Universidade Federal de Minas Gerais Escola de Engenharia Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica Disciplina: Biomecânica para Biocientistas Professor: Estevan Las Casas Alunos: João Batista Soldati Júnior Paulo Maurício Costa Gomes Análise Física do Salto Duplo Mortal Carpado, Grupado e Estendido Introdução: A leveza, a beleza plástica e a biomecânica dos movimentos da ginasta olímpica Daiane dos Santos, uma das nossas maiores atletas olímpicas, foi fonte de inspiração do tema desse trabalho. Além do encantamento do público e das comissões técnicas, proporcionado pelos seus saltos, muitos provavelmente fazem a seguinte pergunta: como ela consegue? Neste questionamento, o tema possui relevância sobre dois aspectos: um dirigido para um público leigo e outro para grupos de especialistas na área da biomecânica dos esportes. Para o público leigo, mas interessado e curioso com o conhecimento científico, a(s) resposta(s) a pergunta “como ela consegue?”, traz uma visão das possibilidades e limitações do corpo humano sobre o olhar da ciência da biomecânica. Colocando de outra forma: divulgação do conhecimento científico para formar melhores cidadãos. Já o público especialista, os biomecânicos do esporte, não está interessado em apenas em entender como Daiane consegue (os processos biomecânicos envolvidos), mas em como otimizar a sua performance com o objetivo de torná-la mais e mais competitiva. Objetivo: fazer uma descrição a respeito dos conceitos físicos presentes nas diferentes fases do movimento de um salto olímpico. Fonte de Inspiração: a leveza, a beleza plástica e a biomecânica dos movimentos da ginasta olímpica Daiane dos Santos, uma das nossas maiores atletas olímpicas. Para a descrição física, o salto foi divido nas seguintes fases: Fase do impulso horizontal. Fase do impulso vertical. Fase do rondate. Fase do vôo. Fase da aterragem. Fase do Impulso Horizontal Cinemática e Dinâmica Linear – Conceitos e Definições Importantes Leis de Newton: Bases da Mecânica Primeira Lei ( Lei da Inércia): um corpo continua em seu estado de repouso, ou de movimento uniforme em linha reta, a menos que seja compelido a mudar de estado por forças colocados sobre ele. Segunda Lei: a aceleração que um corpo adquire é diretamente proporcional à resultante das forças que atuam nele e tem a mesma direção e o mesmo sentido desta resultante. A aceleração é inversamente proporcional a massa do corpo. ∑ F = m a ou FR = m a (1) Terceira Lei: quando um corpo A exerce uma força sobre um corpo B, o corpo B reage sobre A com uma força de mesmo módulo, mesma direção e de sentido contrário. Centro de Massa de um Corpo Movimentos de corpos extensos como o corpo humano são bem mais complexos que o movimento de um ponto material. Assim, quando um atleta ou uma bailarina dá um salto, cada um dos seus pontos pode se mover de forma diferente. Mas existe um ponto especial que descreve uma trajetória parabólica (fig. 1), este ponto é conhecido como Centro de Massa (CM): O CM é o ponto sobre o qual a massa está uniformemente distribuída. Esse deve ser então o ponto de equilíbrio do corpo, ou seja, o ponto sobre o qual a soma dos torques equivale a zero. O CM é um ponto teórico cuja localização pode mudar de instante a instante durante um movimento - toda a cinemática do ponto material pode ser aplicado sobre ele. Assim, por exemplo, a velocidade e a aceleração instantâneas do CM são definidas através das seguintes derivadas: drCM dVCM VCM = (2) e aCM = (3) dt dt O CM não tem necessariamente que ficar dentro dos limites do objeto. O impulso J é definido como a ação de uma força F em um intervalo de tempo segundo a expressão: tf J = ∫ Fdt (4) ti O momento linear P (quantidade de movimento) de um corpo é o produto da massa pela sua velocidade: P = mv (5) A Segunda Lei de Newton também pode ser escrita como: dP = FR (6) dt Pode-se mostrar que o impulso que um corpo sofre é igual a variação do seu momento linear (teorema impulso-momento linear): I = tf ∫ Fdt = ∆ P = mv f − mvi (7 ) ti O trabalho W realizado por uma força F é definido pela integral do seguinte produto escalar: f w= ∫ F ⋅ dr (8) i O teorema trabalho energia cinética diz que o trabalho W realizado por uma força é igual a variação da energia cinética: w= ∆K = 1 2 1 2 mv f − mvi 2 2 (9) A energia mecânica de translação é definida pela soma da energia potencial gravitacional U e cinética K: EM = U + K = mgh + 1 2 mv (10) 2 Descrição do Impulso Horizontal Considerações preliminares: Em nossa análise biomecânica assume-se a força muscular como o somatório das forças dos músculos individuais agindo nas articulações. No caso dos seres humanos, assim como a maioria dos seres vivos, suas fontes de energia são os alimentos ingeridos. Essa energia que o ser humano utiliza na realização de suas atividades é gerada através do mecanismo mostrado abaixo: Alimentos ingeridos Modificação química dos alimentos Moléculas dos alimentos incorporadas ao corpo Reações de oxidação no interior das células Produção de ATP Energia utilizável A força muscular utiliza esta energia para proporcionar impulso ao atleta. A força muscular do atleta é responsável pelo impulso horizontal da seguinte forma: A ação da força muscular sobre o solo faz com este reaja sobre o atleta como ilustra as figuras abaixo: A componente da força de reação do solo ântero-posterior reflete as acelerações horizontais (na direção do movimento) dos segmentos do corpo do indivíduo (fig.2). Considerando a ação desta componente no centro de massa do atleta, tem-se pela Segunda Lei de Newton: FR = M aCM (11) A componente ântero-posterior realiza trabalho sobre o centro de massa do atleta, fazendo com que sua energia cinética aumente, portanto gerando um aumento da energia mecânica translacional, conforme equações (8), (9) e (10). O acréscimo da velocidade o atleta implica em um acréscimo do seu momento linear e pela equação (7) fica caracterizado seu impulso horizontal Fase do Impulso Vertical Os ginastas não entram na fase de impulsão do salto com altas velocidades horizontais mas utilizam também efetivamente a força de reação do solo para converter a velocidade horizontal em velocidade vertical para cima, como mostrado na figura 7: Fase do Rondate e do Vôo Cinemática e Dinâmica Angular – Conceitos e Definições Importantes Análogo Angular para as Leis de Newton: Primeira Lei: um corpo em rotação continuará em estado de movimento angular uniforme a menos que seja influenciado por um torque externo. Segunda Lei: a aceleração angular que um corpo adquire é diretamente proporcional à resultante dos torques que atuam nele e tem a mesma direção e o mesmo sentido desta resultante. A aceleração angular é inversamente proporcional ao momento de inércia do corpo. ∑ τ = Iα ou τ R = Iα (12) Terceira Lei: Para cada torque exercido por um corpo sobre outro corpo, há um torque igual e oposto exercido pelo segundo corpo sobre o primeiro. Torque ou momento de uma força: é a grandeza física que expressa o poder rotatório de uma força. É calculado através do seguinte produto vetorial: τ = F × d (13) Momento de inércia: de acordo com a Primeira Lei de Newton, inércia é uma tendência do objeto de resistir a uma mudança de velocidade. A medida da inércia de um objeto é sua massa. O equivalente angular da massa é o momento de inércia. É uma quantidade que indica a resistência de um objeto a uma mudança no movimento angular. O momento de inércia depende da massa do objeto e da sua distribuição com respeito a um eixo de rotação. Para corpos com distribuição de massa contínua o momento de inércia pode ser calculado através da integral: I= ∫ r dm 2 (14 ) Exemplo de dois momentos de inércia para um mesmo objeto: Um ginasta pode alterar a distribuição de sua massa sobre diferentes eixos e ou assumindo diferentes posições no corpo. Exemplo: Como existe uma maior distribuição de massa rodando sobre o eixo transverso (fig.5) que sobre o eixo longitudinal (fig.6), o momento de inércia é maior no primeiro caso. O momento angular H é o análogo angular do momento linear P. É definido como produto do momento de inércia pela velocidade angular: H = Iω (15) A Segunda Lei de Newton para a rotação também pode ser escrita como: dH τR= dt (16) Na ausência de torques externos o momento angular é conservado: Momento angular inicial = Momento angular final Para um vôo com rotação, deve-se considerar para a energia mecânica três parcelas, a saber: a energia potencial gravitacional e as energias cinéticas de translação e de rotação: EM = mgh + 1 2 1 mv + Iω 2 2 2 (17) Fase do Rondate Trata-se do pré-salto para a realização do vôo. Quando uma força externa resultante não nula age sobre um corpo produzindo um torque externo ocorre a variação do momento angular durante o intervalo de tempo correspondente à duração da ação, equação (16) . Esta variação do momento é o impulso angular: tf J A = ∫ τ dt = H f − H i (18) ti No caso de um ginasta, que deseja fazer rotações em provas aéreas e terrestres, é a força de reação de uma superfície que irá gerar o impulso angular. É na fase do rondate que o corpo adquire o impulso angular necessário para iniciar a fase de vôo. Descrição do Vôo Considere o momento angular de um ginasta fazendo um salto mortal sem apoio sobre um eixo transverso através de seu centro de massa corporal. A quantidade inicial de momento angular do vôo é determinado pelo acréscimo de impulso angular proveniente da fase rondate. O ginasta pode manipular seu momento de inércia, girando mais rápido ou mais lentamente sobre o eixo transverso. Na decolagem, o ginasta está em uma posição “esticada” com um momento de inércia relativamente grande e conseqüentemente uma velocidade angular relativamente pequena. À medida que o ginasta assume uma posição dobrada, o momento de inércia diminui e a velocidade angular aumenta na mesma proporção, pois durante a fase de vôo o momento angular não muda, como mostrado na figura 8. Quando o ginasta já completou a(s) rotação(s) necessária e está se preparando para aterrissar, ele “se abre” assumindo a posição esticada, aumentando seu momento de inércia e diminuindo sua velocidade angular. Se essas ações são feitas com sucesso, o ginasta irá aterrissar sobre seus pés. Comparando o salto carpado com o grupado e o extendido: considerações sobre o momento de inércia e a velocidade angular Dos três tipos de saltos, o salto grupado e o que tera o menor momento de inércia pois neste caso a distribuição de massa encontra-se mais próximo do eixo de rotação logo sua velocidade angular será maior. O salto extendido encontra-se no outro extremo, pois a distribuição de massa do ginasta esta mais afastado do eixo de rotação portanto um maior momento de inércia. Assim sua velociade angular será menor. Consequentemente o salto carpado encontra-se em uma situação intermediaria em relação ao seu momento de inércia e sua velocidade agular Fase da Aterragem Com o objetivo de diminuir a ação do impacto sobre o corpo do ginasta, as articulações do quadril, joelho e tornozelos devem flexionar para aumentar o intervalo de tempo durante o qual a força de aterragem é absorvida, diminuindo assim a força sustentada, fig.9. Referências Bibliográficas [1] HALLIDAY; RESNICK; WALKER. Fundamentos de Física – Mecânica. 4ª ed. Rio de Janeiro. LTC. 1996. [2] HALL, S.J. Biomecânica Básica. 4º Ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan. 2005. [3] OSKAYA, N; NORDIN, M. Fundamentals of Biomechanics. 2ª ed. New York. [4]OKUNO, EMICO; FRATIN, LUCIANO. Desvendando a Física do Corpo Humano – Biomecânica. 1ª ed. Barueri. Editora Manole Ltda. 2003. [5] MCGINNIS, PETER M..Biomecânica do Esporte e do Exercicio. Porto Alegre. Artmed Editora S.A.2002 [6] HAMILL, JOSEPH; KNUTZEN, KATHLEEN M.. Bases Biomecânicas do Movimento Humano. 1ª ed. São Paulo. Editora Manole. 1999.