Na verdade Alexander não inventou nada novo, apenas

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Na verdade Alexander não inventou nada novo, apenas sistematizou as
informações e criou um método de trabalho. Segundo Pignatelli (2004) arquiteto
passou a ter a função de traduzir para o projeto as necessidades de espaço
identificadas no processo.
O método Clustr também foi uma forma de aplicar novos instrumentos
metodológicos que auxiliem o projeto arquitetônico. Este método enfoca a questão
da organização espacial das diferentes atividades que podem ser executadas
dentro de um espaço, levando em consideração o grau de distancia que distingue
cada atividade entre si. Baseia-se na tradução de modelos matemáticos das
relações espaciais que se estabelecem entre as atividades pertinentes a um
espaço. (PIGNATELLI, 2004)
O método de Clustr consiste em quantificar em uma matriz os graus de
proximidade física dos espaços de atividade de cada função com as outras, e
diferenciar a estrutura das relações entre as áreas representadas em um diagrama
de Venn8 (PIGNATELLI, 2004).
Na verdade esse método examina as relações entre os espaços de atividade de
cada tarefa e o quanto cada uma interfere na outra (intersecções), quantificando os
espaços vazios, circulação, entre os equipamentos e mobiliário da moradia.
Portas (1969) criou um método de análise por função e atividades, onde se
reconhecia e definia o conteúdo de cada função ou atividade, descrevendo também
o usuário do espaço. Foram levantados os equipamentos e mobiliário necessário
8
O diagrama de Venn pode ser explicado como a relação entre dois conjuntos, nos quais pode
haver alguns (mas não todos) elementos em comum. Informação disponivel em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Diagrama_de_Venn
72
para diferentes atividades e o espaço requerido para execução das mesmas, e
condições de conforto térmico e iluminação. Com o intuito de levantar as atividades
executadas em uma moradia, Portas (1969) elaborou a tabela 3 onde lista 53
atividades separadas em 16 sub-grupos. Esse levantamento é muito importante
para o dimensionamento da habitação, já que tenta mostrar todas as atividades
domésticas, assim o arquiteto é capaz de projetar espaços que sejam capazes de
atender a todas, ou pelo menos a maioria delas.
Algumas das atividades da listagem da tabela 3 sofreram modificações , seja pelo
fato de máquinas auxiliarem no trabalho, ou algumas alterações nos hábitos,
costumes e disponibilidade de espaço.
73
LISTA DAS FUNÇÕES E ATIVIDADES DA HABITAÇÃO
1
ATIVIDADE
DESIGNAÇÃO DO GRUPO
dormir ou descanso
dormir
fazer a cama
descanso pessoal
tratar de doentes ou crianças
vestir-se arrumar-se
arrumar roupas e etc...
2
receber, conservar alimentos
Alimentação
preparar, lavar e cortar alimentos
preparação
cozinhar
preparar pratos
lavar louça e talheres
arrumar a cozinha e a mesa
eliminar detritos
3
4
5
por a mesa
Alimentação
servir os alimentos
refeições correntes
comer
Alimentação
levantar da mesa
refeições formais
conversar, jogar
estar
descanso, leitura, escrita individual
reunião tempo livre
ouvir rádio, ver TV, ouvir discos
atividades de bricolagem, tocar música, etc.
atender telefone
6
7
receber e acompanhar desde e até a entrada
estar
atividades diversas como em (5)
receber
atividade lúdica
recreio - crianças
vigilância e tratamento
8
trabalhos escolares e outros
estudo - recreio - jovens
reunir os amigos - como em (5)
74
9
estudo ou trabalho - escritório
trabalho - recreio - jovens
trabalho oficina (reparações, bricolagem, etc.)
trabalho artesanal (tecelagem costura, Etc.)
10
11
12
passar, limpar
Tratamento de roupas
arrumar roupas
a) passar a ferro
costurar à mão ou a maquina
b) costura
lavagem manual
tratamento de roupas
lavagem mecânica
lavagem
Secagem natural ou forçada
tratamento de roupas
secagem
13
lavar mãos e rosto
higiene pessoal
banhar-se ou dar banho em crianças
excreções
vestir-se, fazer toalete, barbear-se
fazer curativos
fazer exercícios físicos
14
descansar, reunião, solário
permanência em exterior
cuidar de flores ou animais
jogos ao ar livre
15
introdução na casa, espera
comunicação-separação
independência de grupos ou zonas
comunicação direta ou só audiovisual de zonas
16
guardar roupas de casa ou pessoais
Arrumação
guardar calçados
armazenamento
guardar gêneros alimentícios
guardar produtos de limpeza e combustíveis
guardar meio de transporte privado (carros e motos)
Tabela 3 - Quadro de atividades domésticas.
Fonte: elaborado pela autora a partir de quadro disponível em PORTAS, 1969 p. 20
75
Ao se observar a tabela 3, é interessante ressaltar que a função de alguns espaços
como os dormitórios variam de acordo com a idade do usuário, a criança usa o
espaço para brincar o adolescente passa a usar para estudar e receber os amigos
e o adulto para trabalhar.
O programa de Portas pode ser transposto para plantas, onde existem as
dimensões dos espaços necessários para acomodar e usar os equipamentos
básicos para um dormitório, seja de criança, casal ou individual, salas, cozinha,
banheiro, e outros, e o espaço necessário para utilização destes (espaço de
atividade). A partir destes dados seria possível chegar a um tamanho mínimo para
qualquer ambiente. Portas (1969) diz que o dimensionamento dos espaços está
diretamente relacionado com o tipo de divisão, os equipamentos necessários e
com a representatividade que esse ambiente tem na área útil da habitação. Com a
união de todos esses dados, chega a modelos que ele considera ideais para o
tamanho de todos os ambientes de uma casa.
Alexander Klein, arquiteto russo radicado na Alemanha, elaborou um estudo sobre
uma metodologia cientifica a ser aplicada na questão da habitação. Klein se
preocupou principalmente com os problemas econômicos e tipológicos ligados a
moradia. Elaborou o projeto de construções standard, respeitando aspectos
climáticos como insolação e ventilação, e pela primeira vez foi tentada uma
coordenação modular e pré-fabricação. A estandardização entendida pelos
racionalistas, como Klein, era a garantia de um mínimo, não apenas quantitativo
quanto qualitativo, na produção de elementos modulares aplicados a moradias
sociais (KLEIN, 1980).
O método de valorização da planta de Klein se baseia em três operações.
Primeiramente é feito um questionário onde se tenta descobrir de forma objetiva os
76
números relativos da habitação, são conseguidos coeficientes que permitem
estabelecer um grau de eficiência desde o ponto de vista da redução da superfície
quanto da habitabilidade. Em segundo lugar Klein reduz os projetos a uma mesma
escala, com um mesmo número de camas ele elabora uma série de opções em
planta relativamente homogêneas, respeitando parâmetros dimensionais (espaços
de atividade) que incidem sobre o esquema distributivo. Em terceiro lugar vem o
método gráfico de Alexander Klein, onde ele se utiliza das duas primeiras
operações para chegar a um método gráfico. Método este que permite que para
cada planta de uma habitação se possa observar o desenvolvimento das
circulações e superfícies livres de móveis. Dessa forma, segundo Klein (1980), se
poderia analisar a eficácia de uma planta antes da execução do projeto.
“Assim por exemplo, trajetos de circulações breves mas intrincadas
ocasionam um desgaste de energias físicas (...) os cruzamentos de
circulação impossibilitam o desenvolvimento simultâneo e sem
interferências das principais atividades que se realizam na habitação:
cozinhar – comer, dormir – lavar-se, trabalhar – descansar. Os espaços de
comunicação demasiado grandes e os percursos muito compridos que se
derivam de uma distribuição desfavorável da planta provocando um
aumento da superfície.” (KLEIN 1980, p.33 )
Espaços mínimos residenciais dependem de uma eficiência máxima do uso dos
espaços. Portanto o tamanho, posição dos móveis e circulações otimizadas são
essenciais para se viabilizar a diminuição das áreas. A partir do momento que os
móveis são os menores possíveis, a circulação é o único espaço que pode ser
diminuído, desde que não atrapalhe os espaços das atividades.
Klein utiliza seu procedimento para reduzir o standard das habitações. Cita
constantemente as expressões vivenda mínima e mínimo de vivenda, mas deixa
sempre aberta a possibilidade de uma redução posterior do espaço a partir de uma
concepção de moradia mais articulada com as suas funções e que tenha
considerado as complexas relações entre o interior e exterior. Klein (1980, p. 33)
77
acredita que qualquer redução do standard mínimo deveria ser compensada com
equipamentos de lazer e serviços, o que aconteceu em muitos dos conjuntos
habitacionais modernistas.
Abalos (2003) vê o trabalho de Klein como um importante instrumento para se
chegar
a
tão
sonhada
casa
mínima.
Ao
sistematizar
a
questão
do
dimensionamento da moradia, contribui de forma cientifica a solução do problema
habitacional.
“Os trabalhos de Alexander Klein sobre habitação mínima, os CIAM
dedicados ao Existenzminimun, com suas comparações de plantas e
superfícies, são o triunfo desta redução cientifica do espaço. O esquema
metodológico de Klein é um compendio perfeito do projeto positivista da
casa.(...) A habitação, para Klein, transformou-se em um problema da
industria, que como tal, deve ser estudado com o mesmo espírito que se
aplica a qualquer processo industrial: Contribuições cientificas ao problema
da habitação.” (Abalos 2003. pg. 74)
2.2.5 Os ambientes da casa mínima
Para o projeto de uma habitação mínima o arquiteto deveria conhecer bem o uso
de cada ambiente essencial da moradia, seus móveis e equipamentos
indispensáveis. Na realidade os usos dos espaços e as necessidades sofrem
alterações de acordo com a cultura, poder aquisitivo, tipo de família, faixa etária, e
outros. A seguir mostra-se uma pequena descrição dos ambientes de uma
habitação.
O espaço da cozinha foi um que sofreu as maiores transformações por isso foi tão
estudada. A chegada dos novos eletrodomésticos, a diminuição das refeições
feitas em casa e os alimentos semi-preparados simplificaram a vida da dona de
casa, mudando as necessidades espaciais. Interessante perceber que com essas
78
mudanças todas, o status da cozinha também se transformou, passou de uma área
que era ocupada, nas casas burguesas, quase que exclusivamente pelos
empregados, para uma zona de permanência e socialização dos proprietários, em
parte pelo fato da diminuição na quantidade de empregados domésticos
disponíveis.
A cozinha é um espaço extremamente complexo por abrigar uma série de
processos diferentes, como a cocção, preparação, armazenamento, a lavagem das
louças e o servir, muitas vezes até a refeição é feita na cozinha. Para se chegar a
um desenho de espaço mínimo para cozinha em primeiro lugar deve-se saber
exatamente o número de equipamentos mínimos necessários para que se possam
executar todas as tarefas.
Muitas vezes, o espaço destinado à cozinha, acumula a função de cuidar das
roupas, que abrange o lavar, o secar e o passar. Esse ambiente da casa também
sofreu grandes mudanças com a chegada das máquinas de lavar e secar roupas. A
grande maioria dos conjuntos habitacionais modernistas e edifícios construídos
hoje na Europa, têm lavanderias coletivas em alguma parte de uso comum do
prédio.
A cozinha representa um espaço de função altamente especializada na casa
moderna, ao contrário do que acontecia antigamente, já que servia para se fazer as
refeições, cozinhar e até mesmo como dormitório dos empregados. A cozinha
passou a ser um espaço muito bem equipado, e a racionalização de todos os
equipamentos
proporcionou
uma
redução
do
espaço
necessário.
reorganização da cozinha que mostrou ser possível graças
Foi
a
aos novos
equipamentos, móveis racionais e o espaço bem organizado uma diminuição da
79
área, aspecto muito importante no desenvolvimento de habitações mínimas
(TEIGE, 2002).
A cozinha de Frankfurt foi o resultado de uma série de pesquisas realizadas com
mulheres para saber seus desejos, e seus comportamentos durante os processos
e atividades realizados na cozinha, além de pesquisar os fabricantes de móveis e
materiais de cozinha. A partir destes dados conseguiu-se montar diagramas de
circulação para as cozinhas e localização ótima dos equipamentos. Essa série de
estudos acabou por resultar na inserção destes tipos de cozinhas em milhares de
apartamentos de conjuntos habitacionais de Frankfurt (KOPP, 1990, p. 56).
Professores e estudantes da Bauhaus construíram uma casa experimental para a
Exposição Bauhaus de 1923 , a Haus am Horn ou Versuchshaus projetada por
George Muche, onde a cozinha, Bauhaus Kuche (fig. 11), era conseqüência de
estudos ergonômicos e funcionais.
Essa casa foi planejada com o que havia de mais moderno para poupar o tempo
para o trabalho doméstico. Essa habitação foi concebida “como um objeto
sachlich”9 (FRAMPTON, 1997 p. 152) e se tornou uma Wohnmaschine (máquina
de viver). Esta casa era uma criação genuinamente “bauhausiana”, o primeiro
exemplo prático do novo modo de vida na Alemanha (DROSTE, 2006 p. 105).
Essa casa foi pensada de forma a ter uma circulação mínima, quase não havia
corredores, todo o programa é distribuído ao redor de uma sala (fig. 12) de estar
iluminada por janelas altas como se pode perceber na fachada presente na figura
13.
9
Sachlich é algo funcional e prático em alemão.
80
Fig. 11 Cozinha da Haus am Horn
FONTE:
http://arqandutopie.blogspot.com/2007/04/casaversuchshaus.html. Acessado em 01/09/2007
Fig. 12. Sala com pé direito mais alto que o
resto da residência.
Fonte: DROSTE, 2006 p. 108
Fig. 13 Fachada da casa Haus am Horn, volume mais alto mostra as janelas altas que iluminam a
sala.
Fonte: http://eng.archinform.net/medien/00001637.htm
Acessado em: 06.12.2007
A casa era constituída por um dormitório para senhora, outro para o senhor e um
para as crianças, todos esses espaços são ligados por portas, fazendo com que a
circulação aconteça dentro dos quartos. O cômodo destinado ao banho, diferente
do espaço do vaso sanitário, ficava entre os dormitórios do Sr. e Sra.. Sala de
81
jantar ao lado da cozinha e próxima ao sanitário. A única janela na altura dos olhos
estava situada em um nicho (nische), do lado direito da planta da figura 14.
Fig. 14 Planta da Haus am Horn
Fonte: DROSTE, 2006 p. 108
Segundo Droste (2006 p. 105) a casa sofreu duras criticas, principalmente em
relação a fachada (fig. 13), que foi comparada com caixa de bombom e estação no
pólo Norte. Já as novas idéias para o interior, como cozinha, sala de banho, quarto
de crianças e sala de jantar tiveram melhor aceitação do público. A grande
importância da exposição foi tornar público o trabalho da Bauhaus, pela primeira
vez fotografias de seus produtos foram apresentadas pela imprensa.
Outra experiência importante foi o estudo do “Rationalisirte Hausarbeit” (trabalho
doméstico racionalizado) onde cozinha e anexo foram construídos por Bruno Taut
82
em 1927, onde é previsto o lugar de todos os eletrodomésticos e utensílios. Os
percursos foram otimizados para que se andasse o mínimo possível durante a
execução das tarefas domésticas (KOPP, 1993).
Antes da cozinha de Frankfurt, outras mulheres já tinham tentado planeja-las. Em
1841, Catherine Esther Beecher, publica o primeiro trabalho onde as atividades
domésticas são analisadas, ela “ensina” a cozinhar, lavar, decorar a casa, escolher
frutas e legumes. Em “Treatise on Domestic Economy” Catherine sugere formas de
se organizar uma cozinha, desde a questão do armazenamento até a logística do
trabalho doméstico (FOLZ, 2003). Segundo Gidion (1969) Beecher fala das novas
responsabilidades da mulher na sociedade americana e trata de economia
doméstica como profissão, e que as mulheres deveriam ser valorizadas pelo
trabalho executado. O esquema de Beecher de distribuição dos trabalhos e
armazenagem podem ser vistos na fig. 15. Ela determina local especifico para
armazenamento, lavagem das louças, secagem das louças, armazenamento de
farinha, bancada de trabalho, e forno separado da área de preparo por portas de
correr.
83
fig. 15 A cozinha de Beecher
Fonte: GIEDION, 1969, p. 517
Já na década de 1920, Christine Fredericks, propõe o estudo dos espaços da
habitação, particularmente os esquemas de circulação. Fredericks demonstra como
uma organização racional dos móveis e eletrodomésticos pode economizar tempo
e deslocamentos.
Teige (2002) monta uma tabela (tabela 4) com a diferença das áreas de alguns
“modelos” de cozinhas e a relação com o número de refeições servidas por cada
um, e como se pode observar, a cozinha de um trem que é projetada de forma
racional alcança uma maior eficiência na preparação de refeições.
84
Tipo
Área m²
Media de refeições diárias
Apartamentos urbanos durante o século XIX
ca. 25
4-10
Apartamentos pequenos e médios
ca. 11,50
2-6
Standard Americano
8,91
2-6
Standard Belga
8,65
2-6
Standard Stuttgart
8,60
2-6
Standard Frankfurt – 1ª fase
6,43
2-6
Standard Frankfurt – 2ª fase
5,50
2-6
Standard Berlim (R² = cozinha)
4,50
2-6
Cozinha em carro restaurante de trem
3,78
100-150
Tabela 4 – Tabela das áreas da cozinhas
Fonte: Tabela feita pela autora com base em Teige 2002, p. 220
As inúmeras epidemias ocorridas ainda no século XIX mostraram a importância da
higiene pessoal e fez com que o espaço do banheiro tivesse uma nova conotação,
a de saúde. A popularização dos novos hábitos de limpeza tornou o banheiro um
símbolo de status. Hoje em dia o espaço do banheiro se transformou em um local
para relaxar além da função tradicional de higiene pessoal, o que tem agregado
novos elementos aos equipamentos básicos existentes.
Os banheiros, nas primeiras moradias de aluguel eram comuns aos moradores,
isso é, eram divididos entre os habitantes do andar, com o tempo passaram a ser
privativos até mesmo nos apartamentos pequenos. Segundo Teige (2002) os
equipamentos que faziam parte dos banheiros eram, uma banheira com chuveiro,
lavatório, bidê, toucador (espécie de penteadeira) com espelho e prateleira,
ganchos para toalhas e afins, e cesto de roupa suja.
Como diz Giedion (1969 p. 682) até os anos 1900 banheiros eram apenas
acessíveis às classes mais privilegiadas. O banheiro até hoje é um dos ambientes
85
mais caros de uma construção. Os revestimentos, pisos, louças, metais,
acessórios, tubos e conexões são materiais de custo elevado, portanto na
habitação de baixa renda quanto menos e menores forem os banheiros mais se
economiza no orçamento da obra.
O grande marco na evolução dos banheiros foram os sistemas de abastecimento
de água e coleta de esgoto, até então os espaços destinados a banheiros não
tinham grande utilidade (GIEDION, 1969, p. 686). Após o estabelecimento destas
facilidades o banheiro mudou seu status, se tornando parte importante no projeto
da habitação.
Segundo Giedion (1969, p.706) o banheiro sempre teve um lay-out estandardizado,
isto é, tem equipamentos básicos e essenciais, como vaso sanitário, bidê (ducha
higiênica), banheira (no Brasil apenas o chuveiro) e lavatório. Esses quatro
equipamentos constituem um banheiro, a inexistência de qualquer um deles
descaracteriza o espaço.
A grande questão é porque não produzi-lo em massa, para simplificar as
instalações e barateá-lo? A tendência modernista de eliminar ornamentos dos
móveis e da arquitetura, “contaminou” também o design das peças dos banheiros,
facilitando a produção em grande escala das peças sanitárias.
O primeiro banheiro pré-fabricado foi patenteado em 1931 (fig. 16) esse primeiro
modelo era dividido em painéis que eram montados por diferentes operários,
pedreiros, gesseiros e encanadores (GIEDION, 1969, p. 707). Outro modelo da
mesma época já chegava montado a obra e içado por guindaste e encaixado na
construção sem a necessidade de operários com diferentes especialidades para a
montagem, as ligações só precisavam ser parafusadas as unidades de junção
(fig.17).
86
fig. 16 Primeiro banheiro pré-fabricados
Fonte: GIEDION, 1969, p. 708
fig. 17 módulos pré-fabricados
encaixados na construção
Fonte: GIEDION, 1969, p. 517
a
serem
Buckminster Fuller criou em 1938 um banheiro pré-fabricado onde todas as peças,
inclusive os acessórios estavam incorporados a uma “casca” que forma uma
unidade estrutural como pode ser visto na fig. 18.
87
fig. 18 módulos pré-fabricados
de banheiro
Fonte: GIEDION, 1969, p. 517
As salas eram espaços de uso comum, onde toda a família se encontrava, recebia
visitas, lia, descansava, as vezes servia de sala de jantar, era sempre o maior
cômodo da casa (TEIGE, 2002). A sala não tem funções tão definidas como outros
cômodos da habitação.
Os dormitórios passaram a ser espaços pequenos e individuais, apenas para
dormir, contrário do que era a residência burguesa, onde os quartos eram os
maiores cômodos nos apartamentos, fruto de uma época que o dormir era parte de
um ritual. O dormitório da casa moderna deveria ter uma cama e criado mudo,
armário de roupas ficariam em um espaço destinado apenas a eles (TEIGE, 2002).
Como se observa na figura 19 Portas fez um levantamento dos móveis essenciais
do dormitório, suas dimensões e espaços necessários para sua utilização e
circulação.
88
Fig. 19 – Desenhos dos espaços de atividades e móveis de dormitórios de casal, de solteiro e de
criança.
Fonte: PORTAS, 1969 p. 23
Espaços para armazenamento são muito importantes em uma habitação onde área
tem que ser maximamente aproveitada. Na parte íntima devemos prever espaço
para o armazenamento de roupas, roupas de cama e banho, produtos de higiene e
outros. Na cozinha gêneros alimentícios, utensílios domésticos, louças, produtos
de limpeza e outros.
A casa mínima tem uma série de parâmetros como o mínimo dimensional, mínimo
de conforto ambiental e mínimo custo, que podem classificar a habitação como tal.
Mas na realidade esses parâmetros são relativos à cultura, costumes, localização
geográfica e método construtivo.
89
2.3. INDUSTRIALIZAÇÃO
2.3.1 Como a Industrialização afetou a sociedade no inicio do século XX
O movimento Moderno nasceu das mudanças tecnológicas, econômicas e sociais
acontecidas na Europa a partir do século XVIII, momento denominado como 1ª
Revolução Industrial. Em um primeiro momento a historia da arquitetura moderna
se confunde com a história da industrialização.
Os primeiros efeitos da Revolução Industrial na construção civil foram a troca dos
materiais naturais pelos artificiais (industrializados) e dos materiais heterogêneos e
imprecisos por materiais homogêneos com qualidade assegurada e testados em
laboratório. (CORBUSIER, 1977)
Corbusier (1977) ressalta a importância da economia nos atos da sociedade, e que
o equilíbrio desta depende, entre outras coisas, de uma população satisfeita com a
moradia. A economia rege a construção, e, portanto a industrialização se tornou
um grande aliado, só que as pessoas ainda não tinham o habito de viver em casas
construídas em série e nem todos os arquitetos estavam adaptados a essa nova
forma de projetar.
“A lei da economia rege imperativamente nossos atos e nossos conceitos só
são realizados por ela.
O problema da casa é um problema da época. O equilíbrio das sociedades
depende dele. O primeiro dever da arquitetura, em uma época de
renovação, consiste em revisar os valores e os elementos constitutivos da
casa.
(...)
A grande indústria deve ocupar-se da edificação e estabelecer em série os
elementos da casa.
Há que criar o estado de espírito da série.
O estado de espírito de construir casas em série.
O estado de espírito de habitar casas em série.
O estado de espírito de conceber casas em série” (CORBUSIER, 1977,
p.187)
90
No final do século XIX, assiste-se na Alemanha uma espécie de segunda fase da
revolução industrial, cujos símbolos foram o aparecimento do telefone (1876), da
lâmpada elétrica (1879), do motor a explosão (1885), e já no inicio do século XX o
avião (1903). Por toda a Europa se percebeu uma aproximação das relações
comerciais pelo fato da facilitação dos transportes. O comércio passou a ter grande
importância já que passou a atingir mercados internacionais, por conseqüência há
uma maior dependência entre eles.
A sociedade sofreu importantes mudanças após a implementação do Fordismo em
1914. O inventor Henry Ford criou toda uma idéia revolucionária não apenas na
questão da produção industrial, como a instalação de linhas de produção que
agilizavam todo o processo, mas criou uma nova forma de vida para um novo
homem. Ford decompôs a montagem de um carro em 84 diferentes operações,
levando um terço do tempo usual para montar um automóvel. A grande idéia de
Henry Ford foi transformar o automóvel, até então artigo de luxo, em um objeto
possível de ser consumido pelas camadas menos abastadas da população
(GIEDION, 1969, p. 116).
Como diz Harvey (2005) o que havia de especial em Ford era o reconhecimento de
que produção de massa significa consumo de massa e a conseqüência disto é uma
nova sociedade democrática, racionalizada, modernista e populista. Nesse
contexto foram criados novos padrões de consumo que alteraram os costumes
dessa nova sociedade capitalista.
Já no inicio do século XX, a Holanda institui que a industrialização passa a ser um
problema do governo. Em 1918 o engenheiro J. van der Waerden apresentou uma
proposta de estandardização para a indústria da habitação no congresso holandês.
Foi proposto o limite do número de pavimentos (9 andares) usando dimensões e
91
elementos estandardizados, além de se ter uma central de controle da distribuição
de materiais de construção e mão-de-obra (GRINBERG, 1982).
A industrialização afetou de forma peculiar a construção civil, devido ao rápido
crescimento das cidades. Passou-se a ter uma necessidade crescente por
habitações, mas o desenvolvimento da indústria da construção propriamente dita,
não acompanhava o ritmo do resto das indústrias.
Enquanto se discutia a pré-fabricação na Europa, as casas japonesas eram
construídas a séculos, de forma pré-fabricada, utilizando sofisticados sistemas de
coordenação modular10, cujos similares só apareceriam na Europa no século XIX.
As casas tradicionais japonesas eram bem iluminadas e arejadas, mas por
assimilação de subprodutos da industrialização e aumento vertiginoso da
população urbana, o povo japonês começou a se mudar para apartamentos
apertados com piores condições de conforto (TRAMONTANO, 1994).
2.3.2 Como os arquitetos se posicionaram em relação à industrialização.
Em 1924, Gropius (apud BRUNA 2002) já tratava da questão da industrialização da
construção defendendo-a como uma vantagem para a arquitetura, e que os
elementos estandardizados abririam novas portas para uma nova gama de
possibilidades de projeto.
”é um engano supor que a arquitetura será desprestigiada devido à
industrialização da construção. Pelo contrário, a estandardização dos
elementos construtivos exercerá um efeito benéfico ao conferir um caráter
10
Coordenação modular é quando os diferentes componentes de uma obra arquitetônica são
projetados um em função do outro, isso quer dizer um caixilho é projetado para que encaixe
perfeitamente no seu devido lugar, havendo um mínimo de perdas.
92
unificado às novas habitações e bairros. Não há motivo para temer uma
monotonia semelhante à dos subúrbios industriais ingleses, à condição de
cumprir o requisito básico de normalizar somente os elementos construtivos,
variando o aspecto exterior dos edifícios armados com eles.” (GROPIUS
apud BRUNA 2002, p. 25)
A
partir
da
industrialização,
onde
os
materiais
de
construção
foram
estandardizados a produção arquitetônica passou a ser muito mais variada, mesmo
estando dentro de um mesmo estilo, Guidion (1954) destaca as ilimitadas
possibilidades da indústria em desenvolvimento, no final do século XIX e XX.
Segundo Gropius (2004) o uso de peças industrializadas não deveria uniformizar
as construções, as diferenças ficariam a cargo da criatividade dos arquitetos. A
indústria seria responsável por fabricar uma série de componentes diferentes, fruto
de uma maior flexibilização das linhas de produção, que se adequariam as
exigências de cada obra. Como em um brinquedo LEGO, onde existe um número
limitado de peças e ilimitadas formas de montá-las.
Os arquitetos encaram a industrialização de formas diferentes, alguns deles como
uma forma de se conseguir uma estandardização da moradia, outros como um
subterfúgio técnico para resolver um problema urgente de déficit quantitativo e
outros, como forma de se construir a um menor custo possível. Muitos não
pensavam em qualidade, mas apenas em quantidade e velocidade de produção
transformando a casa em um bem de consumo. Como no trecho abaixo se pode
ver a visão de Abalos (2003) sobre a forma com que alguns arquitetos modernos
trataram
a
industrialização
estabelecendo
um
paralelo
com
a
indústria
automobilística.
“A casa passa a ser um objeto produzido em série, a imagem e semelhança
do Ford T, o grande paradigma da industrialização. Não encontramos nada
disso em Mies van der Rohe, porém sua busca é, antes, distante dos
interesses do conjunto dos arquitetos modernos, em sua investigação sobre
93
o Existenzminimun, para a otimização de tipos estandardizados de
habitação.” (Abalos 2003. pg. 21)
O arquiteto holandês Berlage foi um dos defensores da estandardização pelo fato
de ser importante por causa da integração de argumentos sociais e estéticos.
Berlage (apud GRINBERG, 1982) foi o primeiro a falar da estandardização, não
como medida emergencial na construção rápida de moradias, e sim como uma
nova forma de se construir em massa com melhores preços.
2.3.3 Industrialização da construção
A Alemanha desenvolveu massivamente sua indústria no século XX. No inicio dos
anos 1900 só havia uma alternativa para que resolvessem o problema habitacional,
sair direto da construção artesanal de tijolos para uma produção industrial. Gropius
(apud GIEDION, 1954) se apegou aos princípios da industrialização em meados de
1909. Ele tinha consciência de que a produção de uma moradia nunca poderia ser
tão eficiente quanto a de um carro, porque necessita sempre de detalhes
responsáveis pela personalização do espaço, por esse motivo a produção em
massa de casas estandardizadas não seria solução para o problema da habitação.
A industrialização da moradia deveria se limitar à produção em massa de
componentes standards que permitissem alterações tanto na forma quanto no
planejamento das residências.
Há certa dificuldade em se determinar a diferença entre industrialização da
construção, pré-fabricação e mecanização. Paulo Bruna (2002) diz que a préfabricação é apenas parte do processo amplo e complexo da industrialização, que
envolve organização da produção, montagem, controle e etc. A pré-fabricação
acontece no canteiro de montagem e deveria ser entendida apenas como uma
94
racionalização do sistema de construção, que se mantém essencialmente artesanal
como organização. A mecanização é a racionalização das energias gastas na
produção (gruas, betoneiras, etc) uso de máquinas que aliviam o trabalho do
homem.
A industrialização da construção exige que haja um ritmo e volume constante de
obras para que se torne economicamente viável. Empreiteiras de obras com alto
nível de industrialização acabam por ter sua linha de produção sem flexibilidade,
isto é, usam o mesmo processo anos a fio por não haver condição de mudar a
linha em curtos períodos de tempo, havendo uma defasagem técnica.
Neste contexto nota-se a existência de dois tipos de industrialização. A de Ciclo
aberto, que é quando a empresa produz componentes para mais de uma firma, o
que acaba por estandardizar a produção e a de Ciclo fechado, que consiste em
fabricar elementos pré-fabricados para uma obra especifica, é a idéia presente nas
propostas para habitação mínima dos arquitetos vanguardistas do primeiro pósguerra (BRUNA, 2002).
Em 1931 Gropius cria para Hirsch Kupfer e Messingwerk A. G. uma casa mínima
com elementos industrializados e com possibilidade de ser ampliada, como se
pode observar na planta na fig. 20. Esta era constituída por painéis de madeira
autoportantes,
revestidas
internamente
com
placas
de
fibro-cimento
e
externamente com chapas corrugadas de cobre. O projeto não foi executado por
causa da ascensão do nazismo, mas Gropius continuou suas experiência nos EUA,
e criou um sistema construtivo com painéis chamado de “General Panel System”
(em madeira) e em 1947 conseguiu, que uma indústria produzisse todos os
componentes para essas habitações.
95
Fig. 20 - Casa mínima para Hirsch Kupfer e Messingwerk A. G.
Fonte: BENEVOLO 2006 fig. 607 p. 501
O projeto das Package House System, que usavam o General Panel System,
tinham a armação dos painéis em madeira revestida com tábuas de mesmo
material e eram de fácil manejo. Cada elemento era baseado em uma modulação
com 3 pés e 4 polegadas (aproximadamente 1m), e o comprimento era sempre
múltiplos desta medida. O resultado mostrou que essa modulação era
extremamente flexível permitindo qualquer tipo de combinação. O projeto dessas
casas uni familiares isoladas permitiam ampliações futuras.
O diferencial do sistema de painéis das Packeges Houses da General Panel
Corporation era que o mesmo painel poderia ser usado nas paredes, tetos,
telhados e piso, essa flexibilidade foi possível graças as junções muito eficientes
que poderiam funcionar em qualquer plano (GIEDION, 1954).
Na figura 21 pode-se constatar o encaixe das travessas que constituem a armação
das casas, que funcionam tanto na vertical quanto na horizontal, e a modulação de
1m x 1m. Nas figuras 22 e 23 pode-se apreciar dois diferentes estágios da
montagem da casa, onde na fig. 22 acontece a montagem das paredes e na fig. 23
a montagem do forro.
96
Fig. 21 - Esquema do Sistema das Package House System.
Fonte: GIEDION, 1954 p. 193
Fig. 22 - Montagem casa do Sistema das
Package House System.
Fonte: GIEDION, 1954 p. 199
Fig. 23 - Montagem casa do Sistema das
Package House System.
Fonte: GIEDION, 1954 p. 199
A planta do sistema foi feita de forma a permitir ampliações, pode-se ter 1, 2 ou 3
dormitórios. Na figura 24 nota-se as diferentes formas que a casa assume com o
diferente número de quartos. Toda a área standard se mantém fixa, que
corresponde a um dormitório sala, banheiro, cozinha, depósito e terraço. As áreas
molhadas ficam condensadas em um mesmo lado da construção.
97
Fig. 24 - Planta do projeto da casa do Sistema das Package House System.
Fonte: GIEDION, 1954 p. 200
O General Panel System foi estudado cuidadosamente por Konrad Wachsmann
por muitos anos em Nova Iorque, incluindo o processo total de construção e os
equipamentos mecânicos e elétricos envolvidos no processo, fato que permitiu um
menor número de máquinas a serviço do sistema. O sistema foi testado na
Califórnia e se mostrou eficiente, mas demorou até ser reconhecido como produto
a ser comercializado (GIEDION, 1954).
Como diz Bruna (2002), para que a industrialização funcione os componentes
devem ser substituíveis por outros de outras marcas, e que possam assumir
diferentes funções dentro de uma mesma obra, e ser combinados, formando
diferentes combinações, resumindo os elementos devem ser flexíveis, isto é, ter a
possibilidade de serem montados de diversas formas.
Outro aspecto que é muito importante para o êxito da industrialização é que os
componentes deveriam ser resultados do trabalho de arquitetos, engenheiros e
produtores, para que essas peças pudessem ser coordenadas umas com as
98
outras. Arquitetos deveriam estar presentes no processo de criação das peças e na
definição das dimensões para que no final funcionassem como módulos inseridos
no projeto.
A partir da segunda Guerra com a necessidade de sistematização da produção, o
módulo11 vem para resolver o problema dos componentes da construção. A idéia
era chegar a uma dimensão básica dos principais elementos da construção
(BRUNA, 2002, P.65-68).
A coordenação modular segundo Bruna (2002) foi a tentativa de se criar uma
normalização dos elementos da construção, essencial para a industrialização da
construção, limitando os tamanhos dos componentes e criando módulos. Um dos
conceitos implícitos em módulo é o fator numérico, estabelecendo uma relação
entre números, como uma constante, na verdade esse é o principio do Modulor
criado por Le Corbusier em 1948.
André Wogenscky, assistente de Corbusier em seu escritório (apud CORBUSIER,
1976) diz que, além do Modulor ser essencial para o projeto da moradia, tem sua
serventia no projeto de móveis e equipamentos voltados ao uso do homem,
funcionando como um referencial ergonômico.
Le Corbusier (1976) diz que para o projeto de conjuntos habitacionais mais
especificamente, é necessário que se trabalhe sobre uma base única de medidas
relacionadas ao homem e sempre trabalhando nas três dimensões. O Modulor une
os sistemas métricos e de polegadas facilitando a pré-fabricação de componentes
11
O conceito de módulo é antigo já na arquitetura Helênica, Clássica (Vitruvius) e Palladiana o
módulo é uma unidade de proporção. Modulus (latim) = pequena medida
99
para a construção em todo o mundo, à um preço relativamente baixo com uma
enorme variedade de formas, proporções e soluções. A pré-fabricação modulada
permitiu que a casa fosse acessível a um maior número de pessoas, respeitando a
individualidade. Mesmo a casa industrializada sendo universal tem características
bem definidas relativas que podem ser adequadas a cada povo e região.
A industrialização da construção sofreu grande preconceito por parte do mercado e
dos técnicos, pela falsa idéia de que seria responsável pela uniformização das
construções. Mas na realidade a produção industrializada dos componentes é
apenas um facilitador, para que haja uma maior rapidez, menos desperdício e
menor custo final da obra.
2.4 A FAMÍLIA E A SOCIEDADE NO SÉCULO XX
Durante o século XX a estrutura familiar mudou muito, principalmente pelo fato da
mulher entrar para o mercado de trabalho e conquistar sua independência
financeira. Essa “revolução” das relações familiares é retratada por Berquó no
trecho abaixo:
“ a queda acentuada da fecundidade, o aumento da longevidade, a
crescente inserção da mulher no mercado de trabalho, a liberdade sexual, a
fragilidade cada vez maior das uniões, o individualismo acentuado, etc, são
tendências que vem atuando no sentido de alterar o tamanho, a estrutura e
a função da família” (BERQUÓ, apud TRAMONTANO. 2004)
Segundo
Gausa
(apud
TRAMONTANO,1997)
as
maiores
mudanças
comportamentais são resultado das mudanças na estrutura familiar, conseqüência
do surgimento de casais sem filhos ou com número reduzido, casais
homossexuais, famílias mono parentais e o envelhecimento da população.
Vivemos em uma sociedade cheia de diferentes perfis, com uma série de modos
100
de vida distintos que, muitas vezes não são considerados pelos profissionais
responsáveis pelo ramo da habitação coletiva. Estes projetam segundo Pignatelli
(2004), baseados em um modelo sociológico fixo, uma família composta de marido,
mulher e filhos, que são um padrão de referência de comportamento e são
considerados um sistema de valores estáveis.
Os diferentes “tipos” de famílias existentes hoje em dia, tem exigências espaciais e
de programa diferentes de uma família tradicional. Até mesmo a família tradicional
que tem um membro que trabalha dentro de casa necessita de uma organização
espacial diferente.
Como diz Pignatelli (2004) a família é o lugar institucional da socialização primaria,
portanto onde se reproduzem os valores convencionais, a casa é o lugar físico
onde essa atividade diária acontece. Uma das principais funções da família é
passar
modelos
culturais
(costumes,
conhecimento,
hábitos,
formas
de
organização, política, etc) através das gerações, outra é a de proporcionar
segurança. A casa, espaço com o qual estamos acostumados é um ponto de
referência, na verdade é uma das fontes de afirmação de nossa identidade
psicológica.
A forma da habitação faz parte da vida das pessoas e de sua forma de viver, é um
espelho onde se podem ver os costumes e relações humanas. Na verdade,
segundo PIGNATELLI (2004) analisando as casas do passado poderia se “ler”
muitas informações sobre a vida de nossos antepassados.
O movimento Moderno testemunhou as mudanças que a sociedade vinha
sofrendo, como por exemplo, a emancipação da mulher, igualdade de direitos
políticos e novas relações de trabalho, e tentou criar um homem padrão para
101
resolver os problemas emergenciais da carência de habitações. A habitação foi
transformada no modelo de salvação da sociedade.
“O movimento Moderno, que tinha o habitar como ponto de partida e de
sedimentação de sua reflexão, fez do habitat um arquétipo universal
baseado em uma concepção biológica do individuo. A lógica do método
empregado levava a uma padronização do conjunto dos espaços da vida
social – edifício, bairro, cidade, território.” (TRAMONTANO, 1997, p. 7)
Houve uma mudança estrutural nas relações interpessoais a nível familiar. Passa a
não ser mais tão comum uma figura central que provém o sustento da família,
agora todos os integrantes desta contribuem com a receita mensal, diluindo as
referências hierárquicas dando aos filhos e a mulher uma maior autonomia. Como
todos costumam trabalhar, há menos tempo para se cuidar das tarefas domésticas,
por esse motivo há a necessidade de se repensar os espaços, que passam a ser
mais voltados ao lazer, os afazeres da casa são simplificados e auxiliados por
eletrodomésticos facilitando a vida da “dona de casa” (TRAMONTANO, 1997).
A evolução dos meios de comunicação vem contribuindo para que não se note
tantas diferenças comportamentais entre grandes cidades do mundo, as diferenças
culturais vem se diluindo no meio de uma avalanche de informações. As pessoas
estão vivendo cada vez mais sozinhas e usando a tecnologia para se comunicar
virtualmente.
Tramontano (1997) descreve sua visão da sociedade do século XX:
“ ... metrópole do século 21: seu habitante parece ser um individuo que vive,
principalmente sozinho, que se agrupa eventualmente em formatos
familiares diversos, que se comunica à distancia com as redes a qual
pertence, que trabalha em casa mas exige equipamentos públicos para o
encontro com o outro, que busca sua identidade através do contato com a
informação.” (TRAMONTANO,1997, p. 7)
Com o fim da era da sociedade industrial, não havia mais a necessidade de uma
separação funcional dos ambientes, mudam-se as relações de trabalho e volta-se a
trabalhar em casa, como nas oficinas das cidades medievais. A evolução da
102
informática permitiu que cada vez mais pessoas viessem a trabalhar em casa,
meios de comunicação mais eficientes tornaram muitos dos deslocamentos físicos
desnecessários.
Ainda hoje vivemos em habitações que foram projetadas para a necessidade da
população do século XIX, separado em área social, intima e de serviço, percebe-se
que a sociedade muda seus costumes, mas a casa tradicional ainda persiste no
ideal das pessoas. Segundo Pignatelli (2004) a habitação demora muito a seguir as
modificações da sociedade, normalmente reproduz os modelos ultrapassados e
não costumam buscar tipologias inovadoras e mais adequadas à nova realidade.
Os lofts, por exemplo, foram um movimento espontâneo de um segmento da
sociedade que resolveu por conta própria mudar a forma de morar, e os arquitetos
vieram atrás da tendência que surgiu sem auxilio técnico (TRAMONTANO, 1993).
A organização e distribuição dos espaços da habitação estão profundamente
ligadas às exigências biológicas (comer, dormir, descansar, hábitos de higiene) e
psicológicas (que é a relação do ser com o espaço) dos indivíduos e grupos que a
utilizam. A diversidade das formas das casas nas diferentes culturas evidencia a
variação da apropriação dos espaços (PIGNATELLI 2004).
Não exatamente falando do caso do projeto da unidade habitacional, mas Pignatelli
(2004 p. 39 - 40) fala que o espaço autentico, é onde as pessoas se sentem bem,
são os espaços que são da forma que deveriam ser, não tem nada supérfluo e
nada faltando e não oprime o usuário. Exemplos negativos citados pela autora são
Brasília e Chandigarth, por coincidência cidades planejadas, onde a população
perde o poder de se apropriar do espaço. A autenticidade na arquitetura é algo que
se conquista tecendo uma intricada relação através do tempo, entre necessidades,
espaços e culturas.
103
A arquitetura é a única manifestação artística que hospeda funções práticas
(espaço para as atividades cotidianas) e comportamentos humanos (como o
espaço é utilizado). Muitas vezes o arquiteto não conhece a fundo o
comportamento de uma sociedade, havendo necessidade, ainda na fase de
projeto, de uma fase analítica onde se levarão em conta contribuições de várias
disciplinas, como psicologia, antropologia, e outros (PIGNATELLI 2004).
Quando um arquiteto projeta uma casa para uma determinada família, faz
inúmeras reuniões para levantar informações sobre os desejos e hábitos de seu
cliente. No caso de um conjunto habitacional seria muito difícil ouvir todas as
reivindicações de todos os futuros moradores, por isso é muito importante que o
arquiteto se alie a profissionais de outras áreas para que possa ter uma
interpretação mais realista do público para o qual está projetando.
Fazer arquitetura é organizar o espaço para que funções sócio-biologicas sejam
executadas de acordo com os costumes da cultura local. A arquitetura tem a
função de satisfazer às necessidades do usuário (PIGNATELLI 2004).
O programa, que está ligado as necessidades práticas e psicológicas das famílias,
guia o projeto, dá diretrizes de uso dos ambientes e sua distribuição. Em teoria o
programa deveria ser fruto de um rol de informações e dados que deveriam ser
interpretados e avaliados, só assim o programa seria estipulado e em uma última
fase passar pela avaliação do cliente, do usuário e do arquiteto (PIGNATELLI
2004).
Deveriam ser feitas análises sociológicas antes de se fazer o programa. Os
diferentes componentes da família deveriam ser estudados em relação a idade,
sexo, etc. As atividades desenvolvidas na habitação deveriam ser identificadas, e
medidas em relação a grau de independência entre elas e possível coordenação
104
em tempo e espaço das mesmas, grau de relação entre as atividades e
possibilidade de usar o mesmo espaço (sobreposição de funções). O levantamento
ainda deve incluir as características ambientais requeridas por cada atividade
(iluminação, ventilação), o tipo de separação entre elas (painéis, desníveis,
paredes, etc.) e por último, os efeitos psicológicos derivados de cada atividade
(PIGNATELLI 2004).
A maioria das necessidades primárias acontece dentro da residência, dormir,
comer, coabitar, cuidar dos filhos, cuidar da higiene do corpo, o abastecimento, o
descanso, o estudo, a reflexão, os jogos e as relações sociais. E os ambientes das
casas deveriam proporcionar tudo isso para seus habitantes (PIGNATELLI 2004).
O ser humano costuma ter rituais cotidianos variáveis nas diferentes fases da vida,
portanto o uso do espaço é modificado em quantidade e qualidade conforme a
idade do usuário. Um bebê vive boa parte de seu tempo em seu quarto, já a
criança de 4 ou 5 anos já expande seus horizontes brincando pela casa. Pignatelli
(2004) separa a vida de um homem em 7 ciclos descritos na tabela 5, onde
conforme a idade aumenta, os ciclos passam a ser mais longos, já que as
mudanças de comportamento são menores.
Interessante ressaltar que com os avanços da medicina cada vez mais temos um
maior número de idosos com uma boa mobilidade e com necessidades especificas.
Por esse motivo o desenho universal12 vem ganhando espaço nas discussões
sobre elaboração de projetos de moradia.
12
“O propósito do Universal Design é simplificar a vida das pessoas de todas as idades e
habilidades, projetando produtos, meios de comunicação e ambientes usáveis por muitas pessoas,
com pouco ou nenhum custo.”
Disponível em: http://www.serpro.gov.br/acessibilidade/duniversal.php
Acessado em 07.12.2007
105
Ciclo
Idade
Nascimento
0-1
Infância
2-6
Adolescência
7-15
Cortejo
16-24
Reprodução
25-35
Maturidade
36-65
Velhice
65 adiante
Tabela 5 – Quadro dos ciclos de vida
Fonte: PIGNATELLI, 2004 P. 151
Pignatelli (2004) criou tabela 6 abaixo, para indicar uma metodologia de análise da
habitação de acordo com sete faixas etárias. As casas em branco não significa que
não há utilização, e sim que o espaço tem interesse reduzido ou limitado pela faixa
etária.
As informações sobre o uso do espaço nas diferentes fases da vida são muito
importantes para o projeto da habitação, esta deve atender desde o recém nascido
até o idoso, se adaptando as diferentes necessidades através dos tempos.
106
Espaço
0-1
2-6
Dormitório
uso
constante
7 - 15
16 - 24
25 - 35
Necessida
de de
privacidade
Uso para
relações
sexuais
Necessida
de de
privacidade contra
a invasão
dos filhos
de
Estúdio
começa a
estudar
S. de Jantar
Habitação/ a casa
T.V.
uso
prolongado para
jogos,
reuniões,
entretenim
ento, etc
Uso
limitado
uso
prolongado e
somente
com
pequenos
grupos
T.V.
Interesse
pela jardinagem
Observação da
natureza
uso
prolongado
Cozinha
Varanda/
jardim
renovado
o interesse
pela leitura
e
aprendizado
uso
durante
varias
horas do
dia
T.V.
Escritório
uso
prolongado do
espaço e
necessidade de
privacidade
65 ...
Uso prolongado,
necessidade
tranqüilidade /
enfermida
de
Renovado
interesse
pelo
cuidado
pessoal
Necessida
de
privacida-
Banheiro
uso
limitado
36 - 65
inicio dos
trabalhos
manuais e
técnicos
crescente
interesse
pelos
Hobbies
Tabela 6 – Quadro da distribuição de atividades pelas diferentes fases da vida.
Fonte: Quadro reproduzido pela autora a partir de informações de Pignatelli 2004 p. 154-155
107
Tem-se feito pouca pesquisa sobre as novas necessidades de espaço das
populações urbanas. Continua-se a viver em espaços divididos em social, íntimo e
serviço que já não atendem as necessidades de uma nova forma de vida. Hoje em
dia não há mais tanta oferta de empregados domésticos, e o dono da casa passa a
assumir as tarefas de manutenção da casa. O reflexo disso é o desaparecimento
dos dormitórios de empregados, e o fim da separação entre áreas sociais e de
serviços, com a integração da cozinha com a sala.
Hoje em dia temos diferentes categorias de famílias, ou não-familias, pessoas com
diferentes necessidades espaciais, sejam relativas ao programa ou até mesmo ao
dimensionamento. Julienne e Mandon (apud TRAMONTANO, 1997) dizem que
deveríamos ter a “implantação de um mercado livre de tipologias” que viabilizasse
um tipo para cada grupo com suas peculiaridades. As construtoras deveriam
identificar esses novos nichos de mercado e construir, por exemplo, residências
para idosos seguindo os padrões do desenho universal.
108
3. PROJETOS DE HABITAÇÃO MÍNIMA DE 1900 A 1960
3.1 INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO
O capítulo II desta dissertação tem como objetivo aprofundar o estudo de projetos
de habitações mínimas executados entre 1900 e 1960, por meio da analise dos
projetos Weissenhof (Stuttgart), Siemensstadt (Berlim), Narkomfin (Moscou) e
Unidade de Habitação de Marselha (Marselha). O período escolhido corresponde à
consolidação do modernismo, quando o tema da habitação mínima foi muito
estudado tornando-se motivo de congressos internacionais, como o CIAM de 1929,
e exposições de arquitetura, como o Weissenhof (Stuttgart).
Para introduzir os conjuntos a serem analisados fez-se um apanhado geral do que
estava se estudando e criando em relação a célula habitacional durante o período
escolhido. Como seria impossível retratar toda a produção deste período que
corresponde a aproximadamente 60 anos, foram escolhidos alguns projetos mais
emblemáticos.
A análise e levantamento de projetos de habitação mínima do século XX será feita
de acordo com os seguintes parâmetros: soluções espaciais; dimensionamento e
diferenças de projetos nos diferentes paises estudados; programas da moradia
com ou sem auxilio de equipamentos de uso coletivo. O dimensionamento dos
cômodos será feito com informações das plantas disponíveis, onde não houver
escala gráfica ou numérica as camas serão a referencia de medida, partindo do
pressuposto que as camas tenham 2,0m de comprimento.
109
3.1.1 Werkbund
No inicio do século XX a Alemanha estava em destaque em relação à arquitetura.
Em primeiro lugar, a Alemanha não tinha grandes tradições arquitetônicas como a
França e a Inglaterra. Em segundo vivia uma industrialização recente e as
estruturas sociais estavam muito ligadas ao passado. Essa relativa falta de
precedentes facilitou a entrada de pessoas com idéias inovadoras, como artistas
de vanguarda e teóricos, no comando de postos diretivos em uma sociedade em
transformação (BENEVOLO, 2006, p. 374). Benévolo (2006, p. 476) ainda ressalta
que o Werkbund era uma instituição estatal e portanto financiada pelo governo.
As experiências no campo da habitação na Alemanha foram muito importantes
para a qualificação dos espaços de morar de baixo custo. Um dos movimentos de
grande importância surgidos no inicio do século XX foi o Deutscher Werkbund que
limitou seu campo de atividade ao domínio das artes e da arquitetura (KOPP,
1990).
Criado em 1907 por Muthesius, Naumann e Schmidt, que tinha como primeiros
membros 12 artistas independentes e 12 firmas de produtos artesanais foi uma
tentativa de aliar o setor da criação com o da produção, criando móveis, objetos
utilitários, dentre outros. Para o Werkbund deveria ser criado um estilo para sua
própria época e não copiar ou imitar estilos do passado.
O movimento era deveras heterogêneo e por esse motivo não estava totalmente de
acordo com a idéia de Muthesius do design para a produção industrial.
(FRAMPTON, 1997 P.132). Logo começaram discussões padronização versus
liberdade de projeto; economia versus arte (BENEVOLO, 2006 p.376).
110
Durante a Exposição Deutsche Werkbund em Colônia em 1914, Muthesius fala dos
10 pontos do Werkbund:
“Nos pontos 1 e 2 argumentava que a arquitetura e o design industrial só
podem tornar – se importantes pelo desenvolvimento e refinamento dos
tipos (Typisierung), e, nos pontos 3-10, abordava a necessidade nacional de
produtos de alto nível, que desse modo pudessem ser facilmente vendidos
no mercado mundial. No ponto 9, que dizia respeito a produção em série,
lia-se uma pré-condição para a exportação é a existência de empresas
grandes e eficientes, cujo gosto seja impecável. Os objetos individuais
criados por artistas não cobririam nem mesmo a demanda na Alemanha.
(...) Essencialmente, a arquitetura tende para o típico. O tipo descarta o
extraordinário e estabelece a ordem.” (FRAMPTON, 1997 P.134)
O Werkbund foi uma forma de “encarar” as artes, arquitetura e design com a visão
da “era da máquina”, aliando a arte e indústria. Os integrantes do movimento
acreditavam que os novos meios da indústria seriam capazes de permitir novos
desenvolvimentos artísticos.
A tipificação foi o centro das preocupações do Werkbund, o que tornou possível a
reprodução infinita de um mesmo produto, que foi o mote da industrialização. Essa
tipificação mostrou à população as vantagens, principalmente em relação a custo,
de se ter um produto produzido em série com qualidade igual e preços mais
acessíveis.
A formação de Water Gropius se dá em meio ao Werkbund e da arquitetura
industrial alemã. Já em 1910 inicia o projeto de uma reforma da produção artística,
e durante a guerra se transforma em uma reforma do ensino artístico. Com o apoio
do Grão-duque de Saxônia-Weimar assume a direção da Sachsische Hochschule
fur bildende Kunst (Universidade da Saxônia de artes plásticas) e da Sachsische
Kunstgewerbeschule (Escola da Saxônia de artes e ofícios) de Weimar. Depois a
111
Bauhaus surge da fusão destes dois institutos com um programa baseado no
Werkbund (ARGAN, 2005, p. 41).
O Werkbund era uma instituição estatal e portanto era financiada pelo governo
3.1.2 Neues Bauen
Baseado no Werkbund , surge na Alemanha logo após a 1ª Guerra em 1919, o
movimento Neues Bauen (nova construção). O Neues Bauen teve grande
representatividade no cenário da construção civil, buscando soluções para os
novos problemas surgidos com a Revolução Industrial do século XIX. A revolução
política, econômica e social ocorrida na URSS serviu de base para essa nova
arquitetura.
Os arquitetos da Neues Bauen levavam em conta as condições de vida e
aspirações dos usuários, portanto podia-se dizer que para eles “o moderno não era
um estilo e sim uma causa” (KOPP, 1990). Para eles o problema habitacional não
era apenas uma questão de suprir uma demanda, independente da qualidade, o
intuito era humanizar a moradia.
A nova arquitetura (“Neues Bauen”) foi uma forma de liberação social, uma nova
forma de viver mais comunitária e menos centrada nos problemas da família
(KOPP, 1990). Já se começava a ver a sociedade como um todo, o individualismo
perdeu espaço para essa nova visão de conjunto.
Bruno Taut (apud KOPP, 1990) acentuou a importância da habitação na
arquitetura, o que foi um dos pontos importantes do “Neues Bauen”, ao contrário
dos arquitetos tradicionais, que só se preocupavam com as obras monumentais.
112
Bruno Taut diz que a maioria do que era construído na Alemanha, no entre
guerras, eram prédios de habitação com uso de fundos públicos que pertenciam à
população, fato que evidenciava a importância deste tipo de construção. Na
verdade ficou claro que a necessidade era de edifícios destinados à moradia e não
grandes equipamentos de uso público como prédios culturais e institucionais.
Os arquitetos do “Neues Bauen” concordavam que a arquitetura deveria se tornar
uma ciência com o objetivo de melhorar a vida da população e transformar a
sociedade. É claro que essas transformações não eram vistas da mesma forma por
todos os arquitetos do movimento (KOPP, 1990). Como diz Teige (2002) a
arquitetura não poderia mais ser considerada como arte, esta passou a ser guiada
pelas necessidades práticas da vida.
A mudança na forma de se enxergar e vivenciar a arquitetura foi muito importante
para uma nova concepção do projeto. Na verdade a arquitetura passou a ser mais
acessível, deixando de ser exclusividade das classes sociais mais elevadas.
Um dos problemas centrais do “Neues Bauen” foi a tentativa de se chegar a um
ideal do que seria necessário para uma existência mínima (Existenzminimum). Mas
essa noção de mínimo não era ligada exclusivamente a questões financeiras e
econômicas, tinha o intuito de se chegar a um mínimo com qualidade. Ernest May
(KOPP, 1990) era veemente quando dizia que o “Neues Bauen” lutava contra a
moradia dita econômica, econômica no sentido de miserável, que tornava a vida de
seus ocupantes desconfortável e insalubre. Ernest May defendia também que as
casas fossem pequenas sim, mas habitáveis, e além do mais, que os aluguéis
fossem compatíveis com a renda de seu público. Por esse motivo estas moradias
não deviam ser construídas pela iniciativa privada, por visarem o lucro a qualquer
113
custo, e sim com dinheiro público, o que poderia assegurar certo controle do
mercado imobiliário. O Governo estando responsável pela construção de habitação
de baixa renda, em tese, deveria se preocupar com a qualidade do projeto e da
construção, mas muitas vezes trata a questão habitacional como um simples
problema de quantidade, cumprindo metas a qualquer custo, mesmo que acarrete
prejuízo futuro, como problemas sociais decorrentes da baixa qualidade da
moradia.
Os arquitetos do “Neues Bauen” eram entusiastas dos aspectos técnicos, práticos
e funcionais do projeto, relegando a questão estética de seus trabalhos, a forma
continuava sendo importante, mas como resultado de um processo racional. Como
diz Kopp (1990) o programa, a parte funcional do projeto, é a expressão de uma
análise socioeconômica das necessidades da população, é claro que, para os
arquitetos dessa nova arquitetura, essas necessidades eram as do homem do
futuro que eles idealizavam.
O “Neues Bauen” começa a desaparecer em 1932, vítima da crise econômica
americana deflagrada em 1929 que afetou todo mundo. O nível de desemprego
cresce absurdamente e o número de habitações construídas na Alemanha, por
exemplo, cai para menos da metade, além da diminuição das áreas e do conforto.
Nesse período passou-se a destinar a cada moradia um pequeno pedaço de terra
para que se pudessem cultivar algumas culturas de subsistência, uma pequena
compensação para uma população que vivia em péssimas condições (KOPP,
1990).
As exposições de habitação foram na realidade verdadeiros campos de provas,
onde os modelos eram construídos de verdade, como diz Aymonino (1973) “se
114
trata de um manifesto construído”. O principal exemplo disso é o Weissenhof em
Stuttgat (model housing colony -1925) uma das marcas mais significantes deixada
pelo Neues Bauen, onde 17 arquitetos (Bruno Taut, Max Taut, Peter Behrens,
Victor Bourgeois, Le Corbusier, Richard Döcker, Josef Frank, Ludwig Hilberseimer,
Walter Gropius, Mier van der Rohe, Jacobus Johannes Pieter Oud, Hans Poelzig,
Adolf Rading, Hans Scharoun, Adolf Gustav Schneck, Mart Stam) foram chamados
para construir 33 edificações, todas construídas com materiais modernos e usando
ao máximo, técnicas construtivas que incluíssem elementos industrializados (Teig,
2002).
A exposição não tinha apenas o intuito de mostrar uma nova arquitetura, mas sim
uma nova forma de vida expressa pela arquitetura, espaços mobiliados e um novo
tipo de decoração. As formas eram geométricas básicas, sem ornamentação, uma
arquitetura para ser usada e não admirada. As plantas são flexíveis, isto é, o
projeto permite adaptações feitas pelos moradores, e o projeto é elaborado
combinado com a decoração. Muitas das novidades desta exposição estavam
dentro das unidades habitacionais, muitos novos equipamentos e mobiliário
racional, como cozinhas planejadas, como a de Frankfurt, foram apresentadas
durante o evento.
As edificações para a exposição foram construídas com o que havia de mais
moderno na época, estrutura metálica, lajes térmicas, elementos pré-fabricados,
onde todas essas novas técnicas construtivas foram expostas para apreciação do
público.
Todas as construções tinham lajes planas como cobertura, estuque branco nas
fachadas e amplas janelas, aspectos que foram duramente criticados, as lajes por
não serem adequadas ao clima e não respeitarem as tradições germânicas, e as
115
grandes aberturas que seriam desagradáveis durante o inverno. (SCHOENAUER,
2000)
3.1.3 Ernest May
Ernest May foi uma figura importante na produção habitacional na Alemanha, e seu
trabalho teve repercussão em toda a Europa. Como diretor do departamento de
construção de Frankfurt, estabeleceu um plano de construção de habitações para
10 anos. Como na época, inicio do século XX, boa parte dos terrenos vazios estava
na mão da iniciativa privada, e os custos destes estavam além do orçamento do
governo, a solução foi construir conjuntos habitacionais nas regiões mais distantes
do centro da cidade, no máximo 45 minutos, essas eram as cidades satélites.
Estas deveriam ser separadas da área central da cidade por cinturões verdes,
planejadas para serem verdadeiros reservatórios de ar fresco para a cidade (Teig,
2002), semelhante ao conceito das Cidades Jardim inglesas de Howard.
O programa de May consistia em construir pequenas unidades uni familiares de
baixo custo, continuando a idéia das cidades-jardim inglesas. May acreditava que a
casa uni familiar era a forma ideal de morar. Em pró de seu ideal procurou formas
baratas de se construir usando ao máximo a estandardização, chegando a um
modelo de moradias uni - familiares construídas em fileiras, como casas
geminadas. Na época os apartamentos de vários pisos não eram comuns mesmo
sendo mais econômicos. Posteriormente por pressão, May concordou em construir
edifícios multi-familiares, reconhecendo que esses apartamentos poderiam ter uma
melhor ventilação e insolação do que as casas em fileiras (TEIG, 2002).
116
Em 1914
já
existiam muitos
assentamentos
baseados
no
principio da
individualização da casa, esse tipo de experiência acabou por reforçar a idéia de
que era impossível se sustentar a casa uni - familiar tanto por motivos estéticos
quanto econômicos e técnicos. O fator principal contra a residência uni - familiar foi
o aumento do custo do solo e infra-estrutura (AYMONINO, 1973).
As conquistas habitacionais de Ernest May foram muito bem sucedidas até a crise
econômica do final dos anos 1920. A falta de verba fez com que o número de
moradias produzidas caísse de 4.000 para 3.650 unidades, fato que aumentou o
preço dos imóveis disponíveis deixando de fora a população mais carente. A
solução encontrada foi a diminuição da área das unidades, Ernest May (apud
Teige, 2002. p. 207-208) estabeleceu que o mínimo para uma família média (um
casal sem filhos) seria de 40m², mas logo em 1936 passou a ser necessário
construir habitações com 36m², e algumas com 30m².
Algumas inovações no projeto de habitações coletivas foram feitas em Frankfurt,
como lavanderias coletivas e salas de secagem (drying rooms), e em alguns casos
foram construídos centros culturais. Outra inovação foram os apartamentos
projetados para solteiros, boa parte dessas novidades era em relação às áreas de
uso coletivo dos apartamentos.
Nas normas de construção de Frankfurt, uma habitação mínima deveria, no caso
de um casal sem filhos, ter um dormitório e uma sala, mas na prática existia um só
ambiente. A norma dizia que para uma família o apartamento deveria ter três
cômodos e uma área de 44m², mas era comum acomodar famílias pobres em
apartamentos com um ou dois cômodos (TEIGE, 2002).
117
O método construtivo usado nas casas uni-familiares neste período era o
Plattenbauweise sistema que usava grandes painéis (20 cm de espessura) de
concreto armado que vinham com acabamento da fábrica, eram de fácil montagem
e só havia necessidade de acabamento feito na obra nas junções. Esses painéis
tinham um excelente coeficiente de isolamento térmico, equivalente ao de uma
parede de tijolos de 45cm (TEIGE, 2002).
3.1.4 Viena
Em 21 de dezembro de 1923 o governo da cidade de Viena aprovou uma
resolução que autorizava a construção de 5.000 apartamentos por ano, em 1927
elevou o número para 30.000. A característica marcante destes conjuntos
habitacionais era a verticalização e a presença de pátios que serviam de espaço de
lazer para seus moradores, os famosos Hof13 vienenses.
Esses apartamentos construídos pelo governo, entre 1923 e 1926, tinham área que
variava entre 38m2 e 48m2. A partir de 1927 começaram a ser construídas
habitações de três tipos; unidades de 21m² com o intuito de abrigar pessoas
sozinhas que era constituído de um ambiente só, com banheiro e vestíbulo com um
forno a gás; unidades de 40m² com sala de estar e dois dormitórios, banheiro e
cozinha; e unidades de 57m² com três dormitórios, banheiro e cozinha.
O Karl Marx Hof (fig. 25) foi um importante conjunto habitacional construído entre
1927 e 1930 por Karl Ehn em Viena. São 1.400 apartamentos, para 5.000
habitantes com apartamentos entre 30m² e 60m² de área. Como o próprio nome do
13
Pátio em alemão.
118
conjunto diz, Hof em alemão pátio, havia uma área ajardinada interna ao edifício
como se pode ver na figura 26.
Havia toda uma infra-estrutura de apoio, lavanderias, jardins de infância, centro de
convivência para jovens, biblioteca, consultórios de dentistas, consultórios
médicos, farmácia, correio e banheiros públicos com chuveiros. A idéia era que
todos esses equipamentos coletivos tivessem sua manutenção custeada apenas
pelos aluguéis. Interessante ressaltar que a verba para a construção destes
conjuntos habitacionais era derivada dos impostos relativos a construções
executadas pela iniciativa privada.
Fig.25 Karl Marx Hof
Fonte: www.greatbuildings.com/buildings/Karl_Marx_Hof.html
Acessado em: 29.11.2007
119
Fig.26 Karl Max Hof vista do pátio
interno para a rua.
Fonte:
http://www.greatbuildings.com/cgibin/gbi.cgi/Karl_Marx_Hof.html/cid_20
051213_kmm_img_8144.html
Acessado em: 29.11.07
Na descrição de Aymonino (1973) os Hof Vienenses tinham fachadas despojadas
com certo aspecto de fortaleza. Em relação ao dimensionamento, e programa
mínimo das unidades, era respeitado o que vinha sendo proposto nos outros
paises da Europa, na verdade era uma visão das Cidades Jardim Inglesas, filtradas
através das realizações alemãs das Siedlung.
“A organização (programa) e as dimensões de cada habitação operária não
se diferenciam muito dos exemplos análogos no resto do continente
(europeu). A galeria continua sendo o instrumento que serve a muitas
habitações de dimensões reduzidas com poucas escadas, colocando-as em
relação com um mínimo de serviços indispensáveis (torneira de água
corrente e vasos sanitários). O bloco fechado com pátios é o organismo
arquitetônico fundamental, com fachadas voltadas a rua pública e
mostrando-se ao pátio interior.”(AYMONINO, 1973, p. 21)
120
Nenhum dos conjuntos construídos em Viena poderia ser considerado um modelo
de habitação para todos, muito diferente do pretendido pelo movimento moderno.
Esses conjuntos não partilhavam do ideal moderno de que estes eram apenas uma
solução para a questão isolada do abrigo.
3.1.5 Le Corbusier
Le Corbusier foi um grande ícone da arquitetura e urbanismo que elaborou
importantes estudos e projetos relativos à habitação mínima e industrializada. De
1914 adiante tenta desenvolver um ideal de célula de habitação econômica que
fosse possível de ser produzida em série.
3.1.5.1 Máquina de Morar
A construção passou a ser industrializada e em série, segundo Kopp (1990) as
casas passam a ser construídas como os automóveis, acreditando em uma
diminuição dos custos da moradia, similar com o que aconteceu com os carros.
Deste principio surge a idéia de máquina de morar de Le Corbusier (KOPP, 1990).
Quando Le Corbusier propõe transformar a habitação em uma “máquina de morar”
põe em prática todos os aspectos que permitiriam uma produção em série,
funcional e racional. Esse tipo de moradia rompeu seus vínculos com a sociedade
do local, passando a ser “universal” (PIGNATELLI, 2004).
A idéia de “máquina de morar” seria uma universalização da moradia, uma
globalização dos usos e costumes. Na teoria seria muito interessante para a
industrialização, já que se poderiam estandardizar os componentes da construção.
121
Mas na realidade é muito complicado passar por cima das peculiaridades de cada
povo, de cada cultura.
A idéia de Le Corbusier de que a casa deveria ser construída em série como uma
máquina foi extremamente criticada na época, mas segundo Rossi (apud
BENEVOLO, 2006) essa foi a definição precisa e a mais revolucionaria da
arquitetura moderna. Esse pensamento foi inovador para a época porque ainda
não se vivia sobre os efeitos da globalização. A evolução dos meios de
comunicação passou a promover uma maior integração entre as diversas culturas
mundiais.
O edifício racional não faz com que o homem seja tirado de sua realidade para
vivenciar uma nova concepção de vida, a máquina de morar, Argan (2005, p. 125)
diz que a racionalidade da edificação é fruto da “racionalidade da consciência”, isto
é, o homem adaptando sua moradia as suas novas necessidades.
3.1.5.2 Unidade de Habitação de Marselha
A Unité d’habitation de Marseille foi um verdadeiro ícone da construção de habitações
no mundo. Le Corbusier recebeu a incumbência deste projeto em 1945, do
Ministério da Reconstrução que deu máxima liberdade ao arquiteto, que pode pela
primeira vez expressar todas as suas idéias sobre o habitat moderno
(CORBUSIER, 1971).
Na Unité existem apartamentos de vários tamanhos e para atender desde solteiros
até famílias com mais de seis filhos. O resultado final foi fruto de estudos teóricos
formulados durante 20 anos. O edifício usou peças pré-fabricadas com armação
independente que permite ampliações das unidades, tem instalações de serviços
122
comuns e leva em consideração a orientação do sol para tirar proveito de um
melhor conforto ambiental (CORBUSIER, 1971).
A Unidade de Habitação de Marselha é a síntese dos ideais modernistas, foi
executada com elementos industrializados, partiu das medidas de um homem
standard, o Modulor, e tentava resolver ao máximo as funções domésticas fora do
apartamento.
3.1.5.3 Casa Domino
Em 1915 Corbusier desenvolve a casa Domino, que era um conjunto de casas
construídas de acordo com o principio da produção em massa e industrialização
em larga escala, acabando com a construção artesanal. Foi um importante símbolo
da idéia de “máquina de morar”.
A casa Domino foi o projeto de casas construídas em série com esqueletos de
concreto, como se pode ver na fig. 27. O baixo custo do concreto e do aço na
época permitia seu uso em larga escala. As armações rígidas eram colocadas em
cima do solo por uma empresa, depois os muros e divisórias eram rapidamente
montados, esse serviço todo não demandava mão de obra especializada. A altura
entre as lajes era pensada junto com a altura dos armários, portas e janelas,
respeitando a uma mesma modulação de 1m x 1m, segundo análise da planta (fig.
28). Diferente do usual, a parte de carpintaria era montada antes das paredes, e
ditava o alinhamento das mesmas (CORBUSIER, 1977).
123
Fig. 27 Maison Domino
Fonte: http://www.arch.columbia.edu/DDL/cad/A4535/SUM95/domino/domino.html
Acessado em: 12.12.2007
Fig. 28 - Planta do pavimento dos dormitórios da Maison Domino
Fonte: Le Corbusier 1910 – 1965 p. 24
Na planta acima, figura 28 pode-se observar o segundo pavimento da casa
Domino, onde estão localizados os quatro quartos e banheiro. As divisões entre os
cômodos são feitas com painéis fixos, como citado anteriormente. Muitos destes
painéis eram montados antes da alvenaria de vedação ser construída. As duas
paredes laterais da casa são cegas para que se possam construir casas de ambos
os lados.
124
3.1.5.4 Casa Citrohan
A casa Citrohan (para não dizer Citroen) é pensada como um carro, um ônibus ou
cabine de barco, e é uma reação contra a velha casa que, segundo Le Corbusier
(1977) fazia mau uso do espaço. As necessidades da época são identificadas e
passam a exigir soluções condizentes.
Em um panorama onde as necessidades da época são preço e custo baixos,
surgiu a idéia da casa como máquina de morar ou ferramenta. Com o aumento do
preço da construção, as pretensões arquitetônicas foram reduzidas pela metade e
a quantidade de casas também. O modernismo vinha com uma nova concepção de
casas, não apenas em relação a programa quanto à fachada (forma) e a população
tinha certo preconceito por essa simplificação proposta pelos arquitetos modernos,
como se simplicidade fosse sinônimo de pobreza (CORBUSIER, 1977).
Fig.29 Maison Citrohan, Stuttgart, 1927
Fonte:
www1.uol.com.br/bienal/4bia/salas/irp_rau
m01.htm
125
Fig. 30 - Casa Citrohan planta 1º pavimento
Fonte: Lê Corbusier 1910 – 1965 p. 25
Fig.31 - Casa Citrohan planta 2º pavimento
Fonte: Lê Corbusier 1910 – 1965 p. 25
Fig.32 - Casa Citrohan planta 3º pavimento
Fonte: Lê Corbusier 1910 – 1965 p. 25
Na figura 29 tem-se uma noção da volumetria da casa Citrohan. Nas figuras 30,31
e 32 pode-se observar os três pavimentos da habitação. No primeiro piso estão a
sala, parte dela com pé direito duplo, cozinha, banheiro e quarto de empregada. No
segundo andar há um banheiro, o quarto do casal e um pequeno salão (boudoir)
com vista para a sala. No último piso há dois quartos pequenos, algo em torno de
2,0 m x 2,5 m, dois lavatórios, um vaso sanitário (não foi possível saber se há ou
não chuveiro neste andar) e o solarium.
126
3.1.5.5 Casa Monol
A casa Monol (FIG.33) é uma célula de cimento amianto, feita com placas de 7mm
de espessura, formando fileiras de 1 metro de altura que se enchem de materiais
brutos (entulho, pedras, pedriscos), no lugar de tijolos e materiais comuns de
vedação, envolvendo esse entulho com argamassa, que deixa espaços vazios
nesse enchimento, que dão a essas paredes um caráter de isolamento térmico
importante. Os pisos e forros são feitos de chapas onduladas de cimento amianto
uma verdadeira escora que recebe uma capa de concreto. As chapas arqueadas
são também isolantes térmicas. As janelas são colocadas junto com a montagem
das paredes, a casa usa um corpo único de pedreiros (CORBUSIER, 1977).
Fig. 33 Casa Monol
Fonte. BOESIGER, 1994, P. 11
3.1.5.6 Inmuebles Villas
Inmuebles Villas foi uma nova proposta de edifícios residenciais urbanos com 120
apartamentos, onde cada unidade tem um terraço jardim, não importa que altura
este esteja do chão. Em conformidade com a tendência, esse edifício teria serviços
comuns como lojas de alimentos cooperativas, pista de Cooper e solarium
(BENEVOLO, 2006).
Com o projeto das Immuebles Villas (prédios-vilas) feito em 1922, Le Corbusier
quis dar a forma a uma habitação modelo, fosse um novo sistema de casas
urbanas. Este é um avanço da idéia de célula habitacional, iniciada com a Casa
127
Citrohan (1920-1922), onde pela primeira vez se tentou resolver o espaço
residencial partindo de uma elevada concepção técnica baseada na facilidade de
reprodução do modelo.
Essa habitação é o resumo dos ideais “corbusianos” de espaço doméstico,
condensando
tudo
em
um
paralelepípedo
de
dimensões
mínimas.
Os
apartamentos são sobrepostos, com entradas independentes, são na verdade
pequenas casas duplex com pé direito duplo. No interior das unidades percebemse pequenos espaços destinados aos serviços minimamente calculados para um
melhor aproveitamento e grandes espaços coletivos que são o lugar central do
espaço habitável. A comunicação entre as diversas células de habitação é feita
por uma passarela aberta sobre o pátio. Muitos conceitos dos Immuebles Villas são
usados como princípios por Le Corbusier na Unité d’habitation de Marseille
(CORNOLDI, 1999).
128
Fig. 34 - Plantas do primeiro e segundo pavimento de uma unidade da Inmuebles Vilas
Fonte CORBUSIER 1971 p. 26
O grande diferencial deste projeto é o fato de ser praticamente uma reprodução do
espaço de uma habitação uni familiar isolada em um bloco de apartamentos. O
programa é muito semelhante ao da casa Citrohan, sala com pé direito duplo na
área de estar, terraço, cozinha, banheiro e quarto de empregada no primeiro piso e
no segundo pavimento estão os três quartos e banheiro (fig. 34).
Nas figuras 35 e 36 é mostrado como a distribuição dos espaços internos
repercutem na fachada. Fica bem visível a parte da sala com pé direito duplo onde
há a grande vidraça, e a parte do terraço onde há a grande reentrância. Observase também o coroamento diferenciado do edifício, onde ocorrem os equipamentos
de uso coletivo, como solário, pista de Cooper e outros.
129
Fig.35 - Fachada da Inmuebles Vilas
Fonte CORBUSIER 1971 p. 26
Fig.36 - Fachada da Inmuebles Vilas
Fonte CORBUSIER 1971 p. 26
Na vista interior do apartamento (fig 37) do Inmuebles Vilas se pode ter uma noção
do espaço usado em três dimensões. Na parte de cima da figura 37 tem-se a
noção do pé direito duplo, e na parte de baixo da fig. 37 pode-se ter uma idéia da
distribuição dos espaços do primeiro pavimento.
130
Fig. 37 Vista do interior da Inmuebles Vilas
Fonte CORNOLDI 1999 p. 202
3.1.6 Japão
A tradicional casa japonesa, a parte do movimento inglês das cidades jardim,
também exerceu grande influência no projeto das habitações modernas. Nesse
meio tempo a evolução dos equipamentos, principalmente a calefação central,
permitiu que o projeto da moradia abandonasse a fórmula inglesa e adotasse o
modelo mediterrâneo e asiático, com terraços, balcões, varandas e fachadas
131
abertas. O fato de ser possível climatizar os ambientes trouxe uma maior
flexibilidade no desenho da habitação.
Adolf Loos (apud Teig, 2002) diz que se poderia considerar moderno quase tudo da
casa japonesa. A casa japonesa não tem paredes portantes, a cobertura é
suportada por pilares e vigas, com muita luz, divisórias móveis e persianas de
correr, que não são restritas às divisões internas, fazendo parte também da
vedação externa. Não existem janelas, pelo fato das persianas de correr, fixas
horizontalmente, servirem tanto de porta como de janela. As paredes externas são
feitas de materiais translúcidos ou transparentes. O espaço interno é bem flexível,
podendo ser tanto um salão único quanto uma série de pequenos espaços. A casa
japonesa é normalmente sem móveis, móveis inúteis não são tolerados, não
existem cadeiras, nem mesas e nem camas, se come e dorme no chão em
tatames. A existência apenas de mobiliário essencial torna o espaço mais fluido.
Segundo Waswo (2002, p. 63) a imagem da arquitetura japonesa criada pelos
arquitetos do ocidente não são condizentes com a realidade, eles se remetem a
moradias de alto padrão e não as pequenas habitações populares no Japão.
A multi-funcionalidade dos cômodos na casa japonesa chamou a atenção dos
arquitetos modernistas, entre eles Walter Gropius. Não apenas o caráter indefinido
em relação à função das salas de tatame, mas também a escassez de móveis e a
standardização de componentes da moradia, como os painéis deslizantes, os
tatames, armários e outros (WASWO 2002, p. 62).
Muitos profissionais da arquitetura e reformistas sociais, segundo Waswo (2002,
p.62), diziam que essa multi-funcionalidade era uma reminiscência do feudalismo e
deveria ser eliminada. Diziam que comer e dormir no mesmo ambiente era anti132
higiênico, que a família toda dormindo em um mesmo espaço prejudicava a
privacidade, e a mudança constante do mobiliário de cada cômodo deixava de ser
uma vantagem e passava a ser irracional.
Por iniciativa do governo, os projetos de habitação passaram a ter um espaço que
era uma mistura de cozinha e sala de jantar, a dining- kitchen (sala de jantar –
cozinha) ou DK (WASWO 2002, p. 62). A difusão desse espaço, que separava o
dormir da preparação e consumo dos alimentos, fez com que houvesse a
necessidade de móveis no estilo ocidental, para que fosse compensada a falta de
espaço. Além do mais a evolução dos eletrodomésticos, que tiveram grande
importância no crescimento da economia japonesa após a segunda guerra,
encheram a casa do japonês de objetos. O hábito de sentar no chão e dormir em
tatames quase desapareceu segundo Waswo (2002, p. 62-63).
Na década de 1980 o DK se tornou LDK (living-dining-kitchen), o espaço destinado
a salas de jantar e estar mais cozinha tinha piso não mais de tatame14, agora eram
de madeira, carpete, e outros. Esse espaço agora continha móveis, como sofás,
mesas e cadeiras. Ao invés de 4 salas de tatame, apenas uma no pavimento
térreo, 2 cômodos no pavimento superior com piso de madeira, camas,
escrivaninhas e cadeiras. A sala de tatame tinha funções variadas durante o dia,
essa sim mantinha os costumes japoneses, piso de tatame e poucos objetos, com
a possibilidade de se transformar em quarto de dormir durante a noite (WASWO
2002, p. 63).
14
O tatame tradicional e de palha de arroz prensada revestida com esteira de junco e faixa preta
lateral.
133
As “modernizações” nos projetos de moradias no Japão começaram na década de
1920. Ocorreram pequenas mudanças como à criação de corredores de
distribuição para os quartos, mas apenas em residências de alto padrão,
adaptações à necessidade de luz e ventilação naturais e instalações sanitárias
(WASWO 2002, p. 64).
Após a segunda guerra, e a grande destruição dos estoques de habitação, é que
começou efetivamente a mudar a forma de morar dos japoneses A maior parte das
moradias era construída em madeira, pelo fato de serem mais leves e sofrerem
menos com os terremotos freqüentes, mas por outro lado mais suscetíveis a
incêndios. Durante os duros bombardeios sofridos no final da segunda guerra
houve muita destruição das cidades no Japão, havendo a necessidade de uma
maciça reconstrução (WASWO 2002, p. 64). Na fig. 38 pode se observar o número
reduzido de edifícios que resistiram aos bombardeios americanos no final da
segunda guerra na cidade de Tókyo.
Fig. 38 Tokyo após
bombardeio de
10/03/1945
Fonte:
http://www.japanfocus.or
g/images/463-1.jpg.
Acessado em :
17/11/2007.
134
A grande destruição das cidades japonesas durante os bombardeios da Segunda
Guerra, fizeram com que as pessoas pensassem mais em relação às técnicas
construtivas usadas na construção de casas. As tradicionais casas japonesas em
madeira se mostraram deveras susceptíveis a incêndios, portanto frágil.
Segundo Waswo (2002, p. 65) assim como na Europa, o Japão começou suas
reformas habitacionais de forma a melhorar as condições físicas da moradia, para
melhorar as condições de saúde da população, e também melhorar o
comportamento15 dentro das casas.
Fig. 39 Casa de 5 cômodos no Japão na
década de 1920.Os números 6, 4.5 e 2 são
referentes ao número de tatames de cada
ambiente, que são uma referencia de
dimensionamento para o japonês.
Fonte: WASWO, 2002, p. 66
A planta da figura 39 representa bem o estilo da classe média baixa japonesa de
morar no inicio do século XX. Waswo (2002, p. 65) fala da importância em separar
o espaço íntimo da família e o do pai, que era também o local onde se recebia
15
Comportamento nesse caso é em relação à falta de privacidade e problemas morais decorrentes
do uso de um mesmo quarto por toda a família.
135
visitas importantes. No exemplo da fig. 39, 30% do espaço total da moradia são
destinados a receber, que corresponde a entrada (entry) e sala de visitas (guest
room).
A existência de um quarto de empregada era muito comum, já que famílias de
classe média normalmente tinham serviçais, este ficava entre a entrada e a
cozinha. Esta era no nível do chão diferente do resto da casa que estava a 0,61 m
do mesmo.
A área para a família era extremamente limitada, algo em torno de 10 m² (6
tatames16), neste espaço se comia e dormia, com exceção do pai que dormia na
sala de visitas, a mãe dividia seu futon17 com o filho mais novo. A divisão entre
esses dois espaços era feita por painéis deslizantes, que não tinham bom
isolamento acústico. Não havia espaço para banho, apenas vaso sanitário e
lavatório, banhos eram tomados em banheiros públicos (WASWO, 2002, p. 66).
O fato de a família inteira dividir o mesmo espaço era extremamente perigoso para
a saúde (fácil propagação de doenças), além da falta de privacidade e
promiscuidade. O costume de se dormir toda a família no mesmo espaço não era
exclusividade das famílias mais pobres, as mais ricas compartilhavam do costume.
Mas as informações que vinham do ocidente em relação à salubridade do habito
16
A referencia de medida nas moradias japonesas normalmente á a quantidade de tatames, estes
medem algo em torno de 182,88 cm. X 91,44 cm
17
Futon é um tipo de colchão usado pelos japoneses para dormir. Estes tem em torno de 5cm de
espessura, recheados de algodão e cobertos com tecido.
136
começou a provocar reações da sociedade, passou a se questionar o costume e
começou-se a pensar em eliminá-lo (WASWO, 2002, p. 68).
A privacidade foi um conceito adquirido pelo povo japonês apenas no inicio do
século XX, enquanto que na Europa isso tinha se iniciado no século XVIII
(WASWO, 2002, p. 68).
Após a Segunda Guerra o Japão teve promulgada uma nova constituição, e
passou a ser uma monarquia parlamentarista, nos moldes ingleses. Importantes
reformas de cunho democrático foram executadas a partir de 1946, causando um
período de instabilidade, logo sucedido por uma fase de crescimento econômico
favorecido pela Guerra da Coréia (1950 -1951). Em 1945 a hierarquia familiar foi
democratizada, mulheres e homens passaram a ter os mesmos direitos, e um dos
novos direitos relativos à moradia era o de privacidade. (WASWO, 2002, p. 69). Em
1951 foi devolvida a soberania ao Japão, mas ainda proibido reconstruir sua força
militar. Em 1969 os Americanos abandonaram as bases militares que tinham em
território japonês (LAROUSSE, 1995, p.3310).
O que começou a ser considerado como ideal para a moradia, foi à existência de
um quarto para os pais e quartos separados para cada um dos filhos para que o
senso de autonomia começasse cedo. As divisões entre os dormitórios deveriam
ser de alvenaria e não mais de painéis deslizantes, para que se tivesse maior
privacidade, e entradas independentes por meio de corredores ou hall de acesso.
Outro ponto importante foi separar o local de comer do de dormir, segundo Waswo
(2002, p. 69) fato que dava mais dignidade ao trabalho doméstico e à dona de
casa. O espaço social da casa, antes restrito ao pai, agora poderia ser usado por
todos os integrantes da família.
137
Essas novas iniciativas com relação à distribuição espacial começaram a ser
implementadas com sucesso nos edifícios produzidos pela JHC18 nos anos 1950.
As plantas dos apartamentos foram fruto de estudos ergonômicos, onde os
espaços eram calculados e projetados para atender as necessidades dos
moradores. . Os conjuntos habitacionais do JHC não tinham nenhuma
preocupação com lazer dos moradores (WASWO, 2002, p. 81).
Em 1951 o governo Japonês escolhe uma unidade protótipo conhecida como 51-C.
O estudo do professor Yoshitake, da Universidade de Tókio, visava estandardizar a
habitação moderna. Os edifícios, seguiam os moldes das siedlungen alemãs,
edifícios de 3 ou 4 pisos em laminas, sem grande atenção aos espaços coletivos
abertos. Houve evoluções do modelo 51-C, surgindo o 2DK, ainda em 1951, e
posteriormente o 3DK, que são os legítimos standards de hoje, onde existem 2
cômodos com tatames para dormir, um para a cozinha e refeições e um pequeno
compartimento para se fazer a higiene pessoal ( TRAMONTANO, 1994).
A Dining-kitchen japonesa era uma adaptação da cozinha da década de 1920
pensada pela Bauhaus, com armários racionalizados e superfícies de trabalho.
Esse modelo se provou ser um sucesso e foi usado até os anos 1970, tanto em
projetos com dinheiro público quanto privado. Após os anos 1970 o modelo living
dining + kitchen (LD+K) passou a ser adotado, mesmo que para que esse novo
conceito fosse criado houvesse a necessidade da diminuição da entrada, fato que
foi motivo de críticas.
A idéia de que cada filho tivesse seu quarto para que a individualidade fosse
estimulada logo cedo não foi possível de ser executada nos grandes centros. O
18
Japan Housing Corporation
138
melhor que se conseguiu em pró da privacidade e individualidade foi dividir os
quartos em feminino e masculino.
No pós-guerra muitos apartamentos com dois cômodos mais cozinha (2DK) foram
produzidos. Durante meados da década de 1960, quando a escassez de
habitações estava mais branda, começaram a produzir os 3DK, onde havia um
cômodo a mais e uma DK mais espaçosa, que servia com mais conforto a
realização das refeições. Mas neste período se desenvolveu outro tipo de crise,
jovens casais de baixa renda com um ou dois bebês que não tinham moradias que
se adaptavam as suas necessidades.
Os primeiros 2DK tinham em media 40,13m², 16% menor que as moradias
produzidas antes da 2ª guerra. Na década de 1950 os tamanhos das unidades
evoluíram positivamente, em 1955 eram 42,92m², em 1965 eram 49,98m² e em
1973 eram 59,92m² (WASWO, 2002, p.73).
O exemplo da fig. 40 é o primeiro modelo de 2DK proposto pelos arquitetos
japoneses, e a fig. 41 apresenta o 2DK da JHC, com sutis diferenças na dining –
kitchen e no tamanho da varanda. Os dois quartos tem a mesma quantidade de
tatames, 4,5 e 6. A principal diferença, no 2DK da JHC, é que há local para se
tomar banho dentro do apartamento. Nas unidades produzidas pelo governo áreas
para banho foram aparecer apenas próximas aos anos 1970.
139
Fig. 40 Primeiro modelo do 2DK de 1951
Fonte: WASWO, 2002, p.72
Fig. 41 Modelo do 2DK usados pelo JHC em 1955
Fonte: WASWO, 2002, p.74
Nas figuras 42 e 43 mostram respectivamente evoluções dos modelos 2DK e 3DK.
Os quadriláteros vermelhos delimitam os 2 cômodos, no caso do 2DK e os 3 no
3DK. O quadrilátero azul delimita as dining-kitchen.
Fig. 42 Planta do 2DK produzido em 1975
Fonte: WASWO, 2002, p. 83
Fig. 43 Planta do 3 DK produzido em 1975
Fonte: WASWO, 2002, p. 83
140
No final do século XX do estilo japonês de morar restou uma sala de tatame e suas
portas de correr, os outros cômodos, segundo Waswo (2002, p. 124), passaram a
ser de acordo com os padrões ocidentais de costumes e seus móveis. A autora
acredita que em algumas gerações as salas em estilo japonês venham a
desaparecer.
A maior adaptação da sociedade japonesa a uma nova forma de morar, segundo
Waswo (2002, p. 126) foi o fato de não mais se sentar no chão. O fato do povo
japonês passar a usar móveis teve um custo espacial, os espaços não tinham sido
projetados para abrigar mobiliário, se tornando entulhados19.
A partir dos anos 1980 começou-se a corrigir a distorção entre a área necessária e
a disponível. Segundo Waswo (2002, p. 128) o tamanho das habitações no Japão
cresceu 54% entre 1963 e 1998, diminuindo a diferença relativa à área entre o
Japão e os paises da Europa ocidental.
Os modelos de plantas 2DK e 3DK não eram fixos, como se pode observar nas
figuras 44, 45, 27 e 28, existem variações com relação a disposição dos ambientes.
Esses modelos tinham fixo apenas o programa e dimensões máximas, restrições
impostas pelo governo para controlar o mercado da construção civil.
Analisando a estrutura da planta, tomando como base os projetos presentes nas
figuras 44 e 45, os espaços destinados a higiene pessoal são fragmentados, o
vaso sanitário esta sempre segregado da área do lavatório e de banho. Toda a
19
A mobília em uma moradia típica ocidental ocupa entre 40% e 50% do espaço da mesma.
(WASWO, 2002, p. 128)
141
circulação do apartamento é feita pelo espaço destinado a cozinha, e todos os
cômodos são voltados para ela, com exceção de um cômodo de tatame na figura
45. Nos dois modelos de apartamentos, o 2DK e o 3DK, notam-se a existência de
um hall de entrada que resguarda a visão do interior da unidade. Na figura 44 e 45
observa-se que duas das salas de tatame têm ligação entre elas. Interessante a
marcação de locais específicos para armazenamento (storage).
Fig.44 - Modelo Japonês 2DK
Fonte:
www.yamasa.org/acjs/português/esl.html
Acessado em: maio de 2007
142
Fig. 45 - Modelo Japonês 3DK
Fonte:
www.yamasa.org/acjs/português/esl.html
Acessado em: maio de 2007
143
3.2 ESTUDOS DE CASOS
3.2.1 Siemensstadt (Berlim - 1927)
Em
1927
começaram
os
trabalhos
de
Siemensstadt
(Berlim),
esse
empreendimento foi construido entre os bairros de Charlottenburg e Spandau, no
Nordeste de Berlim, próximo ao distrito industrial Siemens-Schuckert e tinha o
objetivo de ser um conjunto habitacional para os operários de uma das fábricas da
Siemens.
Hans Scharoun fez a implantação do conjunto e os prédios foram projetados por
ele mesmo e pelos arquitetos Hugo Häring, Walter Gropius, Henning, Bartinge F.
Forbat. Todo esse complexo habitacional continha 1.700 apartamentos com áreas
entre 48m² e 72m², e os prédios tinham entre três e quatro pavimentos (TEIGE,
2002).
Esse conjunto de edificações tinha, como era usual na habitação de baixa renda
modernista, infra-estrutura comum, como jardim de infância, centros de saúde,
lojas e até mesmo um sistema exclusivo de calefação (FORSTER, 2006).
A edificação a ser analisada é a de Hans Scharoun. Nas figuras 46 e 47 percebese pelas fachadas as diferentes plantas existentes em um mesmo bloco de
apartamentos e a presença das varandas.
144
Fig.46 - Berlim Siemensstadt (Berlim)
projeto de Hans Scharoun
Fonte:
http://www.capitalieuropee.altervista.org/
1/132.html
Acessado em 05.12.2007
Fig. 47 - Berlim Siemensstadt (Berlim)
projeto de Hans Scharoun
Fonte:
http://www.capitalieuropee.altervista.org/1/13
2.html
Acessado em 05.12.2007
Na figura abaixo (fig. 48) percebe-se que o apartamento tem seu programa em um
só piso, com sala, pequeno hall de entrada, cozinha (independente da sala),
banheiro, dois dormitórios (casal e solteiro com 2 camas) e varanda. Pela análise
do desenho esse deve ser o maior modelo de planta do Siemensstadt (Berlim) com
72m² e cada pavimento tem duas unidades servidas por uma escadaria. As áreas
destinadas a banheiro e cozinha ficam do mesmo lado da edificação, e separadas
145
a uma distancia aproximada de 2,75m, espaço da sala de jantar. No caso
analisado, as três peças essenciais do banheiro, vaso sanitário, banheira e
lavatório se encontram no mesmo espaço, diferente de muitos exemplos onde há
um espaço exclusivo para o vaso.
Fig. 48 - Um dos modelos de planta da Siemmenstadt projeto de Hans Scharoun
Fonte: TEIGE, 2002 p. 203
Na figura 49 é apresentado o projeto do Siemenstadt digitalizado e com as cotas
referentes as medidas internas dos ambientes, e legenda com o nome dos
cômodos presentes.
146
1
2
3
4
5
6
LEGENDA
Sala
hall
Cozinha
Dormitório 1
Dormitório 2
Dormitório 3
7
8
9
10
11
Circulação
Circulação vertical
WC
Banheiro
Varanda
Fig. 49 - Planta do apartamento Siemmenstadt digitalizada
FONTE: Elaborado pela autora a partir do desenho da fig. 31.
Um ponto importante a ser levantado é que todos os cômodos da habitação têm
janelas, havendo iluminação e ventilação natural por toda parte. Outro é o fato de
muitos componentes da construção como as lajes e painéis de vedação são
standardizados.
O progresso das reformas relativas à habitação e a evolução do jeito moderno de
morar podem ser observadas nas exibições feitas na Europa. Esses eventos
mostraram ao mundo inovações no campo dos materiais, técnicas construtivas e
uma nova arquitetura (TEIG, 2002).
147
3.2.2 Wohnblock Wiessenhof (Stutgart - 1927)
O arquiteto alemão Mies van der Rohe foi responsável pela escolha dos
profissionais e também por uma das edificações do complexo “Weissenhof
(Stuttgart)” construído em Stuttgart para a exposição do “Werkbund”. O Weissenhof
foi um importante show room das inovações pregadas pelo Deutcher Werkbund, foi
uma forma de demonstrar com exemplos construídos as novas possibilidades e
ganhar a confiança do público. A verba para este complexo de edifícios veio do
governo alemão, visto que o Werkbund era uma instituição estatal (BENEVOLO,
2006, p. 476)
Nesse conjunto habitacional Mies Van Der Rohe começa a resolver a questão
entre forma e estrutura, com a ajuda da estrutura metálica, usada pela primeira vez
pelo arquiteto segundo John Zukowsky (1986). As paredes externas são de blocos
de concreto cobertas por estuque. Na realidade o sistema estrutural baseado no
aço permite maior flexibilidade dos espaços.
O projeto de Mies Van der Rohe, é um edifício articulado que permite que não haja
muros no exterior e as divisões internas das unidades são flexíveis, com exceção
da cozinha e banheiro, os espaços não têm função definida, permitindo uma maior
liberdade dos moradores. O único aspecto restritivo são os caixilhos, já que a
posição destes não pode ser alterada de acordo com as vontades de cada
morador, já que compõem a fachada. As janelas são grandes e contínuas
permitindo uma boa penetração da luz solar dentro dos apartamentos. As unidades
foram um exemplo de organização racional dos espaços segundo Giedion (1954).
Na planta abaixo, fig. 50 observa-se apartamento de dois dormitórios, banheiro,
cozinha, varanda, sala e despensa, o que não era muito comum nos projetos de
habitação mínima. Interessante ressaltar que pela observação da planta (fig. 50)
148
percebe-se uma grande área destinada ao armazenamento, como toda a área de
corredor ladeada por armários, existência de despensa e armários na sala. No
projeto analisado percebe-se que o corredor faz a ligação da entrada da unidade
com quartos, cozinha, banheiro e sala, área considerável para um apartamento
desse tamanho. Há também uma porta que liga os dois quartos, portanto pode-se
usar um dos dormitórios como passagem, mas há a alternativa de se entrar em um
dos quartos pela sala. Nesse caso todos os ambientes têm iluminação e ventilação
naturais, havendo janelas apenas em duas das faces do apartamento.
Fig. 50 - Planta do conjunto habitacional Weissenhof (Stuttgart) projetado por Mies Van der Rohe
Fonte: Benévolo, 2006, p. 461
Na figura 51 pode se observar a planta do Weissenhof digitalizada, com as cotas
das dimensões internas do apartamento. Uma legenda com os nomes dos
cômodos e números correspondentes, esclarece a função de cada espaço.
149
1.
2.
3.
4.
5.
6.
LEGENDA
Sala
hall
Cozinha
Dormitório 1
Dormitório 2
Dormitório 3
8. Circulação
9. Circulação vertical
10. WC
11. Banheiro
12. Varanda
Fig. 51 Planta do apartamento Weissenhof digitalizada
FONTE: Elaborado pela autora a partir de Benévolo, 2006, p. 461
Na fig. 52 abaixo, observam-se que as grandes aberturas dos quartos e cozinhas
são iguais e o banheiro tem um módulo menor de janela. Pela fachada pode-se
notar que três dos pavimentos tem apartamentos nos moldes da planta da fig.50.
No último andar e pavimento semi-enterrado as janelas menores evidenciam uma
outra distribuição ou uso dos espaços.
150
Fig. 52 - Fachada do edifício de
Mies Van der Rohe para a o
Weissenhof (Stuttgart).
Fonte:
http://archiguide.free.fr/PH/ALL/S
tu/StuttgartWeissMies.jpg
Acessado em: 05.12.2007
3.2.3 Narkomfin (Moscou – 1928/1930)
No inicio dos anos 1920 o governo da URSS promoveu uma série de competições
para o desenvolvimento de habitações coletivas. Um importante exemplo de
habitação de dimensões mínimas foi o Conjunto habitacional de Narkomfin
construído em Moscou no final da década de 1920.
Em 1928 o Stroiko, (Comitê de Construções Estatais) cria uma linha de pesquisa,
liderada por Ginzburg, que em 1929 cria um tipo de apartamentos mínimos de
27m² ou 30m², chamados de célula F, situados em grandes blocos com diversos
serviços coletivos. Esses apartamentos eram menores que as unidades da
Siemensstadt de Berlim (48m² a 72m²), mas semelhantes ao que era produzido por
Ernest May (40m² a 30m² ) em Frankfurt.
Segundo Florence (2005) o modelo tradicional da casa burguesa com
apartamentos monofamiliares cede terreno à casas comuns. Este espaço é
concebido por um estilo de vida integralmente comunitária cuja evolução leva ao
151
desaparecimento progressivo dos serviços essenciais como banheiro e cozinha,
sendo substituídos por equipamentos de uso coletivo.
Apenas dois exemplares seguindo as pesquisas da União Soviética foram
construídos, os desenvolvidos por Moisei Ginzburg e Ignaty Milinis entre 1928 e
1930, um deles foi o Conjunto habitacional de Narkomfin em Moscou (fig. 53).
O projeto de Ginzburg mostram uma unidade habitacional composta de 4
construções: o edifício residencial; um conjunto social (uma unidade funcional
comunitária autônoma, equipada com um ginásio e um refeitório, ligados por uma
passagem coberta); uma escola maternal e uma construção auxiliar ligada a
serviços comuns como uma lavanderia, uma oficina de reparos e equipamentos
técnicos (FLORENCE, 2005).
A unidade residencial tem cinco andares sobre pilotis e é constituída por células de
habitação modulares e dotadas de tipologias diferenciadas. As células são servidas
por duas ruas tipo corredor no primeiro e no quarto andar (FLORENCE, 2005). Um
dos chamarizes do projeto, estas “ruas” eram espaços semi-públicos de uso
múltiplo, que inspirou as “ruas” internas e os apartamentos intercalados de Le
Corbusier na Unidade Habitacional de Marselha. Diferente de Le Corbusier, Moisei
Ginzburg e Ignaty Milinis revestiram a lateral dessas ruas internas de vidro, o que
permite que esse espaço seja iluminado com luz natural, o que fica visível na
volumetria da fig. 53, na foto da fachada fig. 54 e na imagem do interior da “rua”
interna na fig. 55 (FORSTER, 2006).
Segundo Florence (2005) o fator tecnológico tem uma função importante. A adoção
de técnicas construtivas experimentais, a estandardização dos elementos
construtivos como pilares, portas, janelas e vigas, fazem desta construção um
152
modelo de referencia para o plano de modernização da industria da construção
soviética que está nascendo.
Fig. 53 - Volumetria - Narkomfin (Moscou) semi-collectivized housing complex
Fonte:
http://www.archi.fr/DOCOMOMO-FR/Narkomfin (Moscou)-fr.htm
Acessado em: 30.04.07
Fig. 54 - Narkomfin (Moscou) semi-collectivized housing complex
Novinsky boulevard 25 (korpus B)
Moscow 1928 - 1930
Fonte: www.maps-moscow.com/index.php?chapter_id=181&data_id=30&do=view_single
Acessado em 30.04.07
153
Fig. 55 - Foto da “rua” interna
Fonte:
www.archi.fr/DOCOMOMO-FR/Narkomfin (Moscou)-fr.htm
Acessado em: 30.04.07
Fig. 56 Planta - Narkomfin (Moscou) semi-collectivized housing complex
Fonte:www.archi.fr/DOCOMOMO-FR/Narkomfin (Moscou)-fr.htm
154
LEGENDA
1- Sala
2- hall
3- Cozinha
4- Dormitório 1
5- Dormitório 2
6- Dormitório 3
7- Circulação
8- Circulação vertical
9- WC
10- Banheiro
11- Varanda
12- Despensa
Fig. 57 Planta do apartamento Narkomfin digitalizada
FONTE: Elaborado pela autora a partir do desenho da fig. 37.
Na figura 56 acima se pode ver um dos modelos de plantas do conjunto de
Narkomfin (Moscou), o tipo analisado é duplex, a sala com pé direito duplo e
cozinha ficam no piso onde acontece a entrada do apartamento e no segundo
ficam os dois dormitórios, banheiro e w.c. Neste caso o lavatório e a banheira ficam
em espaço diferente do vaso sanitário, este tem um cômodo exclusivo. Na figura
57 é apresentada a planta do Narkomfim digitalizada com as medidas internas e
legenda com os nomes dos cômodos.
155
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