Chen et al. 2011) e a qualidade e a
magnitude da resposta imune gerada são decisivas para levar ao controle ou ao
estabelecimento da infecção e desenvolvimento de doença.
25
Os mecanismos imunológicos que conferem resistência ou suscetibilidade à
infecção por parasitos do gênero Leishmania foram inicialmente caracterizados em modelos
experimentais de infecção com L. major (Heinzel, Sadick et al. 1989; Scott, Pearce et al.
1989). A apresentação antigênica eficiente, com os coestímulos necessários e produção de
IL (interleucina)-12 por células dendríticas que fagocitam os parasitos no sítio de inoculação
levam, em conjunto, à diferenciação, no órgão linfoide secundário, de linfócitos T CD4+
naïves para o perfilTh1(resposta de células T auxiliares tipo 1), produtores de IFN-γ
(interferon- gama) (Alexander and Bryson 2005).
Juntamente com linfócitos T CD4+, as células NK (do inglês Natural Killer) e as T
CD8+ também são fontes importantes de IFN-γ (Scharton-Kersten, Afonso et al. 1995;
Belkaid, Von Stebut et al. 2002). Esta citocina atua nos macrófagos, ativando a enzima óxido
nítrico sintase induzível (iNOS ou NOS2), que acarreta na produção de NO (óxido nítrico) e
consequente morte dos parasitos fagocitados (Liew, Millott et al. 1990; Wanasen and Soong
2008). A citocina TNF (fator de necrose tumoral), produzida por macrófagos infectados, age
em sinergismo com IFN-γ aumentando a ativação de iNOS (Liew, Parkinson et al. 1990;
Liew, Wei et al. 1997).
Em contrapartida, o desenvolvimento de uma resposta imune Th2 (resposta de
células T auxiliares tipo 2) durante a infecção por L. major, dominada pela produção de IL-4
e IL-10, e ausência de IL-12, confere suscetibilidade à infecção por reprimir a síntese das
citocinas pró-inflamatória como TNF e IL-1 (Sacks and Noben-Trauth 2002). Além disso, os
parasitos podem reprimir os mecanismos microbicidas dos fagócitos ao induzirem o aumento
da atividade da glutationa peroxidase e superóxido dismutase, culminando na redução da
produção de espécies reativas do oxigênio (EROs), redução da expressão de Nos2 e
indução de Arg1 (arginase 1). Ainda, a síntese de citocinas anti-inflamatórias, tais como
26
TGF-β (fator de crescimento e transformação-beta) e IL-10 suprimem a síntese de TNF e IL1 (Basu and Ray 2005; Olivier, Gregory et al. 2005; Osorio, Travi et al. 2014).
A resposta de padrão Th1 também está classicamente associada com resistência
à LV, sendo macrófagos ativados com IFN-γ ou TNF capazes de eliminar os parasitos da
espécie L. donovani e L. infantum (Pearson and Steigbigel 1981; Murray, Rubin et al. 1983).
Em pacientes assintomáticos há intensa resposta DTH (hipersensibilidade do tipo tardio) e
alta produção de IL-2, IL-12 e IFN-γ por células mononucleares de sangue periférico
(Carvalho, Badaro et al. 1985; Sacks and Perkins 1985). Ao contrário, a ausência de DTH,
reduzida linfoproliferação e produção de IL-2 e de IFN-γ por PBMC (células mononucleares
do sangue periférico) em resposta ao antígeno do parasito, e elevados níveis séricos de IL10, são características de pacientes que desenvolvem LV por L. infantum ou L. donovani.
(Carvalho, Badaro et al. 1985; Sacks and Perkins 1985). A produção de citocinas do padrão
Th2, tais como IL-4 e IL-13, estão relacionadas com susceptibilidade e desenvolvimento de
LV em humanos, via inibição de células efetoras do sistema imune, como a ativação clássica
de macrófagos (Babaloo, Kaye et al. 2001; Thakur, Mitra et al. 2003). Deste modo, a
ativação alternativa de macrófagos leva a multiplicação e disseminação do parasito, e
acometimento de múltiplos órgãos, devido à inibição dos mecanismos microbicidas citados
previamente (Carvalho, Badaro et al. 1985).
Mecanismos de supressão da resposta imune podem estar envolvidos na
patogênese da LV por suprimir a resposta efetora contra o patógeno e propiciar o
crescimento e disseminação dos parasitos para órgãos-alvo. Uma das citocinas chave na
regulação da resposta protetora contra Leishmania é a IL-10 e, embora sua função seja
menos elucidada em modelos de LV, sabe-se que há níveis elevados desta citocina no
soro de pacientes que desenvolvem a patologia, bem como de seu mRNA (ácido
ribonucleico mensageiro) codificante no baço, medula óssea e nos linfonodos (Nylén and
27
Sacks 2007; Ansari, Kumar et al. 2011). Além disso, tem sido relatado que variações
genéticas capazes de regular a expressão de IL-10, comprovadamente, interferem no
resultado final da infecção; sendo esta citocina um importante alvo de estudo da
imunopatogênese da LV (Hajilooi, Sardarian et al. 2013).
Uma importante fonte de IL-10 provém de células T reguladoras (Tregs), as
quais exercem um papel central na modulação da resposta imune à Leishmania (Peters
and Sacks 2006). . Estudos feitos por nosso grupo mostram que essas células são
encontradas em lesões de pacientes, onde além de produzirem altos níveis de IL-10 e
TGF-β, também dispõem de atividade supressora sobre a proliferação de células T
efetoras heterólogas, vindas de indivíduos sadios, quando incubadas em sua presença
(Campanelli, Roselino et al. 2006). De fato, animais resistentes à infecção com L. major
podem não curar as lesões, mesmo na presença de resposta Th1 com alta produção de
IFN-γ, quando na presença de IL-10 derivada de Treg (Anderson, Mendez et al. 2005) ou
de células TCD4+CD25-Foxp3- (Anderson, Oukka et al. 2007).
Outro subtipo de células T é o produtor de IL-17 (Th17, resposta de células T
auxiliares tipo 17)). Este subtipo celular foi identificado em pacientes com lesões cutâneas
e mucocutâneas, bem como em PBMCs de pacientes com LV, sugerindo que, assim
como citocinas de perfil Th1, a IL-17 também pode desempenhar um papel próinflamatório diante da infecção por Leishmania (Pitta, Romano et al. 2009; Boaventura,
Santos et al. 2010; Gonzalez-Lombana, Gimblet et al. 2013). De fato, dados publicados
por nosso grupo demonstram que a IL-17 produzida durante a infecção experimental por
L. infantum atua sinergicamente com IFN-γ, potencializando a produção de NO por
macrófagos infectados e, dessa forma, aumenta a capacidade leishmanicida dessas
células (Nascimento, Carregaro et al. 2015). Além disso, animais geneticamente
deficientes para as moléculas IL-17R (receptor de IL-17), IL-23p19 (subunidade 19 de IL-
28
23) e IL-6 apresentam um comprometimento na eliminação de parasitas, indicando que
não somente o padrão Th1 atua na resistência do hospedeiro (Jablonska and Jablonski
2002).
1.3 Regulação da Resposta Imune por Adenosina
A destruição de patógenos e de células infectadas é mediada, em grande parte,
pela ação combinada e redundante de uma variedade de citocinas, mediadores próinflamatórios, enzimas e moléculas citotóxicas produzidos por leucócitos frente aos agentes
infecciosos. Entretanto, quando não apropriadamente regulada, a inflamação descontrolada
pode promover o dano tecidual e apresentar um papel central na patogênese da maioria das
doenças crônicas, incluindo o câncer, doenças cardíacas, aterosclerose e, principalmente nas
auto-imunes, como é o caso da artrite reumatóide, psoríase, glomérulo-nefrite, colite e em
doenças infecciosas, como Doença de Chagas, malária, toxoplasmose e leishmaniose. Assim, o
sistema imune pode ser controlado tanto por mecanismos celulares, como por exemplo pelas
células T reguladoras, bem como por alguns metabólitos com alta capacidade inibitória sobre a
ativação leucocitária (Sitkovsky 2003), dos quais incluem certos aminoácidos, catecolaminas,
neuropeptídios, histaminas, adenosina e metabólitos do ácido aracdônico (Prostaglandinas das
séries E e J) (Calder and Grimble 2002; Webster, Tonelli et al. 2002).
Dentre os metabólitos, a adenosina está fisiologicamente envolvida na inibição da
ativação de leucócitos e na proteção do tecido durante os processos inflamatórios in vivo.
Acredita-se que seu acúmulo no compartimento extracelular seja decorrente de situações de
hipóxia e de injúria tecidual, nos quais têm se o comprometimento da microcirculação
sanguínea, reduzido suporte sanguíneo e baixa tensão de oxigênio. Dentro destas condições, a
adenosina primeiro atua no sentindo de “reportar” o dano colateral imune e, então, num
29
segundo momento, para prevenir os danos tissulares por inibir a ativação dos leucócitos no local
(Sitkovsky, Lukashev et al. 2004).
Este nucleosídeo é formado tanto por vias intracelulares quanto extracelulares.
Intracelularmente, a adenosina provém da hidrólise do AMP, e da S-adenosilhomocisteína,
que são metabolizados pela 5’- nucleotidase e S-adenosilhomocisteína hidrolase,
respectivamente. Seu transporte para o ambiente extracelular envolve a participação de
transportadores
bidirecionais,
tais
como
ENTs
(transportadores
equilibrativos
de
nucleosídeo), e CNTs (transportadores concentrativos de nucleosídeo). Os primeiros são
subdivididos em ENT1-4, e estão relacionados com o transporte de nucleosídeos a favor do
gradiente de concentração; ao passo que os últimos são subdivididos em CNT 1-3, e medeiam
o transporte de nucleosídeos contra o gradiente de concentração, usando o concentração de
Na+ como força motriz (Fredholm, IJzerman et al. 2001; Antonioli, Colucci et al. 2013).
Assim, situações de hipóxia e inflamação levam ao consumo do ATP e acúmulo de
adenosina no interior da célula, o qual se difunde para o ambiente extracelular a favor do
gradiente de concentração por meio de ENTs.
Também, situações de estresse celular, ATP (trifosfato de adenosina) e ADP
(difosfato de adenosina), nucleotídeos encontrados em elevados níveis no interior da célula
(5-8mM), são liberados para o ambiente extracelular durante necrose, apoptose e/ou por
meio de transportadores específicos de membrana (Yegutkin 2008). Estas moléculas estão
diretamente relacionadas com a promoção da inflamação, ao ativar a família 2 de receptores
purinérgicos (P2R), composta pelos receptores P2X1-7, que são ionotrópicos e possuem
como molécula ativadora o ATP; e pelos receptores P2Y1,2,4,6,11,12,13,14, que são acoplados a
proteína G e possuem como molécula ativadora o ATP e/ou ADP (Burnstock 2006; Yegutkin
2008; Kronlage, Song et al. 2010). Assim, a síntese extracelular de adenosina envolve o
catabolismo do ATP e ADP por ectoenzimas CD39 (ENTPD1; ectonucleosídeo trifosfato
30
difosfohidrolase 1), capazes de hidrolisar ATP e ADP em AMP (monofosfato de adenosina),
e CD73 (ecto-5’-nucleotidase), o qual defosforila rapidamente o AMP em adenosina
(Burnstock 2006). Esta via é responsável por limitar a ativação de P2R, e sua consequente
ação pró-inflamatória, e elevar consideravelmente os níveis extracelulares do nucleosídeo
(Bayliss, Delarosa et al. 2014; Kuhny, Hochdörfer et al. 2014).
Diversos trabalhos na literatura reportam os efeitos imunomoduladores de
adenosina. Esse nucleosídeo induz a expressão de genes anti-inflamatórios, principalmente
il10, e reprime a transcrição de genes pró-inflamatórios, tais como il12, tnf, ifng (Haskó and
Cronstein 2004). Adenosina também bloqueia a ativação clássica de macrófagos, inibindo
seus mecanismos microbicidas (Csóka, Selmeczy et al. 2012); inibe a produção de espécies
reativas do oxigênio (Cronstein, Daguma et al. 1990; Fredholm, Zhang et al. 1996) e a
fagocitose mediada por fagócitos (Salmon and Cronstein 1990). Ainda, o nucleosídeo inibe o
recrutamento de leucócitos para o sítio inflamatório ao inibir a expressão de moléculas de
adesão necessárias para a transmigração do endotélio para o tecido inflamado (Fredholm
1997; Save, Mohlin et al. 2011). No que se refere a linfócitos T, adenosina induz um potente
efeito supressor por reprimir a ativação de células T, induzindo anergia de células efetoras
(Lappas, Rieger et al. 2005; Bruzzese, Fromonot et al. 2014); induz a geração de células T
reguladoras, ao favorecer a expressão de FOXP3 (do inglês, forkhead box P3) e intensifica
seus mecanismos supressores sob a resposta imune (Ohta, Kini et al. 2012). Os diversos
efeitos de adenosina são mediados, pelo menos em parte, por sua interação e conseqüente
ativação da família 1 de receptores purinérgicos (P1R), que expressos na superfície da
membrana celular e são divididos em quatro subclasses: A1R, A2AR, A2BR e A3R. Estes
receptores contêm sete domínios transmembrana acoplados à proteínas G (ligantes de GTP
intracelular) estimulatória (Gs) ou inibitória (Gi) da adenilato ciclase, enzima que cataliza a
formação ou diminuição dos níveis de cAMP (AMP cíclico) intracelular, respectivamente
31
(Fredholm, IJzerman et al. 2001). A1R e A3R encontram-se acoplados à proteína Gi,
subunidade α da proteína G que inibe a adenilato ciclase, e quando ativados culminam na
redução dos níveis de AMPc intracelular; ao passo que A 2AR e A2BR estão acoplados à
proteína Gs, subunidade α da proteína G que estimula a adenilato ciclase a elevar os níveis
intracelulares de AMPc (Fredholm, Arslan et al. 2000).
Uma vez aumentado no interior da célula, o cAMP ativa a proteína quinase A (PKA)
que, ao ser fosforilada, ativa o fator de transcrição CREB (do inglês, cAMP response elementobinding) (Nemeth, Leibovich et al. 2003), afetando diretamente a expressão/produção de
citocinas pró-inflamatórias por se ligarem à região promotora dos genes ou indiretamente por
competir com NF-κB (fator nuclear kappa B) por um importante co-fator, a proteína ligante de
CREB (Fredholm, Chern et al. 2007). Estudos recentes indicam que outro fator de transcrição,
o C/EBP (do inglês, CCAAT/enhancer-binding protein beta ), é responsável pela produção de
IL-10 decorrente da estimulação de A2AR por agonistas (Csoka, Nemeth et al. 2007). Ressaltase que estes efeitos são mediados via ativação de MAPK (proteína quinase ativada por
mitógeno) e PKC (proteína quinase C) (Fredholm, Chern et al. 2007; Hasko and Pacher 2008).
O papel de A2AR como importante modulador da resposta inflamatória foi
primeiramente relatado em 2001, por Ohta e Sitkovsky. Com a utilização do modelo
experimental de lesão hepática induzida por Concanavalina-A (Con-A), o grupo demonstrou
que a administração de CGS21680, agonista seletivo de A2AR, preveniu o dano hepático e
o acúmulo de TNF in vivo, além de inibir a produção de IL-12 por macrófagos ativados e
IFN-γ por células Th1 in vitro. Ainda, a deleção genética do receptor A2A promoveu a
redução da sobrevida dos animais KOs (do inglês, knockout) em decorrência de um intenso
infiltrado inflamatório e a liberação de altos níveis de citocinas pró-inflamatórias como TNF,
IL-12p40 (subunidade 40 da IL-12), IL-6, IFN-γ no fígado, promovendo, assim, a lesão
hepática (Ohta and Sitkovsky 2001). O efeito de A2AR na atenuação e resolução da inflamação
32
também foi observado em outros modelos inflamatórios crônicos, como na hepatite autoimune
e doenças virais, visto que a deficiência deste receptor exacerbou a liberação de citocinas próinflamatórias e os danos teciduais observados nas diferentes patologias (Ohta and Sitkovsky
2001). Além disso, a administração de antagonistas ou a deleção genética do receptor
também promoveu a piora dos processos inflamatórios crônicos em diferentes modelos
experimentais, tais como: encefalomielite autoimune experimental (Mills, Kim et al. 2012);
aneurismas aórticos abdominais crônicos (Bhamidipati, Mehta et al. 2013); miastenia gravis
experimental autoimune (Li, Mu et al. 2012) e pleurite induzida por carragenina (da Rocha
Lapa, da Silva et al. 2012).
Nosso grupo também está envolvido em avaliar mecanismos reguladores de
adenosina e do receptor A2A na resposta inflamatória crônica. Demonstramos que extrato
de glândulas salivares de Phlebotomus papatasii e P. duboscqi, inseto vetor de
Leishmania sp., apresentam propriedades anti-inflamatórias por mecanismos que
dependem da sua ação sobre a fase efetora do processo inflamatório, inibindo a
apresentação antigênica e, por conseguinte, a migração de neutrófilos para o foco
inflamatório. Tal fenômeno é dependente da produção sequencial dos mediadores
antiinflamatórios PGE2 (prostaglandina E2) e IL-10 por células dendríticas que, de maneira
autócrina, inibem a capacidade de apresentar antígenos por este tipo celular e,
conseqüentemente, a liberação dos mediadores envolvidos no processo inflamatório
(Carregaro, Valenzuela et al. 2008).
A saliva de Phlebotomus papatasi também exibiu uma potente atividade antiinflamatória na Artrite Reumatóide (AR) experimental induzida por colágeno, atenuando os
sinais clínicos da doença. Utilizando diferentes passos de purificação (filtração em
microcon YM-3 e fracionamento por microcromatografia de alta performance - microHPLC), nós identificamos a adenosina (ADO) e AMP como as moléculas imunoreguladoras
33
presentes na saliva de P. papatasii. Esses nucleosídeos atuam preferencialmente nas
células dendríticas (DCs), bloqueando a sua ativação e consequente apresentação de
antígenos, o que interfere com a ativação das células Th17 e no recrutamento de
neutrófilos para o compartimento articular (Carregaro, Sa-Nunes et al. 2011).
Existem evidências crescentes que microrganismos escapam do controle do
sistema imune decorrente da síntese de adenosina no sítio de infecção, o que favorece a
invasão e disseminação dos agentes infecciosos (Kak, Sundareshan et al. 2012). É descrito
a expressão e a atividade de CD39 e CD73 durante as infecções induzidas por vários
microrganismos, incluindo protozoários (pertencente ao gênero Leishmania, Trypanosoma,
Toxoplasma, Trichomonas, Giardia) (Tasca, Bonan et al. 2005; Santos, Possa et al. 2009; de
Souza, de Assis et al. 2010; Russo-Abrahao, Cosentino-Gomes et al. 2011; Paletta-Silva,
Vieira-Bernardo et al. 2012; Mahamed, Toussaint et al. 2015), fungos (Candida parapsilosis)
(Russo-Abrahao, Cosentino-Gomes et al. 2011) e bactérias (Sansom, Newton et al. 2007;
Thammavongsa, Kern et al. 2009; Theatre, Frederix et al. 2012). Os patógenos também
podem explorar as ectonucleotidases expressas nas superfícies de membrana de uma
célula ou tecido para escapar da vigilância imunológica (Paletta-Silva and Meyer-Fernandes
2012). Recentemente foi demonstrado que Streptococcus suis escapa do processo de
fagocitose de neutrófilos por sintetizar adenosina no sangue, além de inibir a atividade
oxidativa e a degranulação do polimorfonuclar por mecanismos dependentes de A 2AR (Liu,
Pian et al. 2014).
Com relação ao papel de adenosina na Leishmaniose, demonstramos que a coinoculação de parasitos com ADO+AMP apresentou efeito exacerbativo na leishmaniose
cutânea experimental, aumentando a lesão e o número de parasitos presentes na orelha.
Esses nucleosídeos induzem um perfil tolerogênico nas DCs decorrente da liberação
sequencial de PGE2 e IL-10. Ambos mediadores também atuam de maneira parácrina
34
induzindo um perfil regulador em linfócitos T efetores, levando, então, a supressão da
resposta imune efetora contra os parasitos (Carregaro, Ribeiro et al. 2015).
Em estudo realizado por Marques-da-Silva e colaboradores, foi evidenciado que
dentre as espécies causadoras de leishmaniose cutânea, as formas promastigotas
metacíclicas de L. amazonensis possuem maior atividade hidrolítica do ATP em relação às
demais, capacidade que culmina no desenvolvimento de lesões maiores e maior parasitismo
no hospedeiro vertebrado. Ainda, a infecção de camundongos C57BL/6 com parasitos e
NECA, análogo sintético de adenosina, promoveu o aumento dos parasitos nos tecidos em
decorrência da redução do infiltrado inflamatório (de Almeida Marques-da-Silva, de Oliveira
et al. 2008). Também foi demonstrado que L. amazonensis, L. braziliensis e L. major
induzem a expressão de CD39 e CD73 em células dendríticas infectadas, resultando no
comprometimento da ativação de tais células (Figueiredo, Serafim et al. 2012). Esta
capacidade, em relação a L. amazonensis, está intrinsicamente relacionada com a ativação
de A2BR, que também culmina com o aumento dos níveis intracelulares de AMPc.
(Figueiredo, Serafim et al. 2012
35
Hipótese
2. HIPÓTESE
A ativação de A2AR representa um importante mecanismo de regulação da
resposta imunológica, o qual é muito explorado na área de doenças autoimunes, e pouco
estudado em doenças infecciosas. Tem-se demonstrado que diversos microrganismos,
dentre eles parasitos do gênero Leishmania, podem evadir do sistema imunológico do
hospedeiro vertebrado ao induzir o acúmulo de adenosina no ambiente extracelular.
Deste modo, nós formulamos a hipótese que este receptor poderia estar relacionado com
a repressão da resposta imunológica específica contra Leishmania infantum em animais
BALB/c, linhagem geneticamente susceptível a leishmaniose.
37
Objetivos
3. OBJETIVOS
3.1 Objetivo geral
Determinar o papel de A2AR na regulação da resposta inflamatória induzida durante a
infecção experimental por Leishmania infantum.
3.2 Objetivos específicos
i) Determinar o número de parasitos presentes nos órgãos-alvo de animais WT (do
inglês, wild type) e A2AR-/- infectados;
ii) Caracterizar o perfil do infiltrado inflamatório presente nos sítios de infecção dos
animais WT e A2AR-/-;
iii) Caracterizar o perfil de citocinas envolvidas na resistência ou susceptibilidade a
infecção causada pelo parasito;
iv) Determinar os mecanismos reguladores de A2AR sobre a resposta inflamatória na
LV.
39
Material e Métodos
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1 Animais
Foram utilizados camundongos fêmeas BALB/c selvagens WT e camundongos
BALB/c geneticamente deficientes para A2AR (A2AR-/-), com cerca de 7 a 8 semanas de
idade. Os animais, pesando entre 18 e 22 g, acondicionados em micro-isoladores,
receberam água e ração ad libitum e foram mantidos em temperatura controlada (22 a
25°C) no biotério do Departamento de Imunologia e Bioquímica da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto - USP. Os experimentos foram conduzidos de acordo com o Comitê de
Ética da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP Processo Nº 196-2011.
4.2 Parasitos e infecção experimental
Os camundongos foram infectados via plexo retro orbital com 1x10 7 formas
promastigotas em fase de crescimento estacionário da cepa HU-UFS 14 de L. infantum.
Tais parasitos foram mantidos a 25°C em meio Schneider (Sigma-Aldrich, Saint Louis,
EUA) suplementado com soro bovino fetal a 20% (Gibco®, Life Technologies, Carlsbad,
CA, EUA), 2% de urina humana masculina, 2 mM de L-glutamina, e 20 μg/mL de
gentamicina (Schneider completo) em garrafas de cultura estéreis (Corning Incorporated,
Corning, NY-EUA).
4.3 Análise da carga parasitária dos animais infectados
Para detecção do número de parasitos presentes nos órgãos-alvo de L.
infantum, baço e fígado de camundongos WT e A 2AR-/- foram removidos e pesados nos
tempos quatro e seis semanas após a infecção. Assim, a porção inferior do baço e o
41
lóbulo esquerdo do fígado foram triturados em um volume de 10 mL de tampão fostato
salino (PBS) 1x. O volume total foi centrifugado a 3000 rpm, 25°C, 10 minutos e
ressuspendido a volume final de 1 mL de Schneider completo. Posteriormente, as
diluições seriadas foram feitas em placas estéreis de 96 poços de fundo chato, conforme
a técnica de diluição limitante, descrita anteriormente por TITUS et al., 1985. A contagem
de poços Leishmania-positivos foi realizada até 15 dias após o início da cultura e o
número de parasitos presentes nos órgãos foi estimado conforme descrito por BUFFET
et al., 1995 (Buffet, Sulahian et al. 1995).
4.4 Antígeno particulado de Leishmania infantum
Os parasitos, cultivados conforme descrito acima, foram coletados quando
atingiram a fase estacionária de crescimento e foram submetidos a 10 ciclos de
congelamento (-196°C em nitrogênio líquido) e descongelamento (4°C em gelo). Assim, o
extrato proteico foi submetido à quantificação por meio do reagente de Bradford (SigmaAldrich),
seguindo
as
instruções
do
fabricante,
com
consequente
uso
do
espectrofotômetro Spectramax 190 (Molecular Devices, Sunnyvale, CA, EUA).
4.5 Imunohistoquímica de tecido hepático
O método para análise imuno-histoquímica da presença de iNOs e de
neutrófilos no fígado de camundongos infectados por
L. infantum foi o da
imunoperoxidase, por meio da avidina-biotina-peroxidase. A reação foi realizada em
cortes de fígado (5µm de espessura) obtidos de tecidos parafinados, os quais foram
provenientes de camundongos WT ou A2AR-/- não infectados e com seis semanas após a
infecção.
42
Inicialmente, a parafina foi removida dos cortes histológicos com xilol e
hidratados com concentrações decrescentes de álcool (do absoluto ao álcool 70%). Em
seguida, a recuperação antigênica foi realizada através do calor (banho-maria a 42 ºC)
utilizando tampão citrato pH 6.0 durante 30 minutos. A peroxidase endógena do tecido foi
bloqueada através da incubação dos cortes com água oxigenada a 3% em PBS 1X, por
20 minutos. Posteriormente, os cortes foram submetidos a três lavagens de 3 minutos
com PBS 1X, para marcação de neutrófilos, e PBS saponina 0.01%, para a marcação de
iNOS. O bloqueio da avidina e biotina entógena foram realizados com o uso do kit de
bloqueio de avidina/biotina (Vector Labotarories, Burlingame, CA, EUA) seguida de duas
lavagens com PBS/PBS saponina 0.01%.
Para o bloqueio das ligações proteicas inespecíficas foi utilizado BSA
(albumina sérica bovina) 1% durante 30 minutos. Os cortes foram finalmente incubados
com anticorpo primário de superfície, específico para marcação de neutrófilos, UltraLEAF™ Purified anti-mouse Ly6G, clone:1A8 (Biolegend, San Diego, CA, EUA) diluído em
BSA 1% numa titulação de 1:500, e específico para marcação de iNOS sc-649 (Santa
Cruz Biotechnology, Dallas, Texas, EUA) diluído em saponina 0.01% em PBS. Deste
modo, os cortes foram incubados overnight à 4ºC.
Após esse período, as lâminas foram lavadas e incubadas por 45 minutos à
temperatura ambiente com o anticorpo secundário biotinilado (Vector Laboratories). Após
novas lavagens, foi adicionado o complexo avidina-biotina peroxidase (Vector
Laboratories) por 45 minutos, à temperatura ambiente ao abrigo da luz. Decorrido o tempo
de incubação, os cortes foram lavados com PBS/PBS saponina 0.01% e a revelação da
reação foi realizada através da adição do substrato diaminobenzidina (DAB) (Vector
Laboratories). As reações foram interrompidas com água, as lâminas contra- coradas com
hematoxilina de Mayer por 3 minutos, seguida de lavagem em água corrente por 10
43
minutos e, então, submetidas à bateria de desidratação (álcool 80%, álcool 90% e xilol por
3 minutos cada) emontadas com Bálsamo de Canadá (Vetec Química, Rio de Janeiro,
Brasil).
A análise das áreas positivas para marcação de iNOS no tecido hepático foi
realizada com o uso do aplicativo IHC Toolbox software ImageJ (NIH, MacBiophotonics,
Boston, USA).
4.6 Obtenção de células do baço
Para a obtenção de leucócitos, baços de camundongos WT e A2AR-/- foram
removidos durante as 2a, 4a, 6ª e 8a semanas após a infecção. Sob condições estéreis, os
órgãos foram macerados em PBS 1x estéril, lavados e centrifugados (10 min, 1300 rpm a
4ºC). As hemácias presentes foram eliminadas por choque osmótico com o uso de 2,0 mL
de tampão de lise, constituído por duas soluções: cloreto de amônio a 0,16M e Tris a
0,17M. Imediatamente após este processo, as células foram lavadas e ressuspensas em
1,0 mL de meio RPMI 1640 completo (L-Glutamina 1%, penicilina e streptomicina 1%,
soro fetal bovino 5%, 2-mercaptoetanol 0,1%, aminoácidos não- essenciais 1% e piruvato
1%).
O número absoluto das células foi determinado pela contagem de alíquotas
diluídas em Tripan Blue, na proporção de 1:100, em câmera de Neubauer, com o auxílio
de microscópio óptico (aumento de 40x) e contador manual.
4.7 Fenotipagem do perfil leucocitário presente no baço
Com o objetivo de caracterizar o infiltrado celular no baço dos animais WT e
A2AR-/- infectados com L. infantum, as células isoladas foram ressuspensas a uma
concentração de 1 x106 células em 50 μL, e fixadas com 125 μL de solução PBS-Formol
44
2,5% com subsequente incubação por 11 minutos a 25 ºC. Em seguida, as células foram
lavadas com PBS 1x e submetidas a incubação com soro de coelho 10% a 4 ºC por 30
minutos para o bloqueio de receptores Fc (FcRs). Às células fixadas, foram adicionados
anticorpos monoclonais contra os antígenos de superfície Ly6G (conjugado a APC, PE e
Alexa Fluor® 700), CD11b (conjugado a FITC e APCCy7), CXCR2 (conjugado a PE e
PERCP), CD69 (conjugado a PECy7), CD39 (conjugado a PE), CD4 (conjugado a FITC),
CD8 (conjugado a PECy7) e CD19 (conjugado a APC). Após a adição dos anticorpos, as
células foram incubadas ao abrigo da luz a 4 ºC por 30 minutos.
Subsequente ao período de incubação, as células foram lavadas com PBS 1X,
centrifugadas por 1 minuto a 8000 rpm e ressuspensas em 100μl de PBS-formol 1%. A
aquisição das células foi realizada em citômetro de fluxo (FACs canto II; Becton
Dickinson, San Jose, EUA). As análises foram feitas usando o programa FlowJo
(FlowCytometry Analysis Software v7.6.5) o qual permite analisar todas as células
adquiridas (100.000/amostra) ou apenas determinadas populações, individualizadas por
janelas (“gates”) estabelecidas com base em parâmetros de tamanho (FSC),
granularidade (SSC) ou fluorescência (FL).
A análise da intensidade de expressão proteica por citometria de fluxo foi
realizada com base na mediana integrada de intensidade de fluorescência (iMFI)
(Stevens, Torelli et al. 2013).
4.8 Cultura de células do baço para marcação intracelular
Para marcação intracelular de IFN-γ, foi realizada a cultura de células totais do
baço. Para isso, 2,0 x 106 céls/poço em placas de cultura com 24 poços (Corning, New
York, EUA) foram estimuladas com 50ηg/mL de PMA (acetato de formol miristato),
500ηg/mL ionomicina e 1μL de BD Golgi PlugTM (Becton Dickinson) por 4 horas em estufa
45
a 37 ºC e 5% de CO2. Decorrido o período de incubação, as células foram submetidas à
fixação com PBS-formol 4% por 11 minutos. Subsequentemente, as células foram lavadas
e permeabilizadas com tampão de permeabilização contendo soro fetal bovino a 1%
(Gibco, Life Technologies), saponina 0,5% (Sigma-Aldrich) e azida de sódio 0,1%
(MERCK S.A Indústrias Químicas, Rio de Janeiro, RJ, Brasil). Após 30 minutos de
incubação com soro de coelho 10% (para bloquear as possíveis ligações inespecíficas
dos anticorpos aos receptores Fc) foram adicionados concomitantemente anticorpos de
superfície, tais como CD3 conjugado a FITC, CD4 conjugado a PERCP, e anticorpo para
proteína intracelular, IFN- γ conjugado a PECy7. Após esta etapa, as células foram
armazenadas a 4ºC ao abrigo da luz por 30 minutos. Posteriormente, as células foram
lavadas com PBS 1X, centrifugadas por 1 minuto a 8000 rpm e ressuspensas em 100μl
de PBS-formol 1%. A aquisição das células foi realizada em citômetro de fluxo (FACs
canto II). As análises foram feitas usando o programa FlowJo (FlowCytometry Analysis
Software v7.6.5).
4.9 Cultura de células do baço de animais infectados com L. infantum
A cultura de células do baço foi realizada em placas de cultura com 48 poços
(Corning, New York, EUA) numa concentração de 2,5 x 10 6 céls./poço em um volume final
de 500µl. As células foram estimuladas com o antígeno específico (antígeno particulado
de Leishmania infantum) (50µg/ml) ou meio por um período de 72 horas em estufa de
BOD, 5% de CO2 a 37°C. Decorrido o período de incubação, o sobrenadante foi coletado
para mensurar os níveis de IFN-γ por ELISA (do inglês enzyme-linked immunosorbent
assay).
46
4.10
Obtenção de leucócitos no tecido hepático
A fim de obter os leucócitos infiltrados no fígado, os animais foram submetidos
à perfusão. Para isso, os animais foram eutanasiados e após o rompimento da veia portahepática, foi inoculado aproximadamente 10mL de PBS-1x estéril no ventrículo esquerdo.
Posteriormente, os fígados dos animais WT e A 2AR-/- foram coletados e após a remoção
da vesícula biliar os órgãos foram fragmentados e incubados na presença de colagenase
tipo IV 100U/mL (Sigma-Aldrich) por 42 minutos a 37 ºC sob agitação de 220 rpm.
Após a digestão enzimática, foi adicionado soro fetal bovino (Gibco, Life
Technologies) aos tubos, de maneira que atingisse a concentração de 10% a fim de
bloquear a atividade da colagenase IV (Sigma-Aldrich). Após esta etapa, os tubos foram
centrifugados a 1300 rpm, 10 minutos, 4ºC, desprezado o sobrenadante e o precipitado
tecidual foi ressuspenso em Percoll 40% (GE Healthcare Life Science, Piscataway, NJ,
EUA) e centrifugado a 2500 rpm, 30 minutos, 25 ºC. O sobrenadante resultante foi
removido com o uso de pipeta volumétrica, e o precipitado celular foi ressuspenso em 1.0
mL de meio RPMI completo para posterior contagem dos leucócitos. As células
inflamatórias foram fenotipadas como descrito nos itens 4.7 e 4.8.
4.11
Depleção de Neutrófilos e IFN-ɣ in vivo
A depleção de neutrófilos ou IFN-ɣ em animais WT e A2AR-/- foi realizada com o
uso do anticorpo Ultra-LEAF™ anti-mouse Ly6G clone 1A8 (Biolegend) ou anticorpo in
Vivo Mab anti-mouse IFN-γ clone XMG1.2 (BioXCell, West Lebanon, New Hampshire,
EUA), respectivamente. O tratamento consistiu de uma injeção com 20µg de α-Ly6G ou
αIFN-ɣ12 horas antes e 24 horas após infecção com 1x107 formas promastigotas. Entre o
período de quatro a seis semanas pós-infecção, os animais foram tratados com mais
47
10µg de cada anticorpo em dias alternados. O grupo controle foi tratado com IgG não
relevante. Os animais foram eutanasiados na sexta semana após a infecção.
4.12
Extração do RNA total e confecção de DNA complementar (cDNA)
O RNA total foi extraído a partir de fragmentos de baço de camundongos WT e
A2AR-/- coletados durante a 2 a, 4a, 6ª e 8a semana após a infecção, e também foram
extraídos de animais não infectados. O método de extração combinou a utilização de
TRIzol (Invitrogen Corporation-Carlsbad, EUA) com o kit de extração Sv Total RNA
Isolation System (Promega, Madson, WI, EUA). Após a coleta do órgão, um fragmento de
aproximadamente 100 mg de tecido foi armazenado em 500 μL de reagente TRIzol a 70°C até o momento da extração. O tecido foi então descongelado e triturado a 4 ºC com
auxílio de haste homogenizadora livre de RNAse. Após o processamento das amostras,
foram adicionados 200μL de clorofórmio com subsequente agitação por 15 segundos e
centrifugação a 13000 rpm por 10 minutos a 4°C. A fase límpida foi coletada e utilizada
para extração de RNA pelo kit Sv Total RNA Isolation System de acordo com o protocolo
fornecido pelo fabricante.
Após extração, o RNA foi quantificado e avaliado quanto a pureza com auxílio
do NanoDrop™ 2000 (Thermo Físher, Madson, Waltham, EUA). O RNA extraído foi
submetido à confecção de cDNA. Para isso, inicialmente todas as amostras foram diluídas
a 500ng em volume final de 10 μL. Consecutivamente, à reação foi adicionado o mix
contendo 1 μL da enzima Transcriptase Reversa SuperScript™ III, 4 μL de tampão da
enzima, 1 μL de DTT 0,1 mM e 1 μL de dNTP 10 mM (Invitrogen Corporation-Carlsbad,
EUA) (200 U/μL), totalizando 20 μL de volume final. Esse volume foi submetido a um ciclo
de 25°C por 10 minutos, seguido de 120 minutos a 37°C, 85°C por 5 minutos e 10°C por
tempo indeterminado no termociclador PTC-100 (MJ Research, Watertown, EUA). O
48
cDNA foi diluído 10 vezes em água livre de nucleases e foi armazenado a -70°C até o
momento do uso.
4.13
PCR em tempo real
A análise relativa de transcritos de genes alvos foi realizada por PCR em tempo
real, utilizando-se do cDNA confeccionado a partir das amostras supracitadas ajustadas a
concentração de 80ng/μL. A reação foi realizada com 6,5 μL de SYBER Green Mix
(Invitrogen Corporation-Carlsbad, EUA), 0,5 μL de primers (+) e (-), respectivamente, a 10
μM, 5 μL do cDNA (80ng/μL, totalizando na reação 400ng de cDNA).
As reações ocorreram com o uso do sistema de PCR em tempo real
StepOnePlus™ (Applied Biosystems, EUA), compreendendo 2 minutos a 50°C, 2 minutos
a 95°C e 40 ciclos de 15 segundos a 95°C – 30 segundos a 58°C - 30 segundos a 72°C.
Um ciclo final de 20 minutos com temperatura crescente de 60 a 95°C foi empregado para
obtenção da curva de dissociação dos produtos da reação, utilizada para análise da
especificidade da amplificação. Todas as reações foram feitas em duplicatas. Os dados
foram normalizados por meio da expressão do gene endógeno B2m (beta-2
microglobulina), NM_009735.3, ou Gapdh, NM_001289726, e analisados com base no
valor de Ct (cicle threshold), ou linha de corte. O resultado foi calculado com a fórmula
ΔΔCt = ΔCt da amostra – ΔCt da amostra controle, onde ΔCt = (Ct gene estudado) – (Ct
B2m). O número de vezes de expressão diferencial do RNA mensageiro comparado com
o controle foi definido pela fórmula 2-ΔΔCt. Os primers e sequências utilizados durante a
reação de PCR em tempo real encontram-se listados na Tabela 1.
49
4.14
Análise estatística dos resultados
Os resultados estão representados como média ± desvio padrão (DP). A
análise de variância (ANOVA) seguida pelo pós-teste de Tukey foi aplicado para amostras
com distribuições normais. As análises foram realizadas através do programa GraphPadPrism (GraphPad Software Inc., San Diego CA, EUA) e foram consideradas
estatisticamente significativas as diferenças que apresentaram valores de P igual ou
inferior a 0.05.
Tabela 1: Sequência dos primers utilizados nas reações de PCR em tempo real.
Gene (Accession
Sequência (+)
Sequência (-)
number)
B2m
CACCCCCACTGAGACTGATACATA
TCACATGTCTCGATCCCAGTAGA
TGCAGTGGCAAAGTGGAGAT
CGTGAGTGGAGTCATACTGGAA
(NM_009735.3)
Gapdh
(NM_001289726)
Cxcl1
CTTCCCTTGGACATTTTGTGTC
TTTGAACGTCTCTGTCCCGAG
CGAAACGCTTCACTTCCAA
TGAGCCTATATTGCTGTGGCT
(NM_008176)
Nos2
(NM_010927)
Il10
TCTACAAGGCCATGAATGAATT
ACACACTGCAGGTGTTTTAGCT
TTTAACTCAAGTGGCATAGATGTGG
TGCAGGATTTTCATGTCACCAT
(NM_0105548)
Ifng
(NM_008337)
50
Resultados
5. RESULTADOS
5.1 A2AR confere susceptibilidade a infecção por L. infantum em animais BALB/c
A fim de avaliarmos o papel de A2AR na susceptibilidade ou resistência a
infecção por L. infantum, animais WT e A2AR -/- foram infectados por via intravenosa (i.v)
com 1 x 107 formas promastigotas em fase estacionária de crescimento. O número de
parasitos presentes nos órgãos alvo da infecção, baço e fígado, na 4ª e 6ª semana pósinfecção foi determinado pela técnica de diluição limitante (Titus, Ceredig et al. 1985;
Buffet, Sulahian et al. 1995).
Conforme demonstrado na Figura 1, os animais A2AR-/- foram mais resistentes
à infecção em ambos os tempos analisados, apresentando quantidades significantemente
menores de parasitos no baço (Figura 1A) e no fígado (Fígado 1B), quando comparados
aos animais WT.
5.2 Análise fenotípica do baço de animais WT e A2AR-/- infectados com L. infantum
Visto que A2AR encontra-se expresso em níveis elevados no baço (Sitkovsky,
Lukashev et al. 2004), e sua ativação interfere tanto na atividade como na manutenção de
linfócitos em diferentes órgãos (Sitkovsky 2003; Fredholm, Chern et al. 2007; Csóka,
Himer et al. 2008; Hasko and Pacher 2008; Cekic, Sag et al. 2013; Cekic and Linden
2014; Subramanian, Kini et al. 2014), nós fenotipamos os linfócitos B, TCD4+ e TCD8+
presentes no baço de animais WT e A2AR-/-.em diferentes períodos pós infecção.
52
Dentre os linfócitos fenotipados, nós observamos que os animais A 2AR-/- não
infectados apresentaram maiores números absolutos de células B no baço, quando
comparados aos animais WT não infectados (Figura 2C). Entretanto, a infecção com o
parasito promoveu uma redução significativa dessas células (Figura 2C) no baço de
animais A2AR-/-, quando comparadas ao grupo A2AR-/- infectado, em ambos os períodos
analisados, alcançando números similares de linfócitos fenotipados em animais WT
infectados. Não foi observado alterações no número absoluto de células TCD4+ (Figura
2A) e de TCD8+ (Figura 2B) no baço de animais A2AR-/- em todos os períodos analisados,
quando comparado ao grupo WT.
Figura 1: A2AR confere susceptibilidade à infecção por L. infantum. Camundongos WT (barras brancas)
(n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5) foram infectados com 1x107 parasitos por via intravenosa. O número de
parasitos presentes no baço (A) e no fígado (B) na 4ª (4) e 6ª (6) semana pós-infecção foi determinado
pela técnica de diluição limitante. Os resultados são representativos de três experimentos independentes e
estão expressos como média ± DP. * P <0.05 comparado ao grupo controle WT.
53
Figura 2: Fenotipagem de linfócitos no baço de animais WT e A2AR-/- ao longo da infecção por L.
infantum. O número absoluto de linfócitos TCD4+(A), TCD8+ (B) e linfócitos B (C) no baço de animais WT
(barras brancas) (n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5) foi determinado por citometria de fluxo em animais não
infectados (0) e durante a quarta (4) e sexta (6) semanas pós-infecção. Os resultados estão expressos
como média ± DP, *P <0.05 comparado ao grupo controle WT não-infectado, #P<0,05 comparado ao grupo
A2AR-/- não infectado.
5.3 A2AR participa da regulação de célulasTh1 durante a infecção por L. infantum
Visto que a ausência de A2AR-/- não interferiu no número absoluto de células
TCD4+ (Figura 2A), avaliamos se células TCD4+ produtoras de IFN-ɣ estavam alteradas
no órgão-alvo da LV, a fim de associá-las ao caráter protetor observado em animais A2AR/-
(Figura 1). Para isso, células do baço de animais WT e A2AR-/- em diferentes períodos
pós-infecção (4 e 6 semanas) e não infectados (0) foram estimuladas in vitro com PMA e
ionomicina e a produção intracelular de IFN-ɣ foi determinada por citometria de fluxo.
Nós observamos que a infecção com o parasito promoveu um aumento de
células TCD4+ produtoras de IFN-ɣ no baço de animais WT infectados quando
comparadas ao grupo controle (WT não infectado). Porém essa população foi
significativamente aumentada em animais A2AR-/- infectados, quando comparadas ao
grupo WT infectado (Figura 3A-C). Em termos de frequência, foi observado um aumento
54
significativo de células Th1 na 6ª semana pós-infecção (Figura 3B) e do número absoluto
na 4ª semana pós-infecção (Figura 3C) em animais A2AR-/-.
Figura 3: A2AR regula a produção de IFN-γ por células TCD4+ no baço durante infecção por L.
infantum. Avaliação da produção de IFN-γ por células TCD4+ do baço. Em A, dot-plots representativos da
percentagem de células TCD4+IFN-γ+ presentes no baço de animais durante a 6ª semana pós-infecção. (B)
Percentagem e (C) número absoluto de células TCD4+ produtoras de IFN-γ presentes no baço de animais
WT (barra aberta) (n=5) e A2AR-/- (barra fechada) (n=5) em animais não infectados (0) e durante as 4ª (4) e
6ª (6) semanas pós-infecção. Os resultados estão expressos como média ± DP, * P <0.05 comparado ao
grupo controle WT não-infectado. #P<0,05 comparado ao A2AR-/- não infectado, &P<0,05 comparado ao WT
infectado.
55
Por meio da análise da expressão gênica relativa por PCR quantitativa (qPCR),
nós detectamos aumento significativo da expressão de ifng no baço de animais A2AR-/- na
6ª semana pós-infecção, fenômeno que não ocorreu nos animais WT, quando comparado
aos respectivos grupos não-infectados (Figura 4A). O mesmo perfil de expressão para
esta citocina foi encontrado no fígado dos animais knockouts (Figura 4B).
O aumento da expressão gênica de ifng em animais A2AR-/- foi confirmado pela
mensuração proteica dessa citocina por ELISA. Para isso, células do baço de animais WT
e de animais geneticamente deficientes em diferentes períodos pós-infecção (4 e 6
semanas) ou não infectados (0) foram reestimuladas in vitro com antígeno solúvel de L.
infantum (SLA- do inglês: soluble leishmania antigen) por 72 h e o sobrenadante da
cultura foi coletado para mensuração dos níveis de IFN-ɣ. Foi observado uma produção
de IFN-ɣ discreta, porém significativa por células do baço de animais WT infectados,
quando comparado ao animal WT não infectado. Entretanto, verificamos que a liberação
dessa citocina foi potencializada em células provenientes de animais A2AR-/- durante a
restimulação in vitro com SLA, quando comparada com o grupo WT infectado.(Figura
4C), demonstrando que A2AR participa da regulação da resposta Th1 na LV.
A principal ação de IFN-γ no controle da infecção por Leishmania sp consiste
em ativar os mecanismos microbicidas de fagócitos, dentre eles ativar a NOS2, enzima
envolvida na síntese de NO e, em última instância, na morte dos parasitos (Liew, Wei et
al. 1997). Assim, nós avaliamos a expressão gênica de nos2 no baço de animais WT e
A2AR-/- em diferentes períodos pós-infecção. Animais geneticamente deficientes para
A2AR-/- apresentaram o aumento da expressão gênica de NOS2 no baço na 4ª e 6ª pósinfecção, quando comparados ao grupo WT infectado (Figura 4D), corroborando o
aumento de células TCD4+IFN-γ+ (Figura 3) e com a produção de IFN-ɣ (Figura 4C) por
células do baço.
56
A marcação tecidual para NOS2 no fígado foi determinada por imunohistoquímica. Assim, secções de tecido hepático de animais WT e A2AR-/- não-infectados e
durante a 6ª semana pós-infecção foram submetidas a marcação de NOS2 utilizando
anticorpos específicos e avaliadas quanto a porcentagem de área marcada no tecido
hepático. Nós identificamos que as áreas positivas para iNOS encontraram-se delimitadas
por infiltrados inflamatórios com aspectos característicos de granulomas e que os animais
geneticamente deficientes de A2AR apresentaram aumento da marcação desta enzima
durante a 6ª semana pós-infecção, quando comparados aos animais WT infectados
(Figura 4E).
57
Figura 4: A2AR regula a resposta Th1 durante a infecção por L. infantum. Fragmentos do baço e fígado
de animais WT (barras brancas) (n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5) não infectados (0) e em diferentes
períodos pós-infecção (2, 4, 6 e 8 semanas) foram submetidos a expressão gênica relativa por qPCR para
ifng (A, B) e NOS2 (D). Células do baço de animais WTs ou KOs em diferentes períodos pós-infecção (0, 4
e 6 semanas) foram reestimuladas ou não in vitro com SLA por 72h. A produção de IFN-ɣ foi determinada
no sobrenadante da cultura por ELISA (C). Marcação de NOS2 no tecido hepático de camundongos WT
(n=5) e KOs (n=5) na 6ª semana pós-infecção ou não infectados por imunohistoquímica utilizando anticorpo
específico. As fotos representam capturas feitas em aumento de 20X e 40X (E). Os resultados estão
expressos como média ± DP, #P<0,05 comparado ao A2AR-/- não infectado, &P<0,05 comparado ao WT
infectado.* P <0.05 comparado ao grupo controle WT não-infectado.
58
5.4 A2AR regula o infiltrado de neutrófilos no baço e no fígado ao longo da infecção
por L. infantum
Devido ao fato dos neutrófilos desempenharem um papel importante no
controle da infecção por Leishmanias (McFarlane, Perez et al. 2008), avaliamos a
presença do polimorfonuclear nos órgãos-alvo da LV.
Com base em seu tamanho característico (FSC) e granularidade (SSC),
observamos um aumento significativo das células totais quando analisadas dentro do gate
de granulócitos em animais A2AR-/- (Figura 5A, paineis superiores). Ao fenotipar tais
células, verificamos freqüências de células Ly6G+CD11bhigh presentes nas amostras do
baço dos camundongos WT infectados (Figura 5A, paineis inferiores). A porcentagem
do influxo de neutrófilos foi siginificativamente aumentada em animais A2AR-/- infectados,
apresentando um aumento de aproximadamente (~) 15% em comparação com WT
infectados na 6ª semana pós-infecção (Figura 5B). Em termos de números absolutos, o
aumento de células Ly6G+CD11bhigh em animais A2AR-/- infectados foi de ~ 88% na 4ª
semana e ~ 60% na 6ª semana (Figura 5C) quando comparados ao grupo WT infectados.
Os neutrófilos são responsivos aos membros da família de quimiocinas CXC e
a secreção desses fatores é de fundamental importância para o processo de migração
dessas células para o sítio de infecção (Charmoy, Megnekou et al. 2007). Ao ser avaliada
a expressão de mRNA para cxcl1, verificamos uma alta expressão no baço dos animais
geneticamente modificados durante a sexta semana de infecção (Figura 5D), coincidindo
com o pico de migração de neutrófilos (Figuras 5B e C).
Assim como no baço, o mesmo perfil inflamatório neutrofílico foi encontrado no
fígado de animais A2AR-/- durante a sexta semana de infecção (Figura 6). Camundongos
A2AR-/- apresentaram um aumento de ~ 50% na frequência de células Ly6G+CD11bhigh no
59
fígado (Figura 6A). Ao ser realizada a marcação de neutrófilos por imunohistoquímica,
nota-se a marcação expressiva de neutrófilos concentradas nas áreas inflamatórias
sugestivas de granuloma hepático em animais A2AR-/- infectados, quando comparada ao
WT infectado (Figura 6B).
Figura 5: A2AR regula o infiltrado de neutrófilos para o baço durante infecção por Leishmania
infantum. Os neutrófilos foram selecionados de acordo com seu tamanho (FSC) e granulosidade (SSC)(A).
Os dot-plots representam a frequência (B) e o número absoluto (C) da população de neutrófilos
caracterizadas por células LY6GhighCD11bhigh por citometria de fluxo no baço de animais WT (barras
brancas) (n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5) em animais não infectados (0), e durante a 4ª (4) e 6a (6)
semana pós-infecção. Expressão gênica de cxcl1 relativo à expressão de B2m no baço de animais WT
(barras brancas) e A2AR-/- (barras pretas) não infectados (0) e infectados por L. infantum em diferentes
períodos pós-infecção (2ª, 4ª, 6ª e 8ª semanas). Os resultados estão expressos como média ± DP, #P<0,05
comparado ao A2AR-/- não infectado, &P<0,05 comparado ao WT infectado.*P <0.05 comparado ao grupo
controle WT não-infectado.
60
Figura 6: A2AR regula o infiltrado de neutrófilos para o fígado durante a sexta semana infecção por L.
infantum. Em A, dot-plot representativo da sexta semana de infecção por L. infantum no fígado,
demonstrando a análise de gate utilizada para a quantificação do infiltrado de neutrófilos (CD11b +Ly6Ghigh)
de animais WT e A2AR-/-. Os gráficos exibem a frequência e o número absoluto de neutrófilos no fígado de
animais WT (barras brancas) (n=2) e A2AR-/- (barras pretas) (n=3) 6 semanas após a infecção. (B) Marcação
de Ly6G no tecido hepático de camundongos WT e KOs durante a 6ª semana pós-infecção ou não
infectados por imunohistoquímica utilizando anticorpo específico. As fotos representam capturas feitas em
aumento de 20X, 40X e 100X. (C) Carga parasitária de animais WT (barras brancas) e A 2AR-/- (barras
pretas) durante a sexta semana de infecção tratados e não tratados com anticorpo α-Ly6G. As setas
indicam células abrigando as formas amastigotas de L. infantum. Os resultados estão expressos como
média ± DP, #P<0,05 comparado ao A2AR-/- não tratado, * P <0.05 comparado ao grupo controle WT
infectado não tratado com α-Ly6G.
61
Sabe-se que neutrófilos são fundamentais para o controle da replicação do
parasito durante a leishmaniose visceral (Rousseau, Demartino et al. 2001; McFarlane,
Perez et al. 2008). Deste modo, nos questionamos se o polimorfo poderia estar
relacionado com o controle da infecção por L. infantum no fígado. Conforme demonstrado
na Figura 6C, a depleção de neutrófilos com o uso do anticorpo α-Ly6G foi capaz de
reverter o fenótipo protetor dos animais A2AR-/-, apresentando números similares de
parasitos aos animais WT não tratados, demonstrando papel protetor de neutrófilos
mediado via A2AR na LV. Em nosso modelo, nós não observamos diferença
estatisticamente significativa no que diz respeito aos grupos WT tratados e WT não
tratados.
5.5 A2AR regula a expressão de moléculas relacionadas com a ativação e
quimiotaxia de neutrófilos ao longo da infecção por L. infantum no baço
A ativação de neutrófilos por produtos microbianos ou citocinas induz
expressão de selectinas e integrinas as quais permitem o rolamento, adesão e
subsequente transmigração do polimorfonuclear do endotélio para o sítio de infecção
(Atzeni, Schena et al. 2002; Hayashi, Means et al. 2003; Atzeni, Del Papa et al. 2004).
Nesse sentido, avaliamos o perfil de ativação do polimorfonuclear com base na marcação
de CXCR2 e CD69 por citometria de fluxo.
62
De acordo com a Figura 7, neutrófilos oriundos do baço de camundongos
A2AR-/- apresentam aumento na expressão de CXCR2 (Figura 7A) e de CD69 (Figura 7C)
em sua superfície celular durante a sexta semana de infecção, quando comparados ao
grupo WT. Nós também identificamos que A2AR exerceu atividades reguladoras sobre a
expressão de CD39 em neutrófilos, molécula intimamente envolvida com sua quimiotaxia
(Corriden, Chen et al. 2008) (Figura 7B).
Figura 7: A2AR regula a expressão de moléculas de superfície relacionadas com a ativação e
quimiotaxia de neutrófilos durante infecção por L. infantum no baço. Expressão de CXCR2 (A), CD62L
(B), CD39 (C), CD69 (D) (iMFI) em células Ly6G+CD11bhigh durante a sexta semana pós-infecção em
animais WT (barras brancas) (n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5). Os resultados estão representados como
média ± DP. Dados representativos da sexta semana de infecção. A diferença estatística entre os grupos
avaliados foi determinada pelo uso do teste t (*p<0.05).
5.6 O recrutamento e a ativação de neutrófilos para o baço de animais A2AR-/- é
dependente de IFN-γ
Considerando os níveis aumentados de IFN-γ (Figuras 3 e 4) e o intenso
infiltrado neutrofílico (Figuras 5 e 6) nos órgãos alvo da LV, e ainda que IFN-ɣ é um
potente modulador de neutrófilos (Meda, Gasperini et al. 1994), nós nos questionamos se
o recrutamento do polimorfonuclear ocorreu de maneira dependente de IFN-γ. Para isso,
realizamos a depleção de IFN-γ com o uso de anticorpo específico em animais WT e
63
A2AR-/-, como mencionado em M&M. De acordo com a Figura 8, o tratamento com α-IFNγ
foi capaz de reduzir aproximadamente 40% da frequência do polimorfo no baço de
animais A2AR-/- durante a sexta semana pós-infecção (Figura 8A-B). Nós não detectamos
diferenças estatisticamente significativas no que diz respeito ao número absoluto de
neutrófilos presentes no baço, embora tenha havido um decréscimo tendencioso após o
tratamento, alcançando níveis similares observados em animais BALB/c (Figura 8C). Ao
investigarmos os mecanismos desempenhados com o bloqueio de IFN-γ que culminam na
redução do recrutamento do polimorfonuclear para o foco infeccioso, a depleção desta
citocina foi capaz de reduzir significativamente a expressão de moléculas relacionadas
com a quimiotaxia e ativação de neutrófilos, tais como CXCR2 (Figura 8D) e CD69
(Figura 8E), demonstrando que IFN-ɣ regula a migração e ativação de neutrófilos na
ausência de A2AR.
64
Figura 8: O infiltrado de neutrófilos para o baço e a sua ativação em animais A2AR-/- é dependente de
IFN-γ. Em A, dot-plot representativo da sexta semana de infecção por L. infantum no baço de animais WT e
A2AR-/- não tratados e tratados com α-IFN-γ. (B) Frequência e (C) número absoluto de neutrófilos seis
semanas após a infecção no baço de animais WT (barra branca) e A 2AR-/- (barra preta) não tratados (n=5) e
tratados com α-IFN-γ (n=5). Expressão de CXCR2 (iMFI) (D) e CD69 (iMFI) (E) por neutrófilos do baço de
animais WT (barra branca) e A2AR-/- (barra preta) durante a sexta semana de infecção por Leishmania
infantum não tratados e tratados com α-IFN-γ. Os resultados estão expressos como média ± DP, #P<0,05
comparado ao A2AR-/- não tratado, * P <0.05 comparado ao grupo WT infectado não tratado com α-IFN-γ.
5.7 A2AR regula a expressão gênica de il10 durante a infecção por L. infantum
Tendo em vista que a via de sinalização mediada por A2AR promove a
trascrição de genes antiinflamatórios como a IL-10 (Cronstein 1994; Haskó and Cronstein
2004; Csóka, Németh et al. 2007; Haskó, Linden et al. 2008; Zarek, Huang et al. 2008) e
esta citocina está relacionada com a persistência do parasito por inibir a ativação dos
mecanismos microbicidas de fagócitos (Murray, Lu et al. 2002; Murray, Moreira et al.
2003), avaliamos se a IL-10 estava alterada em animais A2AR-/-.
65
De acordo com a Figura 9, animais WT infectados apresentaram expressão
de il10 aumentada em ambos os órgãos-alvo da LV, sendo proeminente na quarta
semana de infecção no baço (Figura 9A), e durante a sexta e oitava semanas de infecção
no fígado (Figura 9B), quando comparada ao grupo WT não infectado. Entretanto,
animais A2AR-/- apresentaram expressão gênica de il10 reduzida em todos os períodos
analisados, quando comparados ao grupo WT infectado, sugerindo que a resposta
inflamatória na LV pode ser modulada por IL-10 produzida via A2AR.
Figura 9: A2AR regula a expressão de gênica de il10 em animais BALB/c durante a infecção por
Leishmania infantum. Em A, expressão gênica de il10 relativa a expressão de B2m no baço de animais
WT (barras brancas) (n=5) e A2AR-/- (barras pretas) (n=5) não infectados (0) e durante a segunda (2),
quarta(4), sexta (6) e oitava (8) semana de infecção. Em B, expressão gênica de il10 relativa a expressão
de Gapdh no fígado de animais Wt (barras brancas) e A2AR-/- (barras pretas) não infectados (0) e durante a
segunda (2), quarta (4), sexta (6) e oitava (8) semana de infecção. Os resultados estão expressos como
média ± DP, &P<0,05 comparado ao grupo A2AR-/- infectado.* P <0.05 comparado ao grupo controle WT
não-infectado.
66
Discussão
6. DISCUSSÃO
Neste
trabalho,
identificou-se
que
A2AR
é
responsável
por
conferir
susceptibilidade à infecção por L. infantum em camundongos BALB/c, ao ser observado
redução dos níveis de parasitos nos órgãos alvo da doença durante quatro e seis
semanas após a infecção em animais A2AR-/-.
Crescente têm sido as evidências de que os mecanismos regulatórios da
resposta imunológica proporcionado pela ativação de A 2AR encontram-se intimamente
relacionados com a evasão de microrganismos patogênicos dos mecanismos de defesa
do hospedeiro (de Almeida Marques-da-Silva, de Oliveira et al. 2008, Alam, Kurtz et al.
2009, Thammavongsa, Kern et al. 2009, Figueiredo, Serafim et al. 2012). Em modelo
experimental de gastrite induzida por Helicobacter felis, Alam e colaboradores, em 2009,
verificaram que o estômago de camundongos A 2AR-/- encontravam-se mais inflamados, ao
ser constatado maior infiltrado de células mononucleares e polimorfonucleares quatro
semanas após a infecção quando comparados aos animais WT. Ainda, ao ser feito o uso
de animais deficientes para IL-10, os quais controlam espontaneamente a infecção
gástrica induzida por H. pylori, o grupo evidenciou que ao ser realizada a administração
de ATL313 (agonista de A2AR) na alimentação desses animais, houve a redução do score
da gastrite, redução do infiltrado inflamatório e atenuação da produção de TNF e IFN-γ.
Entretanto, esta melhora foi acompanhada pelo aumento da colonização do agente
patogênico. Assim, esses dados sugerem que a ação inibitória de adenosina, sobre a
resposta inflamatória, tornou a infecção por H. pylori persistente.
A infecção por Staphylococcus aureus está frequentemente relacionada com
bacteremia, e seu tratamento é limitado devido a sua emergente resistência à meticilina.
68
Tem-se documentado que este patógeno possui diversas maneiras de evadir do sistema
imunológico, dentre elas a capacidade de produzir adenosina. Tammavongsa e
colaboradores, em 2009, identificaram a presença da adenosina sintase A (AdsA) na
parede celular destas bactérias, a qual hidrolisa o AMP em adenosina. Deste modo, o
grupo evidenciou que esta enzima é indispensável para a sobrevivência de S. aureus na
corrente sanguínea, na formação de abscessos nos rins, e na resistência às atividades
microbicidas desempenhadas por neutrófilos. Dessas observações, foi levantada a
hipótese de que a adenosina oriunda da atividade de AdsA poderia ativar A 2AR presente
em macrófagos e neutrófilos, culminando na supressão da atividade microbicida dessas
células nos momentos iniciais da infecção.
Diversos estudos (Berrêdo-Pinho, Peres-Sampaio et al. 2001, de Almeida
Marques-da-Silva, de Oliveira et al. 2008, Figueiredo, Serafim et al. 2012) apontam que
parasitos do gênero Leishmania são incapazes de sintetizar adenosina, molécula de
extrema importância para a sobrevivência e replicação do protozoário. Por meio da ação
de nucleosídeo hidrolases presentes na membrana plasmática do parasito, as diversas
“isoformas de adenosina” presentes no ambiente extracelular, tais como ATP, ADP e AMP
são
convertidas em adenosina.
Recentemente demonstrou-se
que o
bloqueio
farmacológico de nucleosídeos hidrolases presentes na membrana de parasitos, tais
como L. infantum e L. amazonensis, com o uso de imucilinas foi capaz de reprimir a
replicação de formas promastigotas em cultura e de amastigotas intracelulares in vitro
(Freitas, Nico et al. 2015). Deste modo, nós especulamos que a infecção por L. infantum,
em nosso modelo, esteja contribuindo para o aumento dos níveis extracelulares de
adenosina tanto pela síntese direta do nucleosídeo, por meio de nucleosídeo hidrolases
(Freitas, Nico et al. 2015), quanto pela indução de sua produção por promover o aumento
69
da expressão de ectonucleotidases em células do sistema imunológico (Figueiredo,
Serafim et al. 2012).
A adenosina, em mamíferos, exerce diversos efeitos biológicos ao interagir
com os membros da família 1 de receptores purinérgicos (P1R), tais como A1R, A2AR,
A2BR e A3R (Fredholm, IJzerman et al. 2001). Sabe-se que estes receptores encontram-se
amplamente expressos em órgãos linfoides e em células do sistema imunológico,
regulando diversas funções quando ativados (Ohta and Sitkovsky 2001, Subramanian,
Kini et al. 2014).
Nossos achados evidenciaram que a susceptibilidade de animais BALB/c está
intimamente relacionada com os mecanismos reguladores decorrentes da ativação de
A2AR, uma vez que acompanhada da redução da carga parasitária, nós identificamos o
aumento da polarização de células T para o perfil Th1 no baço de animais A 2AR-/-, não
havendo diferença no número de células TCD4 + entre os animais WT e knockouts
infectados, e aumento da atividade efetora dessas células ao ser constatada elevada
expressão gênica de ifng ao longo da infecção no baço, e durante a sexta semana de
infecção no fígado, nos animais geneticamente modificados. Em relação as células B, nós
identificamos que animais A2AR-/- não infectados apresentam maior número deste subtipo
celular, e que a infecção por L. infantum induziu a retração do número dessas células a
níveis comparáveis aos animais WT.
De fato, tem-se descrito que a ativação de A2AR em células T culmina na
supressão de suas atividades efetoras. Huang e colaboradores, em 1997, identificaram
que baixas doses de adenosina são capazes de inibir a ativação de células T e inibir a
expressão de CD25, reduzindo, dessa maneira, sua proliferação e expansão em
decorrência da diminuição da sinalização via IL-2. Embora baixas doses do nucleosídeo
70
interajam exclusivamente com A1R, por ser o receptor com maior afinidade a adenosina,
tem-se documentado que a ativação desse receptor induz a expressão de A 2AR em
linfócitos T (Naamani, Chaimovitz et al. 2014). Estudos in vitro demonstram que A2AR é
diferencialmente regulado entre os subtipos de células T, sendo mais expresso em células
T efetoras, e que sua sinalização culmina na redução da secreção de citocinas próinflamatórias e indução da secreção de citocinas anti-inflamatórias, proposto como um
importante mecanismo de retroalimentação negativa e controle da inflamação (Thiel,
Caldwell et al. 2003). Lappas e colaboradores, em 2005, demonstraram que células
TCD4+ murinas ativadas com anticorpos monoclonais anti-CD3 aumentam cinco vezes a
expressão de adora2a, gene que codifica A2AR, e tornam-se mais responsivas ao
agonista ATL146e, culminando no aumento dos níveis intracelulares de AMPc e redução
da produção de IFN-γ. Além de inibir a polarização de células T in vitro, sabe-se que A2AR
é capaz de inibir a atividade efetora de células T ex vivo (Csóka, Himer et al. 2008).
De acordo com a literatura, ao realizarmos a estimulação ex vivo de células do
baço de animais WT e knockouts, em diferentes períodos de infecção, com antígenos
solúveis de L. infantum, verificamos intensa produção de IFN-γ durante a sexta semana
de infecção na cultura de células oriundas de animais A2AR-/-. Este dado reforça a nossa
hipótese de que, durante a infecção por L. infantum, a ativação de A2AR inibe a
polarização e a capacidade efetora de células T produtoras de IFN-γ.
O IFN-γ possui papel central na defesa contra parasitos do gênero Leishmania,
ao intensificar os mecanismos microbicidas de fagócitos, dentre eles o aumento da
expressão e ativação de iNOS (Liew, Millott et al. 1990, Wanasen and Soong 2008).
Deste modo, detectou-se intensa expressão de nos2 no baço durante a quarta e sexta
semana de infecção nos animais A2AR-/-, correspondendo com a maior intensidade da
resposta Th1 neste período. Semelhantemente, detectou-se pela análise de percentagem
71
de área positivas para marcação de iNOS por imunohistoquímica, maior produção da
enzima no tecido hepático durante a sexta semana de infecção, dado de acordo com o
aumento da expressão gênica de ifng no fígado.
Associado à elevada carga parasitária e reduzida polarização da resposta
imune para o perfil Th1 em animais WT, identificou-se que estes apresentaram reduzido
infiltrado de neutrófilos no baço ao longo das quatro e seis semanas de infecção, e no
fígado durante a sexta semana.
Sob condições homeostáticas, o principal receptor ativado em neutrófilos é
A1R, uma vez que este possui alta afinidade a adenosina, que é encontrada em baixas
concentrações no meio extracelular (Cronstein, Daguma et al. 1990). Assim, há estímulo
da quimiotaxia, maior adesão ao endotélio, maior produção de espécies reativas do
oxigênio e maior atividade fagocítica via FcRγ (Fredholm, Arslan et al. 2000). No entanto,
durante condições inflamatórias há o acúmulo de adenosina no meio extracelular que, por
sua vez, é capaz de ativar A2AR (Cronstein 1994). Tem-se documentado que citocinas do
padrão Th1 promovem o aumento na expressão de A2AR em fagócitos (Fortin, Harbour et
al. 2006), o que acarreta em uma série de efeitos quando ativado, tais como: inibição da
adesão celular e da produção de espécies reativas do oxigênio (Cronstein et al., 1990;
Fredholm, Zhang e Van Der Ploeg, 1996; Fredholm, (Cronstein, Daguma et al. 1990,
Fredholm, Zhang et al. 1996, Fredholm 1997); inibição da fagocitose (Salmon and
Cronstein 1990, Zalavary, Stendahl et al. 1994); diminuição da expressão de TNF, MIP
(proteína inflamatória de macrófago)-1α, MIP-1β, MIP-2α e MIP-3α (McColl, St-Onge et al.
2006); bloqueio da síntese de leucotrieno B4 e estímulo da síntese de COX
(ciclooxigenase)-2 via AMPc, ERK1/2, PI-3K e p38K (Cadieux, Leclerc et al. 2005), e
promoção da sobrevida de neutrófilos (Walker, Rocchini et al. 1997, Yasui, Agematsu et
al. 2000). Tem-se relatado que A2BR e A3R também são capazes de reprimir a geração
72
de ânion superóxido (van der Hoeven, Wan et al. 2008). Recentemente foi demonstrado
que Bordella pertussis, por meio da adenylate cyclase toxin (ACT), possui ação
moduladora sobre neutrófilos por elevar os níveis intracelulares de AMPc, culminando na
inibição da apoptose, inibição da produção de espécies reativas do oxigênio e bloqueio da
indução de neutrophil extracelular traps (NET) (Eby, Gray et al. 2014).
Em nosso estudo, também identificou-se que no baço dos animais A2AR-/- há o
aumento significativo na quantidade de células apoptóticas durante a sexta semana de
infecção (dado não mostrado). Um estudo realizado por Köröskényi e colaboradores, em
2011, revelou que a eferocitose mediada por macrófagos A 2AR-/- culmina na produção de
MIP-2, importante quimioatraente de neutrófilos, e produção de óxido nítrico. Partindo do
pressuposto de que neutrófilos constitutivamente morrem por apoptose em sítios
inflamados, e que a fagocitose de corpos apoptóticos leva a produção de mediadores antiinflamatórios, tais como PGE2 e TGF-β, Ribeiro-Gomes e colaboradores, em 2004,
investigaram se este mecanismo poderia estar relacionado com a susceptibilidade à
infecção por L. major. Neste trabalho foi verificado que ao se cocultivar macrófagos
infectados com neutrófilos apoptóticos, a resposta a tais células mortas varia de acordo
com o background genético. Em relação a camundongos BALB/c, tal interação
intensificou o crescimento dos parasitos em macrófagos infectados; em relação a
camundongos C57BL/6, a presença de neutrófilos apoptóticos intensificou a capacidade
microbicida dos macrófagos infectados. Ainda em 2004, Zandbergen e colaboradores
verificaram que neutrófilos apoptóticos infectados atuam como cavalos de tróia, ao
evidenciar que tais células foram responsáveis por infectar e promover o crescimento do
parasito em macrófagos após a eferocitose.
Uma vez que macrófagos que abrigam formas amastigotas de Leishmania sp.
se tornam mais parasitados ao ingerir células apoptóticas, nós sugerimos que na
73
deficiência de A2AR em tal processo contribua para a redução da produção de mediadores
anti-inflamatórios, aumento do infiltrado neutrofílico, aumento da expressão de nos2 e
redução do número de formas amastigotas abrigadas por macrófagos.
Outro dado que fortalece nossa hipótese diz respeito à expressão de cxcl1, que
encontra-se acentuada nos animais geneticamente deficientes de A2AR durante a sexta
semana de infecção no baço. CXCL1 é gerada localmente em sítios de inflamação, e
orquestra o recrutamento local de neutrófilos de vasos sanguíneos para os tecidos por
promover a adesão do polimorfo a células endoteliais e a transmigração para os tecidos
(Jose, Collins et al. 1991, Ley 2002). Assim, os mecanismos regulatórios da resposta
imunológica proporcionados por A2AR, comprometeriam a geração de um microambiente
pró-inflamatório capaz de induzir a produção de CXCL1.
Ao verificarmos a característica do infiltrado de neutrófilos no fígado, foi
observado que o polimorfo encontrou-se concentrado ao redor dos granulomas hepáticos
nos animais geneticamente deficientes, e disperso nos animais WT. Este dado indica que
a ausência de A2AR influenciou o recrutamento do polimorfonuclear para o foco infeccioso,
ou por incrementar a produção de mediadores que recrutam este subtipo celular e/ou por
proporcionar a expressão de moléculas de superfície que tornassem tais células mais
responsivas às quimiocinas produzidas por células de kupffer infectadas.
Ao realizarmos a depleção de neutrófilos com o uso de anticorpos monoclonais
anti-Ly6G (clone 1A8), identificou-se que este subtipo celular é importante para o controle
da infecção hepática em animais A2AR-/- durante a sexta semana de infecção por L.
infantum, ao ser constatado aumento da carga parasitária destes quando deficientes de
neutrófilos. No entanto, a carga parasitária do fígado de animais WT não foi alterada pela
74
depleção do polimorfonuclear, indicando que tais células não foram importantes para o
controle da infecção durante a sexta semana de infecção.
Com o uso do anticorpo RB6-8C5, molécula que possui como alvo tanto Ly6G
quanto Ly6C, proteínas expressas por neutrófilos quanto monócitos, Rousseau e
colaboradores, em 2001, objetivaram identificar o papel de neutrófilos durante a
leishmaniose visceral experimental induzida por L. infantum. Deste modo, foram
separados cinco grupos, os quais foram tratados com dose única deste anticorpo 48h e
5h antes e 72h e 168h após a infecção de camundongos BALB/c. Os resultados obtidos
evidenciaram o papel crucial dos neutrófilos no controle da infecção do baço nos períodos
iniciais, quando houve a depleção de tais células 5 horas antes da infecção.
Mcfarlane e colaboradores, em 2008, também evidenciaram que os neutrófilos
possuem papel relevante durante as primeiras semanas de infecção por Leishmania
donovani. Neste trabalho, ao se depletar tais células com o uso do anticorpo monoclonal
NIMP-R14, o qual é específico para Ly6G e Ly6C, foi possível verificar o aumento no
número de parasitos presentes na medula óssea e no baço de animais BALB/c, ao passo
que no fígado não se pôde estabelecer diferenças estatisticamente significativas entre os
grupos tratado e não tratado. O grupo também evidenciou que, no baço desses animais, a
ausência de neutrófilos acarretou no aumento nos níveis de IL-4 e IL-10 e na diminuição
da produção de IFN-γ por células TCD4+ e TCD8+, indicando que os polimorfonucleares
contribuem para o estabelecimento da resposta Th1 nesses animais.
Ao investigar-se o perfil de ativação de neutrófilos em nosso estudo, detectouse intensa expressão de CXCR2 na membrana de neutrófilos A 2AR-/- durante a sexta
semana de infecção, ou seja, em nosso modelo a expressão de CXCR2 encontra-se sob
a regulação de A2AR.
75
CXCR2 é um receptor de quimiocinas com sete domínios transmembrana
acoplado a proteína G (GPCR), que encontra-se expresso majoritariamente em células de
linhagem mielóide, como neutrófilos e monócitos (Thomas, Taylor et al. 1991), e possui
como ligantes quimiocinas ELR+ CXC, tais como CXCL1 (Bozic, Kolakowski et al. 1995) e
CXCL2 (Tekamp-Olson, Gallegos et al. 1990). A ativação deste receptor possui papel
chave na atividade microbicida de polimorfonucleares, uma vez que além de estar
envolvido com a quimiotaxia, também está envolvido na fagocitose, desgranulação e
produção de espécies reativas do oxigênio. Sua sinalização ocorre via GTP (trifosfato de
guanosina), levando a ativação de fosfolipase C (PLC), mobilização de cálcio, ativação de
Akt e das vias de sinalizalção MAPK e ERK 1/2 (Stillie, Farooq et al. 2009). Quando
ativado, CXCR2 é endocitado e direcionado para a degradação lisossomal, ou reciclagem,
de acordo com a estrutura de seu motivo PDZ ligante carboxi-terminal (Baugher and
Richmond 2008).
Alves-Filho e colaboradores, em 2009, identificaram que camundongos WT
(C57BL/6) apresentavam redução no número de CXCR2 expresso na membrana
plasmática de neutrófilos circulantes durante sepse severa, o que correlacionava com a
redução da migração do polimorfo para o sítio infeccioso e menor sobrevida dos animais
decorrente da redução do clearance microbiano. Neste trabalho, o grupo identificou que a
regulação negativa do receptor encontrava-se sob influências de TLR2 (Receptor tipo Toll
2). Assim, camundongos TLR2-/- apresentaram maior expressão de CXCR2 em
neutrófilos, que culminou no maior recrutamento do polimorfo para o foco infeccioso e
aumento da sobrevida dos animais
Deste modo, nós sugerimos que A2AR esteja regulando o recrutamento do
polimorfo por dois mecanismos: (i) inibição da produção de CXCL1 no foco infeccioso; (ii)
76
favorecendo a internalização de CXCR2 em neutrófilos. Assim, o polimorfonuclear estaria
contribuindo para a redução da carga parasitária nos animais geneticamente modificados.
Durante a quimiotaxia de neutrófilos, tais células liberam grandes quantidades
de ATP para o ambiente extracelular que, de maneira autócrina, leva a subsequente
ativação de receptores P2Y e de P1R (Chen, Shukla et al. 2004, Chen, Corriden et al.
2006). Neste contexto, a hidrólise do ATP mediada por CD39 expresso na membrana
plasmática de neutrófilos é crítica para a orientação quimiotática do polimorfonuclear
(Corriden, Chen et al. 2008) (Corriden, Chen et al. 2008). Em nosso estudo, também
verificamos que a expressão de CD39 encontra-se reprimida em animais WT, ao passo
que nos animais knockout esta molécula encontra-se expressa em elevados níveis na
membrana plasmática de neutrófilos no baço. Deste modo, nós evidenciamos que o efeito
modulador de A2AR sobre o recrutamento de neutrófilos na leishmaniose visceral consiste
em regular a produção de quimioatraentes de neutrófilos e reprimir a expressão de
moléculas de superfície de membrana envolvidas na quimiotaxia do polimorfonuclear para
o foco infeccioso.
Uma vez que A2AR reprime a produção de espécies reativas do oxigênio por
neutrófilos (Cronstein, Daguma et al. 1990, Haskó and Cronstein 2004), nos
questionamos se esse receptor poderia modular ativação desta célula durante a
leishmaniose visceral. Deste modo, verificamos que A2AR, além de regular o recrutamento
de neutrófilos por diferentes vias, também está relacionado com a modulação da ativação
do polimorfo devido à baixa expressão de CD69 em neutrófilos de animais WT.
CD69 é uma glicoproteína integral de membrana tipo II conhecida por ser
induzida por diferentes subtipos de células imunes após ativação (Atzeni, Del Papa et al.
2004). Em macrófagos ativados, esta molécula encontra-se expressa em níveis elevados
77
e está relacionada com a intensificação dos mecanismos leishmanicidas do fagócito
(Marzio, Mauël et al. 1999). Em neutrófilos, esta molécula também é um importante
marcador de ativação, induzida por GM-CSF, IFN-γ e IFN-α (Atzeni, Schena et al. 2002).
Deste modo, nós questionamos se o recrutamento e a ativação de neutrófilos
em animais infectados seria dependente de IFN-γ, uma vez que ambos elementos
encontraram-se elevados nos animais geneticamente modificados. A depleção desta
citocina reduziu significativamente o recrutamento do polimorfonuclear para o baço
durante a sexta semana de infecção. Entretanto, mesmo na ausência de IFN-γ houve
maior infiltrado de neutrófilos nos animais A2AR-/- em relação aos WT, indicando que o
receptor purinérgico avaliado neste estudo é capaz de regular o infiltrado de neutrófilos de
maneira independente de IFN-γ, possivelmente pelos mecanismos supracitados. De
maneira semelhante, o tratamento com anticorpo monoclonal α-IFN-γ mostrou-se eficaz
na inibição de moléculas relacionadas com a quimiotaxia e ativação de neutrófilos ao
avaliarmos a expressão de CXCR2 e CD69. Portanto, a intensificação da resposta Th1
em animais A2AR-/- favoreceu tanto o recrutamento de polimorfonucleares para o foco
infeccioso, quanto sua ativação.
A gravidade da LV em humanos, e a persistência do parasito em modelo
animal, estão intimamente relacionados com a IL-10. Sabe-se que esta citocina inibe a
produção de IL-12, IFN-γ e iNOS, culminando na redução da atividade microbicida de
fagócitos, aumento da carga parasitária, e cronicidade da infecção (Belkaid, Hoffmann et
al. 2001, Murray, Lu et al. 2002, Murray, Moreira et al. 2003, Murray, Berman et al. 2005,
Verma, Kumar et al. 2010). Em nosso modelo experimental, verificamos que, no baço,
A2AR ocasionou a intensificação da expressão de il10 ao longo da infecção, que se
encontra mais acumulada durante a quarta semana. No fígado, também detectou-se
78
intensa expressão de il10 ao longo da sexta e oitava semanas de infecção nos animais
WT.
A IL-10, originalmente nomeada como CSIF (fator inibidor da síntese de
citocinas), encontra-se expressa em diversas células, incluindo macrófagos, células
dendríticas, células B, células NK, e células T (Moore, de Waal Malefyt et al. 2001). Esta
citocina exerce funções regulatórias indiretas na polarização de células Th1, ao atuar
diretamente em células apresentadoras de antígenos (Fiorentino, Bond et al. 1989), tais
como macrófagos e células dendríticas, reprimindo a expressão de MHC classe II,
moléculas coestimuladoras (CD80/CD86), bem como a produção das citocinas próinflamatórias IL-1β, IL-6, IL-8, TNF-α e IL-12 (Fiorentino, Zlotnik et al. 1991, Fiorentino,
Zlotnik et al. 1991, Hedrich and Bream 2010).
Em células dendríticas, tem-se documentado que a ativação de A2AR inibe da
produção de IL-12 e TNF, e induz a produção de IL-10 (Panther, Idzko et al. 2001,
Panther, Corinti et al. 2003), fenômeno que também pode estar relacionado com o
comprometimento da polarização de células T para o perfil Th1 nos animais WT
(Carregaro, Ribeiro et al. 2015). Além disso, Ato e colaboradores, em 2002,
demonstraram que esta citocina inibe a ativação de células T ao reprimir a expressão de
CCR7 em células dendríticas.
Diversos fatores de transcrição têm sido implicados na regulação da expressão
de il10, tais como Sp1(Brightbill, Plevy et al. 2000), Sp3 (Tone, Powell et al. 2000),
C/EBPδ e C/EBPβ (Liu, Tseng et al. 2003), STAT3 (Benkhart, Siedlar et al. 2000), e c-Maf
(Cao, Liu et al. 2005). Em macrófagos, tem-se documentado que A2AR induz a produção
de IL-10 de maneira dependente de C/EBPβ (Csóka, Németh et al. 2007). A ativação de
A2AR também está relacionada com a polarização de macrófagos para o perfil de ativação
79
alternativa, fenótipo caracterizado pela produção de IL-10, elevada expressão de
Arginase-1 e consequente inibição da produção de NO e outros mediadores microbicidas
(Csóka, Selmeczy et al. 2012). Assim, possivelmente macrófagos de animais BALB/c
estejam abrigando maior quantidade de formas amastigotas de L. infantum devido à
supressão de seus mecanismos microbicidas decorrente da incrementada produção de
IL-10 induzida pela ativação A2AR, reduzida produção de IFN-γ e iNOS.
As células T reguladoras são indispensáveis para a integridade tecidual ao
suprimir a resposta inflamatória (Sakaguchi, Ono et al. 2006) por diferentes mecanismos.
Devido à sua elevada expressão de CD39 e CD73, tais células são grandes produtoras de
adenosina (Deaglio, Dwyer et al. 2007). Tem-se documentado que A2AR não somente
inibe a ativação de células T, mas também é responsável por expandir o número de
células T reguladoras e estabilizar a expressão de FOXP3 nessas células, intensificando
suas atividades supressoras (Ohta, Kini et al. 2012). Tais células também são importantes
fontes de IL-10 (Li and Flavell 2008).
Deste modo, nós especulamos que a expressão de il10 no foco infeccioso de
animais competentes para A2AR comprometeram a capacidade de células apresentadoras
de antígeno induzirem a polarização da resposta imunológica de padrão Th1, e induzindo
a geração de células T produtoras de IL-10. De fato, nós identificamos redução na
frequência de células CD3+FOXP3+ nos animais A2AR-/- (dados não mostrados), indício de
que em nosso modelo experimental, A 2AR esteja induzindo a geração de células T
reguladoras ao longo da infecção.
Portanto, os resultados obtidos pelo nosso grupo evidenciaram que a
susceptibilidade de camundongos BALB/c à infecção por L. infantum está relacionada
com os mecanismos reguladores decorrentes da ativação de A 2AR, uma vez que animais
80
privados deste receptor foram capazes de estabelecer uma resposta de padrão Th1 com
intenso recrutamento de neutrófilos ativados para o foco infeccioso.
81
Conclusão
7. CONCLUSÃO
A2AR está envolvido com a inibição da resposta imunológica contra Leishmania
infantum, favorecendo o estabelecimento da infecção ao inibir a produção de IFN-γ e
induzir a expressão de il10. Nós especulamos que antagonistas deste receptor
purinérgico possam ser uma interessante abordagem terapêutica no tratamento de LV.
82
Referências
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